Módulos do Curso
DEPRESSÃO E TRANSTORNO BIPOLAR NO MUNDO REAL curso liberado
- A RELAÇÃO COM O PACIENTE E O SENTIMENTO DE QUEM O TRATA
- DIAGNÓSTICO DAS (INÚMERAS) DEPRESSÕES
- DIAGNÓSTICO DOS (VÁRIOS) TRANSTORNOS BIPOLARES
- DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
- TRATANDO AS DEPRESSÕES NO MUNDO REAL
- MEDICAMENTOS PARA AS DEPRESSÕES
- PSICOTERAPIAS DAS DEPRESSÕES
-
TRATANDO OS T. BIPOLARES NO MUNDO REAL
- STEP-BD
- GUIAS - ALGORÍTMOS - CAMINHOS
- ALGORITMO DO TEXAS PARA BIPOLAR I
- GUIA DA APA PARA OS T BIPOLARES
- ESTABILIZADORES DO HUMOR
- ANTIPSICOTICOS ATÍPICOS E ANSIOLÍTICOS
- PSICOTERAPIAS NOS T. BIPOLARES
- BIPOLAR COM ENXAQUECA: NOVO SUBTIPO?
- BIPOLAR II: ALTA RECORRENCIA DE DEPRESSÃO
- EXERCÍCIO
- Vídeo - JACK LONDON
- SUICÍDIO
- ANTIDEPRESSIVOS EM PACIENTES COM OUTRAS DOENÇAS FÍSICAS
- INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS
- GRAVIDEZ
- AMAMENTAÇÃO
- ESCALAS DE AVALIAÇÃO DAS DEPRESSÕES
- AS CLASSIFICAÇÕES
- FUNÇÕES EVOLUTIVAS DA DEPRESSÃO
- O FUTURO
- NOVIDADES QUE ACRESCENTAM
A RELAÇÃO É TUDO
1.2. A RELAÇÃO É TUDO
Na minha opinião, aqui reside o busílis da questão: a relação com o paciente e com seus familiares determinará o sucesso ou o insucesso do tratamento. Dicas:
a. O paciente deverá perceber o médico como alguém interessado nele e otimista em relação a sua melhora. Mas para se mostrar assim, o médico tem de estar assim.
b. É fácil estarmos otimistas, pois realmente houve um formidável progresso nesses trinta anos.
c. E estarmos interessados no paciente é estarmos interessados em nossas próprias vidas. Afinal, por que estudamos e praticamos tanto? Cada paciente que atendemos, cada um, faz parte de nossa própria biografia. Biografia profissional e biografia de vida.
d. Devemos ter suficiente humildade para saber que nenhum de nós está livre de ser um dia invadido pela síndrome de Burnout: um estresse crônico, um desânimo, uma desesperança em relação à atividade que se faz. Se isto acontecer, vamos ver quais fatores estão nos levando a ela: excesso de trabalho, condições inadequadas, necessidade de aprimorar nossa capacidade de manejar os conflitos de relacionamento com colegas, com familiares, com pacientes? Vamos corrigi-los. Se necessário, vamos buscar ajuda junto a um colega.
e. Na nossa frente temos um ser humano que está com medo e com desesperança, um ser humano que observa se nós nos colocamos no lugar dele, se temos verdadeira empatia por ele; se nossa postura é a de quem vai, sim, assumir para valer o seu caso. Ele já lutou com suas próprias forças e, quem sabe, perdeu as esperanças. Não tem mais amanhã. Lembro-me de um paciente deprimido que, ao final da primeira consulta, retirou do bolso meio sem querer um bilhete premiado de loteria. Não tinha tido ânimo para ir no banco retirar o dinheiro. Um poeta uma vez escreveu que nunca vira um suicida com um bilhete premiado de loteria. Mas nós que trabalhamos com depressão já vimos.
f. Precisa estabelecer uma relação forte com o paciente, forte o suficiente para que ele possa acreditar em nós. “Doutor, agradeço seu interesse, mas seu esforço não vai adiantar nada, não há esperança para mim”. Entendo que ao dizer isso o paciente está, ao mesmo tempo, sendo sincero e observando se nós, que pensamos o contrário, também estamos sendo sinceros, se nosso otimismo em relação a seu futuro é mesmo sincero.
g. Quando o paciente é bipolar e o atendemos em fase maníaca, o que vemos? Uma pessoa que perdeu o juizo crítico, perdeu a noção de perigo. É um ser humano que dá a impressão de que logo vai estar metido em alguma tragédia, que tudo é fácil, um otimista irrealista. É alguém que parece bêbado sem ter bebido, cujos familiares já se indignaram com suas atitudes e já entraram em atrito com ele. Ao contrário deles, precisamos conviver com seu comportamento de risco sem entrar em atrito, mas sendo realistas e firmes.
h. A relação que estabelecemos com o paciente e com os seus familiares também é a relação de professor. Sim, precisamos informá-los ao máximo sobre a doença, ao ponto de as opções de tratamento poderem ser discutidas com eles. Vamos informá-los que o início do quadro pode ser súbito ou pode vir surgindo pouco a pouco. Quanto a seu prognóstico, vamos explicar que, quando diagnosticado e tratado adequadamente, o prognóstico é muito bom. Quanto à etiologia vamos explicar que são vários os fatores envolvidos: ambientais (dieta, álcool, ritmos biológicos), individuais (relacionados à personalidade) e dos relacionamentos interpessoais – que desencadeiam a doença em pessoas biologicamente vulneráveis. Os fatores psicossociais em geral representam desencadeantes, por exemplo a perda do emprego, de um ente querido, separações. Os fatores genéticos são fundamentais. Não existem traços de personalidade predisponentes; a depressão pode ocorrer em qualquer tipo de personalidade.
i. A porta estará sempre aberta para aquele paciente que nos abandonar. Entender que é humano numa doença cuja melhora, por vezes, demora, à procura de outra opinião profissional ou, até mesmo, de condutas pseudocientíficas ou escapes milagrosas. Eu digo: “Duas cabeças pensam melhor que uma. A opinião de outro colega vai nos ajudar, com certeza”. Quanto a suas crenças, vamos respeitá-las ao máximo. Lembro-me de um casal, cuja esposa sofria de depressão, que, ao sair da primeira consulta, perguntou-me o local do cemitério onde estava enterrada uma jovem que possuía, segundo eles, poder de cura. Quando a vi, após trinta dias, estava bem melhor da depressão. Achavam que a reza no cemitério fora fundamental, do que eu não discordei.
j. Sabemos da importância de o paciente manter o vínculo com um mesmo profissional. Pode ter idas e vindas, abandonos e retornos, mas deve manter o vínculo. Evolui mal aquele paciente que pula de galho
k. Os problemas de relacionamento que o paciente revela conosco não são pessoais. É fruto de seu sofrimento. Por isso, é fácil tolerá-los.
l. Podemos atender um amigo? Certa vez, um amigo me fez atendê-lo e me fez mudar. Até então não atendia amigo, encaminhava. Mudei. O critério é outro, é perceber se me sinto à vontade atendendo aquela determinada pessoa, seja ela amigo ou não. Quantos pacientes depois se tornam nossos amigos?
m. “A técnica é o paciente”, ouvi certa vez do colega Paulo Sérgio Rosa Guedes, no sentido de que é o paciente que vai determinar a técnica empregada, não a preferência do terapeuta. Vale para a psicoterapia e vale para a medicação. Entre todos os medicamentos eficazes, há um que é o que se ajusta melhor e assim sendo: “O medicamento é o paciente que determina”.
n. Há pacientes e pacientes, claro. Há pessoas e pessoas. Há pacientes chatos? Sim. São a exceção. Na vida pessoas chatas são a exceção, não a regra.
o. Se você que lê este curso é paciente, colabore com seu médico. Quantas vezes já fui paciente! Continuo sendo e serei até o final da vida. Sempre penso assim: “O médico que me atende é um ser humano, sou paciente de um ser humano, tenho de saber me relacionar com ele, tenho, sim, de ter paciência com ele. Não sou um ‘paciente’?”
p. Estaremos sempre disponíveis aos nossos pacientes e aos seus familiares por telefone.
q. Quando, por mais que revisemos o andamento do caso, sua evolução segue não sendo boa, vamos encaminhá-lo a outro colega.
r. Quando já “de cara”, na primeira consulta, vejo que o caso não é bem para mim, encaminho-o imediatamente. Devolvo o dinheiro da consulta, orientando que seja usado na consulta com o outro médico.
s. Importantíssimo! Atendemos doentes, não doenças. Para ter uma boa relação com alguém é útil conhecê-lo. Saber quem é “esse que está a nossa frente”. Descobrir o “jeito de chegar”. Para tanto, precisamos observar seu nível de maturidade, traços de personalidade, ética e moral, sua inteligência interpessoal, sua capacidade de empatia, suas qualidades e seus defeitos. O curso RELAÇÕES INTERPESSOAIS INTELIGENTES trata deste tema.
Vídeo - SENTIMENTO DE QUEM TRATA
COMEÇA O TRATAMENTO
1.3. COMEÇA O TRATAMENTO
Já no início do atendimento precisamos conhecer o ponto de vista do paciente em relação ao sofrimento que o traz à consulta. As “oito perguntas de Arthur Klenman” nos respondem à questão:
1. Como é o nome do seu problema?
2. Qual foi a causa?
3. Por que você acha que começou quando começou?
4. O que causa a você?
5. Qual a intensidade do problema?
6. De que você tem mais medo com relação a ele?
7. Quais são os principais problemas que lhe tem causado?
8. Que tipo de tratamento você acha que deve receber?
Alguns pacientes chegam ao psiquiatra alegando sofrerem de nervosismo, ou de terem tido um ataque de nervos, ou de sofrerem de um “mau humor terrível”. Quem sofre de nervosismo em geral apresenta um quadro de transtorno de ansiedade generalizada (TAG). O ataque de nervos pode ser uma crise de pânico ou uma crise dissociativa, ou, ainda, uma frustração seguida de agressividade. O “mau humor terrível” pode ser sintoma de um quadro depressivo.
As perguntas de Arthur Kleinman revelam o respeito que o médico tem pelas concepções prévias do seu paciente. E também servem para perceber o nível de entendimento e o quanto de informações o médico deverá passar na consulta.
O DIAGNÓSTICO INICIAL
1.4. O DIAGNÓSTICO INICIAL
Além das “oito perguntas de Arthur Kleinman” que faço ao paciente e além da anamnese inicial, faço-me QUINZE perguntas.
AS QUINZE PERGUNTAS QUE DEVEMOS NOS FAZER NA PRIMEIRA CONSULTA:
1. Trata-se de episódio maníaco?
2. Episódio depressivo?
3. Misto?
4. Está psicótico?
5. Risco de suicídio?
6. Possui familiar ou amigo interessado e capaz de cuidá-lo?
7. O paciente aceita fazer o tratamento?
8. Faz-se necessário avaliação neurológica e clínica?
9. Quais traços de personalidade ele apresenta?
10. Qual seu nível de maturidade?
11. Quais qualidades humanas me chamaram a atenção nele?
12. Quais defeitos?
13. É fácil ou difícil estabelecer vínculo com ele? Ele possui boa empatia?
14. Que sentimento despertou em mim?
15. Estou me sentindo capacitado para atendê-lo?
Vídeo - ERNEST MILLER HEMINGWAY (1899-1961)
Vídeo - IRRITAÇÃO NO TRÂNSITO
SINTOMAS PRINCIPAIS
2.1. SINTOMAS PRINCIPAIS
Mas é claro que ainda observamos a sua aparência geral: expressão facial triste, olhar melancólico ou arregalado, apreensivo, testa franzida, ombros curvados, lentidão no andar e no falar. E observamos seus sintomas, que são muitos, mas os principais são os seguintes:
1.Humor depressivo.
2.Falta de interesse e motivação.
3.Lentidão psicomotora.
4.Redução da energia mental e física.
5.Redução ou ausência da capacidade hedônica, em outras palavras: da capacidade sentir prazer, alegria, felicidade em situações cabíveis e proporcionais a elas.
6.Irritabilidade e “tolerância zero”: tudo o incomoda, muito sensível, tudo o “pega”.
7.Mau humor, tipo: “até as dez horas da manhã evite falar com ele”.
8.Nem todos os estados depressivos se caracterizam por sentimentos de tristeza ou humor depressivo; algumas depressões se manifestam apenas por apatia e por falta de motivação.
9.Avaliação pessimista de si mesmo e de tudo que o rodeia; assim, descreve seu passado, seu presente e seu futuro.
10.Sentimentos e idéias negativas de tipo: baixa auto-estima, fracasso, ruína, inferioridade, inutilidade, auto-recriminação, culpa, pecado, doença grave, vazio, desesperança.
11.Medo, insegurança, sente-se ameaçado pelo futuro; preocupações excessivas e desproporcionais aos fatos.
12.Dificuldades na atenção.
13.Dificuldades na memória.
14.Insônia inicial: dificuldade para adormecer.
15.Insônia intermediária: despertar durante a noite com dificuldade para voltar a dormir.
16.Insônia terminal: despertar muito cedo, sendo incapaz de conciliar o sono novamente.
17.Sonolência exagerada: sono noturno prolongado com dificuldade para despertar pela manhã ou sonolência diurna.
18.Pesadelos: estima-se a prevalência em
19.Idéias delirantes negativas, de pecado, de culpa, de destruição, podem estar presentes; um paciente me disse, depois de melhorar, que tinha a convicção de que eu iria matá-lo com os remédios e que não teve vontade de se defender, pois achava justo, merecia ser justiciado.
20.Idéias suicidas.
21.Perda de peso ou ganho de peso significativo: mais de 5% do peso corporal em um mês.
SÓ SINTOMAS? O DIAGNÓSTICO EXIGE MAIS
2.2. O DIAGNÓSTICO EXIGE MAIS.
Para se fazer o diagnóstico é necessário que o quadro sintomatológico já se faça presente por duas semanas pelo menos (veremos no módulo classificações). Na fase diagnóstica, temos de observar bem mais que os sintomas.
Dicas:
a.Determinar se o diagnóstico é mesmo de depressão.
b.Determinar se há outra doença psiquiátrica no paciente e doenças orgânicas.
c.História da doença atual.
d.Sintomas: quais os que mais incomodam o paciente?
e.História psiquiátrica prévia, incluindo se apresentou sintomas de mania.
f.Resposta a prévios tratamentos.
g.História médica geral.
h.História de dependência a substâncias.
i.Histórico resumido de sua vida emocional: infância, adolescência, adulto jovem...
j.Vínculos familiares antigos e atuais.
k.Exame das funções mentais (no site, leia em "MUITOS TEXTOS": CAPACIDADES DA MENTE:ASMOCPLIAC)
l.Avaliar risco de suicídio e o apoio que ele pode conseguir no sentido de vigiá-lo e de cuidá-lo.
Vamos observar:
I – presença de idéias suicidas ou homicidas
II – presença de planos para se suicidar
III – tentativas prévias
IV – acesso a armas, venenos, medicamentos, ou seja, de meios para tirar a sua vida ou a de outros
V – uso abusivo de álcool ou outras drogas
VI – história de tentativas sérias no passado
VII – história de suicídio na família
VIII – acompanhou recentemente os fatos relacionados ao suicídio de alguém.
m.Avaliar prejuízo que possa estar tendo pela depressão em sua vida de relação tanto afetiva, profissional, lazeres e outros interesses.
n.Observar a capacidade de empatia do paciente; haverá aderência ao tratamento? Seus familiares poderão colaborar nesse sentido?
o.Observar sentimentos transferenciais e contratransferenciais.
p.Começar a educá-lo quanto á doença depressiva, sua evolução com e sem tratamento, o tempo que os remédios levarão para agir, o que é remissão, as modalidades de tratamento, etc.
SUBTIPOS: O ESPECTRO DEPRESSIVO (1)
2.3. SUBTIPOS: (1)
São vários os tipos ou subtipos de depressão (espectro depressivo), e em cada um deles os sintomas se agrupam de forma diferente.
(1) DEPRESSÃO UNIPOLAR
Também chamada de depressão maior e de depressão endógena. Neste tipo vamos encontrar vários quadros (subtipos) que apresentam características comuns: o paciente não apresenta episódio maníaco; o quadro não é causado por fatores externos, como perdas ou desilusões, os quais podem colaborar para o desencadeamento da doença; a causa da doença está dentro do indivíduo, é endógena, está relacionada a alterações na bioquímica do seu cérebro.
EPISÓDIO DEPRESSIVO*
|
1. Humor deprimido 2. Sono perturbado
3. Apetite diminuído ou aumentado 4. Perda de interesse e prazer
5. Pensamento negativo e pessimista 6. Atividade diminuída
7. Sentimento de culpa e de inutilidade 8. Energia reduzida
9. Idéias ou atitudes auto ou heteroagressivas |
*Com base na CID-10 |
(2) DEPRESSÃO MELANCÓLICA
Neste subtipo o paciente revela fortes idéias de culpa e prejuízo na sua psicomotricidade: seus movimentos e pensamentos estão mais lentos que o habitual. A depressão melancólica caracteriza-se por anedonia absoluta, humor depressivo não-reativo a estímulos agradáveis e de qualidade distinta da tristeza normal (diferente do luto), sentimentos de culpa, insônia terminal, diminuição de apetite, perda de peso e retardo ou agitação psicomotora. Esses sintomas se denominam “características melancólicas” ou “sintomas somáticos” (excetuando sentimento de culpa) de um episódio depressivo.
(3) DEPRESSÃO PSICÓTICA
Sua psicomotricidade está prejudicada e ele se mostra fora da realidade: no conteúdo de seu pensamento observamos idéias delirantes de culpa; também pode apresentar idéias delirantes paranóides, ficar, por exemplo, desconfiado de que estão falando dele ou armando algo contra ele; pode apresentar ilusões e alucinações. Trata-se de depressão grave, na qual ocorrem sintomas psicóticos (delírios e/ou alucinações), que podem ser congruentes ou incongruentes com o humor. Os delírios comumente são de ruína financeira ou moral, doença, culpa, morte ou aniquilação. Entre as alterações sensoriais e de percepção, as alucinações geralmente são auditivas (vozes acusatórias) e muitas vezes não passam de uma sensação de ouvir barulhos na casa ou chamar seu nome; podem ser visuais, de conteúdo desagradável (visões do próprio túmulo, de pessoas mortas etc.), ou caracterizar-se por ilusões (sensação de ver vultos, por exemplo). O paciente pode apresentar um comportamento psicótico. Van Gogh, por exemplo, apresentou comportamento psicótico ao cortar a própria orelha.
(4) DEPRESSÃO ANSIOSA
A ansiedade é o sintoma principal.
(5) DEPRESSÃO IRRITADA
Irritação e tolerância zero.
(6) DEPRESSÃO RAIVOSA
É constante a raiva no interior do paciente.
(7) DEPRESSÃO IMPULSIVA E AGRESSIVA
O paciente age impulsivamente. Por vezes, por exemplo, num impulso joga objetos na parede. O sistema serotoninérgico mostra-se alterado. Níveis diminuídos de um metabólito da serotonina 5-HIAA têm sido encontrados nestes pacientes. Usando um ISRS, a melhora da impulsividade e da agressividade, na minha observação, aparece após uma semana. Um ISRS pode ser ineficaz e outro pode resolver o problema.
(8) DISTIMIA
A depressão é leve, persistente, crônica. Parece ser o próprio jeito do indivíduo. Dizem: “sempre foi assim”. O quadro clínico da distimia é semelhante ao do episódio depressivo maior, porém com sintomatologia atenuada e evolução crônica com duração de pelo menos dois anos.
São sintomas comuns a letargia, inércia (piores pela manhã), anedonia, dificuldades de concentração, sentimentos de inadequação e baixa auto-estima. Alterações marcantes no apetite, agitação ou retardo psicomotor são incomuns. Os pacientes queixam-se de desânimo, mau humor e infelicidade, que muitas vezes são interpretados como características inerentes ao indivíduo devido à cronicidade do quadro. Caracteriza-se por uma depressão leve ou moderada de duração de pelo menos dois anos. Seu período de melhora ou remissão raramente ultrapassa dois meses. São pessimistas crônicos, introvertidos, com baixa auto-estima e quase incapazes de se divertir.
Costuma-se classificar a distimia como de início precoce ou tardio se antes ou depois dos vinte um anos de idade. Costuma apresentar comorbidade com depressão maior, uso de álcool e outras drogas.
É importante não confundir com estados mistos depressivos de leve a moderada intensidade, nos quais os pacientes são extremamente irritáveis e podem ter crises de raiva. São mentalmente acelerados, apesar do conteúdo do pensamento ser negativo.
DISTIMIA
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1.Humor deprimido de muito tempo.
2.Principiou no início da vida adulta e persiste por anos e anos.
3.Os sintomas são leves.
4.Paciente preocupado e queixoso, em geral não dorme bem.
5.Mesmo se sentindo às vezes inadequado, consegue lidar com a vida. |
O termo “distimia” é de origem grega e seu significado inicial era “mal-humorado”. A distinção entre este quadro e o chamado transtorno de personalidade de depressiva ainda é controversa.
Tratamento: antidepressivos e a aquisição de habilidades interpessoais, já que em geral ficaram prejudicados pelo isolamento que a doença lhes provovou.
Acredita-se que 3,3 % da população sofra de distimia.Este quadro é diagnosticado quando a pessoa apresenta humor deprimido ou irritável por um período de pelo menos dois anos para o adulto e de pelo menos um ano para a criança e para o adolescente.
Além de humor deprimido e/ou irritável devem estar presentes pelo menos dois dos seguintes sintomas: (1) apetite diminuído ou aumentado; (2) insônia ou muito sono; (3) fadiga ou baixa energia; (4) auto-estima baixa; (5) dificuldade de concentração e de tomar decisões.
Os sintomas não podem ter desaparecido por um período que ultrapasse a dois meses. Caso isso ocorra, trata-se de outro tipo de depressão que não a distimia. A pessoa com distimia pode apresentar episódios de depressão mais grave, a que alguns chamam de depressão dupla: a distimia e outra mais grave.
Acredita-se que 75% das crianças e dos adolescentes que apresentam distimia acabam apresentando um quadro de depressão de tipo mais grave. Mais uma razão para se diagnosticar e tratar esses quadros.
(9) DEPRESSÃO SAZONAL
É caracterizada pela ocorrência de episódios depressivos em épocas características do ano, mais comumente no início do outono e inverno com remissão na primavera. Ocorre predominantemente em mulheres e os sintomas atípicos (hipersônia, hiperfagia, letargia, ganho de peso e avidez por carboidratos) são freqüentes.
(10) DEPRESSÃO ATÍPICA
Nos quadros de depressão atípica encontramos inversão dos sintomas vegetativos (aumento do apetite, do sono, ganho de peso, “paralisia de chumbo”, isto é, sensação de ausência total de força), reatividade do humor (capacidade de se alegrar com eventos positivos) e um padrão persistente de extrema sensibilidade à percepção de rejeição interpessoal. Sintomas atípicos, particularmente o aumento de apetite e a hipersônia, são mais comuns em deprimidos bipolares.
Critérios diagnósticos estão sendo propostos para o DSM-V (Stewart JW, McGrath PJ, Quitkin FM, Klein DF. Atypical depression current status and relevance to melancholia. Acta Psychiatr Scand, 115(S433):58-71, 2007):
1.Preenche critérios de depressão maior ou distimia;
2.Uma das seguintes características deve estar associada: hiperfagia, hipersonia, paralisia grave, sensibilidade patológica a rejeição.
3.Início de disforia importante antes dos 20 anos de idade.
4.Quase não há bem-estar espontâneo desde que a doença começou.
5.Há pelo menos 2 anos vem doente.
6.Não está presente psicose.
(11) DEPRESSÃO BIPOLAR
Ocorre em pacientes portadores de transtorno bipolar, nos quais se alternam episódios depressivos, mistos e maníacos ou hipomaníacos. O único critério reconhecido para diferenciar episódios depressivos bipolares de unipolares é a história de episódio hipomaníaco (TB tipo II) ou maníaco (TB tipo I). Em deprimidos bipolares observam-se mais retardo psicomotor, sintomas atípicos (anergia, hipersônia e hiperfagia), sintomas psicóticos e, menos freqüentemente, ansiedade e insônia inicial. Os quadros bipolares são caracterizados por início mais precoce, maior número de episódios e maior probabilidade de abuso de substâncias ao longo da vida. Esses sintomas podem ser utilizados como indicadores se houver dúvidas quanto à polaridade do episódio depressivo, orientando, assim, a escolha terapêutica.
O risco de suicídio é maior em deprimidos bipolares do que nos unipolares, principalmente no TB tipo II, o mais freqüentemente confundido com depressão unipolar. Porém, ocorrem alguns exageros. O primeiro é considerar que quadros de depressão unipolar são, na verdade, bipolares; que os episódios maníacos ou hipomaníacos não foram percebidos na avaliação (bipolar I e II). Tal fato induz o médico a usar sempre um estabilizador do humor, afinal poderia não ser uma depressão apenas unipolar. Um paciente poderá ficar recebendo por muitos anos um medicamento desnecessariamente
(11) DEPRESSÃO AGITADA
Em geral, o quadro agudo é aquele que denominamos depressão unipolar agitada. Vamos tratá-lo com antidepressivos e ansiolíticos ou com antipsicóticos atípicos. E vamos observar ao longo do tratamento se não se trata de um paciente bipolar II ou bipolar V. Caso for, teremos de acrescentar um estabilizador do humor ou um antipsicótico atípico. Aliás, mesmo em se tratando de um quadro uni e não bipolar, é freqüente que pelo menos durante um tempo acrescentemos um antipsicótico atípico. A agitação do paciente requer isto. Na Universidade de Nápoles na Itália, foi realizada uma grande pesquisa sobre o unipolar agitado: Maj M, Pirozzi R, Magliano L, Fiorillo A, Bártoli L. Agitated “unipolar” major depression: prevalence, phenomenology, and outcome”. J Clin Psychiatry, 2006 May; 67(5):712-9. Este estudo foi realizado entre 1º de janeiro de 1978 até 31 de dezembro de 1996. É comparada a evolução de 94 pacientes com depressão agitada com 94 pacientes com depressão não agitada. O grupo com depressão agitada passou mais tempo no período com os sintomas da doença e recebeu mais antipsicóticos atípicos que o outro grupo.
(12) MASCARADA P/ SINTOMAS FÍSICOS
O paciente já consultou inúmeros clínicos em virtude de variados e vagos sintomas, especialmente dores de caracterização imprecisa. Não se encontraram outras causas para justificá-los. Lembro-me de um paciente que me procurou com duas malas. Numa trazia suas roupas, já que vinha de cidade distante, noutra, os exames que já havia feito e os medicamentos que já havia ingerido. O fato é que esses pacientes melhoram com o uso de antidepressivos. Será pelo efeito analgésico de alguns antidepressivos? Será por se tratar de uma “depressão mascarada por sintomas físicos” especialmente por dor?
(13) BLUES OU DISFORIA PUERPERAL
Quadro comum, entre
Provavelmente bem mais que 10% das mulheres desenvolvem um tipo de depressão após um parto ou cesariana. Não estou me referindo ao blues. Refiro-me à doença depressiva, que pode ser leve, moderada ou grave. Pode ser uni ou bipolar, ou pode tornar a mulher psicótica, ou seja, sair fora da realidade, num quadro chamado de psicose puerperal.
Na depressão unipolar os sintomas, entre outros, são tristeza, desânimo, problemas com o sono, perda do interesse por quase tudo, insegurança, ansiedade. Na depressão unipolar pós-parto é comum a presença de ansiedade e sintomas de medo e fobias. A mãe preocupa-se em excesso com o filho. Há casos em que a mãe não pode nem ver a criança; tem a sensação de que não gosta dela ou até teme que possa feri-la ou matá-la. Na depressão unipolar grave a mulher fica com dificuldades de raciocínio, seu pensamento torna-se muito negativo. Há risco de suicídio e de infantício. A vida e o mundo trazem tanto sofrimento, são tão ruins que o melhor é fugir deles e levar o filho junto para que este não sofra também. A depressão unipolar pode, portanto, tornar-se psicótica, com a mulher apresentando delírios e alucinações.
A depressão bipolar, quadro em que a pessoa tanto pode se mostrar deprimida como acelerada, triste como eufórica, em geral se manifesta nos três primeiros dias do pós-parto tendo um início súbito. Quanto psicótica, a gravidade é enorme.
Uma mulher que já apresentou depressão não relacionada com o parto tem uma chance maior do que a média da população de apresentar depressão após o nascimento de seu filho. O índice sobe de 10% para 25%. Se ela já apresentou depressão após ganhar um filho, as chances sobem mais ainda: vão para 50%. Uma depressão iniciada até quatro meses após o parto ainda pode ser considerada pós-parto.
A depressão pós-parto está relacionada com a queda dos níveis de hormônios que ocorre logo após o parto em mulheres vulneráveis à alteração da bioquímica dos neurotransmissores cerebrais. Há, portanto, nesta mulher uma vulnerabilidade biológica de origem genética.
O tratamento é feito basicamente com o uso de medicamentos antidepressivos. Porém, a escolha do tipo de fármaco e da dosagem dependerá também do fato de a mulher estar ou não amamentando.
É importante diferenciar depressão de hipotireoidismo pós-parto.
É útil observar previamente fatores de risco para o surgimento de depressão pós-parto para não ser pego de surpresa, para se organizar quanto a como proceder para tratar esta mulher caso o quadro realmente ocorra. Isso se faz levantando os antecedentes pessoais e os antecedentes familiares.
Pelo componente genético existente, as depressões pós-parto são mais comuns em determinadas famílias.
Em artigo publicado em 1998 no British Journal of Psychiatry, os psiquiatras Louis Appleby, Preben Mortensen e Brian Faragher revelam que o risco de suicídio é especialmente elevado no primeiro ano do pós-natal. O risco torna-se dezessete vezes maior do que o da população.
(14) DEPRESSÃO DA MENOPAUSA
A idade média para a menopausa é 51 anos, com a perimenopausa ocorrendo de cinco a sete anos antes da completa cessação da ovulação. Não parece haver risco do surgimento de um primeiro episódio de depressão nessa fase, porém mulheres que já tiveram episódio depressivo correm risco maior de recidiva no período.
O tratamento da depressão na menopausa tem focado duas estratégias: medicamentos antidepressivos e estrógeno terapia.
O uso de antidepressivos, em especial da paroxetina e da venlafaxina, é indicado no tratamento dos fachos de calor quando a terapia hormonal é contra-indicada ou não é aceita pela paciente.
(14) TDPM
É importante distinguir o transtorno pré-menstural (TPM) do transtorno disfórico pré-menstrual (TDPM). O primeiro, que acomete até 75% das mulheres, consiste na presença de sintomas físicos – mastalgia, inchaço, cefaléia – e alterações leves no humor que não atrapalham muito a rotina da mulher.
Já o TDPM atinge apenas de 2% a 9% das mulheres, sendo mais comum entre as idades de 25 e 35 anos. Os sintomas são intensos e atrapalham muito a vida da mulher. A paciente apresenta no período pré-menstrual cinco ou mais dos seguintes sintomas: 1. humor acentuadamente depressivo; 2. ansiedade, tensão, “nervos à flor da pele”; 3. instabilidade emocional: subitamente triste, muito sensível a qualquer desatenção; 4. irritabilidade e raiva; 5. diminuição do interesse por aquilo que antes mantinha interesse; 6. dificuldade de concentração; 7. falta de energia, fadiga fácil; 8. alteração do apetite; 9. alteração do sono para mais ou para menos; 10. descontrole emocional; 11. sintomas físicos: inchaço das mamas, sensação de “inchaço geral”, dores musculares, dores articulares, cefaléia, ganho de peso.
Algumas teoria tentam explicar as causas da TDPM: alterações hormonais, alteração nos mineralocorticóides e alteração nos neurotransmissores. A última teoria vem sendo confirmada pelo resultado positivo alcançado pelos medicamentos que agem nos neurotransmissores. São medicamentos chamados de antidepressivos, porém cuja denominação mais adequada deveria ser recuperadores dos neurotransmissores. Ocorre que a primeira alteração de neurotransmissor tratada com estes fármacos foi aquela responsável pelo desencadeamento de quadros depressivos. Daí que esses medicamentos passaram a ser chamados de antidepressivos. Na verdade, eles apresentam eficácia em outros quadros relacionados com a alteração das subtâncias neurotransmissoras, como a serotonina, a dopamina e norepinefrina. Apesar de algumas pesquisas encontrarem resultado positivo no uso de antidepressivo apenas nos 12 ou 14 dias prévios à menstruação, os resultados são melhores quando a cobertura se faz por todo o ciclo menstrual.
(14) TRISTEZA
Reação normal que surge após uma perda, uma desilusão, uma situação desagradável. A reação de tristeza deve acompanhar a magnitude do fator desencadeante. A pessoa mantém a capacidade de se alegrar. Em geral, com o uso da força de vontade, a pessoa tem poder sobre a tristeza, conseguindo “dribá-la”. Portanto, trata-se de sentimento normal, absolutamente compreensível, que faz parte da vida psíquica de todos nós, mas não é objeto de atenção médica.
(15) DEPRESSÃO REATIVA
Depressão reativa por perdas, desilusões, ausência de objetivos. No caso, já é maior e mais prolongada que a tristeza. (a) Depressão reativa a perdas. A perda pode ser afetiva: por morte ou por separação. Separação matrimonial, dos filhos. Por mudança de cidade, de país. Pode ser devida a uma doença ou limitação física: o surgimento de hepatite C, por exemplo. HIV positivo, problemas cardíacos que impedem de seguir na prática de determinado esporte, etc. Pode ser financeira, patrimonial, a perda de uma empresa, de um emprego. Chama-se de luto patológico quando a tristeza é intensa e se arrasta. No caso de perda por morte, se uma tristeza que traz prejuízos a pessoa se arrasta por mais de um ano chama-se de luto patológico.
(b) Depressão reativa a desilusões. Por expectativas exageradas colocadas na figura de um novo namorado, por exemplo. Por colocar todas as “fichas” na esperança de determinado negócio ou empreendimento que depois não se realiza. (c) Depressão reativa à ausência de objetivos. Um vazio existencial, não saber com que se comprometer na vida. Poderia ter existido um objetivo que depois, por diferentes razões, foi abandonado e não se criou outro.
A tristeza não requer tratamento. A depressão reativa a situações psicológicas ou sociais referidas acima pode requerer tratamento. Tudo depende da intensidade, do tempo e da dificuldade da pessoa de superar com a ajuda de si mesma e de seus familiares, amigos e colegas. No caso, o tratamento será psicoterápico e não medicamentoso.
(16) DEPRESSÃO MENOR
Envolve menor número de sintomas e menos prejuízos para a vida do indivíduo do que na depressão maior.
Convencionou-se dizer que a depressão é menor quando apresenta no máximo 5 e no mínimo 2 dos seguintes sintomas: (1) humor deprimido na maior parte do dia, quase todos os dias. O paciente diz, por exemplo, sentir-se triste ou vazio. Ou os que convivem com ele observam manifestações de sua tristeza, por exemplo, acham que ele anda com cara de choro. Em crianças ou adolescentes pode se manifestar na forma de um humor irritado; (2) seus prazeres e seus interesses estão diminuídos acentuadamente na maior parte do dia em praticamente todos os dias; (3) alteração no peso sem estar em dieta para mais ou para menos, alteração no apetite para mais ou para menos; (4) insônia ou excesso de sono praticamente todos os dias; (5) agitação ou retardo psicomotor observado por outros; (6) fadiga ou diminuição da energia quase todos os dias; (7) culpa excessiva que pode ser delirante ou inadequada ou sensação de inutilidade quase todos os dias; (8) indecisão ou capacidade diminuída para pensar ou concentrar-se quase todos os dias; (9) idéias recorrentes de morte, ideação suicida recorrente sem um plano específico ou uma tentativa ou plano específico para cometer o suicídio.
Os sintomas trazem sofrimento ou prejuízo na vida do paciente. Os sintomas não são devidos a uma condição médica (hipotereoidismo) ou pelo uso de uma droga ou de um medicamento. Não são explicados por luto. O paciente nunca apresentou depressão maior, distimia, mania, hipomania, episódio misto, ciclotímico. Esta depressão não ocorre exclusivamente durante transtorno psicótico como esquizofrenia ou transtorno delirante.
(17) DEPRESSÃO BREVE
Quando preenche os critérios para depressão maior mas o quadro é de menor duração, menos que duas semanas, mas pelo menos dois dias.
(18) PERSONALIDADE DEPRESSIVA
Difere dos chamados traços depressivos normais (infelicidade, pessimismo, propensão a culpas e a se autocriticar) por ser mais intenso, estar mais entranhado no paciente e lhe trazer sofrimento e prejuízo em seu funcionamento.
A questão difícil é diferenciá-lo de distimia. O paciente apresenta pelo menos cinco dos seguintes sintomas: (1) seu humor é abatido, triste, desanimado, descontente e infeliz; (2) acha-se inútil, inadequado e revela baixa auto-estima; (3) é crítico, depreciativo e acusador de si mesmo; (4) tem o hábito de meditar e de se preocupar; (5) é negativista, crítico e preconceituoso quanto aos outros; (6) é pessimista; (7) é propenso a sentir culpa ou remorso.
(19) PERSONALIDADE NEGATIVISTA
Também denominado de passivo-agressivo, o paciente apresenta quatro ou mais dos seguintes critérios: (1) queixa-se de ser incompreendido e desconsiderado pelos outros; (2) é mal-humorado e propenso a discussões; (3) resiste passivamente à realização de tarefas profissionais ou sociais rotineiras; (4) critica irracionalmente e desdenha a autoridade; (5) verbaliza queixas exageradas e persistentes de azares que teve na vida; (6) expressa inveja e ressentimento para com aqueles que aparentemente tem mais sorte ; (7) alterna entre o desafio hostil e uma sofrida resignação.
(20) DEPRESSÃO HISTÉRICA (no tópico seguinte)
SUBTIPOS: O ESPECTRO DEPRESSIVO (2)
2.4. O ESPECTRO DEPRESSIVO (2)
(20) DEPRESSÃO HISTÉRICA
Faz lembrar a antigamente chamada “psicose histérica”. Seria uma psicose histérica depressiva?
(21) DEPRESSÃO RESISTENTE
Há casos de depressão cuja melhora é mais difícil. Pode ocorrer tanto em depressões que sejam leves, moderadas ou graves. No caso da leves, infelizmente, a pessoa pode “ir levando” e não voltar ao médico. No caso das graves, o paciente tende a fazer uma “romaria” por consultórios.
Não há consenso quanto a se catalogar uma depressão como resistente. Em geral, considera-se assim o paciente que não obteve resposta após três ou mais tentativas adequadas. Eu, particularmente, penso que só pode ser considerada assim aquela depressão que foi tratada com todos os recursos medicamentosos e psicoterápicos de que se dispõem hoje sem resultado.
Frente a uma depressão supostamente resistente, o que faço é começar tudo de novo. Revejo o diagnóstico. Não se trata de um quadro bipolar em vez de unipolar? Há um transtorno de personalidade não visto? Há um componente psicológico, ocupacional ou social não suficientemente examinado? Há uma doença orgânica não diagnosticada, como o hipotireoidismo?
Os tratamentos já feitos foram realmente bem feitos? O médico prescreveu os medicamentos na dosagem e nas combinações certas? O paciente usou-os pelo tempo necessário ou pressionou o médico, que acabou trocando antes da hora? A psicoterapia concomitante foi bem aplicada? O paciente tomou o remédio direito?
Os medicamentos foram absorvidos adequadamente? Houve associação com outros medicamentos que atrapalharam? É possível dosar a substância no sangue para se decidir quanto a dose certa?
O paciente tem indicação para ECT?
(22) DEPRESSÃO LEVE
O paciente não sente mais prazer em suas atividades do dia-a-dia, mas ainda consegue realizá-las a contento.
(23) DEPRESSÃO MODERADA
Quando o paciente já não consegue realizar todas as suas atividades e as que realiza o faz com dificuldade.
(24) DEPRESSÃO GRAVE
A angústia é forte, quase constante; torna-se incapaz de realizar suas atividades; muito baixa auto-estima; idéias de culpa ou ruína; pode ter idéias delirantes e alucinações; pode ter idéias suicidas e até fazer tentativas; há risco de desidratação, desnutrição e de pegar infecções pela baixa das defesas.
Lembro-me de uma paciente que, após melhorar de um quadro de depressão grave, contou da sede que passara. Por isso, uma dica: peçam aos familiares que ofereçam muita água ao paciente. Ele, mesmo que perceba a necessidade, não se anima a buscar o copo d’água ou não se acha merecedor de bebê-lo.
(25) NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA
A criança revela um aspecto mais deprimido, podendo ter queixas somáticas e mostrar-se agitada. O adolescente revela uma sensação de infelicidade, alterações no apetite e excesso de sono. As idéias suicidas são bem mais presentes nos adolescentes do que nas crianças abaixo dos dez anos de idade, provavelmente porque as crianças ainda não desenvolveram capacidade mental suficiente para o planejamento e a avaliação de seus próprios atos.
SINAIS DE DEPRESSÃO NA PRÉ-ADOLESCÊNCIA
|
1.Perda de interesse por atividades que até então lhe interessavam
2.Piora sem motivo no rendimento escolar
3.Queixas físicas vagas e freqüentes
4.Comportamento mais infantil do que o habitual
5.Necessidade de mais atenção |
SINAIS DE DEPRESSÃO NA ADOLESCÊNCIA
|
1.Isolamento social pronunciado
2.Baixa auto-estima
3.Idéias exageradas de que é rejeitado
4.Acha sua aparência muito desagradável aos demais
5.Mudanças acentuadas no humor
6.Reações exageradas frente a frustrações
7.Perda do interesse por atividades que antes lhe interessavam
8.Distúrbios de comportamento com atitudes agressivas ou delinqüentes
9.Abuso de álcool
10.Uso de drogas |
(26) DEPRESSÃO NA TERCEIRA IDADE
“É normal nessa idade?” Não é não! Essa pergunta revela o quanto ainda não se faz o diagnóstico de depressão na terceira idade.
Parece ser mais freqüente na terceira idade que os sintomas depressivos sejam acompanhados de sintomas psicóticos. Idéias delirantes de perseguição, hipocondríacos, de empobrecimento são mais comuns do que as de culpa. A valorização dos sintomas psicóticos em detrimento da depressão pode complicar o tratamento. O uso de antipsicótico sem o uso de antidepressivo pode retardar em muito a melhora.
DICAS SOBRE O DIAGNÓSTICO
2.4. DICAS SOBRE O DIAGNÓSTICO
a) Como não existem exames que ajudem a fazer o diagnóstico da depressão, este é feito pela observação clínica . Nós fazemos isso todo o dia do nosso jeito, baseado no que aprendemos e na nossa experiência e habilidade para nos relacionarmos com nosso paciente.
b) Às vezes não temos total certeza quanto ao subtipo de depressão apresentado pelo paciente. Necessitamos, de qualquer forma, começar o tratamento. A dúvida: poderia ser uma depressão bipolar? Vamos começar com antidepressivos e observar. Porém, se nossa dúvida pende para sim, podemos adicionar um estabilizador junto com o antidepressivo e observar. Depois, se for o caso, podemos retirá-lo.
c) Nossa maior preocupação deve ser, inicialmente, o risco de suicídio.
d) Se desejamos inserir numa pesquisa os casos que observamos, devemos utilizar de entrevistas padronizadas, como o Structured Clinical Interview for DSM-IV (SCID) e o Schedules for Clinical Assessment in Neuropsychiatry (SCAN).
e) Outro aspecto importante é o diagnóstico multiaxial, que nos permite ir além do subtipo da depressão e observar outros fatores que serão importantes para a estratégia de tratamento. A DSM-IV sugere cinco dimensões multiaxiais:
(1) diagnóstico do transtorno mental atual;
(2) transtorno de personalidade;
(3) condição médica geral;
(4) estressores psicossociais;
(5) funcionamento social;
f) O diagnóstico multiaxial que faço na minha prática diária totaliza dez itens:
1. transtorno clínico: depressão e seu subtipo;
2. traços de personalidade;
3. nível de maturidade;
5. familia do paciente e seu vínculo com ela;
6. profissão e sua satisfação com ela;
7. amigos e o vínculo que mantém com eles;
8. interesses, hobies;
9. projetos futuros;
10. vive alguma crise evolutiva ou acidental?
EXERCÍCIO
Caso de alegria. Um homem de 32 anos vem à consulta para ouvir mais uma opinião médica. Tratava-se para depressão bipolar, segundo diagnóstico dado por seu médico há um ano, com estabilizador do humor. Fizera uso por seis meses de antidepressivos, mas já havia interrompido por ordem médica. Estava sem sintomas, mas achava muito caro manter o estabilizador prescrito. Queria mesmo saber se era necessário continuar seu uso. Tivera há seis anos um episódio depressivo moderado: triste, desanimado, ansioso, com dificuldade para dormir, mas conseguira levar adiante com bastante dificuldade seu trabalho; faltara algumas vezes ao trabalho e suspendera seu lazer. Na ocasião melhorara apenas com antidepressivo. Por ocasião da melhora, ficara bastante alegre, parece que havia nascido de novo. Trocou de carro e andou, por alguns meses, saindo bastante à noite. Gastou um pouco além do seu orçamento, mas logo se equilibrou novamente. Por ocasião do atual episódio depressivo, seu médico, sabedor da sua alegria após a melhora do prmeiro episódio e de que gastara além do seu orçamento, considerou-o bipolar.
Por favor, faça seus próprios comentários sobre o caso antes de continuar a leitura!
Meus comentários:
Uma das coisas que mais envergonham um médico é deixar passar um diagnóstico. Muitas “campanhas” foram feitas para que os médicos percebessem a presença de um transtorno bipolar e passassem a receitar os estabilizadores do humor mais recentes lançados pela indústria farmacêutica. Conclusão: qualquer alegria maior ou gasto além do orçamento leva a que o paciente depressivo unipolar já seja considerado bipolar.
No caso relatado, orientei o paciente a suspender o uso de estabilizadores do humor e informei-o, em detalhes, sobre os sintomas da depressão bipolar. Pedi que ele orientasse um familiar de confiança a respeito e o incumbisse da função de auxiliá-lo na percepção do surgimento de sintomas maníacos e hipomaníacos.
vídeo - GRANDES PINTORES
PROBLEMA SÉRIO E GENÉTICO
4.1. PROBLEMA SÉRIO E GENÉTICO
Estima-se que os t. bipolares afetem de
Na gênese dos TH os fatores genéticos são fundamentais, principalmente no TB. Cerca de 50% dos bipolares de tipo I têm pelo menos um dos pais com transtorno afetivo, especialmente depressão; se um dos pais é portador de TB
SINTOMAS: MANIA
4.2. SINTOMAS: MANIA
Ao observar se um paciente está em fase maníaca, eu me concentro, inicialmente, em três funções mentais:
(1)Pensamento. Acelerado com fuga de idéias; as idéias surgem em tão grande número e com tanta velocidade que o paciente não consegue concluir um pensamento e já passa para outro, para outro e para outro. Parece que ele começa a desenvolver um pensamento e este lhe foge. Na verdade, outro pensamento surge com tanta força que o faz abandonar o primeiro. Falta-lhe o bom senso frente aos excessos de todo o tipo. Sempre acham uma justificativa para seus pensamentos e atitudes, já que não as criticam. Os franceses cunharam a expressão folie raisonnante. Poderíamos traduzi-la para algo como “loucura raciocinante”. Podem desenvolver idéias paranóides. Sentem-se prejudicados por não conseguirem levar adiante seus planos inadequados, perseguidos por quem os atrapalham. Porém, diferem da paranóia do esquizofrênico pela falta de fixação. Mudam de perseguidor com muita facilidade. Também desenvolvem idéias supervalorizadas e, às vezes, até megalomaníacas. Mas seu conteúdo tem algum sentido, permanece compreensível. Muitas vezes dizem brincadeiras, pela euforia, que não são idéias megalomaníacas. Por exemplo, descrevem-se como os “maiores”, mas devido a estarem fazendo graça.
(2)Afeto. Eufórico, alegre demais, por vezes, irritado. Em geral, os pacientes se sentem muito importantes e o respeito e a consideração pelos outros desaparecem. Sentem-se exageradamente alegres e tornam-se pouco sensíveis a eventos tristes.
(3)Comportamento. Compulsão para agir, não consegue ficar parado. As idéias se transformam facilmente
O diagnóstico de um episódio maníaco exige que a alteração do humor no sentido da euforia e da irritabilidade já tenha durado pelo menos uma semana e que seja acompanhada de pelo menos três dos seguintes sintomas: auto-estima inflada ou grandiosidade, necessidade de sono diminuída, pressão por falar, fuga de idéias, distraibilidade, maior envolvimento em atividades dirigidas a objetivos ou agitação psicomotora, envolvimento excessivo em atividades prazerosas com um alto potencial para conseqüências dolorosas.
Se o humor for irritável em vez de eufórico, é necessários a presença de quatro dos sintomas acima descritos.
O quadro deve conter aspectos psicóticos (idéias delirantes ou comportamento inadequado que não leva em conta aspectos da realidade, o comportamento pode ser até mesmo bizarro) ou prejudicar de forma acentuada as atividades ocupacionais, sociais e o relacionamento com as outras pessoas.
SINTOMAS: HIPOMANIA
4.3. SINTOMAS: HIPOMANIA
Na prática, primeiro faço a observação geral dos sintomas, para, depois, definir se significam um quadro de mania ou de hipomania, pois os sintomas, quase todos, se fazem presentes nos dois quadros. Na hipomania são menos intensos e não causam prejuízos acentuados nas atividades ocupacionais, sociais e no relacionamento com outras pessoas.
A diferença, além da intensidade, está no fato de que na hipomania o paciente permanece dentro da realidade, não revela sintomas ou comportamento psicótico. A fuga de idéias é incomum e, se presente, dura pouco. É alguém que age constantemente de forma exagerada, mas não “fora do normal”.
Um macete é quanto à fala: diferente do maníaco, o hipomaníaco permite que sua fala seja interrompida. Ele apenas fala um pouco mais alto e mais rápido que o habitual.
Antigamente chamava-se de psicose maníaco-depressiva. Areteu da Capadócia (ano 2 d.C) escreveu: “(...) Alguns pacientes, depois de permanecerem melancólicos, têm crises de mania”. Baillarger, na metade do século 19, publicou alguns casos da doença e chamou-a de “loucura de dupla forma”.
SUBTIPOS: O ESPECTRO BIPOLAR
4.4. SUBTIPOS: O ESPECTRO BIPOLAR
Vamos estudar a bipolaridade a partir da classificação do espectro bipolar descrita por Akistal et all. e também comentar a bipolaridade na infância e na adolescência. Mas vamos fazê-lo analisando criticamente. Esse conceito, e sua grande divulgação, ajudou a criar um problema: overdiagnosis.
A propósito, recomendo o artigo:
Bipolar disorder: the shift to overdiagnosis.
Source
School of Psychiatry, University of New South Wales, Sydney, Australia. phil.mitchell@unsw.edu.au
Abstract
Sometimes dramatically changing vogues in diagnostic practice in psychiatry resemble the volatility of international share markets. One such quickly shifting diagnostic area has been that of bipolar disorder (BD). Historically regarded as a relatively uncommon condition until recent decades, the construct of BD underwent a major expansion in the 1990s and 2000s with promulgation of the concept of the soft bipolar spectrum disorder, from which the recent research focus on subthreshold BD presentations was derived. Related to this has been renewed interest in treatments for BD from the pharmaceutical industry. The increasing rates of diagnosis have largely related to BD II, for which there has been a dramatic broadening ofdiagnostic criteria. This article critically reviews research data, both for broadening the diagnostic criteria for BD and, conversely, for the growing evidence of overdiagnosis in clinical practice. Why does this debate matter? I would suggest that there are many valid reasons to be concerned about overdiagnosis: first, the potential for overtreatment or inappropriate treatment of such patients with mood stabilizing treatments, including antipsychotics; second, the potential for diagnostic oversimplification, with consequent diagnostic deskilling and loss of credibility for the psychiatric profession; and third, the potential major impact on etiologic research for this condition. Psychiatry should not uncritically accept the shift to overdiagnosis, which has developed a rapid momentum in recent decades, in both clinical and academic circles. We must ensure, as a profession, that any change in diagnostic practice is underpinned by rigorous and critical research inquiry.
Como é conceito muito divulgado, precisamos conhecê-lo.
ESPECTRO BIPOLAR
Bipolar ½ Esquizoafetivo
Bipolar I Depressão e mania
Bipolar I e ½ Hipomania
Bipolar II Depressão e hipomania
Bipolar II e ½ Depressão ciclotímica
Bipolar III Hipomania farmacológica
Bipolar III e ½ Hipomania com abuso de álcool e estimulantes
Bipolar IV Hipertimia e depressão
Bipolar V Estado de depressão mista
Bipolar V e ½ Depressões recorrentes
Bipolar VI Instabilidade do humor e demência precoce
|
No módulo diagnóstico diferencial, veremos a dificuldade de se diferenciar um paciente bipolar de um esquizofrênico. Acho útil na clínica o bipolar 1/2 já que seu tratamento é um pouco diferente conforme veremos no módulo tratamento. Aqui são colocados os pacientes esquizoafetivos tipo maníacos.
(2) BIPOLAR I
Caracteriza-se pela presença de episódios maníacos e de episódios depressivos ou mistos. É o quadro clássico. O episódio depressivo se apresenta de forma muito semelhante ao da depressão unipolar, mas faz parte de uma doença diferente, com evolução e tratamento diferente. Tende a ser episódio mais breves do que o da depressão unipolar. Apresenta distribuição semelhante em ambos os gêneros, diferente da unipolar, que é mais freqüente
O melhor guia é o conhecimento do padrão como a doença vem se manifestando no paciente. Durante o uso de antidepressivos, alguns pacientes bipolares parecem ter melhorado da depressão. A “melhora” pode ser, na verdade, o aparecimento de sintomas maníacos.
EPISÓDIO MANÍACO* |
1.Humor anormal, elevado, expansivo, irritável |
2.Auto-estima inflada, grandiosidade |
3.Fala muito, pressionado por si mesmo a falar e falar |
4.Fuga de idéias: de uma idéia passara para outra sem concluir nenhuma |
5.Necessidade de sono bem diminuída |
6.Aumento de atividades, agitação psicomotora |
7.Envolvimento exagerado em atividades prazeirosas com conseqüências negativas: compras absurdas, indiscrições sexuais, orgias. |
*Com base na DSM-IV |
(3) BIPOLAR I e ½
Clinicamente, observamos apenas uma hipomania, mas uma hipomania muito prolongada.
O paciente faz episódios depressivos e episódios apenas hipomaníacos, não maníacos. É um quadro que gera confusão diagnóstica com a depressão unipolar. Também gera controvérsias quanto ao uso permanente de estabilizadores de humor ou não, conforme veremos no módulo tratamento.
(5) BIPOLAR II e ½
O paciente apresenta-se em vários períodos com sintomas hipomaníacos e, em vários outros, com sintomas depressivos. Porém, esses sintomas depressivos não são tantos a ponto de se poder dizer tratar-se de um episódio depressivo. Por isso, não se enquadram no bipolar II.
CICLOTIMIA
|
1.Humor instável com períodos de depressão e outros de euforia leve
2.Pode haver períodos de humor normal e estável
3.Inicia no começo da vida adulta
4.O paciente não relaciona suas oscilações do humor a eventos de sua vida |
Ocorre quando a hipomania se manifesta por indução de um antidepressivo. Em geral, o paciente está sendo tratado como tendo depressão unipolar e no uso dos antidepressivos revela-se hipomaníaco.
(7) BIPOLAR III e ½
Depressão e excitação hipomaníaca associada ao uso de álcool ou outras drogas.
(8) BIPOLAR IV
O paciente apresenta um temperamento hipertímico. É um hipomaníaco crônico. Superposto a isso, surgem também episódios depressivos.
(9) BIPOLAR V
Há uma mistura de sintomas da depressão e da mania durante, pelo menos, uma semana, trazendo acentuado prejuízo à vida profissional, social e de relacionamento. O paciente apresenta uma rápida alternância entre tristeza, irritabilidade e euforia. Em geral, mostra-se agitado, tem insônia, seu apetite está desregulado e pode pensar em suicídio.
Mania medrosa depressiva. O paciente apresenta afeto triste, idéias negativas, mas está com o pensamento acelerado e fala muito. Queixa-se de que os pensamentos vêm em grande quantidade e sem ele querer.
Mania pobre
Mania coagulada. O paciente revela uma expressão alegre, mas mostra-se muito parado. Também chamado de “estupor maníaco”.
Pensamento com inibição e com fuga de idéias. Por paradoxal que seja, é possível um paciente apresentar fuga de idéias sem ter o pensamento acelerado. Ao contrário, o pensamento é lento, mas o paciente passa para outro conteúdo sem terminar o primeiro. É como se atalhasse o caminho normal de pensar. É como uma pessoa alcoolizada que começa a falar lentamente, até pode interromper a fala e nunca concluir um conteúdo, atalhando para outro, para outro e para outro.
(10) BIPOLAR V e ½
Depressões recorrentes.
(11) BIPOLAR VI
Instabilidade do humor e demência precoce.
MANIA
|
HIPOMANIA |
HIPERTIMIA |
Escandaloso, arrogante |
Exibicionista, exagerado |
Expansivo, confiante |
Gastos absurdos |
Gastos exagerados |
Gasta o que ganha |
Provoca grandes brigas, é muito intrusivo |
Irrita-se e desentende-se, é indiscreto |
Mostra-se muito efusivo em seus relacionamentos |
Fala muito rápido, mistura assuntos, é dono da verdade, não escuta |
Interage pouco, fala muito e não gosta de ser contrariado |
Aumenta um pouco o volume e o ritmo da fala, mas interage bem |
Acelerado, irreal |
Acelerado, confunde-se |
Espirituoso, otimista |
Relações curtas, grandes noitadas, orgias |
Casos extraconjugais, grande apetite sexual |
Estável, eventualmente algum caso |
Visual escandaloso |
Visual alternativo |
Vaidoso |
(12) BIPOLAR: INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA
Pode haver confusão diagnóstica da mania com o transtorno de déficit de atenção em decorrência da hiperatividade do paciente. Em geral, a mania em crianças apresenta irritabilidade, acessos de raiva e labilidade emocional. A questão é: qual criança não apresenta tal comportamento? Há, freqüentemente, história familiar de mania. Mas como se a criança não apresenta comportamento semelhante a de seus pais por ter também a doença ou por imitação? Portanto, é necessário muita cautela para afirmar que há uma doença e que é necessário medicação.
AVALIAÇÃO MULTIAXIAL
4.5. AVALIAÇÃO MULTIAXIA
O diagnóstico multiaxial que faço na minha prática diária acompanha o que faço no caso da depressão, totalizando dez itens:
1.Transtorno clínico: transtorno bipolar e seu subtipo.
2.Traços de personalidade.
3.Nível de maturidade.
5.Família do paciente e seu vínculo com ela.
6.Profissão e sua satisfação com ela.
7.Amigos e o vínculo que mantém com eles.
8.Interesses, hobies.
9.Projetos futuros.
10.Vive alguma crise evolutiva ou acidental?
EXERCÍCIO
Mulher, 26 anos. Fala muito, de forma acelerada, diz que os pensamentos vêm “em enxurrada” a sua cabeça, sem ela querer. O conteúdo de suas idéias é pessimista, seu futuro é ruim, espera o pior da vida. Seu afeto é triste, mostra-se amargurada, de mal com a vida.
Primeira impressão diagnóstica?
Qual a sua impressão?
Bipolar V de tipo mania medrosa depressiva?
TESTOSTERONA
6.0. TESTOSTERONA
A baixa do hormônio pode causar alguns sintomas semelhantes ao de um quadro depressivo.
FADIGA CRÔNICA
6.1. FADIGA CRÔNICA
A síndrome da fadiga crônica (SFC) é caracterizada por uma fadiga persistente e inexplicável de intensidade que faz com que o paciente tenha muita dificuldade para realizar as atividades diárias. O fato de a fadiga ser inexplicável caracteriza o quadro e, ao mesmo tempo, faz com que se duvide de sua própria existência como síndrome. Quem sabe não passe de sintoma de uma doença de difícil diagnóstico? Sinais físicos e exames laboratoriais nada revelam. Pensa-se nesta síndrome quando a fadiga é inexplicável. A partir de 1994 chegou-se ao consenso quanto ao seu diagnóstico:
A.Fadiga com persistência de pelo menos seis meses
B.Fadiga nova ou de início indefinido
C.Fadiga não resultante de doença orgânica ou esforços contínuos
D.Fadiga que não diminui com o repouso
E.Fadiga que resulta em importante redução de atividades ocupacionais, educacionais, sociais e pessoais
F.Quatro ou mais dos seguintes sintomas, presentes por mais de seis meses: prejuízo de memória ou concentração, dor de garganta, nódulos cervicais ou axilares, dor muscular, dor em diversas articulações, dor de cabeça, sono não recuperador e mal-estar após exercícios.
G. Em cerca de 75% dos casos se observa como gatilho a presença de alguma infecção devido a resfriados, viroses ou mononucleose.
A fadiga pode estar presente numa série de doenças, entre elas:
.esquizofrenia
.anorexia nervosa
.bulimia
.alcoolismo
.outras drogas de abuso
.demência
.obesidade mórbida
.depressão uni ou bipolar
No caso, a dica que passo adiante foi retirada da revista Lancet. Prins JB, Van der Meer JWM e Bleijenberg G do Expert Centre for Chronic Fatigue, Radboud University Nijmegen Medical Centre, Nijmegen, Holanda, publicaram uma revisão a respeito da síndrome no Lancet (367:346-55, 2006) revelando algo que para nós que tratamos depressão é muito importante saber. As únicas intervenções terapêuticas que se mostraram benéficas foram a psicoterapia cognitivo-comportamental (PCC) e a terapia com exercício gradual (TEG). A PCC revelou taxas de melhora de 70% e a TEG, de 55%. Os medicamentos não deram bons resultados até aqui.
Está aí uma boa dica: quando ficamos em dúvida tratar-se de depressão ou de fadiga crônica, não vamos tratar com antidepressivos, mas indicar PCC. De qualquer forma estaremos acertando, pois esta técnica, como bem sabemos, trata tanto depressão como fadiga crônica.
DEMÊNCIA
6.2. DEMÊNCIA
Tanto a depressão como a demência podem apresentar-se com dificuldades na memória, na atenção e na orientação, confundindo o médico. Na depressão, em geral, o início do quadro é mais preciso; há uma progressão mais rápida dos sintomas; há história pregressa de depressão, presença de transtornos afetivos em familiares; há preservação do juízo crítico sobre os sintomas, o paciente responde “não sei”. Na demência, a instalação é lenta, insidiosa; raramente o paciente e os familiares identificam o quadro em seu início. Há ausência de juízo crítico; o paciente não diz “não sei” e, ao contrário, tenta alguma explicação mesmo não sabendo. Podem coexister os dois quadros.
Cada vez mais pacientes com suspeita de demência são atendidos em ambulatórios ou consultórios de médicos que lidam com clientela idosa. O Dr. Paulo Caramelli, neurologista, professor adjunto da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais e professor do curso de pós-graduação em Neurologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, no intuito de auxiliar os médicos no correto diagnóstico, publicou um artigo na Revista Brasileira de Psiquiatria junto com sua colega Dra. Maira Tonidandel Barbosa, sob o título “Como diagnosticar as quatro causas mais freqüentes de demência?” (Rev Bras Psiquiatr 2002;24 Supl I: 7-10) Como a prevalência de demência duplica a cada cinco anos após os sessenta anos de idade, é de suma importância a todo o médico ter o conhecimento necessário para o diagnóstico desses quadros. Leia neste site uma entrevista com o Dr. Paulo Caramelli sobre o tema.
A demência é uma síndrome caracterizada pelo declínio de memória associado a déficit de pelo menos uma outra função cognitiva (linguagem, gnosias, praxias ou funções executivas) com intensidade suficiente para interferir no desempenho social ou profissional do indivíduo.
O diagnóstico de demência exige a ocorrência do comprometimento da memória, embora essa função possa estar relativamente preservada nas fases iniciais de algumas formas de demência, como nas demências frontotemporais. Este grupo de demência (DFT) é o que mais se confunde com diagnóstico de depressão. Fazem parte dele a doença de Pick, a degeneração dos lobos frontais e a demência associada à doença do neurônio motor (esclerose lateral amiotrófica) e também a chamada demência semântica. Alguns desses quadros podem se apresentar como isolamento social, apatia, perda de crítica, desinibição, irritabilidade e descuido da higiene pessoal.
TIREÓIDE
6.3. TIREÓIDE
Tanto a depressão como o hipotireoidismo ocorrem principalmente em mulheres e podem ocorrer juntas ou isoladamente. Os sintomas do hipotireoidismo podem ser fadiga, fraqueza, sonolência, dificuldade de concentração, diminuição da memória e vontade não fazer nada, ou seja, queixas sugestivas de depressão. Portanto, convém sempre lembrar a possibilidade de nosso paciente estar apresentando baixo funcionamento da tireóide. E convém lembrar que na população adulta o hipotireoidismo pode ocorrer sem aumento do volume da glândula. Precisamos pedir exame de TSH. O hipertireoidismo, por sua vez, pode ser confundindo com hipomania.
DOENÇAS NEUROLÓGICAS
6.4. DOENÇAS NEUROLÓGICAS
Além de certos tumores cerebrais, é importante estar atento para a presença de doenças degenerativas como a doença de Parkinson, especialmente; doenças cerebral vasculares, como no caso de um pós-acidente vascular cerebral.
DOENÇAS METABÓLICAS
6.5. DOENÇAS METABÓLICAS
Deficiência de vitamina B1
INFECÇÕES VIRAIS E OUTRAS
6.6. INFECÇÕES VIRAIS E OUTRAS
Como hepatite, mononucleose, HIV e outras infecções.
CERTOS CÂNCERES
6.7. CERTOS CÂNCERES
Como o carcinoma de pâncreas e outros.
DICAS
DICAS:
1. Não é prático solicitarmos sempre uma avaliação neurológica do paciente que nos procura com sintomas de depressão ou de transtorno bipolar. Por isso, não vamos fazê-lo como rotina. Na grande maioria dos casos que nos procuram trata-se mesmo de um quadro psiquiátrico.
2. Porém, vamos ficar sempre alerta à presença de outros sintomas e, quando os encontrarmos, encaminhar o paciente para avaliação.
3. Quando um primeiro quadro de mania ou hipomania se apresenta pela primeira vez tarde na vida da pessoa, encaminha-se imediatamente à avaliação clínica e neurológica.
4. Não custa solicitar TSH para a maioria dos pacientes; especialmente quando se tratar de mulher e na faixa dos cinqüenta anos de idade. Aliás, esta faixa etária é de pico de incidência tanto de depressão como de hipotireoidismo.
5. Mesmo quando não há sintomas que façam pensar em outro quadro além da depressão ou do transtorno bipolar, pergunta-se se o paciente tem feito revisões clínicas. Deve-se insistir para que ele consulte preventivamente.
EXERCÍCIO PARA REFORÇAR O CONTEÚDO
Lembro-me de um paciente que me foi trazido por apresentar sintomas de depressão. Tratava-se de um homem de sessenta que se sentia também cansado, “cansado para respirar fundo”, me disse ele. Insisti com a familia para que o levasse a uma avaliação clínica. Ele e a família insistiam tratar-se de depressão, pois no passado ele já havia tido um episódio depressivo.
No dia seguinte me telefonaram perguntando se depressão provocava febre.
Por favor, faça seus próprios comentários sobre o caso antes de continuar a leitura!
Meus comentários:
Respondi: “Claro que não! Vocês ainda não o levaram ao clínico?” Infelizmente, o paciente estava com um tumor pulmonar. A família tentava negar a gravidade do quadro e buscava um diagnóstico (falso) de melhor prognóstico.
STAR*D
7.1. STAR*D
A maioria das pesquisas sobre tratamento da depressão vem sendo realizada em ambientes artificiais, “laboratoriais”: os pacientes da amostra são escolhidos a dedo e aqueles que aplicam o tratamento são pesquisadores.
No mundo real dos consultórios e dos ambulatórios, no ambiente real e cotidiano, as coisas não se passam bem assim. Os pacientes apresentam-se com variados subtipos de depressão, não estão sendo pagos para se submeter ao protocolo de pesquisa e seguem sob a influência positiva ou não de seu meio familiar, profissional e social. Quem aplica o tratamento não é um pesquisador e muitas vezes não é um psiquiatra.
Como conseqüência, os resultados destas pesquisas no mundo acadêmica nem sempre se repetem quando aplicadas na prática do dia-a-dia realizada no mundo real. As pesquisas nem sempre correspondem às necessidades daquele que lá no consultório ou no ambulatório aplica o tratamento e é cobrado pelos resultados.
Já faz tempo que se procura atrair o clínico para o mundo das pesquisas insistindo para que ele se atualize. Houve, felizmente, um movimento no outro sentido: atrair as pesquisas para o mundo dos clínicos.
O governo americano, através do National Institute of Mental Health (NIMH), patrocinou um estudo iniciado em julho de 2001 e completado em setembro de 2006, visando aproximar a pesquisa da prática: STAR*D (Sequenced Treatment Alternatives to Relieve Depression / Tratamento Alternativo Sequenciado para Aliviar a Depressão).
Coordenado por A. John Rush da Universidade do Texas e com o orçamento de 35 milhões de dólares, o estudo envolveu mais de 4.000 pacientes em 41 locais de atendimento: 23 ambulatórios de psiquiatria e 18 de atenção primária, ou seja, a depressão no mundo real tratada, inclusive, em grande parte por médicos não psiquiatras.
Na primeira etapa, 4.041 pacientes portadores de depressão não-psicótica, muitos apresentando co-morbidades, receberam citalopram por 12 semanas em doses altas.
Na segunda etapa, com duração também de 12 semanas, os pacientes que não alcançaram a remissão eram convidados a optar: (1) Estaria disposto a parar o atual tratamento e mudar para outro medicamento? (2) Desejaria parar e mudar para terapia cognitiva? (3) Desejaria que fosse acrescentado mais um medicamento? (4) Desejaria que fosse acrescentado ao tratamento a terapia cognitiva?
Os medicamentos desta fase foram sertralina, bupropriona e venlafaxina. A terapia cognitiva foi realizada com duas consultas por semana nas primeiras quatro semanas e, daí em diante, uma vez por semana.
A terceira etapa, com duração também de 12 semanas, reunia os pacientes que com os tratamentos anteriores não haviam alcançado a remissão. Os pacientes eram, então, encaminhados a uma das seguintes três opções: (1) acrescentar lítio ou medicação para tireóide; (2) Mudança para mirtazapina; (3) Mudança para nortriptilina.
Na quarta etapa da pesquisa, aqueles que ainda não haviam obtido a remissão eram tratados com uma das seguintes opções: (1) Combinação de venlafaxina e mirtazapina; (2) IMAO não-hidrazina (tranilcipramina).
Estudando os artigos referentes à pesquisa, observei o que segue:
(A) A remissão foi definida como uma pontuação igual ou menor a 7 na escala de Hamilton (HRSD-17), ou uma pontuação igual ou menor que 5 no Questionário Breve de Sintomatologia Depressiva de Rush (QIDS – SR 16). A resposta foi definida como uma redução igual ou maior que 50% nas pontuações iniciais do QIDS-SR. Na primeira fase do tratamento, as taxas com citalopram em média 41,8 mg/dia foram: (1) resposta: 47% (QIDS-SR); (2) remissão: 28% (HRSD-17) e 33% (QIDS-SR).
(B) Pacientes em centros psiquiátricos e em centros de medicina primária não diferiram quanto às taxas de remissão ou de resposta.
(C) Uma parte dos pacientes apresentou bons resultados apenas após oito semanas de tratamento.
(D) Pacientes empregados e com níveis mais altos de educação ou renda apresentaram maiores taxas de remissão.
(E) Já pacientes com co-morbidades psiquiátricas, em especial transtorno de ansiedade e abuso de drogas, e com co-morbidades clínicas apresentaram taxas de remissão mais baixas.
(F) 70% tiveram de entrar na segunda fase, quando o citalopram foi associado à bupropriona de liberação lenta, ou foi trocado por ou sertralina ou venlafaxina ou bupropriona.
(G) Na segunda fase as taxas de remissão, na ordem, primeiro, pelo HRSD 17 e, em segundo, pelo QIDS-SR, foram: sertralina: 17,6% e 26,6%; venlafaxina de liberação prolongada: 24,8% e 25%; bupropriona de liberação lenta: 21,3% e 25,5%.
(H) Nesta segunda fase, 565 pacientes tiveram o citalopram associado a bupropriona de liberação lenta na dose de até 400 mg/dia. Remissão: 29,7% (HRSD 17) e 39% (QIDS-SR).
(I) A terceira fase reuniu 235 pacientes que apresentaram intolerância ou resposta inadequada nas duas fases anteriores. Aqueles que receberam mirtazapina em doses iguais ou menores que 60 mg por dia apresentaram: melhora 33% e remissão 12%. Os tratados com nortriptilina em doses iguais ou menores que 200 mg/dia alcançaram: melhora 31% e remissão 20%.
IMPORTANTE! Na minha visão de clínico, a conclusão que realmente nos ajuda desta pesquisa é: a diferença mesmo está em usar doses altas do medicamento antidepressivo! Será mais bem sucedido o psiquiatria fizer isso o mais rapidamente possível.
P.S.: Para se informar mais leia os artigos de Rush a respeito.
Rush AJ et al. Revising Conventional Wisdom. CNS Drugs, 2009;23(8):627-47.
Rush AJ et al. Bupropion-SR, sertraline e venlafaxine-XR after failure of SSRIs for depression. N Engl J Med 2006; 354 (12): 1231-1242.
GUIAS PARA TRATAR A DEPRESSÃO
7.2. GUIAS PARA TRATAR DEPRESSÃO
Os colegas Irismar Oliveira e Pedro Lima, em artigo na Revista Brasileira de Psiquiatria (v. 25 n. 2, junho de 2003), salientam o valor e a importância da elaboração de diretrizes: dão suporte para as decisões que o médico tem de tomar, aproximam o médico da medicina baseada em evidência científica e se constituem em fonte de educação e pesquisa, entre outros. Porém, lembram que há limitações. Os médicos, em geral, não usam as diretrizes no seu dia-a-dia dando mais valor à própria experiência. As diretrizes devem se basear nas pesquisas, as quais nem sempre são isentas dos interesses da indústria farmacêutica. Algumas drogas, por exemplo, são mais pesquisadas que outras.
A propósito, cabe lembrar que muito da educação continuada em nosso meio é patrocinado pela indústria farmacêutica, ou seja, nesse processo estão contidas a divulgação e a propaganda de seus produtos em detrimento de outros também eficazes e, em alguns casos, de menor custo para os pacientes. O Conselho Federal de Medicina, na Resolução nº 1595/00, diz: “É vedado: (a) Vinculação da prescrição médica ao recebimento de vantagens materiais oferecidas por laboratórios ou empresas de equipamentos de uso na área médica; (b) Proferir palestras ou escrever artigos divulgando produtos farmacêuticos, sem declarar os agentes financeiros que patrocinam suas pesquisas”. O importante é que essa relação indústria farmacêutica/educação médica seja colocada às claras. Assim, o médico pode se beneficiar da colaboração da indústria e, ao mesmo tempo, manter seu juízo e discernimento sobre o que é melhor para seus pacientes.
Por isso tudo, penso que temos de ter um olho nos guias e nas diretrizes e outro na experiência, na nossa e na de nossos colegas de nosso meio.
Vários guias, diretrizes, algoritmos vêm sendo elaborados por associações e grupos de especialistas para o tratamento dos transtornos afetivos, tanto para a depressão quanto para a bipolaridade. Por exemplo: World Federation of Societies of Biological Psychiatry (WFSBP), British Association of Psychopharmacology (BAP), Texas Medication Algorithm Project (TMAP), Canadian Network for Mood and Anxiety Disorders.
No Brasil vários colegas têm trabalhado na questão “diretrizes”: Marcelo Pio de Almeida Fleck, Beny Lafer, Everton Botelho Sougey, José Alberto Del Porto, Marco Antônio Brasil, Mário Francisco Juruena, Karpinski, Irismar Reis de Oliveira, Pedro Prado Lima, entre outros.
Recomendo o programa Diretrizes da Associação Médica Brasileira (AMB). Entre no site:
http://www.projetodiretrizes.org.br/ans/diretrizes/depressao_unipolar-tratamento.pdf
O “guia” da AMB deveria ser o mais compatível com o “nosso mundo real”. Porém, ele depende do desenvolvimento das pesquisas em nosso meio. No momento, sua elaboração se faz muito com base em pesquisas realizadas em outros países. Mas é um guia de fácil acesso e que foi revisado em janeiro de 2011, portanto é bem atualizado.
A American Psychiatric Association (APA) publicou o seu Guia em 2000 e atualizou-o em 2005: Practice Guideline for the Treatment of Patients with Major Depressive Disorder.
Sites: www.psych.org
www.psych.org/psych_pract/treatg/pg/prac_guide.cfm.
A intenção foi a de oferecer a nós, clínicos, caminhos que nos ajudem a raciocinar. Não se trata de um “roteiro engessado” ou de uma “receita de bolo”, e, sim, de um “menu de escolhas racionais”. Foi montado com base numa atualização das pesquisas a respeito. Toda a bibliografia consta no site da APA, por isso não a estou colocando aqui no presente curso.
PRACTICE GUIDLINE (APA)
7.3. PRACTICE GUIDELINE FOR THE TREATMENT OF PATIENTS WITH MAJOR DEPRESSIVE DISORDER (APA)
7.3.1. PRIMEIRA FASE: AGUDA
No site da entidade norte-americana encontra-se todo o Guia Prático da APA, que vou descrever já acrescentando a forma como faço em meu dia-a-dia.
Em geral a fase aguda dura de oito a doze semanas e tem por objetivo o alívio dos sintomas. Escolhe-se o tratamento inicial a partir de alguns critérios. A APA parte da intensidade do quadro, o que me parece muito acertado.
No caso de depressão leve, o paciente pode optar entre psicoterapia ou farmacoterapia; se pela farmacoterapia, prescrever-se-á apenas um antidepressivo.
Na depressão moderada ou grave o antidepressivo é o tratamento de escolha.
Na depressão grave com sintomas psicóticos, além dos antidepressivos, devem se acrescentar antipsicóticos ou ECT.
Quando é possível optar, devemos observar a presença de fatores que sugerem ser melhor farmacoterapia e outros que sugerem ser melhor psicoterapia.
Fatores que apontam para a opção por farmacoterapia:
1.história prévia de boa resposta com medicamento;
2.sintomatologia severa;
3.distúrbios significativos do apetite;
4.distúrbios significativos do sono;
5.agitação;
7.preferência do paciente;
8.não há oferta no meio ou condições do paciente optar por outra modalidade de tratamento.
Fatores que sugerem ser melhor psicoterapia:
1.presença significativa de problemas (estressores) psicológicos e ou sociais;
2.conflitos intrapsíquicos;
3.dificuldades interpessoais;
4.presença de transtorno de personalidade;
5.gravidez, amamentação ou desejo de engravidar em seguida;
6. preferência da paciente.
Fatores que apontam para a combinação de farmacoterapia e psicoterapia:
1.quando a depressão é acompanhada de problemas psicológicos e sociais; 2. quando é acompanhada de problemas de relacionamento interpessoal;
3.quanto há comorbidade com transtorno de personalidade;
4.quando há história de melhora parcial ao ser empregada isoladamente uma das modalidades de tratamento;
5.quando há pobre aderência ao tratamento.
O uso do ECT está indicado quando:
1.há grande número de sintomas graves e prejuízo no funcionamento;
2.presença de sintomas psicóticos ou catatonia;
3.necessidade de melhora urgente: por exemplo, risco grave de suicídio ou prejuízo nutricional importante com o paciente se negando a ingerir alimentos;
4.presença de outras doenças com as quais não se deve usar antidepressivos;
5.história prévia de boa resposta ao ECT;
6.paciente prefere ECT.
Quando a opção é a farmacoterapia, a APA sugere critérios para que se escolha o primeiro antidepressivo a ser utilizado, levando-se em conta que há eficácia semelhante entre vários deles:
1.efeitos colaterais que provavelmente aparecerão;
2.tolerância que o paciente terá a um efeito colateral e não a outro;
3.preferência do paciente;
4.quantidade e qualidade da experiência clínica que se dispõe com determinado medicamento;
5.custo;
6.história prévia de resposta com determinado antidepressivo;
7.presença de comorbidade psiquiátrica;
8.presença de determinadas doenças físicas;
9.o uso de IMAOs somente quando os outros antidepressivos não responderem.
A prescrição de um antidepressivo deve seguir alguns critérios:
1.segundo a APA, devemos iniciar com a dose terapêutica mais baixa. Eu não penso assim. Já nos primeiros dias procuro que a dose alcance a dose terapêutica alta, pois o paciente tem pressa
2.o aumento da dosagem terapêutica deve levar em consideração: efeitos colaterais, idade do paciente, doenças outras que o paciente apresenta em comorbidade;
4.o método do monitoramento será determinado pelo contexto: face a face, telefone, e-mail, contato com outro médico que atenda o paciente.
Quando o primeiro antidepressivo não responde:
1.se o paciente não revelou pelo menos uma resposta moderada após quatro a oito semanas de uso do medicamento, é necessário rever o tratamento;
2.investigar a aderência do paciente ao tratamento;
3.considerar a farmacocinética ou a farmacodinâmica do medicamento;
4.revisar o plano de tratamento considerando as seguintes opções
4.1.maximizar a dose do medicamento;
4.2.adicionar, modificar ou aumentar a freqüência da psicoterapia;
4.3.mudar para outro medicamento;
4.4.acrescentar uma medicação auxiliar (lítio, hormônio da tireóide, psicoestimulante, anticonvulsivante, por exemplo);
4.5.revisar o diagnóstico;
4.6.reavaliar formas de fazer com que melhore a aderência ao tratamento;
4.7.examinar a presença de outros fatores: doenças físicas, doenças psiquiátricas como abuso de sustâncias, problemas psicológicos e sociais importantes;
4.8.se a não resposta continuar, considerar a possibilidade de usar ECT.
Critérios para se indicar um tipo ou outro de psicoterapia:
3.levar em conta a preferência do paciente;
4.avaliar a capacidade do terapeuta de quem o paciente pode dispor quanto a sua capacidade e experiência naquela técnica psicoterápica.
A aplicação da psicoterapia requer alguns critérios:
2.se o paciente não revelar melhora pelo menos moderada após quatro a oito semanas, rever a indicação da psicoterapia
Critérios para a aplicação conjunta do antidepressivo e da psicoterapia:
1.se após quatro a oito semanas não houver melhora pelo menos moderada, rever tanto a medicação quanto a psicoterapia;
2.se após mais quatro a oito semanas adicionais, rever novamente tanto a indicação da psicoterapia quanto da medicação e examinar a possiblidade do uso de ECT.
7.3.2. SEGUNDA FASE: CONTINUAÇÃO
A segunda fase vai da melhora à remissão. A maior parte dos sintomas desapareceram mas a nossa meta é que ocorra a remissão, ou seja, que a melhora seja a ponto de o paciente não ter mais sintoma algum, de voltar a se sentir igual ao estado saudável de antes da doença. Varia de paciente para paciente, mas eu considero que isso deva ocorrer num período máximo de seis meses.
A maioria considera adequado que ela vá do período de
1.para prevenir recaída, continua-se com o medicamento antidepressivo na mesma dosagem usada na fase aguda;
2.considerar o uso de psicoterapia para auxiliar na prevenção de recaída;
3.considerar o uso de ECT se a medicação ou a psicoterapia não se mostram eficazes;
4.nesta fase a freqüência das consultas poderá variar de várias por semana a apenas uma a cada dois ou três meses, dependendo da condição clínica e do tratamento que está sendo empregado.
7.3.3. TERCEIRA FASE: FASE DE MANUTENÇÃO
A manutenção do tratamento visa evitar uma recaída; seu objetivo é a prevenção. Como o quadro pode voltar, precisamos estabelecer qual medicamento e/ou psicoterapia o paciente deverá manter mesmo estando bem. Essa fase leva, no mínimo, na minha opinião, dois anos. Há pessoas que precisarão da manutenção pelo resto de suas vidas.
Artigo publicado no Journal of Biological Psychiatry pelos psiquiatras norte-americanos Martin Keller e Robert J. Boland revela os seguintes dados. A incidência da doença depressiva nos Estados Unidos é de 17,1%. Após a recuperação, as recaídas ocorrem em pelo menos 60 % dos casos.
As pesquisas atuais revelam que o uso de antidepressivos depois que o paciente melhorou da depressão é muito importante para evitar uma recaída. Porém, por quanto tempo usar?
Sabe-se que cada paciente terá um tempo de uso ideal para si. Não há uma conduta única.
Nenhum colega contesta que o antidepressivo deve ser mantido por, pelo menos, seis meses após um primeiro episódio de depressão; outros sugerem um ano; e alguns, de
Entro em acordo com o paciente. Discutimos a gravidade do quadro que teve, o atrapalho, caso recaia naquele momento de sua vida.
Há ainda pacientes que, provavelmente, terão de usar antidepressivos por muitos e muitos anos, talvez por toda a vida. A postura atual indica a manutenção do uso de antidepressivos ao longo da vida nas seguintes situações, segundo sugeriu o Dr. Táki Athanássios Cordás, psiquiatra do Hospital de Clínicas/Faculdade de Medicina da USP:
1.para pacientes que já tiveram três ou mais episódios de depressão, independente da idade;
2.para pacientes com quarenta ou mais anos que tiveram dois episódios ou mais de depressão;
3.Para pacientes com cinqüenta ou mais anos que estão tendo seu primeiro episódio.
Determinados fatores devem ser considerados na decisão de se optar por um ou outro tipo de tratamento de manutenção: preferência do paciente, efeitos colaterais experimentados pelo paciente com a manutenção do tratamento, a severidade do episódio depressivo que ele teve, risco de suicídio, sintomas psicóticos, prejuízo importante no seu funcionamento, presença de sintomas residuais entre os episódios, número de episódios depressivos que ele já teve, presença de comorbidades, presença de doença física crônica.
7.3.4. QUARTA FASE: DESCONTINUAÇÃO DO TRATAMENTO
Tendo se decidido pela descontinuação, devem-se seguir alguns critérios:
1.o medicamento deve ser retirado aos poucos: minimiza o risco da síndrome de descontinuação;
2.se os sintomas voltam, basta aumentar a dose novamente;
EXERCÍCIO PARA REFORÇAR O CONTEÚDO
Como vimos, no caso de depressão leve o paciente pode optar entre psicoterapia ou farmacoterapia. Quando dá para optar, devemos observar a presença de fatores que sugerem ser melhor farmacoterapia e outros que sugerem ser melhor psicoterapia. Anote os fatores que apontam para psicoterapia (P) e para a farmacoterapia (F):
1.história prévia de boa resposta com medicamento ( )
2.sintomatologia severa ( )
3.distúrbios significativos do apetite ( )
4.distúrbios significativos do sono ( )
5.agitação
6.presença significativa de problemas psicológicos e ou sociais ( )
7.conflitos intrapsíquicos ( )
8.dificuldades interpessoais ( )
9.presença de transtorno de personalidade
10.gravidez, amamentação ( )
Respostas: F (1,2,3,4,5); P (6,7,8,9,10)
ANTIDEPRESSIVOS: DICAS
8.1 ANTIDEPRESSIVOS: DICAS
a. Atendo muitos pacientes que vêm de tratamentos frustrados pelo simples fato de que o antidepressivo havia sido ministrado em dose baixa.
b. Sugiro que o colega se dedique a receitar inicialmente três tipos de antidepressivos para que possa conhecer bem seus efeitos e se sentir seguro ao prescrevê-los.
c. Não sou favorável a se estar sempre na “moda” receitando todas as novidades que a indústria farmacêutica nos apresenta. Na prescrição devemos ser conservadores e incorporar as novidades aos poucos, bem aos poucos.
d. Não custa lembrar que os efeitos de todos os antidepressivos indistintamente se relacionam com a regulação de alguns neurotransmissores. Dez substâncias são consideradas neutrotransmissoras: aminas derivadas de aminoácidos (dopamina, noradrenalina, adrenalina, serotonina e histamina), aminoácidos (asparato, glutamato, glicina, ácido gama-aminobutírico – GABA), acetilcolina. Além dos neurotransmissores, existem outras substâncias que atuam na transmissão neuronal: os neuromoduladores e os neuromediadores.
e. A questão é que, tudo indica, existem muitas outras substâncias neurotransmissoras ainda desconhecidas por nós. Não é por nada que um medicamento, por exemplo, inibidor seletivo da recaptação da serotonina age nem sempre igual ao outro; provavelmente atinge neurotransmissores desconhecidos diferentes. Há indícios de 40, porém bem podem ser 300 os neurotransmissores. Isso explica por que a fluoxetina e a sertralina, dois inibidores seletivos da serotonina, por exemplo, não tem o mesmo perfil de ação nem exatamente os mesmo efeitos colaterais. Provavelmente, além da serotonina, cada um age em diferentes neurotransmissores ainda não conhecidos. E agem sobre os neuromoduladores e sobre os neuromediadores? Ou seja, a observação clínica que fazemos no dia-a-dia com nossos pacientes é soberana.
f. Na minha opinião, esses medicamentos deveriam ser denominados de “reguladores dos neurotransmissores”. São chamados de antidepressivos pelo fato de ter sido a depressão a primeira patologia a ser tratada por eles. Só depois foram empregados no tratamento de outras patologias, como ansiedade generalizada, pânico e transtorno obsessivo-compulsivo.
g. Para nós, clínicos, não importa tanto memorizar detalhes de suas ações sobre as sinapses neuronais e sobre os neurotransmissores conhecidos.
Basta saber que os mecanismos pelos quais eles atuam são: diminuindo a metabolização (destruição) do neurotransmissor; aumentando a liberação do neurotransmissor na fenda sináptica; inibindo a recaptação do neurotransmissor; atuando na transmissão neuronal como segundo mensageiro; atuando sobre os receptores como agonista.
h. A serotonina é neurotransmissor em maior evidência atualmente, também chamado de 5-hidroxitriptamina (5-HT). É derivado do aminoácido triptofano, que não é sintetizado pelo organismo humano, depende da dieta. A falta de triptofano na alimentação pode levar a uma falta de serotonina.
ANTIDEPRESSIVOS A VENDA NO BRASIL
8.2. ANTIDEPRESSIVOS NO BRASIL
Inibidores da recaptação da serotonina (ISRS)
Fluoxetina, sertralina, paroxetina, fluvoxamina, citalopram e escitalopram.
Inibidores da recaptação da serotinina e da noradrenalina (IRSN)
Desvenlafaxina, venlafaxina, milnaciprano e duloxetina
Inibidor da recapatação da dopamina e da noradrenalina
Bupropriona
Noradrenérgico e serotoninérgico específico
Mirtazapina
Fenilpiperazínicos
Trazodona, nefazodona
Tricíclicos (ADT) e heterocíclicos
Imipramina, amitriptilina, clomipramina (aminas terciárias)
Nortriptilina (amina secundária)
Tetracíclicos
Mianserina, maprotilina
IMAOs
Irreversível: tranilcipromina
Reversível: moclobemida
Psicoestimulantes
Metilfenidato
Lisdexanfetamina
QUAIS AS VANTAGENS DE UM OU OUTRO GRUPO?
8.3. DIFERENÇAS
a. os ISRS devem ser os preferidos pelos baixos efeitos colaterais e pela segurança. Quanto menor a toxidade, maior a segurança. E como muitos dos pacientes têm risco de suicídio, os ISRS se impõem já que elas são muito seguros. A dose letal é muito alta e não foram reportadas mortes por overdose com eles; os medicamentos de efeito dual (serotonina e noradrenalina) também são de primeira escolha, particularmente a desvenlafaxina que vem se mostrando quase sem efeitos colaterais e quase sem interação com outros medicamentos.
b. já os ADTs não são seguros. Há muitos casos de suicídio após ingestão de overdoses destes produtos, especialmente da amitriptilina;
c. os IMAOs irreversíveis devido a suas interações prejudiciais com determinados alimentos devem ser usados em depressões resistentes;
d. optaremos pelos ADTs e pelos IMAOs no caso das depressões resistentes ao tratamento (DRT) com os outros antidepressivos mais seguros e com menores efeitos colaterais.
8.4. IMAOs
São substâncias que inibem a ação da monoamina oxidase, ou seja, impedem o desmanche de monoaminas neurotransmissoras. Em conseqüência, aumentam a disponibilidade de dopamina, noradrenalina e serotonina. Existem dois tipos monoamina oxidase. O tipo chamado de A, na prática, vai metabolizar a serotonina e da noradrenalina; o tipo B vai metabolizar as feniletilaminas.
A moclobemida inibe de forma reversível a MAO de tipo A, ao passo que a tranilcipromina inibe tanto A como B e de forma irreversível. Em conseqüência, não há problemas em se utilizar a moclobemida; já o emprego de IMAO irreversível implica muitos cuidados.
Os pacientes que estejam usando a tranilcipramina devem suspendê-la durante 14 dias antes de começar com outro antidepressivo. Os pacientes tratados com outro antidepressivo e que vão trocá-lo pela tranilcipramina, devem suspender esse antidepressivo sete dias antes.
É inegável a eficácia da tranilcipramina. Eu a utilizei muito e com resultados muito bons. Quando a prescrevermos, nunca devemos esquecer de orientar o paciente e seus familiares dos alimentos que devem ser evitados como:
.queijos, pizzas;
.fígado e miúdos, embutidos (presunto, salsicha, salames, patês);
.peixes (caviar, conservas de peixe, enlatados marinhos), charques, extratos de carnes;
.vegetais (frutas maduras, feijão, vagem, frutas em lata);
.cervejas e vinhos.
Os pacientes podem apresentar efeitos colaterais nos dois tipos de IMAOs: hipotensão postural, inquietação, agitação e insônia. Com a tranilcipramina pode haver também crises hipertensivas.
Macetes:
a. É bom lembrar que a selegilina é um IMAO tipo B irreversível, que aumenta a quantidade de dopamina, substância que se encontra diminuída no cérebro dos pacientes com Parkinson; também tem um efeito antidepressivo.
b. Cuidado! Quando se vai medicar um paciente depressivo com Parkinson, observe se ele não está tomando este medicamento. A interação com outro antidepressivo lhe trará efeitos colaterais importantes.
8.5. ADTs
São medicamentos eficazes, que perderam espaço em virtude do surgimento de concorrentes com bem menos efeitos colaterais e mais seguros. Hoje, somente os uso quando o paciente não vem obtendo resultado com os antidepressivos mais modernos.
Quais seus efeitos colaterais desagradáveis?
Efeitos anticolinérgicos: decorrentes da oposição à atividade do nervo parassimpático. Efeitos parassimpaticolíticos: boca seca, constipação intestinal, turvação visual, dificuldade para começar a urinar, retardo ejaculatório, aumento da pressão intraocular, entre outros.
Macete para a boca seca:
Para a boca seca, a xeostomia, também chamada de oligosaliva, aptialismo ou estomatite seca sugiro duas opções: 1. carmelose sódica 10 mg/ml, o Salivan do laboratorio Apsen, um frasco spray. Em geral se vaporiza oito vezes ao dia; 2. outra opção: pilocarpina colírio a 4%; 1 parte colírio + 3 partes de água. Bochecho, cospe fora.
Hipotensão ortostática. Ao mudar bruscamente de postura o paciente sente-se tonto, escurece tudo. A nortriptilina é o ADT que menos induz hipotensão ortostática. Deve-se a sua ação central no centro vasomotor e do bloqueio alfa-adrenérgico periférico.
Macete para a hipotensão ortostática:
Solicito ao paciente que evite mudanças bruscas de postura. Por exemplo, deve levantar-se devagar. E explico por quê.
Efeitos cardiotóxicos. Produzem diminuição de condutividade do impulso cardíaco com bloqueio de ramo direito de grau variável. São contra-indicados em pacientes com o diagnóstico de bloqueio bifasicular, bloqueio de ramo esquerdo ou prolongamento do intervalo QT. Podem causar também taquicardia e extra-sistolia.
Ganho de peso. Aumentam o apetite, podem provocar retenção hídrica.
Intoxicação por overdose. Quando o paciente, por engano ou numa tentativa de suicídio, toma uma dose exagerada de um ADT, ele pode passar a apresentar hipotensão, arritmias cardíacas, convulsões e, na ausência de tratamento, pode chegar ao óbito. O tratamento de emergência implica em: indução de vômito, lavagem e aspiração gástrica, entubação e administração de carvão ativado para absorver as substâncias ingeridas.
8.6. ISRS
Os antidepressivos chamados de Inibidores Específicos da Recaptação da Serotonina (ISRS) são aqueles que não interferem ou interferem pouco nos demais neurotransmissores além da serotonina (5HT).
O efeito antidepressivo dos ISRS é conseqüência do bloqueio seletivo da recaptação da serotonina (5-HT).
As doses dos ISRS devem ser individualizadas para cada paciente e variam. Não esqueça! Doses baixas nos fazem perder tempo ou até mesmo perder um bom medicamento para aquele paciente: “Doutor, esse medicamento eu já usei e não adiantou nada”.
Fluoxetina:
Sertralina:
Paroxetina:
Citalopran:
Escitalopran:
Fluvoxamina:
Seus efeitos colaterais, quando aparecem, são em geral leves e tendem a desaparecer em poucos dias. São eles: náuseas e vômitos, inapetência com perda de peso corporal no início do tratamento, diminuição da libido, retardo ejaculatório, anorgasmia, tremor, inquietação, taquicardia e tonteiras.
A fluoxetina tem se associado a alguns casos de acatisia (imposibilidade de permanecer sentado), especialmente quando a dose é muito alta.
A fluvoxamina produz mais intolerância digestiva, sedação e interações farmacológicas que outros ISRS.
A paroxetina origina mais sedação, efeitos anticolinérgicos e extrapiramidais que outros ISRS. Podem aparecer sintomas de abstinência com a supressão brusca do tratamento com a paroxetina.
Um fator que pesa a favor: esses efeitos colaterais são quase sempre leves e bem tolerados. Há pacientes que não sentem efeito colateral nenhum. Outro fator que pesa: não são perigosos, não são “armas” na mão de pacientes suicidas, como no caso dos ADTs.
8.7. TETRACÍCLICOS
A mianserina tem elevada propriedade anti-histamínica, podendo produzir como efeitos colaterais como sedação, sonolência, ganho de peso, cansaço muscular e ataxia (a coordenação motora fica prejudicada). É útil no controle da insônia.
A maprotilina, embora seja um tetracíclico, na prática revela efeitos colaterais semelhantes aos dos tricíclicos. É um medicamento muito eficaz. Antes da chegada dos ISRS foi um dos meus preferidos.
8.8. NORADRENÉRGICOS E SEROTONINÉRGICOS ESPECÍFICOS
A mirtazapina é particularmente útil em pacientes que têm insônia e anorexia. Os efeitos colaterais, além do sono e do aumento do apetite, tendem a ser leves e muitas vezes são passageiros como náusea, vertigem, diminuição da libido.
8.9. IRSNs
Os inibidores da recaptação da serotonina e da noradrenalina apresentam efeitos colaterais em geral leves e passageiros como náuseas, boca seca, sonolência. Em doses altas podem elevar um pouco a pressão arterial.
8.10. IRDN
O inibidor da recaptação da dopamina e da noradrenalina no mercado é a bupropriona, um medicamento bem tolerado. Não provoca ganho de peso e em algumas pessoas auxilia na perda de peso por inibir a fome. Pode provocar de forma leve náusea e insônia. Há referência a irritabilidade e rash cutâneo. Esse útlimo paraefeito, nunca vi ocorrer.
8.11. FENILPREPAZÍNICOS
A trazodona. Os efeitos colaterais que eu vejo acontecer são sono e boca seca. Há referência de que a trazodona poderia provocar hipotensão ortostática, sedação e priaprismo. Este último efeito, nunca vi acontecer.
8.12. PSICOESTIMULANTES
O metilfenidato é um droga estruturalmente relacionada às anfetaminas. Acredita-se que promova o bloqueio da recaptação da noradrenalina e da dopamina, mas não se tem certeza. O metilfenidato é vendido: tipo ação curta (Ritalina) que age por 4 horas; tipo ação longa (Ritalina LA e CONCERTA) que age por
No caso de intoxicação por anfetaminas, o paciente pode mostrar ansiedade, tremores, aumento dos batimentos cardíacos (taquicardia), aumento da pressão arterial, sudorese, dilatação das pupilas (meninas dos olhos), agitação e alterações psiquiátricas. O diagnóstico é baseado na história de ingestão de ingestão de anfetaminas e pelo quadro de ansiedade, tremores, taquicardia, sudorese e agitação; é confirmado pela identificação de anfetamina na urina. O paciente deve receber oxigênio, medicamentos calmantes, como os benzodiazepínicos e medicamentos que reduzam a pressão, como a fentolamina.
Acompanho há anos um paciente com depressão unipolar que havia experimentado praticamente todos os antidepressivos sem resultado. Mantém-se muito bem tomando Ritalina 10 mg 3 cp/dia.
MAIS DICAS
8.13. MAIS DICAS
a. Sobrepeso. Todo o paciente com sobrepeso quer emagrecer. Obviamente, vamos evitar todos os antidepressivos que despertam o apetite. No caso, dou preferência pela sertralina e posso ainda utilizar junto o metilfenidato. Ou, caso a depressão seja do bipolar II, por exemplo, aproveito e uso o topiramato, que na maioria das pessoas diminui o apetite. No caso de o paciente ser unipolar, mas ter cefaléia, também aproveito e uso o topiramato, muito útil na prevenção da cefaléia. Alguns antidepressivos provocam craving (desejo exagerado) por carboidratos. Se o paciente se queixar disso, não é gula psicológica. Reveja o medicamento que está sendo prescrito.
b. Baixo peso e insônia. Utilizo a mirtazapina e, com certeza, ele passará a dormir bem. Fico na torcida de que surja o efeito colateral do aumento do apetite.
c. Ejaculação precoce. Boa parte dos antidepressivos retarda a ejaculação. A paroxetina e a sertralina são as substâncias de minha preferência no caso.
d. Convulsão. Só tive dois casos de convulsão por uso de antidepressivo, e isso há bastante tempo. Um paciente estava muito emagrecido, anorético, e o outro tinha tido convulsões na infância. A literatura refere que o risco de os antidepressivos tricíclicos desencadearem convulsão vai de
e. Anticoncepcional. Há referência na literatura da possibilidade de o antidepressivo diminuir o efeito do anticoncepcional. Veremos o mecanismo bioquímico responsável no módulo interações medicamentosas. Na prática, não vi acontecer gravidez indesejada pelo uso de antidepressivo junto com o anticoncepcional; vi acontecer com o uso de anticonvulsivantes. Entretanto, é bom comentar esta dúvida com a paciente e pedir para ela trocar idéias com seu ginecologista. A conduta poderá ser aumentar a dose do anticoncepcional, substituí-lo ou manter o mesmo se considerado bem eficaz.
f. Síndrome serotoninérgica. Consiste no surgimento simultâneo ou seqüencial (às vezes abrupto) de um conjunto de sintomas. Psiquiátricos: agitação, confusão mental, hipomania, eventualmente coma. Motores: mioclonias, tremores, hiperreflexia, rigidez, hiperatividade. Vegetativos: hipotensão ou hipertensão arterial, taquicardia, calafrios, hipertermia, diaforese. Gastrintestinais: náusea, vômitos, cólicas, diarréia. Não é quadro comum, mas devemos ficar atentos a seus primeiros sinais e diminuir ou suspender o antidepressivo.
g. Anestésicos. Alguns antidepressivos, se tomados concomitante a anestésicos endovenosos, podem desencadear a síndrome serotoninérgica. Os IMAOs devem ser suspensos pelo menos 14 dias antes de o paciente receber anestésicos endovenosos. Com os tricíclicos o problema é menor, mas também devem ser suprimidos alguns dias antes. Já com os ISRS praticamente não há problema, basta suprimi-los no dia que antecede a anestesia.
ANTIDEPRESSIVOS
|
DOSES / mg
|
Amitriptilina |
50 – 250 |
Bupropriona |
150 – 300 |
Citalopram |
20 – 60 |
Clomipramina |
75 – 300 |
Desvenlafaxina |
50 – 200 |
Escitalopram |
10 – 20 |
Fluoxetina |
20 – 60 |
Fluvoxamina |
100 – 300 |
Maprotilina |
25 – 150 |
Mianserina |
15 – 60 |
Milnaciprano |
100 – 200 |
Mirtazapina |
15 – 45 |
Moclobeminda |
300 – 900 |
Nefazodona |
300 – 600 |
Nortriptilina |
50 – 150 |
Paroxetina |
20 – 60 |
Sertralina |
50 – 200 |
Tranilcipromina |
20 – 60 |
Trazodona |
50 – 150 |
Venlafaxina |
75 – 225 |
ANSIOLÍTICOS E ANTIPSICÓTICOS DA DEPRESSÃO
8.13 ANSIOLÍTICOS NA DEPRESSÃO
Podem ser usados como auxiliar até o antidepressivo começar a fazer efeito. Veremos em outro módulo mais detalhes sobre estes medicamentos.
Como sempre, devemos cuidar para que o paciente com risco de suicídio não fique com esses medicamentos a sua disposição. Em caso de intoxicação por benzodiazepínico por tentativa de suicídio, o paciente apresenta diminuição da pressão arterial e dos batimentos cardíacos, lentificação do raciocínio e dos movimentos, dificuldade respiratória, podendo chegar ao coma.
O diagnóstico se faz pelo relato de uso de benzodiazepínicos, e pelo quadro de torpor, lentificação do raciocínio e dos movimentos, diminuição da freqüência cardíaca e dificuldade para respirar.
Deve-se esvaziar o estômago por indução de vômitos ou lavagem gástrica e administrar carvão ativado. Como antídoto usa-se o flumazenil.
Grande parte dos pacientes que atendi nesses anos me disse que o pior sintoma de sua depressão era a ansiedade.
Deverão ser usados em caso de depressão psicótica. Hoje a primeira escolha se faz pelos atípicos. Veremos mais detalhes sobre estes medicamentos em outro módulo.
Opto como primeira escolha pela risperidona que provoca muito pouco ganho de peso se comparada à clozapina e à olanzapina. O ganho de peso pode se associar a hiperglicemia, diabetes tipo II e a dislipidemias. Inclusive o FDA sugere que quem toma antipsicótico atípico seja monitorado em relação a esses problemas. Com a respirodona, entretanto, a possibilidade de algo assim ocorrer é bem menor. Inclusive, algumas pesquisas chegam a apontar para a possibilidade de a risperidona possuir algum efeito benéfico sobre as dislipidemias. Por outro lado, a risperidona pode provocar acatisia: o paciente se sente inquieto, “não tem parada”. Mas não é comum de ocorrer.
EXERCÍCIO
A literatura refere que o risco dos antidepressivos tricíclicos desencadearem convulsão vai de
Na prática, devemos observar se o paciente tem predisposição para convulsão verificando alguns fatores. Assinale os corretos:
1. Se está com sobrepeso;
2. Teve epilepsia no passado;
3. Tem história de convulsões sem diagnóstico de epilepsia;
4. Tem história familiar de epilepsia;
5. Sofrimento cerebral por tumor e outras doenças;
6. Doenças multissistêmicas como lupus e sarcoidose;
7. Desiquilíbrio eletrolítico ou endócrino como hiponatremia ou hipoglicemia;
8. Suspensão recente de consumo habitual de álcool: a síndrome de abstinência alcoólica deixa o paciente mais vulnerável;
9. Paciente jovem.
Respostas corretas: 2,3,4,5,6,7.
TÉCNICAS INDICADAS
9.1. TÉCNICAS INDICADAS
No caso de depressão leve, como já vimos, o paciente pode optar entre psicoterapia ou farmacoterapia.
Mark Reinecke, professor de psiquiatria da Universidade de Chicago, em entrevista no Boletim de Psiquiatria da Sociedade de Psiquiatria do RS, afirmou: “O futuro deve pertencer às psicoterapias estratégicas, dirigidas aos problemas, como a psicoterapia cognitivo-comportamental e a psicoterapia interpessoal”.
Como já vimos em outro módulo, o Practice Guideline for the Treatment of Patients with Major Depressive Disorder da American Psychiatric Association (APA), publicado em 2000 e atualizado em 2005, escreve textualmente: “A psicoterapia cognitivo-comportamental (PCC) e a psicoterapia interpessoal (PIT) oferecem os melhores resultados com base em pesquisas documentadas. A psicoterapia psicodinâmica, na opinião consensual de alguns clínicos, é habitualmente orientada para a melhoria dos sintomas e para agir sobre transtorno de personalidade”.
Outra técnica vem sendo aplicada e avaliada com resultados promissores particularmente no tratamento da distimia e da depressão crônica: Cognitive Behavioral Analysis System of Psychoterapy (CBASP).
Comentaremos cada uma delas e, na seqüência, veremos a forma como uma ou outra seria aplicada em um caso. Farei os comentários pelo fato de ter tido treinamento e ter praticado todas elas.
Nos primeiros anos de profissão, trabalhei com psicoterapia psicodinâmica. Tive como supervisor o professor David Zimmermann, entre outros. Inclusive, foi ele meu orientador na minha tese de mestrado em psiquiatria (UFRGS), que, por sinal, versava sobre a compreensão psicodinâmica de pacientes com transtornos somatoformes.
Depois, fiz cursos de psicoterapia cognitivo-comportamental e trabalhei com ela em inúmeros casos de depressão e transtorno obsessivo-compulsivo. E, desde há vinte anos, trabalho com a psicoterapia interpessoal. Atualmente, além da psicoterapia interpessoal, tenho praticado em certos casos selecionados a CBASP.
A propósito, o Residency Review Committee of the Accreditation Council for Graduate Medical Education dos Estados Unidos exige agora que os residentes em psiquiatria demonstrem capacidade de aplicar cinco tipos de psicoterapia.
Vídeo - PSICOTERAPIA INTERPESSOAL
PSICOTERAPIA INTERPESSOAL (PIT)
9.2. PSICOTERAPIA INTERPESSOAL (PIT)
9.2.1. TÉCNICA ABERTA
A psicoterapia interpessoal (PIT) foi desenvolvida, inicialmente, para tratar depressão unipolar não psicótica. Começou nos anos 70 e foi se desenvolvendo e sendo testada com sucesso. Seu primeiro manual foi publicado em 1984 por dois psiquiatras norte-americanos: Gerald Klerman, já falecido, e Myrna Weissman, sua esposa e companheira de trabalho e colaboradores.
A intervenção do terapeuta focalizava a formação dos sintomas, o ajustamento social do paciente e seus relacionamentos interpessoais. Trabalhava-se com os problemas atuais. A influência das vivências infantis era reconhecida como importante, mas não era o foco. O foco era no "aqui e agora".
A psicoterapia interpessoal não se constitui propriamente numa escola. É uma técnica aberta que vem sendo aplicada e desenvolvida de forma diversa por diferentes profissionais que lidam com depressão. Inclusive, uma série de outros transtornos já está sendo tratada por ela e também conflitos de relacionamento.
Os profissionais que trabalham com esta técnica não pensam que a causa da depressão esteja nos fatores interpessoais. Apenas pensam que a pessoa adoece num contexto social e interpessoal e que o início, o desenvolvimento, o tratamento, o prognóstico da doença vai ser influenciado pelas relações interpessoais do indivíduo. Se o paciente souber manejar melhor os problemas interpessoais vinculados à depressão, vai ter mais chance de obter melhora.
Inclusive, exponho num curso técnicas de relacionamento (RELAÇÕES INTERPESSOAIS INTELIGENTES) e, noutro, habilidades úteis para se lidar com relações difíceis (SOLUCIONANDO CONFLITOS DE RELACIONAMENTO). Entendo que podem ser melhoradas as relações não só com pessoas, mas também com nossos interesses na vida.
Cabe ressaltar que uma boa relação interpessoal não significa se tornar popular, conquistar o “voto” de todos. A relação boa visa facilitar à pessoa alcançar o jeito de viver que a ela agrade.
Uma pessoa poderá, sim, se tornar popular; outra, poderá preferir ter relações com poucas pessoas e poderá aumentar e melhorar sua relação com atividades, lazeres, esporte e cultura, que, inclusive, possam até ser realizadas solitariamente. Trabalhar as relações interpessoais de alguém implica também trabalhar a sua relação consigo mesmo, sua relação intrapessoal.
9.2.2. EVOLUÇÕES DA TÉCNICA
No início a técnica consistia em focalizar uma área-problema. Nos pacientes deprimidos encontravam-se as seguintes áreas-problema:
1. Luto por perda ou morte;
2. Disputas interpessoais com familiares, amigos, colegas, sócios;
3. Mudança de papéis, tipo novo emprego, saída de casa, término de estudos, mudança de casa, divórcio, mudanças econômicas e outras.
4. Déficits interpessoais tipo isolamento social.
A técnica priorizava a área-problema mais relacionada com a depressão atual e no máximo, mais uma considerada secundária. Estava estruturada para ser realizada semanalmente num total de 16 sessões.
As três sessões iniciais tinham por objetivo: (1) Avaliação do paciente; (2) Diagnóstico; (3) Papel de doente: explicar que o que sentia era devido a uma doença reconhecida; visava aliviá-lo de obrigações percebidas como acima de suas capacidades; evitava que se sentisse ainda mais culpado; (3) Inventário das relações interpessoais: examinar com ele suas relações atuais mais significativas observando como elas se processam, a comunicação, o afeto, a empatia, a satisfação que lhe trazem, os problemas que podem ser melhorados e aqueles com que se deve resignar (ver CURSO SHII 1); (4) A vinculação da depressão com suas relações, a escolha de uma área-problema como foco do tratamento; (5) A decisão se deve, concomitantemente, fazer ou não uso de medicação antidepressiva.
Nas sessões intermediárias refletia-se a área, ou as áreas-problema. No luto por morte ou perda, a função do terapeuta era facilitar a expressão dos sentimentos associados e auxiliá-lo a buscar novos vínculos, novas atividades e relacionamentos, para, e assim, conseguir preencher o vazio e, gradativamente, ir elaborando a perda. No caso das disputas interpessoais, examinavam-se com ele suas causas, possibilidade de conserto ou a aceitação de sua irreversibilidade e necessidade de afastamento; no caso da mudança de papéis, a percepção dos ganhos e das perdas de uma forma bem realista e a chance de alcançar um novo estilo de viver. No caso dos déficits-interpessoais, o deprimido, em geral, revelava vazios na sua vida atual. A técnica, em geral, recuperava em sua memória boas relações passadas para, depois, partir para formação de estratégias para melhorar suas relações atuais e buscar novas. Relações não só com pessoas, mas com interesses.
As sessões finais visavam estimular o paciente a reconhecer e consolidar seus progressos e a desenvolver a capacidade de identificar sintomas depressivos caso viessem a aparecer no futuro.
A técnica inicialmente desenvolvida segue de base, porém vem sendo modificada livremente por cada profissional que a aplica, adaptando-a a cada paciente que é atendido, dentro da visão de que a “técnica é o paciente”. A técnica não é escolhida pelo desejo do terapeuta.
9.2.3. PIT DE MANUTENÇÃO (PIT-M)
A PIT-M foi desenvolvida para manter a recuperação e prevenir recaídas. Era aplicada, em média, uma vez por mês. O terapeuta observava atentamente o ressurgimento de problemas interpessoais que estiveram associados ao episódio depressivo e tentava erradicar “o mal pela raiz”.
9.2.4. TÉCNICA INTEGRADORA
A PIT foi se desenvolvendo livremente e integrando-se com outras técnicas e abordagens terapêuticas. Não há problema algum no seu uso concomitante à medicação. Vai se desenvolvendo e desembocando em outras abordagens dependendo do paciente. Repito: “A técnica é o paciente”. O terapeuta tem de ser flexível. O importante é a necessidade do paciente, não a “necessidade do terapeuta de aplicar sua técnica pura”.
Dependendo da capacitação do terapeuta, ele pode trazer às sessões aspectos piscodinâmicos inconscientes do paciente, pode orientá-lo com técnicas da terapia cognitivo-comportamental, integrar o cônjuge ou a família no tratamento. Não é uma técnica que compete com as outras. Questiona-se, inclusive, se é uma técnica específica de psicoterapia ou se é uma meta, um direcionamento: melhorar a relação do paciente com as pessoas, consigo mesmo e com a vida utilizando-se de medicação, se necessário, do desenvolvimento de habilidades, da percepção de aspectos do seu inconsciente, da necessidade de corrigir falsas crenças e de agir.
Um paciente pode apresentar apenas tristeza. Não temos um diagnóstico para ele, não está doente. Por exemplo, sofre por fazer uma leitura ingênua da vida, ou está com dúvidas existenciais. Deseja ser ouvido e ouvir a forma como o terapeuta lidaria. Creio ser correto explicar que não há uma método psicoterápico específico cientificamente avaliado para ser aplicado em quem não está doente ou não tem sintomas. A psicoterapia interpessoal poderá auxiliá-lo no sentido de avaliar como andam suas relações com as pessoas e com interesses e com o próprio “existir”. Os conselhos que deseja virão da vivência, do conhecimento e da filosofia de vida do terapeuta. Ou seja, devemos explicar os limites de nossa atuação. Poderemos sugerir que faça aconselhamento filosófico ou espiritual. Que procure aquele familiar ou amigo que julga mais capaz de lidar com situações como as que vive. Que busque no seu passado alguém que até mesmo possa não estar mais vivo e se pergunte: “Como ele em minha situação lidaria?”
PSICOTERAPIA PSICODINÂMICA
9.3. PSICOTERAPIA PSICODINÂMICA
A psicanálise e a psicoterapia psicodinâmica, técnica dela derivada, vem sendo questionada nos últimos anos no que se refere a suas indicações. Durante determinado período, pelo baixo desenvolvimento de outras técnicas e dos medicamentos para tratar doenças mentais, sua indicação foi muito abrangente. Aqueles que a praticavam já sabiam que no futuro haveria outras opções e que a psicanálise e a psicoterapia psicodinâmica iriam receber indicações mais restritas e específicas.
A respeito, escreve Isaac Pechansky, membro efetivo e analista didata da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre: “Mas Freud já chamava a atenção para os limites da psicanálise como método terapêutico. Ele afirmava que o método não se aplicava a todas as doenças mentais, sendo sua maior indicação para as neuroses, sabidamente capazes de desenvolver transferência. (...) O fator transferência, por ele mesmo descoberto, passou a se constituir no elemento fundamental para a instalação do processo analítico e, conseqüentemente, o caminho através dos quais os conflitos da mente encontram solução” (Jornal da SPPA, ano 5, nº 9, p. 5, 2006).
É a única técnica que trabalha sistematicamente com a transferência, a contratransferência e a interpretação dos sonhos.
Alguns entendem a psicanálise como técnica destinada a tratar determinadas doenças; outros, como um método de reflexão sobre a mente que visa à busca de uma melhor qualidade de vida. Inclusive, já tive oportunidade de discutir esta questão com Raul Hartke, psicanalista, ex-presidente da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre, meu amigo pessoal.
Se a psicanálise e a psicoterapia psicodinâmica visam tratar doenças, ela se coloca na posição de ser avaliada, da mesma forma como o são a PCC e a PIT, ou seja, avaliada quanto a sua capacidade de esbater sintomas. Se visa à reflexão sobre a mente e ao alcance de uma melhor qualidade de vida, não precisará se submeter a este tipo de avaliação; deverá se submeter aos testes que estão sendo desenvolvidos para avaliar qualidade de vida.
Fiz esses comentários para explicar por que o guia da APA refere-se à psicoterapia psicodinâmica de uma forma dúbia. Repetirei seu texto: “A psicoterapia cognitivo-comportamental (PCC) e a psicoterapia interpessoal (PIT) oferecem os melhores resultados com base em pesquisas documentadas. A psicoterapia psicodinâmica, na opinião consensual de alguns clínicos, é habitualmente orientada para a melhoria dos sintomas e para agir sobre transtorno de personalidade”.
PSICOTERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL
9.4. COGNITIVO-COMPORTAMENTAL (PCC)
9.4.1. A TÉCNICA COGNITIVA
Como sabemos, volta-se para a correção do conteúdo do pensamento do paciente. Consiste em corrigir as falsas crenças em relação às situações que lhe trazem ansiedade e à sua própria auto-imagem. Muitas vezes, essas idéias distorcidas são introjetadas na infância ou adolescência e agora surgem atutomaticamente. O indivíduo pouco observa o que se passa realmente a sua volta para poder obter uma avaliação realista; de forma tendenciosa e automática, já lhe vem uma avaliação negativa. Sofre não devido à realidade, mas, sim, a um "velho" discurso negativo de si mesmo.
O terapeuta ajuda o paciente a identificar seus pensamentos distorcidos e procura auxiliá-lo, através de certas técnicas, a corrigi-los ou a não dar importância a eles. As pessoas sem depressão tem pensamentos negativos, porém não dão valor a eles.
A abordagem cognitiva parte da constatação de que os pensamentos negativos são mais do que um sintoma, são um dos pilares da doença depressiva. Identificando e corrigindo esses pensamentos, a depressão diminui significativamente. Sentimentos negativos resultam de pensamentos negativos.
Nossos pensamentos são alimentados por opiniões verbais que recebemos daqueles que exercem influência sobre nós como pais, irmãos, colegas etc. Tais opiniões são internalizadas e formam nossos valores e crenças. São necessárias, são referências para refletir e compreender as novas experiências.
Se forem referências disfuncionais, farão surgir em nós frente aos acontecimentos da vida “pensamentos negativos automáticos” (PNAs). Por exemplo, alguém que acredita que seu valor pessoal depende de seu sucesso ficará tomado por PNAs caso não alcance sucesso. Alguém cujo pressuposto diz que para se alcançar a felicidade é necessário ser amado por alguém, será tomado por PNAs caso esteja sozinho.
9.4.4. A TÉCNICA COMPORTAMENTAL
A técnica comportamental tenta modificar comportamentos inadequados pela aprendizagem de comportamentos adequados. O terapêuta planeja com o paciente uma seqüência de experiências de retreinamento.
Nas interações com o ambiente, reforços positivos surgem como conseqüência do comportamento adotado. Quando o comportamento não traz reforço positivo, o indivíduo tente a desistir dele.
O indivíduo poderá se deprimir quando certos comportamentos perdem o caráter de reforço positivo. Viraram rotina, por exemplo, e não agregam mais ganho emocional. Poderá se deprimir quando, numa nova situação de vida, não revelar habilidades que lhe permitam conquistar reforço positivo. Poderá passar a solicitar mais a atenção dos outros que, irritados, passam a rejeitá-lo.
A terapia tentará encontrar comportamentos eficazes que dêem ao paciente retorno em termos de reforço positivo. Predisposição genética, estresse e falta de habilidade para conquistar reforços positivos, pode influir no surgimento de uma depressão.
Para ler mais a respeito, entre no site da Sociedade de Terapia Cognitiva e procure ler os livros Aristides Volpato Cordioli e Paulo Knapp entre outros.
CBASP
9.5. SISTEMA DE ANÁLISE COMPORTAMENTAL COGNITIVA DE PSICOTERAPIA (CBASP)
9.5.1. FUNDAMENTAÇÃO
Técnicas desenvolvidas pela psicoterapia cognitivo-comportamental vêm sendo integradas a outras abordagens, inclusive à meditação. A respeito sugiro a leitura de dois artigos: 1. Lau M A, McMain S F. Integrating Mindfulness Meditation With Cognitive and Behavioural Therapies: The Challenge of Combining Acceptance and Change Based Strategies. Can J Psychiatry, Vol 50, nº 13, november, 863-9, 2005. 2. Shapiro S L, Carlson L E, Astin J A e Freedman B. Mechanisms of Mindfulness. Journal of Clinical Psychology, vol 62(3), 373-386, 2006.
A CBASP, por sua vez, também usa técnicas da psicoterapia cognitivo-comportamental. Trata-se de uma psicoterapia empírica de apoio desenvolvida por James P. McCullough da Virginia Commonwealth University para tratar pacientes com depressão crônica e distimia.
Déficit de percepção. Parte do princípio de que o paciente não está consciente de que seu pensamento e comportamento estão em certo ponto desconectados do ambiente, de que apresenta um déficit de percepção. A CBASP visa corrigir este déficit.
Pensamento pré-operativo. McCullough recorre ao conceito de pensamento pré-operativo de Piaget para descrever a estrutura do pensamento e da linguagem do deprimido crônico. A depressão crônica leva o paciente a pensar, falar e se comportar como uma criança de
Tendenciosidade. É incapaz de perceber a realidade como ela é, pois há sempre a tendenciosidade de a ler como negativa. A sua visão de mundo não é influenciada pelo ambiente. Ele não reage, não responde à realidade. Sua visão negativa/destrutiva é jogada sobre a realidade a sua volta; seus cenários estão contaminados.
O terapeuta que entrar em disputa com o paciente sobre a visão de mundo tenderá a fracassar. Ao contrário disto, o terapeuta na CBASP iniciará num nível mais básico: tentará ensinar o paciente a pensar de outra forma através de repetidos exercícios estruturados.
Hipótese tomada como verdade. As crianças pré-operacionais e os pacientes depressivos vão da premissa a conclusão e vão num movimento só, sem nenhuma parada para avaliar a realidade da situação. Não checam a hipótese. Aliás, não possuem uma hipótese, possuem uma “verdade”. E mesmo que a realidade demonstre claramente que sua premissa negativa estava errada, não abrem mão dela.
Não modula conforme a realidade. O comportamento não é influenciado por razões lógicas ou por feedback baseado na realidade. Vê com olhos negativos o próprio encontro com o terapeuta, mesmo que a realidade esteja lhe mostrando o contrário. Dirá: “Você foi treinado para se mostrar como quem gosta dos pacientes”; “Você até pode estar me aceitando agora, mas daqui a pouco você me rejeitará como todos as pessoas o fazem”.
Egocentrismo que gera solidão interpessoal. Crianças pré-operativas continuamente focam a si mesmas. Essa egocentricidade também se vê no depressivo crônico. No seu mundo egocêntrico, ele se coloca no papel de vítima, de rejeitado, de derrotado, de..., enfim, algo negativo. Sentar-se numa sala de atendimento com alguém assim egocêntrico traz a experiência da “solidão interpessoal”.
Monólogo. Crianças pré-operativas e depressivos crônicos abusam do monólogo, de tal forma, que suas falas são as mesmas independentemente de quem os ouve. Parecem-se com aquelas falas gravadas que ditam instruções seja por telefone, seja em certos ambientes públicos: a mensagem é a mesma não importando a reação de quem a ouve.
Baixa capacidade de empatia. Assim como as crianças, os depessivos são emocionalmente muito sensíveis às atitudes que os demais tomam em relação a eles, mas revelam baixa capacidade de se colocar no lugar das outras pessoas.
Pobre controle emocional. Assim como as crianças, apresentam baixo controle emocional, poucos recursos para lidar com as dificuldades emocionais, como se fossem adultos-crianças.
Energia voltada para se defender. As energias da crianças estão voltadas para a sobrevivência, não para o crescimento. É provável a vivência na infância de maus-tratos; pelo menos, a criança deve sentir certas situações vividas como sendo situações de maus-tratos, maus-tratos emocionais. “Uma hora ou outra, quando surgir uma oportunidade, frente a determinadas situações, os outros vão me ferir”. E a criança precisa, em conseqüência, consumir sua energia mental para se defender, não para crescer. Há uma sensação de desamparo acompanhada por outra de desesperança: “Minha vida será sempre assim”.
9.5.2. PRINCÍPIOS QUE NORTEIAM O TRATAMENTO
Essa abordagem parte do construtivismo de Piaget. O terapeuta terá de ajudar o paciente a reconhecer as conseqüências de seu pensar e se comportar nas suas relações interpessoais. Não é um ser passivo, uma vítima do que acontece nas suas relações com as pessoas e com seus interesses na vida. Ele dá o tom das relações, ele as constrói.
Princípios:
1. Ajudar o paciente a reconhecer as conseqüências de seu pensamento/comportamento desconectado da realidade.
2. Ajudá-lo a perceber como globaliza, generaliza e tem dificuldade em focalizar um problema específico, localizado numa determinada situação ou relação.
3. Ajudá-lo a perceber sua baixa motivação para mudança e a compreender que, em grande parte, o indivíduo é que produz e mantém sua própria miséria.
4. Se o terapeuta adotar a postura de comandar a terapia, o paciente assumirá o papel de observador.
5. É esperado que o paciente não propicie um ambiente afetivo e cooperativo. Ele estará ensimesmado, desmotivado e poderá, inclusive, se mostrar hostil. O terapeuta já deve ter tal espectativa para não ser pego de surpresa e se frustrar com o paciente.
6. Não ficar só no passado. O paciente poderá trazer relações passadas em que se sentiu maltratado. A relação com o próprio terapeuta ajudará a confrontar a tese de que sempre seus vínculos serão ruins.
7. O terapeuta deverá levar o paciente a questionar as conseqüências do pensamento/comportamento pré-operativo nas situações de sua vida real. Pensamento que não o ajuda a “operar”, a produzir, a realizar, a ser bem sucedido em seu dia-a-dia.
9.5.3. TÉCNICAS DA CBASP
9.5.3.1. Técnica Um: Análise Situacional (AS)
Exercícios que visam: (a) derrubar, destronar o funcionamento pré-operacional; (b) expor o funcionamento inadequado do paciente na sessão; (c) demonstrar ao paciente que seu comportamento traz conseqüências.
O exercício é feito sobre um acontecimento ocorrido recentemente no seu relacionamento com alguém. Vai se mostrar a discrepância entre o que o paciente desejava que acontecesse na relação e o que realmente aconteceu. Resultado real (Actual Outcome / AO) e resultado desejado (Desired Outcome / DO). A AS se faz em duas fases.
Fase do esclarecimento:
O que aconteceu? (descrição da situação)
O que a situação significou para você? (a interpretação)
O que você fez na situação? (o comportamento que adotou)
Que conseqüências a situação trouxe para você? (AO)
Que conseqüências você desejava? (DO)
Que diferença você nota entre o desejado e o que ocorreu? (AO x DO)
Por que você não conseguiu o que você queria na situação? (já se está fazendo a transição para a fase seguinte).
Fase da remediação:
Como cada interpretação contribuiu para você avançar no sentido do resultado desejado? (DO)
Se você tivesse interpretado a situação à luz de uma nova interpretação, você teria se comportado diferente?
O que você aprendeu na AS de hoje? (passo resumo)
Como o que você aprendeu na AS de hoje pode ser aplicado em outras situações? (transferindo o aprendizado)
Casos exemplos de aplicação da AS.
A paciente conta que o namorado foi rude com ela ao telefone e o desligou na sua cara.
“O que o ocorrido significou para você?”, pergunta o terapeuta.
“Que eu sempre sou uma perdedora”. Sua interpretação está ancorada numa interpretação globalizada (passada) e não na situação referida (real). “Que eu nunca tenho uma boa relação com alguém”. Idem.
“O que você fez na situação? O que você fez enquanto ele a criticava e batia o telefone na cara?”
“Eu não disse nada para me defender”.
“Que resultado ocorreu?” (AO)
“Ele desligou na minha cara”.
“Que resultado você desejava?” (DO)
“Eu desejava ter dito que ele estava me magoando terrivelmente”.
O terapeuta comenta a diferença existente entre AO e DO e pergunta: “Por que você não fez o que você disse aqui que gostaria de ter feito?”
“Eu não reajo e fico com cara de boba. É sempre assim”.
“A sua interpretação é antiga e conhecida: ‘É sempre assim, sou uma perdedora, nunca tenho uma boa relação’. No que ela contribuiu para você alcançar o que você desejava nesta relação real? Para você dizer que ele estava te magoando muito?”
“É... não ajudou”.
“Qual seria a interpretação que ajudaria?”
Junto com a paciente se cria uma “Interpretação de Ação” (Action interpretation), focada na situação. E, na seqüência, transfere-se o aprendizado para outras situações de sua vida.
9.5.3.2. Técnica Dois: Exercício de Discriminação Interpessoal (EDI)
O paciente espera algo negativo da pessoa do terapeuta, pois sempre pensa assim. (Lembro-me de uma paciente que, após melhorar da depressão foi bem franca ao me dizer que na primiera consulta chegou não esperando “boa coisa” do psiquiatra).
O paciente faz uma lista de seis ou sete pessoas cuja relação é significativa ou foi significativa para ele. Provavelmente, vai descrever a maioria dessas relações pelo seu lado negativo. Por exemplo, descreve seu pai como alguém que o ofendia verbalmente.
“Compare a relação que eu estou tendo com você com a relação que seu pai mantinha com você”.
A discriminação entre o pai e o terapeuta reduz o desconforto na relação e ajuda o paciente a superar aquela velha forma de pensar. Há uma experiência emocional corretiva.
9.5.3.3. Treinamento de Habilidades Para Bem Se Relacionar
Devido a seu jeito até então disfuncional, o paciente não desenvolveu suficientemente habilidades de relacionamento. Deve ser orientado a fazer um treinamento. Os treinamentos, segundo McCullough, são variados e todos ensinam algo de proveito. No meu caso, mantenho dois cursos de treinamento: SHII 1 e SHII 2.
Para ler mais, sugiro o artigo: McCullough J P. Treatment for chronic depression using cognitive behavioral analysis system of psychoterapy (CBASP) J Clin Psychol / In session 59:833-846, 2003.
Sugiro também o livro: McCullough J P. Treating Chronic Depression with Disciplined Personal Involvement. Springer, USA.
EXERCÍCIO
CASO ALTINA
Vamos chamar a paciente de Altina. Aliás, sempre é bom lembrar que, quando descrevemos um caso, os dados de identificação são alterados e outras informações mais. As modificações podem ser tantas a ponto de tratar-se de ficção a partir da vida real.
Altina está com 20 anos, cursa o primeiro ano de uma faculdade, é solteira, não tem filhos. Há pouco menos de um ano, mudou de cidade, ingressou na universidade e passou a morar sozinha.
A partir de então começou a gradativamente sentir tristeza, ansiedade, insegurança, desânimo, insônia matinal, diminuição do apetite com perda de quatro quilos e perda de interesse por coisas que antes a interessavam. Nos estudos, por exemplo, ela que sempre fora boa aluna, passou apenas a freqüentar as aulas. Parou de estudar em casa e passou a deixar tudo para a última hora. Virou, como disse, “estudante procrastinadora”.
Por ocasião da primeira consulta, estava realizando com muita dificuldade os exames: havia pego-os em todas as matérias. Não se interessava nem mais por futebol. Logo ela que gostava de assistir a jogos pela televisão, hábito adquirido na longa convivência com o pai e que gostava de jogar futebol de salão.
Era a primeira vez que procurava tratamento. Nunca fizera psicoterapia antes, nem tomara medicação. Referia não ter história de depressão na família, porém, pela descrição que fez de seu pai, é possível que ele sofresse de distimia.
Bebia apenas socialmente, não usava outras drogas. Porém, ultimamente, em algumas ocasiões abusara do álcool.
Não fazia tratamento para outras doenças pois possuía boa saúde. Seu pai era hipertenso e sua mãe tomava medicamento por sofrer de hipotireoidismo.
Filha única, seus pais se separaram quando ela tinha dez anos, a mãe havia se envolvido com outro homem. A mãe foi viver com o novo companheiro em outro estado e teve mais um filho.
Altina ficou com o pai que, não mais se casou e manteve apenas relações eventuais e passageiras com mulheres. Com a mãe convivia apenas em curtos períodos nas férias escolares. Perdeu, como afirma, toda a intimidade com ela.
Com o pai, apesar do convívio diário, nunca compartilhou sua vida íntima. Ele era um homem calado, mais para triste do que para alegre. Assistiam regularmente a futebol pela televisão comendo pipoca e comentando alguns lances. Torciam, sem muito alarido, para o mesmo time. Ele raramente a acompanhou em suas atividades, umas poucas vezes assistira a jogos de futebol de salão em que ela jogava.
No segundo grau, entrou para um grupo de futebol coordenado por uma professora, que passou a desempenhar um importante papel, pois pela primeira vez havia alguém que a ouvia e a orientava em relação à vida. Desde que mudara de cidade e entrara na universidade, o contato com a professora fora diminuindo, e logo a professora engravidou e não se mostrou mais disponível.
Seu pai algumas vezes telefonava queixando-se de solidão, insinuando que ela deveria voltar para junto dele, provocando-lhe sentimentos de culpa.
Logo que as aulas começaram iniciou namoro com um colega, seu primeiro namorado e o primeiro com que se relacionou sexualmente. Após três meses, o namorado foi se afastando e a relação acabou terminando sem um motivo maior.
Perguntada sobre por que estava deprimida, respondeu não saber bem. Questionada sobre a influência que poderia ter tido o romimento com o namorado, o afastamento da professora sua conselheira, do seu pai, se por expectativas irreais que poderia ter em relação à universidade, respondeu achar que talvez pudesse ser um pouco de tudo.
Disse que, semelhante a seu pai, sempre fora mais para triste, mas a intensidade agora era maior. Antes levava a vida sem muitas dificuldades, agora não mais, mas dizia ser de uma família de gente fracassada e que “a fruta nunca cai muito longe do pé”. Já suspeitava que iria fracassar na faculdade e que sempre soubera de que alguém “mais ou menos” não iria se interessar muito tempo por ela. Solicitada a classificar a intensidade de seu quadro depressivo e informada dos critérios, respondeu julgá-lo leve ou de leve a moderado.
Avaliação diagnóstica:
Eixo 1 – Episódio depressivo de leve a moderado e distimia (diagnóstico provisório);
Eixo 2 – Traços de personalidade dependente:
Eixo 3 - Dificuldades no relacionamento interpessoal com colegas, com namorado, com a pessoa que a orientava, com o pai e, há muito tempo, com a mãe; vive uma crise devido à mudança de cidade e início na universidade.
Eixo 4 – Aparentemente sem outras doenças.
Discussão diagnóstica:
Eixo 1. Há fortes indícios de que seu quadro seja o primeiro episódio de transtorno depressivo recorrente CID-10: F33, de uma depressão unipolar. Poderia ser um transtorno de adaptação de tipo depressivo prolongado (CID-10: F43.21); ou poderiam ser os dois quadros: a paciente já apresentaria uma distimia (CID-10: F34.1), seu pai parece apresentar, e, devido à dificuldade de adaptação pela mudança de cidade e entrada na universidade, apresentaria também uma depressão reativa. Estima-se que a cada ano um de cada dez pacientes com distimia desenvolve um episódio depressivo.
Ou ainda, três quadros concomitantes: distimia, primeiro episódio de um transtorno depressivo recorrente (depressão unipolar) e reação depressiva pela dificuldade de adaptação. O esclarecimento diagnóstico do eixo 1 será feito ao longo do atendimento.
Trata-se de uma depressão leve, a paciente é capaz de realizar a maior parte das atividades do dia-a-dia. Podemos dizer de leve a moderada, já que algumas atividades realiza com muita dificuldade, como é o caso dos estudos.
Eixo
Eixo
A escolha da modalidade de ratamento:
Baseando-se no guia da APA, a escolha poderá recair sobre medicação ou sobre psicoterapia. A paciente deve ser informada das indicações possíveis, das vantagens e desvantagens de cada opção. A paciente tem o direito de optar.
No caso de uma psicoterapia, expliquei-lhe que os temas abordados certamente abrangeriam seus traços de personalidade dependente, suas dificuldades de relacionamento atuais e passadas e a crise que vive pela mudança de cidade e pelo ingresso na universidade. Ainda, no caso do uso de medicação, se se mostrasse eficaz, orientei-a que os sintomas iriam desaparecendo e ela, ao se sentir com ânimo e energia, iria aos poucos retomando seu jeito de ser e de viver e por ela mesma iria lidando com suas dificuldades de relacionamento e com as crises que vivenciava. Disse-lhe que, na minha opinião, seria também possível o uso concomitante de psicoterapia e de medicação.
Cabia a ela o direito de optar.
Então, a paciente me disse que não gostava muito de conversar, conversar e conversar, referindo-se à psicoterapia, mas que achava que precisava e que a medicação seria um boa alternativa. Caso ela funcionasse, não precisaria prolongar uma psicoterapia.
A escolha da psicoterapia.
Expliquei-lhe as opções de tratamento e, resumidamente, o funcionamento de cada técnica psicoterápica indicada. Como atualmente trabalho com psicoterapia interpessoal, disse que poderia apenas monitorar o uso do antidepressivo e encaminhá-la para terapeuta que trabalha com a técnica psicoterápica escolhida por ela.
O fato de eu trabalhar como psicoterapia interpessoal influi na decisão dos pacientes por esta técnica. Em geral me dizem: “Se eu vim lhe procurar é por confiar no seu jeito de tratar”. Mas há pacientes que já se sentem envolvidos numa outra técnica, seja por conhecimento prévio, simpatia, indicação de amigos que já fizeram tratamento com elas, familiares que são profissionais em dada técnica psicoterápica e outros motivos.
Quando não encontro no paciente conteúdos que necessitem de abordagem psicoterápica, mesmo em casos de depressão leve e mesmo explicando as opções que o guia da APA sugere, sugiro apenas o uso de medicação.
No caso da paciente Altina, vamos hipotetizar a aplicação de diferentes técnicas psicoterápicas.
Optando por Psicoterapia Cognitivo-Comportamental
O terapeuta estabeleceria as metas do tratamento. Desenvolveria junto com ela uma compreensão de sua doença, incluindo a relação entre pensamentos, sentimentos e comportamentos. Informaria como seria o procedimento nas sessões e a importância dos “temas de casa”, dos exercícios que ela faria entre as sessões.
A procrastinação nos estudos poderia ser um comportamento que ocorreria em resposta a um conjunto de sentimentos possivelmente relacionados a pensamentos automáticos. Ela teria de fazer um levantamento, como tema de casa, explorar os padrões de sua procrastinação escolar.
Ela poderia dizer que não sente prazer em nenhuma aula na faculdade. Seria possível, entretanto, que, se ela parasse para observar, poderia pontuar de
Altina teria de observar os sentimentos que lhe surgiam em determinada aula ou que a impediam de se manter ligada na aula. Por exemplo, ansiedade, vergonha, desânimo. Teria de observar os pensamentos. Por exemplo, “sou um fracasso”, “vou ser humilhada”, “rejeitada”. Ela poderia ter dificuldade, inicialmente, em discriminar e nomear os sentimentos e os pensamentos que estariam vinculados à procrastinação.
De maneira similar, o terapeuta iria focalizar seus sintomas depressivos, incluindo tristeza, perda de interesse pelas atividades e isolamento. Ela poderia dizer que nada lhe dava prazer, que era melhor ficar em casa isolada.
Se ela passasse a observar e a pontuar as diferentes situações de sua vida, veria que não há homogeneidade no desprazer. Ela poderia imaginar-se presente em determinado lugar e observar o que se passaria em seu interior. Poderia realizar uma experiência comportamental, ou seja, ir a determinadas situações para avaliar-se.
Portanto, o automonitoramento, ativação comportamental e reestruturação cognitiva poderiam ser técnicas que o terapeuta cognitivo-comportamental aplicaria na paciente tanto em relação ao problema da procrastinação quanto dos outros sintomas de seu quadro depressivo.
Seu relacionamento com homens, em particular com o único namorado que teve, com colegas, bem como com o senso de si mesma como uma mulher adulta, também poderia ser alvo da psicoterapia. Poderia monitorar os sentimentos e os pensamentos que surgem nessas relações.
O terapeuta cognitivo-comportamental iria examinar as “crenças básicas” de Altina. Carregava ela sentimentos e pensamentos repetitivos de tipo exclusão e rejeição relacionados ao abandono que sofreu por parte de sua mãe.
Os sentimentos e pensamentos que a afligiam quando sofria uma desatenção por parte de colegas, de professores etc., poderiam se dever muito mais a essa “crença básica” do que ao fato atual em si.
Com a continuidade da terapia a paciente poderia desenvolver a habilidade de identificar e modificar seus pensamentos automáticos, que originavam de sua crença básica.
Optando por Psicoterapia Psicodinâmica (Psicoterapia de Orientação Psicanalítica)
Altina encontraria no terapeuta alguém que procuraria se revelar aberto, não julgador e curioso em relação a ela e a seus problemas. Seus problemas, para ele, refletiriam motivações e medos sobre os quais ela estaria apenas parcialmente consciente.
O terapeuta iria observar e trabalhar, quando julgasse adequado, com os sentimentos desenvolvidos pela paciente na relação com ele e estaria atento aos sentimentos que o encontro com ela despertariam nele.
Tentaria já de início levá-la a aprofundar sua reflexão. Poderia dizer que ela estava se portando muito educada, muito polida na sessão, mas que, ao mesmo tempo, mantinha-se muito na “superfície”. Poderia questionar se essa postura de ficar na “superfície” não seria para evitar reviver sofrimentos. O objetivo seria aumentar a reflexão da paciente, expandir sua consciência e encorajá-la a ter curiosidade em relação a si mesma. O contexto de não julgamento estabelecido na relação permitiria à paciente relaxar e se revelar mais tolerante com suas dificuldades e consigo mesma.
Como a técnica-chave que diferencia a psicoterapia psicodinâmica das demais é a ênfase na transferência e na contratransferência, o terapeuta estaria muito atento a este fenômeno. Perceberia que, num primeiro momento, poderia ser tentado a assumir uma postura paternalista ou maternalista, tipo “deixa que eu resolvo seus sofrimentos”. Por exemplo: “Vamos tomar esse remedinho e tudo ficará bom”. Ou poderia assumir o papel de uma mãe intolerante, rejeitadora e, de uma forma sutil, criticar, recriminar, rejeitar a paciente.
O terapeuta acreditaria que a raiva inconsciente de Altina oriunda do sentimento de rejeição experimentado com a mãe, poderia resultar em necessidade de autopunição. Mas o terapeuta não colocaria essa formulação para a paciente. Se o fizesse estabeleceria um encontro intelectualizado e infrutífero. Tal formulação, seria uma espécie de “guia interno” para o terapeuta.
Procuraria estabelecer uma relação “sentida”. A paciente revelaria suas dificuldades interpessoais misturadas a seus sentimentos depressivos. O terapeuta mostraria interesse por isso, mas procuraria observar e trazer a reflexão para a presença desse tipo de sentimento na relação com ele.
Altina iria repetir na relação com ele alguns desses sentimentos que vivia na relação com o namorado, com os colegas e que estavam impregnados pelo conflito inconsciente da rejeição, raiva e culpa.
O terapeuta procuraria levar a compreensão afetiva da paciente de um nível superficial e atual para um nível mais profundo e vinculado ao seu conflito passado. Procuraria desvendar tal conflito na relação transferencial. Por exemplo, se a paciente dissesse “você deve estar me vendo como uma fracassada”, o terapeuta responderia “você está colocando em mim um julgamento que existe dentro de você”.
A paciente, voltando a falar no fracasso na faculdade, nos exames que estava fazendo, poderia ouvir do terapeuta algo assim: “Esse você que me sente como um julgador prefere ser vista como fracassada no estudo do que como fracassada nas relações amorosas”. Mais adiante, poderia ouvir do terapeuta: “É mais fácil falar nos problemas acadêmicos do que nos problemas emocionais. Talvez você tema que eu possa rejeitá-la se eu souber mais de seus sentimentos e desejos”. Ou seja, suavemente conduziria a paciente a refletir sobre o sentimento de rejeição ali na própria relação com ele.
Quando o terapeuta fizesse colocações que a paciente a princípio gostaria de negar, ele teria o cuidado de fazê-lo no tom que deveria caracterizar o encontro dos dois: afetivo no sentido de tolerante, colaborativo e curioso.
Optando por Psicoterapia Interpessoal
O terapeuta iria explicar à paciente que seus sintomas depressivos, provavelmente, eram devidos a fatores internos ligados à alteração da bioquímica dos neurotrasmissores, ou seja, ela sofria de uma doença, não era por culpa dela que estava como estava. Mas que fatores externos relacionados a sua dificuldade em se relacionar com pessoas poderiam estar influindo, seja como desencadeadores, seja como agravantes dos sintomas.
Nas sessões iniciais o terapeuta iria identificar as relações interpessoais atuais e passadas mais significativas da paciente e levantar as dificuldades existentes. Seria feito um “inventário interpessoal” e iria se vincular o surgimento dos sintomas depressivos a essas dificuldades.
O terapeuta colocaria que vida a levou a lidar com dificuldade além da esperada frente às situações de rejeição; que seus sintomas depressivos estão também vinculados à crise interpessoal que passou a viver desde que mudou de cidade, afastou-se das suas relações de então com o pai, com a treinadora; que as situações de mudança são sempre difíceis de lidar, mas que podemos influir no andamento da vida nova que se apresenta à nossa frente; que temos poder para influir no andamento das novas relações com as pessoas e com os interesses.
O terapeuta iria assinalar o problema da rejeição e iria observar como a paciente sentia e reagia nessas situações. Por exemplo, como sentira e reagira nas poucas vezes que se encontrou com sua mãe? Como sentira e reagira quando a técnica da equipe de futebol, sua orientadora em relação à vida, não mais lhe dera atenção? Quando seu primeiro namorado fora se afastando dela? Quando seus colegas foram desatentos em relação a ela?
Ficaria evidenciado o quanto a paciente era sensível e passiva em relação à rejeição. Estabelecer-se-iam tarefas na terapia: 1. Qual “truque” mental poderia usar para não ser tão sensível, para que as situações vividas como de rejeição não a “peguem e a derrubem”? 2. Que habilidades de relacionamento interpessoal precisa adquirir para conquistar, ser aceita pelas pessoas, estreitar e conseguir manter seu vínculo com elas?
Num caso assim, em geral, o terapeuta interpessoal iria sugerir a necessidade de 12 sessões, na freqüência de uma sessão por semana.
O foco seria a sua vida no aqui e agora e nas emoções que suas relações interpessoais estavam lhe despertando.
A paciente chegaria numa sessão e o terapeuta perguntaria: “Como a vida andou desde nosso último encontro?” “Mal, numa das poucas vezes que fui a faculdade um professor criticou meus comentários”. “Me conte em detalhes como isso se passou e o que você realmente sentiu naquele momento”. Ou seja, a sessão se passaria em cima de eventos concretos e se centraria na emoção vivida. O terapeuta iria examinar o que ela fez ou deixou de fazer para que as coisas acontecessem como aconteceram na relação com aquele professor, com seu ex-namorado, com os colegas que a rejeitaram. A paciente começaria a ver que o andamento das relações depende também dela, ou seja, que ela tem poder. Ela estava passiva, não estava usando seu poder. O terapeuta assumiria o papel de um auxiliar que a ajudaria a melhorar suas habilidades para se relacionar.
Observação um:
Os comentários sobre o possível andamento das diferentes técnicas psicoterápicas no caso da paciente Altina partem não só de minha experiência com as técnicas, mas também da literatura, especialmente de um artigo que encontrei com um caso em parte semelhante ao que atendi e dos comentários que os autores fizeram. Trata-se de: Cutler J L e colaboradores. Comparing Cognitive Behavior Therapy, Interpersonal Psychotherapy, and Psychodynamic Psychotherapy. Am J Psychiatry, 161(9), 1567-73, september 2004.
Observação dois:
A psicoterapia interpessoal é um técnica aberta, flexível; é uma meta, ou seja, podemos ao longo de sua aplicação utilizar elementos oriundos de outras abordagens.
Como tive experiência em psicoterapia de orientação psicanalítica, em psicoterapia cognitivo-comportamental e, ultimamente, na CBASP, apliquei na paciente Altina a psicoterapia interpessoal acrescida de contribuições das outras técnicas.
Meu antendimento centrou-se portanto:
1. Uso de antidepressivo: ISRS.
2. Psicoterapia interpessoal. Até mesmo pequenas desatenções ou situações em que ficava isolada já lhe despertavam sentimento de rejeição. Identificar esses sentimentos. Descobrir um “truque mental” para que esses sentimentos diminuam e não mais a “peguem e derrubem”. Ação: deixar de lado a passividade e ir em busca de conquistar ativamente as pessoas. Para tanto, desenvolver habilidades para bem se relacionar, aperfeiçoar sua inteligência emocional, aprimorar sua capacidade de empatia. Desenvolver seus interesses outros, não só por pessoas, que a tornariam mais rica e independente. Integrar-se na faculdade e na nova cidade. Uma mudança poderá ser sentida como perda ou como ganho. No caso dela, não havia até então ganho, pois estava desvinculada, numa relação impessoal com a faculdade e com a nova cidade. Ação. Por exemplo, ouviu de uma colega de que estavam precisando de mais gurias para um grupo que joga todas as semanas futebol de salão. Assim como um remédio amargo que temos de tomar, precisa se oferecer para o grupo, mesmo que inicialmente sem vontade ou com sentimentos negativos. Rever seu futuro, planos, metas a atingir, seu compromisso com o fenômeno vida.
3. Enriqueci com técnica da psicoterapia cognitivo-comportamental: automonitoramento, ativação comportamental e reestruturação cognitiva. Utilizei-as tanto em relação ao problema da procrastinação nos estudos, de seu relacionamento com homens, em particular com o único namorado que teve e com colegas. Altina aprendeu a monitorar os sentimentos e os pensamentos que surgiam nestas relações e aprendeu a pontuá-los quanto aos sentimentos negativos despertados. Foi aprendendo a discriminar as situações, o desprazer não era homogêneo.
4. Utilizando-me de recursos da psicoterapia psicodinâmica, percebi a presença de sentimentos transferênciais e contra-transferenciais. A paciente começou a, sistematicamente, me perguntar: “E daí, doutor, o que que eu faço?” Tal postura fez despertar em mim uma pontinha de irritação e rejeição: “Que bom se eu estive agora caminhando em meio as árvores no campus da universidade como costumo fazer sempre que posso em vez de estar aqui...” Percebi que ela tentava repetir comigo a relação de dependência (frustrada) que um dia provavelmente tivera com a mãe, com o pai e com a professora/técnica do futebol de salão. Eu que tendia a me colocar no papel que ela esperava de mim: uma mãe que se irrita com ela e a rejeita. Abordei indiretamente o fenômeno. “Altina, você tem escutado o teu desejo?” “A minha opinião você quer dizer? Eu não tenho opinião por isso pergunto a sua opinião”. “Toda opinião é influenciada por um desejo. Qual teu desejo?” Sempre que ela me perguntava eu devolvia com a pergunta: “Qual teu desejo em relação a esta situação que você me traz?” Ela não aprendera a auscultar e valorizar seus sentimentos e desejos. E também, provavelmente, ela temia se voltar para eles, pois acabaria encontrando lá dentro dela desejos perigosos ligados as suas decepções, suas raivas e conseqüentes culpas relativas à mãe, relativas ao... Bem, não precisávamos avançar por aí. A psicoterapia interpessoal não se propõe focalizar em profundidade os sentimentos inconscientes e as vivências infantis da paciente. Minha abordagem era permanecer no aqui e no agora. Por isso a percepção dos sentimentos transferenciais e contratransferênciais, mas não a utilização terapêutica sistemática da forma como bem sabe fazer a psicoterapia dinâmica.
5. Utilizei-me de uma técnica da CBSAP: Resultado real (Actual Outcome / AO) e resultado desejado (Desired Outcome / DO). Uma colega entregou o trabalho feito em grupo para um professor esquecendo de colocar o nome de Altina. “O que o ocorrido significou para você?”, perguntei. “Que nessa cidade deu tudo errado para mim”. Vimos que sua interpretação estava baseada numa interpretação globalizada (passada) e não na situação referida (real). “O que você fez na situação? O que você fez quando a colega te contou por telefone que esquecera do teu nome no trabalho?” “Eu não disse nada para me defender, apenas pensei que nada vai dar certo para mim”. “Que resultado ocorreu?” (AO) “Ela desligou”. “Que restultado você desejava?” (DO) “Eu desejava ter dito que ela estava me prejudicando se não entrasse em contato com o professor e explicasse do seu esquecimento”. Vimos a diferença entre AO e DO. Perguntei: “Por que você não fez o que você disse aqui que gostaria de ter feito?” “Eu não reajo e fico com cara de boba. É sempre assim”. “A sua interpretação é antiga e conhecida: ‘É sempre assim, sou uma perdedora, nunca tenho uma boa relação’. No que a sua interpretação contribuiu para você alcançar o que você desejava nesta relação atual e real?” “É... não ajudou”. “Qual seria a interpretação que ajudaria?” Junto com a paciente criamos uma “Interpretação de Ação” (Action interpretation), focada na situação. E, na seqüência, tentamos transferir o aprendizado para outras situações de sua vida.
A evolução da paciente.
Na oitava sessão, a paciente de um a dez, classificou sua melhora em oito. É fato que na quinta sessão ela se revela satisfeita com sua evolução, ou seja, após o período necessário para o antidepressivo funcionar. O quanto sua melhora se deveu ao medicamento? O quanto se deveu à abordagem psicoterápica centrada na psicoterapia interpessoal e enriquecida com recursos de outras técnicas?
A evolução com outras abordagens.
É possível que a paciente obtivesse melhora com qualquer uma das técnicas psicoterápicas aplicadas isoladamente e com a utilização exclusiva da medicação antidepressiva.
Depressão leve: o paciente “escolhe” a terapia.
Como bem coloca o Guia da APA: na depressão leve o paciente tem o direito de escolher. É claro que vamos influenciar, mas devemos ter sempre o cuidado de levar em conta suas preferências e suas possibilidades, o custo em tempo e
Na depressão leve, o paciente deveria de fato ter o direito de escolher; na prática, nem sempre isso ocorre. Fatores que atrapalham: 1. O paciente está debilitado e com dificuldade para refletir e optar; tende a seguir a proposta do terapeuta que realiza nele o primeiro atendimento; 2. O terapeuta tende a “enquadrar” o paciente na sua técnica; 3. Não são todos os terapeutas que possuem experiência em várias técnicas psicoterápicas e em farmacoterapia para conseguir valorizar adequadamente cada uma delas; 4. Há terapeutas que estão numa cruzada para alargar o campo de atuação de sua técnica em detrimento das demais; 5. E há aqueles terapeutas que pensam que numa questão existem sempre dois lados: “O meu lado e o lado errado”. Afinal, os terapeutas, todos eles sem exceção, são ... seres humanos.
STEP-BD
10.1 STEP-BD
The Systematic Treatment Enhancement Program for Bipolar Disorder / Programa de Melhoria do Tratamento Sistemático do Transtorno Bipolar (STEP-BD) foi criado devido a preocupação do National Institute of Mental Health do governo do Estados Unidos (NIMH) em estudar a efetividade dos tratamentos para os transtornos bipolares.
O estudo envolveu um grande número de médicos e de pacientes em diferentes centros de tratamento nos Estados Unidos e foi coordenado por Gary Sachs do Massachusetts General Hospital de Boston (E-mail: SachsG@aol.com)
Objetivou, portanto, avaliar os tratamentos efetivados no mundo real com todas as comorbidades, dificuldades na relação médico-paciente e dificuldades de aderência ao tratamento. Até então, a maior parte das pesquisas era feita em ambientes de pesquisa e em amostras cuidadosamente selecionadas. O estudo entrou na brecha existente entre as pesquisas que observam o resultado dos tratamentos em amostras bem controladas e o tratamento “real” que é feito nos centros de atendimento.
A amostra reuniu 1.000 pacientes, 590 mulheres e 410 homens. A média de idade dos participantes foi 40.6 anos. A maioria preenchia os critérios do DSM-IV para bipolar I: 71%; 24% preenchiam os critérios para bipolar II. O coordenador do estudo, Gary Sachs, é do Massachusetts General Hospital de Boston.
Lendo alguns dos artigos da pesquisa, verifiquei algumas achados de interesse prático:
a. Existe mesmo a influência sazonal. A exposição da luz solar influiu no curso de pacientes bipolares vulneráveis. Os pacientes do STEP-BD que residiam no norte dos Estados Unidos apresentaram mais episódios depressivos do que aqueles que viviam no sul.
b. Da amostra do STEP-BD, 656 pacientes apresentavam pelo menos uma comorbidade psiquiátrica.
c. Quando a comorbidade é com transtorno de ansiedade, a evolução do paciente é mais difícil.
Os achados do STEP-BD seguem sendo analisados e debatidos. Vamos acompanhar.
Editorial do British Medical Journal da edição de outubro de 2009 resume bem a situação de hoje.
Escrito por Young A H, Macritchie K A N, Calabrese J R, diz que o lítio segue sendo o tratamento central para o transtorno bipolar:
(1)"Vários fármacos mais recentes surgiram nos últimos dez anos, porém as evidências sobre sua eficácia ainda são desapontadoras".
(2)"O valproato é o estabilizador do humor prescrito com maior frequência nos Estados Unidos e vem sendo cada vez mais usado na Europa"
(3)"Hoje (os anticonvulsivantes) são usados cada vez mais como monoterapia de primeira linha, embora as evidências para o seu uso continum incompletas".
(4)"Todos os estabilizadores parecem ser mais eficazes na prevenção da fase maníaca do que da fase depressiva. Relata-se que o lítio tenha efeitos antissuicidas específicos".
(5)"Estudos placebo-controlados da olanzapina e da risperidona demonstram a eficácia antimaníaca aguda desses dois antipsicóticos atípicos, embora os efeitos do uso prolongado ainda não estejam claros".
(6)"Os antipsicoticos atípicos são eficazes na mania aguda, mas podem exacerbar a depressão pós-mania. Há poucas evidências que indiquem seus usos como profiláticos e seu uso prolongado pode colocar o paciente em risco de discinesia tardia".
Na mesma revista (BMJ outubro 2009), John Geddes, professor na Universidade de Oxford, escreve textualmente:
"O tratamento medicamentoso de longo prazo para o transtorno bipolar é pouco pesquisado e muitos fármacos, particularmente os anticonvulsivantes e outros, são usados sem aprovação e com poucas evidências de suas eficácias".
GUIAS - ALGORÍTMOS - CAMINHOS
10.2. GUIAS, ALGORÍTMOS, CAMINHOS
Algorítmo é outra denominação dada a “guia”; é um conjunto de procedimentos que visam à solução de um problema. O estado do Texas, por exemplo, vem elaborando algoritmos de medicação, guias que tentam auxiliar o médico na escolha da medicação adequada ao tratamento de determinadas patologias.
Em 2004, um grupo formado por psiquiatras professores universitários, administradores farmacêuticos, médicos que trabalham em saúde mental, advogados e consumidores reuniu-se e chegou a um consenso em relação aos passos que se deve dar ao se medicar um paciente bipolar.
A intenção é orientar a tomada de decisão do médico, mas não determinar a escolha; outros fatores vão influir, os quais dependem do julgamento do médico. Por exemplo, os efeitos colaterais. Para determinado paciente com propensão para sobrepeso, é melhor prescrever, por exemplo, a medicação de segunda ou de terceira escolha. Outro, por ser anorético, beneficiar-se-á mais com determinada medicação cujo efeito colateral é abrir o apetite. Um homem que tenha ejaculação precoce será beneficiado se for utilizado um medicamento que retarda a ejaculação.
Também temos de levar em conta o preço da medicação e sua disponibilidade no Brasil.
Para ler mais sobre as conclusões do grupo do Texas, leia: Suppes T, Dennehy E et al. The Texas Implementation of Medication Algorithms: Update to the Algorithms for Treatment of Bipolar I Disorder. The Journal of Clinical Psychiatry, 7(66), 2005.
Nem todos os guias combinam com nossa experiência. Mais adiante vou descrever o que me agrada mais, que é do APA, porque combina com o que eu faço. Primeiro farei a crítica deste do Texas.
ALGORITMO DO TEXAS PARA BIPOLAR I
10.3. ALGORITMO DO TEXAS: BIPOLAR I
Vá ao site do grupo que organiza e atualiza este guia:
http://www.pbhcare.org/pubdocs/upload/documents/TIMABDman2007.pdf
O meu papel aqui será apenas de apresentar e fazer uma análise crítica de uma das versões do guia. Lembre-se: temos de sempre analisar esses "caminhos" em acordo com a nossa própria experiência. Esse o exercício que proponho. As atualizações do guia serão sempre encontradas no site do própria guia.
10.3.1. Episódio maníaco agudo
Para tratar um episódio maníaco agudo, o grupo lá reunido sugeriu as seguintes etapas:
Etapa
Etapa 1
Também como opção monoterapêutica, o Painel de Consenso, apontou tanto a carbamazepina como a olanzapina. Porém, preferiu-se separar essas substâncias por considerá-las com maior potencial de efeitos adversos. Na olanzapina, especialmente a possibilidade de ganho de peso. Na carbamazenpina (a de liberação prolongada é a forma aprovada pelo FDA para a carbamazepina no tratamento de mania), a preocupação dirigiu-se ao seu potencial para interações medicamentosas por meio da indução de enzimas hepáticas.
Etapa 2
Consiste na combinação de dois medicamentos: lítio mais valproato, por exemplo. Lítio ou valproato mais um dos seguintes antipsicóticos atípicos: aripiprazol, quetiapina, risperidona, ziprasidona.
Etapa 3
Maior variedade de combinações. Além dos medicamentos já citados na etapa 2, incluem-se aqui carbamazepina, oxcarbamazepina e medicamentos antipsicóticos típicos mais antigos, como o haloperidol.
Etapa 4
A combinação de três medicamentos. Inclui-se aqui também a opção pela clozapina; também o ECT.
Quando o paciente chega a um quadro de mania aguda, a maior dificuldade consiste em estabelecer uma relação com ele e conseguir sua aderência ao tratamento. E isso vai em muito depender da rapidez com que seus sintomas vão diminuir. Por isso, não me arrisco com monoterapia, pois, caso o fármaco escolhido não funcione, perdemos tempo precioso. Portanto, eu começo já com dois ou três medicamentos associados (etapas 2, 3 ou 4).
Vou usar o litio ou o divalproato associado a um antipsicótico atípico. Tenho usado mais a risperidona, mas também uso a olanzapina e a quetiapina e os mais recentes antipsicóticos atípicos.
Por exemplo: lítio (de
Alguns colegas preferem primeiro observar, pois na maioria das vezes esses paraefeitos não aparecem. Penso ser melhor evitar. Em geral, o paciente em fase maníaca não gosta de tomar medicamentos; temos de evitar que ele passe a gostar menos ainda.
Caso não obtenha melhora, posso associar lítio + divalproato + risperidona e, se necessário, posso acrescentar a antiga levomepromazina ou clorpromazina.
A olanzapina é, sem dúvida, um medicamento eficaz na mania. Porém, seu uso se torna mais limitado devido ao aumento do apetite com ganho de peso.
Quando os sintomas da mania diminuírem, vamos avaliar os efeitos colaterais que os medicamentos estão causando. Baseados neles, vamos promover a retirada de alguns deles e/ou a diminuição de sua dose. O plano será tentar mantê-lo com o uso de apenas um medicamento. O primeiro que retiro é o antipsicótico; depois, verei com qual dos estabilizadores de humor eu permaneço.
O efeito colateral do carbolitium que eu mais vi acontecer foram tremores e retenção de líquidos.
O efeito colateral do divalproato que mais vi acontecer foi náusea transitória no início do tratamento.
Porém, qualquer efeito colateral que o paciente referir eu levo em consideração, pois cada organismo é único. Não insisto com um medicamento quando o paciente não está tendo uma boa impressão com ele, mesmo quando acredito que o efeito colateral referido possa não ser devido a ele. Creio que o paciente deve “simpatizar” com a substância que irá ingerir cotidianamente.
Uma possibilidade é passar para outro estabilizador, queode ser a carbamazepina, a oxicarbamazepina, a lamotrigina ou o topiramato. Este último traz a vantagem de prevenir cefaléia e de, para muitos pacientes, diminuir o apetite e o sobrepeso. Portanto, dependendo dos efeitos colaterais ou de outros efeitos terapêuticos que o paciente necessite, vou optar pelo estabilizador que vai acompanhar o paciente depois que os sintomas forem esbatidos.
Portanto, eu não acompanho a seqüência proposta pelo Painel de Consenso do Texas. Prefiro começar com uma combinação de medicamentos e, só depois, tentar mantê-lo em monoterapia.
Acompanho o algaritmo texano no que se refere ao ECT. Eles o colocam na Etapa 4, eu também. O ECT é válido em pacientes com sintomas maníacos muito intensos que necessitem de hospitalização devido aos riscos que correm de se ferir e de ferir aos outros. Felizmente, são casos pouco freqüentes.
Bem mais fácil de lidar do que na mania. Os sintomas são menos intensos e o paciente não se apresenta psicótico; ele consegue interromper a fala e prestar atenção no que falamos.
Nestes casos concordo com os texanos: a monoterapia é, sim, possível com um estabilizador do humor. Às vezes, posso associar com um ansiolítico tipo clonazepan ou bromazepan, por exemplo.
10.3.3. Episódio misto agudo
Para ganhar tempo, já vou descrevendo como trato. Divalproato + risperidona + antidepressivos, se os sintomas depressivos são proeminentes e, mais ainda, se a ideação suicida se faz presente. Sei que é controverso, que muitos colegas dirão que estou errado em acrescentar antidepressivo.
A grande crítica é que o antidepressivo poderá provocar uma virada maníaca. Felizmente, em combinação com medicamentos antimaníacos, o potencial para provocar a virada é baixo com os antidepressivos mais recentes. As pesquisas apontam entre 5 e 12%, ou seja, similar ao placebo (Post, RM; Leverich, GS; Nolen, WA et al, “A reevalutation of the role of antidepressants in the treatment of bipolar depression: data from the Stanley Foundation Bipolar Network”. Bipolar Disord, 2003, 5:396-406. E é isso o que eu vejo na prática.
A tendência minha é manter o esquema que deu certo para o episódio agudo. Quando a vida do paciente já está no prumo de novo, experimento simplificar o esquema medicamentoso. Tento reduzir a dose de algum medicamento que esteja dando algum paraefeito, ou, até mesmo, suspendo um dos medicamentos. Mas faço isso lentamente, sempre explicando ao paciente e ao familiar a possibilidade de que alguns dos sintomas retornem e que, então, deveremos retornar rapidamente ao esquema que deu certo na fase aguda.
Caso o paciente tenha algum efeito colateral indesejável com a terapia, como ganho de peso, por exemplo, sou obrigado a trocar os medicamentos. Eu escrevi “sou obrigado”, pois não é meu desejo “mexer em time que está ganhando”. Entretanto, pelo sucesso obtido até então, o vínculo com o paciente já está sólido, ele e seus familiares já entendem bastante da doença, ou seja, dá para se fazer com relativa segurança algumas experiências com medicamentos de que ele ainda não fez uso.
10.3.5. Episódio depressivo agudo do Bipolar I
Também nestes casos eu não sigo exatamente a seqüência sugerida pelo grupo do Painel de Consenso do Texas. Explicarei os motivos.
Etapa 1
Monoterapia com lamotrigina, sugerem os texanos. Caso o paciente já venha tomando outro antimaníaco, deve continuar com ele e acrescentar a lamotrigina.
Etapa 2
Monoterapia com quetiapina ou tratamento de combinação de olanzapina com fluoxetina.
Etapa 3
Combinação de dois entre os medicamentos lítio, lamotrigina, quetiapina e combinação de olanzapina com fluoxetina. Quando se usar como um dos dois a combinação da olanzapina com a fluoxetina, estarão sendo usando três fármacos.
Etapa 4
Só aqui sugerem a inclusão de um antidepressivo em combinação com as substâncias sugeridas nas etapas anteriores. Optaram pelos inibidores seletivos da recaptação da serotonina (fluoxetina, sertralina, paroxetina, citalopram, escitalopram e fluvoxamina), pela bupropriona e pela venlafaxina. Também nesta etapa se sugere a possibilidade do uso do ECT.
Etapa 5
Acrescentam só nesta etapa os antidepressivos tricíclicos.
No Painel de Consenso um grupo discordou por defender que a Etapa 4 deveria virar a Etapa 2.
Na minha observação, a Etapa 4 deveria ser a Etapa 1.
Prescrevo um antimaníaco associado a um antidepressivo. Já vimos que, nesta associação, o antidepressivo promove virada maníaca na mesma proporção que o placebo, ou seja, praticamente não promove.
Quanto à lamotrigina como monoterapia de primeira escolha, creio que há uma precipitação. Serão, na minha opinião, necessárias mais observações clínicas e mais pesquisas com amostragem maior.
Por exemplo, vamos analisar um dos estudos em que o Painel de Consenso do Texas se baseou para afirmar que a monoterapia com lamotrigina seria a primeira escolha para tratar a depressão aguda do bipolar I: Calabrese, JR; Bowden, CL; Sachs, GS et al (for the Lamictal 602 Study Group). “A doublé-blind placebo-controlled study of lamotrigine monotherapy in outpatients with bipolar I depression”. J Clin Psychiuatry, 1999, 60:79-88. Neste estudo, a monoterapia com lamotrigina a 200 mg/dia atingiu reduções singificativas na depressão em comparação com o placebo ao final de três semanas. Mas isso pela Escala de Classificação de Montggomery-Asberg para Depressão (MADRS – Montgomery-Asberg para Depression Rating Scale). Pelo escore da Escala de Classificação de Hamilton para depressão (HAM-D – Hamilton Rating Scale for Depression) o resultado já não foi o mesmo.
Outra questão que temos de levar em conta: não se recomenda iniciar a lamotrigina com maior dose nem aumentá-la rapidamente, pois, se o médico assim o fizesse, estaria colocando o paciente em risco de desenvolver exantemas (rashes) sérios, potencialmente letais.
Temos de começar com 25 mg por dia e manter assim por duas semanas; nas duas semanas seguintes, 50 mg por dia. Daí passamos para 100 mg por mais duas semanas; mais duas semanas 150 mg e só então chegaremos aos 200 mg/dia, ou seja, só depois de dois meses alcançaremos 200 mg/dia. Se assim fizermos, o risco de rashes fica em: não sérios entre 3,9 % e 13,4%; sérios em menos de 0,1% dos pacientes.
Pergunto: qual paciente pode esperar dois meses para começar a ter uma dose realmente eficaz do medicamento? Para que deixá-lo sofrendo os sintomas depressivos por tanto tempo? Por que deixa-lo em risco sem tiver ideação suicida?
Não vamos perder tempo, vamos prescrever um antidepressivo com um estabilizador do humor ou mais ainda. Poderíamos prescrever, dependendo da gravidade da depressão, um ISSRS + lítio ou divalproato + risperidona.
Depois, quando o paciente sair do quadro agudo, retiraremos o antipsicótico atípico e o ISSRS e, aí sim, tentaremos ficar apenas com o estabilizador. Poderá ser um dos que já estávamos usando, ou trocarmos para a lamotrigina, a carbamazepina, a oxcarbamazepina ou o topiramato.
A definição mais aceita até hoje para a ciclagem rápida refere-se à ocorrência de pelo menos quatro episódios no curso de um ano, incluindo fases maníacas, hipomaníacas, depressivas ou episódios mistos.
Dentro do grupo existem dois subgrupos:
(1)Cicladores ultra-rápidos: os ciclos sucedem-se em semanas ou até mesmo em dias;
(2)Cicladores ultradianos: grandes variações de humor dentro do período de 24 horas. De
Há uma discussão em andamento: os cicladores rápidos são mesmo uma outra apresentação do bipolar? Alguns autores pensam que são bipolares II que são levados a ciclar rapidamente devido à presença de fatores como abandonos freqüentes do tratamento que acabam gerando novos episódios, presença de hipotireoidismo, uso de álcool e drogas. Corrigida a causa precipitante, o paciente volta a ser bipolar II.
Na minha experiência, existe, sim, este subtipo ciclador rápido, porém são poucos os casos. A maioria são mesmo bipolar II, que são levados, pelos fatores mencionados, à ciclagem rápida.
O tratamento, portanto, deve ser: (1) corrigir o fator precipitante se existir e tratá-lo como bipolar II; (2) se não existir fator precipitante, se for ciclador rápido “puro”, na minha observação os estabilizadores de humor mais eficazes são o divalproato de sódio e a carbamazepina. Também tenho usado o topiramato, que tem efeito bom sobre a impulsividade, que pode estar associada ao quadro.
Em geral, precisamos associar com outros medicamentos. Como, em geral, o que mais preocupa nestes pacientes são os momentos depressivos, muitas vezes necessitamos usar também antidepressivos. Às vezes emprego algum antipsicótico atípico junto, como a risperidona ou a quetiapina. Parece que este último tem um perfil mais “antidepressivo”, mas não tenho certeza disto.
Ultimamente tem se falado no uso dos bloqueadores dos canais de cálcio (BCCs), mas ainda não há evidência consistente na literatura e eu, particularmente, não tenho experiência com eles. Entretanto, vamos observar como vão evoluir as pesquisas. Para questão de informação, os BCCs dividem-se em três grupos: (1) fenilalquilaminas (verapamil); (2) diidropiridinas (nimodipino); (3) benzotiazepinas (diltialzem).
GUIA DA APA PARA OS T BIPOLARES
10.4. GUIA DA APA PARA OS T BIPOLARES
O guia da APA publicado em 2002 e atualizado em 2005 baseia-se naturalmente em informações oriundas da revisão da literatura e do consenso de especialistas. Ele já não é mais considerado atualizado. Existe constantemente equipes de trabalho para apresentar novas versões. Aqui, no caso, vamos apresentar a versão de 2005 no sentido de discutir esse tipo de guia. Temos de ter sempre uma visão crítica, com base em nossas próprias experiências. Isso é que nos torna mais capazes. Portanto, o que vou descrever abaixo é para estimular nosso raciocínio crítico. Não é uma atualização.
Leia mais sobre o assunto no site da APA, observe as constantes atualizações divulgadas pela entidade: psychiatryonline.org/guidelines.aspx
O guia da APA estabelece três categorias de recomendação:
I – Recomendado com substancial confiança clínica
II – Recomendado com moderada confiança clínica
III – Pode ser recomendado em determinadas circunstâncias individuais
10.4.1. Mania aguda e episódios mistos
Primeira escolha.
Nos casos de leve a moderado, monoterapia com lítio, valproato ou antipsicótico (I – Recomendado com substancial confiança clínica). Dos antipsicóticos existentes, preferir os atípicos devido ao perfil de efeitos colaterais mais toleráveis (I). Optar, em primeiro lugar, pela risperidona ou pela olanzapina (II).
Nos casos graves, combinação de lítio ou valproato com antipsicótico (I). Pode ser necessário acrescentar também benzodiazepínico (II).
Nos episódios mistos, a primeira escolha é o valproato (II); a segunda escolha recai sobre a carbamazepina ou a oxcarbamazepina (II). Os antidepressivos, se estão sendo usados, devem ser reduzidos e depois descontinuados.
Outra observação da APA: as terapias psicossociais, quando indicadas, devem ser aplicadas sempre concomitante ao tratamento farmacológico, que é indispensável.
10.5.1. Recaída durante o tratamento de manutenção após um episódio maníaco ou misto.
Primeira escolha:
Quando o paciente vem em manutenção e recai, deve-se otimizar a dose dos medicamentos que ele está usando (I). Se necessário, reintroduzir ou acrescentar um antipsicótico (II). Pode-se acrescentar também um benzodiazepínico por um tempo curto (I).
Segunda escolha:
Se o tratamento falhar, pode se adicionar outra medicação também considerada de primeira linha (I) ou acrescentar carbamazepina ou oxcarbamazepina (II). Se ocorrem sintomas psicóticos, é necessário acrescentar, se o paciente já não vinha fazendo uso, um antipsicótico ou trocar para um que ele ainda não tenha tomado (I).
ECT pode ser indicado para casos graves, resistentes ou se preferido pelo paciente (I). Também se usa ECT na gestação.
10.5.2. Episódio depressivo agudo do Bipolar
Primeira escolha:
Casos não considerados graves: lítio (I) ou lamotrigina (II). (A lamotrigina não se revelou, com o passr do tempo, eficaz. E provoca efeitos colaterais que podem ser letais).
Casos considerados graves: lítio e um antidepressivo (III). A monoterapia com antidepressivos não é recomendada. ECT é uma alternativa para pacientes com inanição, sintomas psicóticos ou risco de suicídio (I). Também o ECT é uma opção para gestantes em depressão grave (II).
Junto com o tratamento farmacológico pode se empregar Terapia Cognitivo Comportamental ou Psicoterapia Interpessoal (II) ou, ainda, psicoterapias psicodinâmicas (III).
Primeira escolha:
Otimização da dose da medicação em uso (II).
Segunda escolha:
Adicionar lamotrigina (I), bupropriona (II) ou paroxetina (II). O passo seguinte será usar outro ISRS, venlafaxina (II) ou IMAO (II). ECT pode ser indicado para pacientes psicóticos, catatônicos, pacientes com depressão grave ou resistentes aos outros tratamentos. Na presença de sintomas psicóticos acrescentar antipsicótico.
O risco de pacientes Bipolares II fazerem virada maníaca ao utilizarem antidepressivos é menor que o de pacientes Bipolares I. Portanto, nestes casos a possibilidade de se usar antidepressivos é maior (II).
10.5.4. Ciclagem rápida:
Primeiro passo: verificar se há alguma condição médica ou psiquiátrica que possa estar contribuindo, como abuso de substância ou hipotireoidismo (I) Também suspender o uso de antidepressivo (II). Segundo passo: usar lítio ou valproato (I). A lamotrigina pode ser outra opção (I). Ou também tratamento combinado (II). Na minha maneira de ver, a suspensão do antidepressivo será possível se o paciente não apresentar risco de suicídio. Lembro-me de uma paciente que ciclava a cada 24 horas. Num dia não conseguia sequer levantar da cama, escovar os dentes ou tomar banho e ficava a arquitetar planos para se matar. No outro, se embelezava, e saía às compras e se endividava. Seu marido estava atônito. Ela, felizmente, estabilizou-se bem com carbolitium e com amitriptilina. Nunca foi possível retirar a amitriptilina, pois a depressão voltava com força. Viveu muitos anos tomando os dois medicamentos. Veio a falecer, não faz muito, de um quadro de câncer.
10.5.5. Tratamento de manutenção pós-ciclagem rápida.
Primeira escolha:
Lítio (I) ou o valproatro (I). De preferência manter a medicação que foi usada no tratamento do quadro agudo.
Segunda escolha:
Lamotrigina (II), carbamazepina ou oxcarbamazepina (II). ECT de manutenção, caso tenha sido este o tratamento eficaz na fase aguda. Podem se combinar duas medicações entre estabilizadores, antipsicóticos e antidepressivos.
Concomitante ao tratamento farmacológico, podem-se empregar intervenções psicossociais, (II) assim como a psicoterapia de grupo (II) ou grupo de apoio (I).
Em
ESTABILIZADORES DO HUMOR
10.6. ESTABILIZADORES DO HUMOR
O lítio, a carbamazepina e o valproato já são bem conhecidos como bons estabilizadores. A oxacarbamazepina, a lamotrigina e o topiramato vêm pouco a pouco ocupando uma fatia do mercado, dependendo muito do maior ou menor trabalho de divulgação de seus fabricantes.
Lítio. O mais antigo e ainda o medicamento principal, de primeira escolha. Consegue uma resposta boa ao tratamento em cerca de 70% dos pacientes. É barato. Em geral, são necessários entre dois e cinco comprimidos por dia, uma dose pela manhã outra a noite. Podemos dosar seu nível sangüíneo. Num episódio de mania, deseja-se uma dose de
Carbamazepina. Anticonvulsivante conhecido, relativamente barato. Não causa aumento de peso. Efeitos colaterais: alergia na pele, náuseas, sedação, leve descordenação motora, diarréia ou constipação. De forma espaçada, mas regular, é bom que o paciente faça um exame de sangue e as provas de função hepática. A carbamazepina interage com vários outros medicamentos, conforme veremos no módulo de interação medicamentosa.
Oxacarbamazepina. Anticonvulsivante parecido com a carbamazepina. Como é mais novo, ainda não se tem tanta prova de seu efeito como se tem com a carbamazepina, porém a prática tem demonstrado que apresenta menos efeitos colaterais que esta; também não causa ganho de peso e tem pouca interação com outros medicamentos.
Ácido valpróico e divalproato de sódio. Também um anticonvulsivante. Efeitos colaterais: náusea, tremor, sedação, raramente queda de cabelo. Pode alterar algumas funções hepáticas. Provoca ganho de peso, porém na forma liberação lenta (Depakote ER) este efeito é bem menor. É barato.
Lamotrigina. Anticonvulsivante, é ingerido uma vez ao dia. Não induz ganho de peso. A dose em geral varia de
Topiramato. Anticonvulsivante, bem tolerado, quase sem efeitos colaterais. O paciente pode se queixar, se a dose for alta, de alguma dificuldade de atenção e memória, em geral passageira; também, no início, de dormência ou formigamento na ponta dos dedos e em torno dos lábios. O aspecto positivo é que não induz ganho de peso e em boa parte dos pacientes há perda de peso pela redução do apetite. Também é bom para prevenir cefaléia. O aspecto negativo é a constatação de sua pouca eficácio como estabilizador.
ESTABILIZADORES
|
DOSES / mg
|
Lítio |
900 – 2100 |
Ácido valpróico |
500 – 1800 |
Carbamazepina |
400 – 1600 |
Oxcarbamazepina |
900 – 2400 |
Lamictal |
50 – 400 |
Topiramato |
75 – 300 |
Dicas:
a. Lítio e ácido valpróico, para algumas pessoas levam a ganho de peso e, no caso, a ganho de peso semelhante. Ao que parece, o depakote ER, liberação lenta, promove bem menos ganho de peso que o depakote convencional. O topiramato, para algumas pessoas, provoca diminuição do apetite e diminuição do peso. A oxcarbamazepina não provoca ganho de peso.
b. Vale a pena lembrar de M. Schou, pesquisador dinamarquês recentemente falecido que dedicou sua vida à pesquisa do lítio, em seu artigo publicado em 1954 deu o “pontapé inicial” para o feliz casamento entre lítio e o transtorno bipolar. (Schou M, et al. The treatment of manic psychoses by the administration of lithium salts. J Neurol Neurosurg Psychiaty. 1954; 17(4): 250-60.
c. Bombardeados pela divulgação por parte dos laboratórios farmacêuticos do efeito estabilizador dos anticonvulsivantes e dos antipsicóticos atípicos, vejo que muitos psiquiatras novos parecem não dar a importância devida ao lítio. O lítio continua sendo a medicação de primeira escolha para o tratamento do transtorno bipolar.
d. O ácido valpróico/divalproato, após o lítio, é o mais eficaz. Os dois são usados concomitantemente. Aliás, a terapia combinada de ambos vem sendo estudada. Acompanhe: http://cebmh.warne.ox.ac.uk/balance/balance 1/index.html.
ANTIPSICOTICOS ATÍPICOS E ANSIOLÍTICOS
10.7. ANTIPSICÓTICOS ATÍPICOS
Os antipsicóticos vêm sendo desenvolvidos com base na hipótese de hiperfunção dopaminérgica. Sua função dependeria da capacidade com que bloqueiam os receptores tipo D2. Seus efeitos terapêuticos e seus efeitos colaterais estariam relacionados com a taxa com que ocupam os D2. Uma taxa de
Entre eles, o aripripaxol é considerado uma droga de terceira geração e tem sobre a olanzapina, por exemplo, a vantagem de não provocar ganho de peso.
A olanzapina (Zyprexa) vem se mostrando eficaz tanto no tratamento da crise quanto na manutenção. Suas desvantagens são o preço e o ganho de peso.
A quetiapina (Seroquel) tem a vantagem de não provocar ganho de peso. Sua desvantagem também é o preço.
A risperidona (Risperdal, Zargus) tem a vantagem de não ser tão cara, mas pode causar alguns efeitos colaterais, como tremor e rigidez muscular.
A ziprazidona (Geodon) também vem sendo usada no tratamento do bipolar.
Substância |
Faixa terapêutica
(mg/d) |
Dose inicial
(mg/d) |
Meia-vida
(horas) |
Risperidona |
2-8 |
2 |
24 |
Quetiapina |
300-800 |
50 |
6 |
Olanzapina |
10-30 |
5-10 |
33 |
Ziprasidona |
120-160 |
40 |
7 |
Aripripazol |
10-30 |
10-15 |
75 |
Amisulprida |
400-800 |
200 |
12 |
Clozapina |
150-600 |
25 |
12 |
10.8. ANSIOLÍTICOS
Muitas vezes precisamos associar um ansiolítico ao longo do tratamento de um paciente bipolar. Vários são úteis com pouca ou nenhuma vantagem entre um e outro. A escolha depende mais da experiência maior ou menor do médico com determinado produto.
ANSIOLÍTICOS
|
DOSES / mg
|
Cloxazolam |
1 – 8 |
Clordiazepóxido |
5 – 75 |
Diazepam |
2 – 30 |
Lorazepam |
0,5 – 6 |
Clobazan |
10 – 60 |
Alprazolam |
0,25 – 3 |
Bromazepan |
3 – 18 |
Clonazepam |
0,5 – 8 |
Buspirona |
5 – 30 |
Clorazepato |
5 – 60 |
PSICOTERAPIAS NOS T. BIPOLARES
10.9. PSICOTERAPIAS NOS T. BIPOLARES
Diferentemente da depressão unipolar, os pacientes bipolares precisarão sempre de medicamentos. Na depressão, como vimos, em seus casos leves é possível tratar apenas com psicoterapia; alguns pensam assim inclusive em alguns casos moderados. Porém, nos t. bipolares, se usarmos psicoterapia, será sempre concomitante aos medicamentos ou ao ECT.
O paciente bipolar se beneficiará com um acompanhamento psicoterápico, com um terapeuta com o qual ele possa ter um vínculo estável e duradouro, pois, se ele puder ir resolvendo seus problemas de relacionamento com as outras pessoas e se puder ter quem o ajude a manter uma vida organizada e com hábitos regulares, sua evolução será bem mais favorável.
BIPOLAR COM ENXAQUECA: NOVO SUBTIPO?
10.10. BIPOLAR E ENXAQUECA
Daí a importância se perguntar a esses pacientes a respeito da presença de enxaqueca. Se presente, poderemos optar por estabilizador do humor que tenha eficácia na enxaqueca, como o divalproato. Poderemos associar também o topiramato.
BIPOLAR II: ALTA RECORRENCIA DE DEPRESSÃO
10.11. BIPOLAR II: ALTA RECORRÊNCIA DE DEPRESSÃO
O National Institute of Mental Health do governo dos Estados Unidos patrocinou um estudo sobre o Bipolar II: prevenção e recaída. Seu registro é: Clinical Trials. Gov Identifier NCT00044616
(site: clinicaltrials.gov/show/NCTOOO44616).
O estudo foi coordenado por Jay Amsterdam da Philadelphia, Pensylvania. Os resultados seguem sendo analisados e discutidos.
Comparou-se a evolução dos grupos:
1. Monoterapia com fluoxetina;
2. Monoterapia com lítio;
3. Lítio + fluoxetina;
4. Placebo.
No Bipolar I a monoterapia com antidepressivos não é recomendada. É recomendado a monoterapia com estabilizador do humor, ou o uso dos dois: estabilizador + antidepressivo.
No Bipolar II há a suspeita de que a monoterapia com antidepressivos provoque a virada maníaca como pode acontecer com o Bipolar I, porém isso não está comprovado. Quando ocorre a virada, se ocorre, é apenas virada para a hipomania, nunca para a mania ou para a ciclotimia. Devido as dúvidas, foi necessário esse tipo de pesquisa.
Jay Amsterdan, coordenador do estudo referido, publicou os seguintes artigos:
1
Efficacy and safety of long-term fluoxetine versus lithium monotherapy of bipolar II disorder: a randomized, double-blind, placebo-substitution study.
Source
Depression Research Unit, Department of Psychiatry, University of Pennsylvania School of Medicine, Philadelphia, PA 19104, USA. jamsterd@mail.med.upenn.edu
Abstract
OBJECTIVE:
The authors examined the safety and efficacy of long-term fluoxetine monotherapy, lithium monotherapy, and placebo therapy in preventing relapse and recurrence of bipolar type II major depressive episode. The authors hypothesized that fluoxetine monotherapy would be superior to lithium monotherapy with a similar hypomanic mood conversion rate.
METHOD:
Patients at least 18 years old who recovered from their major depressive episode during initial open-label fluoxetine monotherapy were randomly assigned to receive 50 weeks of double-blind monotherapy with fluoxetine at 10-40 mg/day, lithium at 300-1200 mg/day, or placebo. The primary outcome measure was time to relapse or recurrence. Secondary outcome measures included the proportion of patients remaining well and the frequency of hypomanic symptoms.
RESULTS:
There were no significant differences in clinical or demographic characteristics among the fluoxetine (N=28), lithium (N=26), and placebo (N=27) groups. The mean time to relapse was 249.9 days for the fluoxetine group, 156.4 days for the lithium group, and 186.9 days for the placebo group. The hazard of relapse was significantly lower with fluoxetine compared with lithium, and the estimated hazard of relapse with lithium was 2.5 times greater than with fluoxetine. There were no statistically significant or clinically meaningful differences in hypomanic symptoms among treatment groups over time. One patient taking fluoxetine and one patient taking placebo discontinued treatment because of hypomania.
CONCLUSIONS:
These findings suggest that long-term fluoxetine monotherapy may provide superior relapse-prevention benefit relative to lithium monotherapy after recovery from bipolar II major depressive episode without an increase in hypomanic mood conversion episodes.
(Estes resultados sugerem que a monoterapia fluoxetina a longo prazo pode fornecer superior benefício de prevenção de recaída em relação à monoterapia com lítio após a recuperação da Iepisódio depressivo do bipolar II sem um aumento nos episódios de conversão de humor hipomania.)
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Efficacy and mood conversion rate during long-term fluoxetine v. lithium monotherapy in rapid- and non-rapid-cycling bipolar II disorder.
Source
Depression Research Unit, University of Pennsylvania School of Medicine, Philadelphia, PA, USA. jamsterd@mail.med.upenn.edu
Abstract
BACKGROUND:
Controversy exists over antidepressant use in rapid-cycling bipolar disorder.
AIMS:
Exploratory analysis of safety and efficacy of fluoxetine v. lithium monotherapy in individuals with rapid- v. non-rapid-cycling bipolar II disorder.
METHOD:
Randomised, double-blind, placebo-controlled comparison of fluoxetine v. lithium monotherapy in patients initially stabilised on fluoxetine monotherapy (trial registration NCT00044616).
RESULTS:
The proportion of participants with depressive relapse was similar between the rapid- and non-rapid-cycling groups (P = 0.20). The odds of relapse were similar between groups (P = 0.36). The hazard of relapse was similar between groups (hazard ratio 0.87, 95% CI 0.40-1.91). Change in mania rating scores was similar between groups (P = 0.86). There was no difference between groups in the rate of syndromal (P = 0.27) or subsyndromal (P = 0.82) hypomania.
CONCLUSIONS:
Depressive relapse and treatment-emergent mood conversion episode rates were similar for lithium and fluoxetine monotherapy and placebo during long-term, relapse-prevention therapy of rapid- and non-rapid-cycling bipolar II disorder.
Portanto, há evidências de que o tratamento de manutenção de paciente Bipolar II com antidepressivo em monoterapia é eficaz e não provoca virada maníaca.
EXERCÍCIO
Um homem de 40 anos apresenta um episódio depressivo agudo. Ele tem história de transtorno bipolar, porém havia quase dois anos abandonado o tratamento de manutenção.
São corretas as assertivas:
(a) Monoterapia com lítio;
(b) Monoterapia com lamotrigina;
(c) Uso de lítio e um antidepressivo;
(d) Monoterapia com um antidepressivo;
(e) Monoterapia com psicoterapia cognitivo-comportamental;
(f) ECT deve ser considerado se houver sério risco de suicídio;
Respostas corretas: (c) (f)
Vídeo - JACK LONDON
Vídeo MILANA ALDÁROVA
PREOCUPAÇÃO MUNDIAL
11.1 PREOCUPAÇÃO MUNDIAL
Mann JJ, Apter A, Bertolote J e outros publicaram um importante artigo de revisão sobre o suicídio na revista JAMA: 294(16):2064-74, 2006. No artigo consta a conclusão a que chegaram especialistas de 15 países que se reuniram por 5 dias em Salzburgo, Áustria, debatendo o tema: “Como prevenir o suicídio”. As recomendações seguem válidas, conforme entrevista dada por José Bertolote na revista Debates - Psiquiatria Hoje na edição de julho/agosto de 2009.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que em torno de
Esses números devem ser maiores, pois existem as situações chamadas de parassuicídios ou equivalentes suicidas. A pessoa provoca um acidente de carro, por exemplo, ou expõe-se a risco pelo uso exagerado de certas drogas.
O suicídio ocorre mais em homens e as tentativas mais
Nos Estados Unidos a taxa gira em torno de 11 por 100.000 habitantes por ano, ou seja, em torno de 90 pessoas se matam por dia.
Na Itália, 10/100.000 por ano.
Na América Latina, 6,5 por 100.000 por ano. No Brasil, as estatísticas oficiais variam de estado para estado na ordem de
Outras taxas estimadas: (a) tentativa de suicídio 0,6%; (b) o desejo, a intenção de se matar: 3,3%.
Numa cidade de duzentos mil habitantes, como Passo Fundo (RS), por exemplo, são de se esperar dois suicídios por mês.
Mais de 80% dos suicidas têm um diagnóstico psiquiátrico. A depressão uni e bipolar é responsável por 60% dos casos de suicídio. Também são importantes o abuso de álcool e o uso de drogas.
Entre os 10% que não apresentam diagnóstico psiquiátrico, muitos se matam devido ao sofrimento de doenças físicas. Não é por nada que a faixa etária que possui as maiores taxas de suicídio é a que corresponde aos idosos acima de 65 anos. E isso se deve às depressões e, também, ao fato de que são os que têm mais doenças físicas e sofrem os maiores prejuízos delas decorrentes.
Os especialistas reunidos em Salzburgo concluíram que as estratégias mais eficazes para diminuir essas alarmantes taxas são:
(1) restrição ao acesso aos meios letais;
(2) educação dos médicos para que se capacitem a reconhecer e a tratar as depressões uni e bipolares.
Esta última estratégia é fundamental: 80% dos suicidas procuraram ajuda médica no período de um ano antes do ato suicida e 66% procuraram durante o mês anterior ao ato que lhes tirou a vida.
Pelo menos em 80% dos casos existe uma doença mental por trás, predominando de forma absoluta a depressão.
Existem também muitos casos relacionados ao alcoolismo, ao uso de outras drogas e à esquizofrenia. Provavelmente, o alcoolista seja um depressivo que recorreu ao álcool para obter alguma euforia. Certas drogas, como a cocaína, por exemplo, podem provocar a depressão.
O esquizofrênico, em geral, comete o suicídio nos momentos em que se sente deprimido ao perceber as perdas que a doença está lhe acarretando e na desesperança de uma melhora significativa.
SUICÍDIO E T BIPOLAR: AUSÊNCIA DE ESPERANÇA
11.2. SUICÍDIO E T. BIPOLAR: AUSÊNCIA DE ESPERANÇA
Concluíram que o comportamento suicida varia entre as diferentes fases pelas quais passa o paciente bipolar; que, sem dúvida, a ideação suicida e a tentativa de suicídio na fase depressiva da doença têm a ver com a gravidade da depressão que acomete o paciente. Porém, um predidor de risco para todas as fases, não só para a depressiva, é a ausência de esperança. O paciente bipolar que não tem esperança positiva em relação a sua vida futura está mais sujeito a cometer o suicídio do que um bipolar que não apresenta essa desesperança.
ANTIDEPRESSIVOS COMO ARMA
11.3. ANTIDEPRESSIVOS COMO ARMA
Após
O médico suspeita do diagnóstico por sintomas como a taquicardia, a sudorese e as convulsões e por sinais como o das pupilas dilatadas.
O paciente deve ser mantido respirando; uma lavagem gástrica ou administração de carvão ativado deve ser realizada para diminuir a ação da droga, porém o vômito não deve ser provocado. Os efeitos da overdose são combatidos com a utilização de bicarbonato de sódio.
AVALIAÇÃO DE RISCO DE SUICÍDIO
11.4. AVALIAÇÃO DE RISCO DE SUICÍDIO
Os seguintes fatores apontam para risco:
1.depressão uni ou bipolar
2. início da doença na adolescência
3. abuso de substâncias ou de álcool
4. impulsividade
5. viver sozinho
6. esquizofrenia
7. transformação recente e importante em sua personalidade
8. intenso estresse emocional e ou social
9. pensar, falar, escrever sobre a morte e o morrer
10. alteração em seu estado mental
11. ideação suicida
12. planos a respeito
13. tentativa prévia
14. atitudes de quem se despede de amigos e familiares
15. procura por armas, venenos ou drogas para overdose
16. profunda desilusão com pessoa significativamente importante
17. profunda frustração em objetivos idealizados
18. ausência de metas e de objetivos
19. pessimismo e ausência de esperança em relação a seu futuro
20. história familiar de suicídio
21. baixa auto-estima
22. falta de familiares, amigos e de apoio social.
CONDUTA FRENTE AO RISCO DE SUICÍDIO
11.5. CONDUTA FRENTE AO RISCO
Além de tratar o mais eficaz e rapidamente possível a doença psiquiátrica, devemos proteger o paciente de si mesmo. Ele deve ser informado do próprio risco e seus familiares também. Teremos de decidir quem cuidará melhor dele, se a família, amigos, ou se ficará melhor protegido numa clínica psiquiátrica.
Fatores que favorecem para que a decisão seja tratar o paciente em casa sem hopitalizá-lo:
1.baixa intenção suicida;
2.boa relação com o médico;
3.está comprometido com o tratamento;
4.é capaz de garantir que não tentará o suicídio;
5.não usa drogas ou abusa no álcool;
6.não é impulsivo;
7.não vive fatores estressantes graves;
8.nunca tentou no passado;
9.prefere tratar-se em casa;
10.tem o apoio de familiares.
MACETES
11.6. MACETES
a. Jogo aberto com o paciente e seus familiares sobre o tamanho do risco.
b. Se necessário, ser impactante. Lembro-me de ter dito a uma paciente e a seus familiares que, se eu tivesse de optar por “sim” ou “não” em relação a ela se matar ou não, eu optaria naquele momento pelo “sim” tamanho era seu risco. Ela está viva e bem até hoje e disse que nunca se esqueceu daquelas palavras, considerando-as um desafio positivo: “Você se enganou comigo”, disse-me ela várias vezes.
c. Dizer ao paciente que por mais que tentemos protegê-lo, a decisão de ficar vivo passa por ele, ou seja, fazê-lo assumir a responsabilidade.
d. Orientar a família a retirar armas da casa.
e. Orientar a família a esconder os medicamentos do paciente.
f. Orientar os familiares de que o paciente nunca poderá ficar sozinho, nem no banheiro.
g. Orientá-los de que o perigo será passageiro, vale todo o esforço.
h. Orientá-los a se revezar nos cuidados.
i. A religião nem sempre ajuda. Um casal cuidava do filho com risco de suicídio de uma forma zelosa; eram muito religiosos. Certo sábado à tarde, vendo que ele estava no bom do sono, foram à missa pedir a ajuda de Deus; na volta, encontraram-no enforcado.
j. Se o suicídio aconteceu, nosso papel é consolar a família aliviando suas culpas.
k. Aliviam-se as culpas de diversas maneiras: fazendo-os ver a responsabilidade do próprio paciente no ocorrido, salientando o esforço positivo que realizaram, mostrando as estatísticas para que percebam se tratar de um problema da humanidade e outras mais.
l. Não considerar imediatamente como suicídio. Lembro-me de um paciente que ficou tão eufórico pela melhora súbita obtida que saiu de carro para visitar sua lavoura sem avisar a família e sem contar que havia melhorado. Como ainda estava fraco e sem reflexos, saiu fora da estrada com o carro, mas nada lhe aconteceu. Disse-me: “Poderia ter morrido no acidente e minha família teria certeza de se tratar de suicídio quando, na verdade, seria barberagem”. Lembro-me de outro paciente que foi encontrado afogado num alagado onde mantinha uma chácara; estava de calção e afogado quase na margem, ao lado do barco, pronto com vara de pesca e iscas. A família suspeitava de suicídio, já que até há pouco ele estava com risco. Penso que por estar fraco devido ao longo período de depressão, na tentativa de subir ao barco deve ter caído na água e se afogado. Se fosse suicídio, teria se jogado no meio do alagado e, mais ainda, por que iria vestir calção e preparar iscas?
EXERCÍCIOS
Assinale as afirmativas corretas:
(a) 40% dos suicidas procuraram ajuda médica no período de um ano antes do ato suicida.
(b) 66% por cento procuraram ajuda médica durante o mês anterior ao ato que lhes tirou a vida.
(c) Pelo menos em 80% dos casos existe uma doença mental por trás, predominando de forma absoluta a depressão.
(d) Fator de risco para suicídio: profunda desilusão com pessoa significativamente importante.
(e) Fator de risco para suicídio: profunda frustração em objetivos idealizados.
Respostas corretas: (b) (c) (d) (e)
Assinale os fatores que favorecem para que a decisão seja tratar o paciente em casa, sem hopitalizá-lo:
(a) baixa intenção suicida
(b) boa relação com o médico
(c) está comprometido com o tratamento
(d) não é capaz de garantir que não tentará o suicídio
(e) não usa drogas ou abusa no álcool
(f) não é impulsivo
(g) não vive fatores estressantes graves
(h) nunca tentou no passado
(i) prefere tratar-se em casa
(j) tem o apoio de familiares
Respostas corretas: (a) (b) (c) (e) (f) (g) (h) (i) (j)
Vídeo HORACIO QUIROGA
EXERCÍCIO
Homem de 65 anos apresenta um quadro depressivo unipolar de moderado a grave. Informa sofrer de diabete, doença coronária e bloqueio de ramo. Também disse estar tratando glaucoma. Informa que um irmão seu melhorou da depressão fazendo uso de fluoxetina e que um médico que é seu vizinho disse ter amostras de venlafaxina. Preferia um destes dois antidepressivos.
Quais antidepressivos não devemos receitar para ele? Cite dois antidepressivos que ele pode usar?
Por favor, faça seus próprios comentários sobre o caso antes de continuar a leitura!
Meus comentários:
Lembre-se que em pacientes com bloqueio de ramo ou doença coronária que estejam usando propanolol ou metoprolol a fluoxetina pode ocasionar bradicardia severa. Mesmo seu irmão tendo melhorado com ela, não podemos receitar para o paciente.
No caso do glaucoma, medicamento que faça dilatar a pupila pode piorar o quadro. Portanto, mesmo que seu vizinho lhe dê amostras da venlafaxina, não devemos receitá-la. Também não é indicado receitar os tricíclicos, a fluoxetina, a paroxetina, a venlafaxina, a tranilcipromina e a mirtazapina.
Qual indicar?
Por favor, faça seus próprios comentários sobre o caso antes de continuar a leitura!
Meus comentários:
Devemos levar em conta não só as doenças que o paciente apresenta, mas também os medicamentos de que ele faz uso pela questão das interações. A princípio, podemos pensar no citalopram e no escitalopram, por não apresentarem risco de agravar suas doenças e também pela quase ausência de interações com outros medicamentos. Também poderíamos pensar na sertralina, um antidepressivo de baixo efeito colateral e poucas interações. Entretanto, devemos recolher o nome de todos os medicamentos que toma e realizar uma consulta no capítulo “Interações” para termos certeza da compatibilidade. Lembre-se: sempre é melhor consultar; os medicamentos são muitos e não temos memória de computador.
Recomendo a leitura do livro editado pela Atheneu em 2000: Depressões em medicina interna e em outras condições médicas. De autoria de Fráguas Jr e Figueró. Também artigo publicado na Revista de Psiquiatria do RS de jan/abril de 2002 escrito por Mauro Barbosa Terra e colaboradores: “O uso de antidepressivos no contexto médico geral”. Os textos mesmo escritos há alguns anos continuam importantes.
REUMATOLOGIA
12.11. REUMATOLOGIA
A fibromialgia é freqüentemente acompanhada por ansiedade e depressão. O antidepressivo mais sugerido na literatura é a amitriptilina.
Na artrite reumatóide, a depressão aparece em 23% dos pacientes. Os ISRSs são os mais indicados. Um trabalho publicado por Bird e Broggini no Journal of Reumatology no ano 2000 revelou maior tolerabilidade pelo uso da paroxetina em relação à amitriptilina.
No lupus eritematoso sistêmico a ansiedade e a depressão são muito freqüentes. São mais indicados os ISRSs, entre eles, a paroxetina, a fluoxetina e o citalopram.
Os ISRSs são também os mais indicados nos casos de síndrome de Sjögren.
INFECTOLOGIA
12.10. INFECTOLOGIA
Outra questão são as interações medicamentosas: os antiretrovirais elevam os níveis séricos dos antidepressivos.
NEUROLOGIA
12.9. NEUROLOGIA
Na doença de Alzheimer a depressão está presente em 20 % dos casos, sendo os ISRSs indicados. Quando se deseja sedação, pode-se usar a nortriptilina ou a mirtazapina. Quando o paciente apresenta inibição psicomotora ou, por outro motivo, deseja-se ativação, está indicada a bupropiona.
Na doença de Parkinson os medicamentos de escolha, ao que parece, tenderão cada vez mais a ser os ISRSs, com preferência para a sertralina e a fluvoxamina. A fluoxetina e a paroxetina em alguns casos podem acentuar os tremores.
Na enxaqueca a literatura não revela contra-indicação de nenhuma classe de antidepressivos, porém os tricíclicos são os mais utilizados, alguns deles também pelo efeito analgésico.
Na epilepsia há sempre o problema de que os antidepressivos, de maneira geral, podem diminuir o limiar convulsivante. Os IMAOs não fazem isso, porém não são hoje muito empregados. Os ISRSs, por outro lado, aumentam o nível sérico dos anticonvulsivantes.
No acidente vascular cerebral (AVC) a depressão pode ocorrer em 50% dos casos. Não há na literatura referência a contra-indicação de antidepressivos. Um dos mais usados tem sido a nortriptilina.
NEFROLOGIA
12.8. NEFROLOGIA
ENDOCRINOLOGIA
12.7. ENDOCRINOLOGIA
OFTALMOLOGIA
12.5. OFTALMOLOGIA
No caso do glaucoma de ângulo agudo, a utilização de antidepressivos deve ser sempre comunicada ao oftalmologista. Muitas pessoas apresentam o ângulo da câmara anterior estreito - 1% das pessoas acima de 35 anos - mas não necessariamente desenvolvem o glaucoma. Algo que faça dilatar a pupila pode precipitar o processo. Deve se evitar o uso dos tricíclicos, da fluoxetina, paroxetina, venlafaxina, desvenlafaxina tranilcipromina e mirtazapina.
DERMATOLOGIA
12.4. DERMATOLOGIA
Na dermatite atópica, doença inflamatória crônica com a pele eritematosa e pruriginosa, os antidepressivos menos indicados são os tricíclicos, a fluoxetina e a venlafaxina. O mesmo vale para o acne e para o vitiligo.
Na pelagra, doença que afeta principalmente alcoolistas pela deficiência de vitamina B, a escolha de um antidepressivo é difícil. O alcoolista tem outras complicações a serem consideradas. A maioria dos antidepressivos causa boca seca, facilitando o aparecimento de lesões na mucosa oral. A literatura coloca como menos indicados os tricíclicos, a fluoxetina e a sertralina. A mirtazapina está sendo indicada.
GATROENTEROLOGIA
12.3. GASTROENTEROLOGIA
Quando há obstipação, os ISRSs estão mais indicados. Se o que se deseja é o efeito antidepressivo, a dosagem tem de ser a plena.
Na cirrose devido à insuficiência hepática, a dose dos antidepressivos deve ser menor. Os tricíclicos podem gerar maior sedação, confusão e efeitos anticolinérgicos. Os ISRSs produzem menor sedação, sendo os mais indicados para pacientes com encefalopatia hepática. Porém, pelo fato de inibirem enzimas hepáticas, os ISRSs podem aumentar o tempo de metabolização de outras drogas que usam a mesma via. Como a fluoxetina possui uma meia-vida mais longa, deve ser evitada. Por este critério, sugere-se o uso da paroxetina na metade da dose usual.
Na úlcera péptica e na gastrite, a amitriptilina é indicada pelo efeito bloqueador de H2. Os ISRSs podem produzir irritação gástrica, porém a paroxetina é indicada por ter ação histaminérgica.
CARDIOLOGIA
12.2. CARDIOLOGIA
Muitos pacientes com afecções cardíacas apresentam depressão. Atualmente, os ISRSs são os mais indicados na cardiopatia isquêmica (angina e infarto do miocárdio), na insuficiência cardíaca e na hipotenção arterial sistêmica.
Na cirurgia de revascularização do miocárdio antes do ato cirúrgico, de
Nas arritmias os ISRSs são indicados, com exceção da fluoxetina. A fluoxetina, em pacientes com bloqueio de ramo ou doença coronária que estejam usando propanolol ou metoprolol, pode ocasionar bradicardia severa. Tem se estudo o efeitos dos ISRSs no intervalo QT. (Acompanhe artigos novos a respeito em novidades que acrescentam).
Na hipertensão arterial sistêmica os ISRSs também são bem aceitos, sendo contra-indicados os IMAOs e os tricíclicos.
ANTIDEPRESSIVOS E NÃO-PSIQUIATRAS
12.1.MÉDICOS NÃO PSIQUIATRAS
Do total das prescrições dos medicamentos antidepressivos, mais da metade é feita por médicos não psiquiatras. Além disso, muitos pacientes fazendo uso de antidepressivos por doenças psiquiátricas apresentam também alguma doença orgânica. Portanto, médicos de diferentes especialidades necessitam conhecer os efeitos desSes produtos.
Os medicamentos procuram de uma ou outra maneira conseguir que os neurotransmissores voltem a existir na quantidade necessária. Recordando: os primeiros antidepressivos foram os IMAOs e os tricíclicos. Os primeiros, inibem esta enzima responsável pela destruição dos neurotransmissores, permitindo, assim, que eles se acumulem. Os tríciclicos atuam bloqueando a recaptação do neurotransmissor pela célula que o liberou. Nesse período, o uso de antidepressivos por médicos de outras especialidades que não a psiquiatria era menor que hoje, devido, em parte, aos efeitos colaterais desses medicamentos.
Depois surgiram outros antidepressivos, entre eles, os inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRSS), que agem, portanto, quase só sobre a serotonina: fluoxetina, sertralina, fluvoxamina, citalopram e paroxetina. Este último tem um poderoso efeito sobre a serotonina, mas também age de forma significativa sobre a noradrenalina. Portanto, ao mesmo tempo é considerado um ISRS e também um antidepressivo de dupla ação. Surgiu ainda outra linha de antidepressivos que atuam sobre os neurotransmissores de forma diferente dos IMAOs, dos tricíclicos e dos ISRS: bupronpiona, mirtazapina, venlafaxina, desvenlafaxina, trazodona, nefazodona, mianserina. Desde então, devido a esses novos produtos apresentarem poucos efeitos colaterais, os antidepressivos passaram a ser bastante prescritos por médicos de diferentes especialidades.
EXERCÍCIOS
CASO 1: OLANZAPINA E CIPROFLOXACINA
O que se passou de fato?
Por favor, faça seus próprios comentários sobre o caso antes de continuar a leitura!
Meus comentários:
A metabolização da olanzapina, vamos recordar, é feita principalmente na Fase II, por glicuronidação, mas também na Fase I, pela 1A2 e um pouco pela 2D6. A ciprofloxacina é inibidor potente de 1A2. Em conseqüência, houve aumento da concetração de olanzapina e surgiram os efeitos colaterais.
Qual conduta teria sido a mais correta?
Ora, fora dificil para esta paciente encontrar um estabilizador do humor eficaz, pois experimentara vários. Era importante ficar com o mesmo, ainda mais sabendo que ela já havia feito quadro psicótico. Portanto, o clínico não deveria ter trocado. Bastava diminuir a dose da olanzapina de 10 mg para 5 mg e, se os efeitos colaterais ainda continuassem, para 2,5 mg.
CASO 2: FLUOXETINA, AMITRIPTILINA E CIMETIDINA
Cozza e colaboradores, no já recomendado por mim Princípios das interações medicamentosas na prática clínica, American Psychiatric Publishing Inc, na página 414, relatam o caso de um homem de 58 anos, o Sr. A, que chegou a uma colega psiquiatra encaminhado por seu médico de família. Apresentava humor deprimido, irritabilidade e queixas somáticas como dor no joelho sem causa orgânica. Apesar de já ter feito tratamento com fluoxetina (80 mg/dia durante oito semanas), continuava na mesma.
Quando a psiquiatra obteve a história de piora da insônia, aumento de crises de enxaqueca e distúrbios gastrointestinais (azia), recomendou a diminuição da dose de fluoxetina para 40 mg/dia para reduzir os efeitos colaterais gastrointestinais. Adicionou amitriptilina 50 mig à noite (para aumentar os níveis do ISRS, melhorar o sono e reduzir o componente da dor no joelho da síndrome depressiva do paciente) e cimetidina, 300 mg quatro vezes ao dia para aliviar a azia do paciente. O clínico seguiu essas recomendações da psiquiatra.
Três semanas depois, o Sr. A informou a seu clínico que estava sentindo uma melhora significativa. Seu humor melhorou, o sono retornou ao normal e os sintomas gastrointestinais foram totalmente resolvidos. O médico continuou o tratamento com amitriptilina e fluoxetina, mas interrompeu a cimetidina. Três semanas depois, o Sr A foi encontrado morto
Por que o Sr. A piorou da depressão a ponto de cometer o suicídio se vinha reagindo tão bem com a medicação?
Por favor, faça seus próprios comentários sobre o caso antes de continuar a leitura!
Meus comentários:
A parada da terapia com cimetidina resultou em diminuição dos níveis sangüíneos dos antidepressivos. A combinação de ADT e ISRS atingiu a dosagem terapêutica necessária à medida que o paciente tomava também cimetidina, que provocava a inibição de enzimas que depuram os antidepressivos. A fluoxetina faz aumentar a concentração de amitriptilina e vice-versa. A cimetidina faz aumentar ainda mais. Quando a cimetidina foi suspensa, as enzimas não mais inibidas metabolizaram os antidepressivos e a dosagem desses medicamentos, não sendo mais terapêutica, acarretou a volta da depressão e o suicídio.
Provavelmente, o antidepressivo eficaz estava sendo a amitriptilina. A fluoxetina não vinha respondendo. Não é possível afirmar com certeza que a retirada da cimetidina foi decisiva. Porém, é inegável que temos de levar em conta tal possibilidade.
CASO 3: CIMETIDINA E PAROXETINA
Um médico clínico me encaminhou um paciente que havia começado com ele tratamento para depressão unipolar e havia melhorado com paroxetina 20 mg. Depois de algumas semanas bem, a depressão voltara. O colega me encaminhou para que eu fizesse a troca por outro antidepressivo, já que aquele, na sua opinião, havia perdido o efeito. O paciente me relatou que apresentava gastrite e, concomitante ao uso de paroxetina, fizera uso de cimetidina. Quando os sintomas desapareceram, ele suspendeu por conta a cimetidina. Foi depois da suspensão que a depressão voltou. Deveríamos trocar o antidepressivo?
Por favor, faça seus próprios comentários sobre o caso antes de continuar a leitura!
Meus comentários:
Não, aumentar a dose da paroxetina. Lembrando: a cimetidina não induz nenhuma enzima, porém inibe 2D6, 2C9, 3A4, 1A2. A paroxetina é vulnerável a interações medicamentosas com inibidores 2D6. Junto com cimetidina a paroxetina estava em dose maior no paciente. Sem ela, era necessário ajustar para cima sua dose.
CASO 4: PAROXETINA E RISPERIDONA
Um colega neurologista tinha dúvida quanto a tratar-se de depressão unipolar ou transtorno bipolar II com predomínio de fases depressivas. O paciente mostrava também alguma ideação paranóide. Andara brigando inclusive numa boate por achar que o estavam chamando de gay. Resolveu medicá-lo com risperidona 3 mg à noite. A ideação paranóide desapareceu, porém ele se mostrava desanimado, sem vontade de fazer as coisas que antes gostava de fazer e, às vezes, tinha vontade de chorar sem motivo. Então, o colega acrescentou 20 mg de paroxetina. O paciente passou a apresentar sintomas extrapiramidais e o colega me perguntou o que teria se passado.
O que se passou?
Por favor, faça seus próprios comentários sobre o caso antes de continuar a leitura!
Meus comentários:
A depuração da risperidona é reduzida por associação com inibidores potendes 2D6, como a paroxetina e a fluoxetina. Já foi demonstrado que com a paroxetina seu nível de concentração aumenta em 45%, podendo provocar o surgimento dos efeitos colaterais extrapiramidais
DICA: GASTRITE
13.16.14. GASTRITE: DICA
Devemos perguntar se nosso paciente está usando um medicamento para gastrite.
A cimetidina não induz nenhuma enzima, porém inibe 2D6, 2C9, 3A4, 1A2. Como conseqüência, diminui a depuração de vários medicamentos, entre eles os antidepressivos tricíclicos e a olanzapina.
O omeprazol inibe 2C19 e induz 1A2.
Por sua vez o pantoprazol, não inibe nem induz nenhuma enzima. Portanto, se possível, devemos solicitar que nosso paciente dê preferência a este último medicamento.
ESTABLIZADOR, O MELHOR
13.16.13. ESTABILIZADORES DO HUMOR
ESTABILIZADORES DO HUMOR
13.16.13. ESTABILIZADORES DO HUMOR
13.16.13.2. ÁCIDO VALPRÓICO, VALPROATO, DIVALPROATO
13.16.13.3. CARBAMAZEPINA
13.16.13.4. OXCARBAMAZEPINA
13.16.13.5. TOPIRAMATO
13.16.13.6. LAMOTRIGINA
ADTs e Outros
13.16.9. ADTs e OUTROS
Usamos um ADT associado a um ISSRS. Por exemplo, amitriptilina com sertralina. Precisamos lembrar que, como regra, essa associação provocará um aumento da concentração dos dois antidepressivos. A prescrição conjunta de fluoxetina e amitriptilina, citando como exemplo, provoca aumento da concentração de fluoxetina em até duas vezes e da amitriptilina em até nove vezes. Portanto, é melhor, primeiro, maximizarmos a dose do antidepressivo e, só depois, pensarmos na possibilidade da associação com outro, pois o efeito terapêutico que atingimos com a associação poderia ser apenas pelo aumento da concentração de um deles.
Há indícios de que os antidepressivos tricíclicos aumentam a concentração da olanzapina. Pelo menos com a imipramina já está constatado: ela aumenta em 20 % a concentração de olanzapina.
13.16.10. OUTROS ANTIDEPRESSIVOS
Tanto a nefazodona como a trazodona são metabolizadas por 3A4, porém a nefazodona é potente inibidor 3A4. A trazodona é um fraco inibidor dessa enzima. Por isso, a nefazodona é contra-indicada com pimozida (antipsicótico) e pode aumentar as concentrações de carbamazepina, alprazolan, triazolan, ciclosporina (imunossupressor), sinvastatina (hipocolesterolemiante) e tracolimo.
IRSNs
13.16.8. IRSNs
Os inibidores de recaptação de serotonina e de noradrenalina são a venlafaxina, a desvenlafaxina e a duloxetina.
A venlafaxina é um inibidor fraco de 2D6, podendo aumentar um pouco as concentrações de desipramina, haloperidol e risperidona. Por outro lado, inibidores de 2D6 aumentam as concentrações de venlafaxina. Por exemplo: paroxetina, bupropriona, quinidina (antiarrítmico), difenidramina (anti-histamínico). Terfenadina (anti-histamínico), lítio, inibidores das enzimas 3A4 e 2D6, IMAO, imipramina, hipoglicemiantes, haloperidol, diazepam, cimetidina, outros antidepressivos, anti-hipertensivos, alprazolan, álcool.
A duloxetina é metabolizada por 2D6 e 1A2. Paroxetina e fluoxetina, inibidores 2D6, aumentam sua concentração. Embora a cafeína seja inibidora 1A2, não revelou interação com este antidepressivo. A duloxetina aumenta os níveis dos antidepressivos tricíclicos, das fenotiazinas e de antiarrítmicos.
A desvenlafaxina apresenta um baixo potencial de interação medicamentosa. Sua via de metabolização independe do citocromo CYP 450. Possui boa absorção via oral e não sofre prejuizo se ingerida com ou sem alimentos. A Imatinibe, medicamento para tratar leucemias e certos tumores gástricos, pode elevar um pouco a concentração plasmática da desvenlafaxina. Não deve ser utilizado junto com IMAOs. Quando usada com outros agentes serotoninérgicos devemos observar se surgem sintomas da Sindrome da Serotonina. Também alguma cautela quando usada junto com drogas que interfiram na coagulação, na hemostase. Portanto, são muito pequenas as preocupações do médico que prescreve desvenlafaxina no que se refere a interação com outros medicamentos.
ANASE
13.16.7. ANASE
A mirtazapina é um antidepressivo noradrenérgico e serotonérgico específico (ANASE); é metabolizada por 1A2, 2D6, 3A4 e por glicuronidação. Não é um inibidor potente P450.
Pelo fato de a desipramina ser um inibidor 1A2, 2D6, 3A4, aumenta a concentração da mirtazapina em até quatro vezes.
A cimetidina, um inibidor fraco de enzimas do P450, aumenta a concentração de mirtazapina em até 22%.
A carbamazepina, um “pan-indutor”, diminui significativamente a concentração de mirtazapina.
Com álcool ocorrem alterações psicomotoras.
A mirtazapina pode reduzir a atividade anti-hipertensiva da rilmeltidina.
Com risperidona ocorre um efeito aditivo, podendo haver hipotensão e sonolência. Podemos usá-las ao mesmo tempo, mas teremos de reduzir a dose de risperidona.
IRND
13.16.6. IRND: BUPROPRIONA
Pelo fato de a carbamazepina induzir várias enzimas, poderá reduzir a quantidade de bupropriona, um inibidor fraco de 2D6. Pode elevar um pouquinho as concentrações de venlafaxina, nortriptilina e desipramina, mas não aumenta as da paroxetina, da sertralina e, provavelmente, de nenhum dos outros antidepressivos ISSRS. Provavelmente porque eles tem valor de Ki mais baixo (maior afinidade): ocuparão os sítios das enzimas antes que a bupropriona.
Apesar de ser metabolizada também por glicuronidação, não interage com a lamotrigina.
ISRS
13.16. ISRS
Em geral, bem seguros quanto às interações, vamos comentar um pouco sobre cada um deles.
13.16.1. CITALOPRAN E ESCITALOPRA
Bastante seguros, muito poucas interações medicamentosas envolvem esses produtos devido à diversidade de suas vias metabólicas. Eles são metabolizados em diferentes etapas por várias enzimas: 2D6, 2C19, 3A4. Porém, as concentrações de ambos podem diminuir com a co-administração de carbamazepina, pois esta é um “pan-indutor”: aumenta a síntese de proteínas do P450, aumentando a ação de muitas enzimas especialmente da 3A4.
IMAO interagindo com citalopram: suspender o IMAO 15 dias antes de iniciar o tratamento com citalopram. Para se trocar o citalopram por um IMAO esperar pelo menos sete dias. Efeitos cardiovasculares: angina, hipertensão arterial.
Esomeprazol (antiulceroso) interagindo com citalopram: a inibição da enzima 2C19 provoca o aumento dos níveis plasmáticos do citalopram, fazendo-se necessário diminuir sua dose.
Anticoagulantes orais interagindo com citalopram: pode haver potencialização do efeito anticoagulante.
13.16.2. FLUOXETINA
A fluoxetina e a norfluoxetina, seu metabólito de vida longa, são potentes inibidores de 2D6 e inibidores leves a moderados de 2B6, 2C9, 2C19 e 3A4. Substâncias que são metabolizados pelo 2D6 são fortemente afetadas na presença da fluoxetina. A concentração de desipramina, por exemplo, é aumentada quatro vezes. A risperidona aumenta 75% sua concentração, pois é metabolizada tanto pelo 2D6 como pelo 3A4.
A fluoxetina é afetada em sua metabolização por “pan-indutores”, como os anticonvulsivantes mais antigos.
Clorpromazina interagindo com fluoxetina: aumento da possibilidade de desenvolvimento de arritmias cardíacas e da síndrome neurolépitica; aumento da sedação e dos efeitos anticolinérgicos de ambos os fármacos. Efeito aditivo e inibição da depuração de ambos os fármacos.
Delavirdina interagindo com fluoxetina: aumento de 50% na concentração plasmática mínima da delavirdina (antiviral); inibição da metabolização hepática. Vamos rever a dose de delavirdina.
Lercanidipino interagindo com fluoxetina: diminui a eliminação da lercanidipina aumentado seu efeito. Vamos diminuir a sua dose.
13.16.3. FLUVOXAMINA
É um “pan-indutor”: é um inibidor potente de 1A2 e 2C19 e um inibidor de leve a moderado de 2B6, 2C9 e 3A4. Temos de ficar atentos as suas interações, especialmente com: varfarina (anticoagulante), triptofano, terfenadina (anti-histamínico), teofilina (broncodilatador), temazepan, sumatriptana (antienxaquecoso), ropinirol (antiparkinsoniano), quinidina, propranolol, oxazepam, metropolol, cloridrato de metadona, lorazepan, carbonato de lítio, succninato de lítio, IMAO, flunitrazepam, ditiazem, digoxina (cardiotônico p/ insuficiência cardíaca, p/ fibrilação), difenil-hidantoína, diazepan, cumarina, clozapina, clorpromazina, clobazam (ansiolítico), cisaprida (gastrocinético), cigarro, cetoconazol (antifúngico), carbamazepina, bloqueadores beta-adrenérgicos, benzodiazepínicos, atenolol, astemizol (anti-histamínico), antidepressivos tricíclicos, anticoagulantes orais, alprazolam.
Devemos começar com doses baixas e observar qualquer sinal de toxidade, especialmente com os antidepressivos terciários, com varfarina (anticoagulante), fenitoína e teofilina (broncodilatador). Outro detalhe: fumaça de cigarro induz 1A2 e, em conseqüência, diminui a concentração de fluvoxamina.
Potente inibidor de 2D6 e 2B6. Desipramina aumenta 360% quando co-administrada com paroxetina.
Não deve ser associada ao álcool: aumenta a sedação e rebaixa o funcionamento do sistema nervoso central.
Não deve ser associada a antidepressivos tricíclicos: aumentam os efeitos colaterais e o risco de toxidade.
A cimetidina provoca um aumento dos níveis séricos de paroxetina. Vamos rever a dose da paroxetina.
Interação com o clobazam (ansiolítico): a eliminação do clobazam é reduzida aumentando o efeito ansiolítico. Vamos reduzir a dose do clobazam.
Interação com clorpromazina: ocorre um efeito aditivo pela inibição da depuração de ambos os fármacos. Pode ocorrer aumento da sedação e dos efeitos anticolinérgicos de ambos os fármacos. Há possibilidade maior do surgimento de arritmias e da síndrome neuroléptica. É possível a associação de ambos, porém com muita precaução.
Lembre-se: paroxetina e desipramina não devem ser usadas concomitantemente.
A paroxetina interfere no metabolismo da digoxina (cardiotônico, p/ insuficiência cardíaca, p/ arritmias), fazendo-se necessário observar de perto o quadro clínico dos pacientes e os níveis séricos da digoxina.
A paroxetina reduz a eliminação do flunitrazepam (hipnótico), fazendo-se necessário a redução de sua dose.
Não administrar triptofano durante o tratamento com paroxetina: aumentam-se os efeitos colaterais adversos, como tontura, sudorese e cefaléia.
É metabolizada por várias enzimas do P450: 2B6, 2C9, 2C19, 2D6 e 3A4. É vulnerável a drogas “pan-indutoras” como carbamazepina e fenitoína, que fazem seu nível de concentração e efeito terapêutico diminuir. Em doses moderadas inibe apenas e fracamente 2C9, 2C19 e 3A4. Há relatos isolados de que teria aumentado as concetrações de fenitoína, varfarina (anticoagulante) e ciclosporina (imunossupressor); em doses altas, pode inibir 2D6. Acarreta, nestes casos, o aumento da concentração de desipramina em 44%.
Por outro lado, a sertralina pode inibir a glicuronidação causando concentrações tóxicas de lamotrigina.
Alimentos interagindo com sertralina: aumenta sua biodisponibilidade. O efeito antidepressivo é otimizado; por isso, recomenda-se que ela seja ingerida com as refeições.
Clobazam interagindo com sertralina: aumenta o efeito ansiolítico por reduzir a eliminação do clobazam. Devemos reduzir o clobazan.
Digitoxina interagindo com sertralina: aumenta o nível sérico da sertralina. Vamos rever a dose.
Flunitrazepam interagindo com sertralina: aumenta o efeito ansiolítico, pois a eliminação do flunitrazepam é reduzida. Vamos rever a dose do flunitrazepam
Varfarina interagindo com sertralina: aumenta o nível sérico da sertralina. Rever a dose.
IMAOs
13.15. IMAOs: EVITAR USÁ-LOS
Em verdade, não se conhecem todas as interações dos IMAOs. Aliás, todos os medicamentos antigos foram pouco estudados. Há 15 anos iniciaram-se os estudos do P450 e as exigências da U.S. Food and Drug Aministration eram muito menos rigorosas. E depois que uma empresa farmacêutica perde a patente de um produto, ela não vê retorno em continuar estudando-o.
INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS
13.1. UM BILHÃO DE DÓLARES
13.2. INTERAÇÃO FARMACODINÂMICA
Um medicamento pode alterar a atividade de outro através da farmacocinética e da farmacodinâmica.
Interação farmacodinâmica é aquela causada pela influência de um medicamento no efeito de outro no seu órgão alvo, no seu sítio final de ligação. Por exemplo, num receptor cerebral. A interação de um antidepressivo tricíclico com um antidepressivo inibidor da monoaminoxidase, resultando na síndrome serotoninérgica, é farmacodinâmica.
13.3. INTERAÇÃO FARMACOCINÉTICA
Interação farmacocinética deve-se ao efeito de um medicamento no movimento do outro pelo corpo: na absorção, na distribuição, no metabolismo e na excreção. Exemplo de interação por absorção: antiácidos diminuem a absorção de antipsicóticos. Exemplo de interação por distribuição é a interação de ligação de proteínas. As proteínas plasmáticas ligam-se aos medicamentos. Somente a fração não ligada, livre, é farmacologicamente ativa. O uso de duas drogas que normalmente são fortemente ligadas a proteínas poderá acarretar competição entre elas e a fração não ligada de uma delas ser maior que o habitual, aumentando seu efeito ou promovendo toxidade.
No que se refere aos medicamentos usados em psiquiatria, a interação maior é no metabolismo. Os medicamentos vão interagir farmacocineticamente no metabolismo pela inibição e pela indução.
13.4. ORIGENS ANCESTRAIS
Os medicamentos estão sujeitos à ação defensiva do organismo que os recebem. Os animais alimentavam-se de plantas e as plantas desenvolveram toxinas para se defender. Para sobreviver, os animais tornaram-se capazes de detoxicar essas substâncias, e um elaborado sistema de detoxicação foi se desenvolvendo ao longo da evolução das espécies. As enzimas que transformam as substâncias permitindo sua eliminação do organismo, enzimas metabólicas, têm origem em genes ou proteínas ancestrais comuns a plantas e animais.
13.5. FASES DA METABOLIZAÇÃO
A metabolização faz-se em duas fases. A fase mais bem estudada, Fase I, inclui o sistema P450, também chamado de citocromo P450. As enzimas P450 oxidam compostos endógenos e exógenos, tornando-os menos ativos e preparando-os para transformações posteriores. Na Fase II ocorrem outras reações, como glicuronidação e sulfatação, e, finalmente, ocorre a eliminação do corpo.
13.6. P450
As enzimas P450 têm como função primária metabolizar compostos endógenos como colesterol, triglicerídeos, estrógenos, testosteronas, neuropeptídeos e outros. A detoxicação de substâncias ingeridas é função secundária. Medicamentos são “toxinas” recentes na história evolutiva. O sistema P450 ocupa-se com elas há pouco tempo.
Já se identificaram mais de quarenta enzimas do P450. Seis delas são responsáveis por mais 90% das oxidações de drogas em humanos: 1A2, 3A4, 2C9, 2C19, 2D6 e 2E1.
13.7. VARIABILIDADE GENÉTICA
Existe variabilidade genética decorrente, por exemplo, de populações isoladas que foram obrigadas a desenvolver capacidade de metabolizar certos compostos e não outros. Variações na resposta a uma droga podem decorrer da variabilidade genética. O gênero também influi na variabilidade dos sistemas metabólicos enzimáticos. Exemplo de variabilidade genética: pacientes negros apresentam níveis séricos de nortriptilina significativamente maiores que outros pacientes, o que se deve à genética das enzimas 2D6 e 3A4.
Testes genotípicos já estão sendo feitos para as enzimas P450, administrando-se uma “droga-teste” (probe drug). “Drogas-teste” são aquelas metabolizadas especificamente por uma enzima. Por exemplo, dextrometorfano é exclusivamente metabolizado pela enzima 2D6, resultando no metabólito dextrorfano. Um paciente que, após administração de dextrometorfano, não apresenta dextrorfano não tem atividade da 2D6.
No futuro, teremos como saber o perfil genético enzimático de um paciente. O conhecimento de que ele é um metabolizador fraco, por exemplo, de um determinado medicamento afetará na prescrição. As prescrições serão específicas a cada paciente. Cada um terá seu próprio cardápio de medicamentos e de doses.
13.8. BIOTRANSFORMAÇÃO E ELIMINAÇÃO
Os medicamentos são substâncias lipofílicas, o que lhes permite penetrar em órgãos-alvo. Por outro lado, substâncias lipofílicas são difíceis de eliminar, fazendo-se necessário biotransformá-las. Na Fase I ocorre a oxidação delas; na Fase II, a adição de moléculas hidrossolúveis. Os metabólitos solúveis em água podem, então, ser eliminados com mais facilidade através da bile, da urina ou das fezes. Os processos enzimáticos mais estudados na Fase II são glicuronidação, sulfatação e metilação.
Essa biotransformação ocorre em todo o corpo. O cérebro, os rins, os pulmões e a pele, por exemplo, realizam atividade metabólica significativa, mas, sem dúvida, ela é mais intensa no fígado e na parede do estômago e do intestino.
13.9. VIA DE ADMINISTRAÇÃO
Muitos medicamentos sofrem o “efeito da primeira passagem” (first-pass effect) o que ocorre quando atravessam a parede intestinal e penetram no fígado, antes mesmo de atingirem a circulação e o órgão-alvo. Perdem atividade, pois o corpo já está preparado para sua eliminação. É um fato que influi na decisão de se administrar determinado remédio por via oral ou via parenteral.
13.10. INTERAÇÃO FARMACOCINÉTICA METABÓLICA
Como vimos, no caso dos medicamentos usados em psiquiatria a interação se faz especialmente pelo metabolismo e, nele, por meio de dois mecanismos: inibição ou indução de enzimas.
13.11. INIBIÇÃO
A afinidade de um medicamento por uma enzima é chamada de potencial inibitório ou Ki. Ki baixo quer dizer grande afinidade; Ki alto, pouca afinidade.
Medicamento com grande afinidade por uma enzima (Ki baixo) irá, por competição, inibir a ligação de outro medicamento com essa mesma enzima; o medicamento com menor afinidade (Ki alto) sairá perdendo. Essa inibição levará a um prolongamento do efeito desse medicamento. Não podendo ser eliminado pela enzima já ocupada, seu nível sérico será mais alto, podendo resultar
13.12. INDUÇÃO
Alguns medicamentos aumentam a síntese de proteínas do P450 proporcionando um aumento das enzimas; induzem à criação de mais locais de biotransformação. Um medicamento metabolizado por determinada enzima aumentada é metabolizado e eliminado do organismo mais rapidamente; seu efeito terapêutico será menor. Um medicamento que para se tornar ativo necessita de um primeiro processo de metabolização pela enzima terá seu metabólito ativo produzido mais rapidamente do que o esperado e revelará efeito aumentado, até mesmo tóxico.
13.13. INTERAÇÕES NA PRÁTICA CLÍNICA
Creio que, para nós, que somos clínicos, estas noções básicas de farmacologia são por ora suficientes. Não somos farmacologistas nem metabologistas. Não devemos ocupar nossa memória com conhecimentos além daqueles de que necessitamos. Sabiamente, nosso cérebro nos faria rapidamente esquecê-los.
Mais ainda, não vamos conseguir lembrar de todas as interações possíveis. Se esquecermos de uma só interação, já teremos problemas. Portanto, o importante não é decorar todas as interações, mas desenvolver o hábito da consulta. Cada prescrição será precedida da consulta a um banco de dados.
13.14. ONDE CONSULTAR
Utilizei-me da bibliografia descrita a seguir na elaboração desta síntese prática. Recomendo-a para quem queira se aprofundar no tema.
(1) O P.R.VADEMÉCUN pode ser acessado via internet no site:
http://www.prvademecum.com/PRData/buscainteracciones.asp
Há o P.R. VADEMÉCUM no formato CD.
(2) Para nos aprofundarmos mais nos conhecimentos farmacológicos, recomendo o Guia conciso dos princípios das interações medicamentosas na prática clínica, escrito por Cozza K, Armstrong S e Oesterheld J. American Psychiatric Publishing, Inc., que vem sendo gentilmente distribuído pelo laboratório Lundbeck.
(3) A Lemos editorial lançou Interações medicamentosas dos psicotrópicos de Ângela Miranda-Scippa e Irismar Oliveira, 2006.
(4) Com o apoio da Wyeth a EPUC lançou de autoria de Odilon Tadeu Soares, Guia de interações medicamentosas em psiquiatria, 2006.
(5) Com o apoio da Aché, Angela Miranda-Scippa e Irismar Reis de Oliveira, relançaram, agora pela editora CASA, Interações Medicamentosas dos Piscotrópicos.
EXERCÍCIO
EXERCÍCIO PARA REFORÇAR CONTEÚDO:
Pacientes bipolares que engravidam sem planejar são verdadeiros desafios aos obstetras e aos psiquiatras.
Vamos contar uma situação montada a partir de um caso descrito por Dell D. e O’Brien B na revista The American College of Obstetricians and Gynecologists, 102(6) 1306—9, 2003.
Uma mulher de 26 anos, primigesta de 12 semanas, é trazida por sua mãe A um centro de atendimento psiquiátrico de emergência. Ela tem história de transtorno bipolar e a gravidez não foi planejada e nem é desejada. Sua gravidez surgiu no momento em que se separava de um namorado com quem mantinha uma relação tumultuada. Ela não deseja interromper a gravidez e quer doar a criança. Compareceu a consulta obstétrica quando já estava com oito semanas de gravidez.
Na consulta, ela foi orientada a suspender a medicação e a procurar seu psiquiatra. A paciente vinha recebendo oxcarbamazepina (Trileptal) 300 mg duas vezes ao dia e bupropriona (Wellbutrin SR) 150 mg por dia nos últimos cinco meses. Uma semana após ter descontinuado a medicação, ela se sentiu deprimida e foi então que compareceu ao centro de atendimento psiquiátrico de emergência. Foi-lhe receitada olanzapina (Zyprexa) 2,5 mg por dia (categoria B) e recomendado que seguisse as consultas com seu obstetra e no ambulatório de psiquiatria.
Nas seguintes duas semanas ela compareceu duas vezes no mesmo centro psiquiátrico de atendimento de emergência. Nas duas vezes, alega piora na depressão, mas negava ideação suicida. Como ela não havia retornado ao obstetra nem procurado o ambulatório de psiquiatria, foi-lhe recomendado que fizesse isso e a medicação não foi alterada.
Com 12 semanas de gravidez, a paciente voltou à emergência e acabou sendo internada num hospital psiquiátrico. Ela cortara seus cabelos e doara seus pertences, dizendo que não tinha mais esperanças, e negara-se a usar medicação. Ela contou ter desejado cortar seus pulsos, mas que lhe faltara energia para fazê-lo. Também havia escrito uma carta de despedida para sua mãe, que morava em outra cidade.
No passado, a paciente já havia tido outras hospitalizações psiquiátricas. A primeira vez fora quando contava 18 anos. O motivo era episódio de depressão ou episódio de mania. Já tinha tentado o suicídio, a última vez fora há oito meses antes dessa internação, tomando uma overdose de medicamentos.
Ela não costumava aderir aos tratamentos. Não referia história de doença mental na família. Relatava ter uma relação íntima com seus pais e seu irmão. Sua infância fora feliz, não sofrera abusos sexuais, físicos ou emocionais. Negava uso de drogas e alcoolismo. Tivera um relacionamento curto e nada bom com o pai do seu feto. Estudava numa universidade e trabalhava. Porém, havia recém largado o emprego.
Ao exame psiquiátrico msotrava-se lúcida, orientada quanto a pessoas, lugares e quanto ao tempo. Ela preferia comunicar-se escrevendo, pois falar lhe exigia muito esforço, segundo dizia. Não revelava alucinaçãoes nem ilusões na sensopercepção. Descrevia-se com o afeto deprimido e sem esperanças. Mostrava-se lenta em seus movimentos e não contatava as outras pessoas com o olhar. Seu pensamento não revelava ideação delirante, mas revelava ideação suicida e dizia planejar dar-se um tiro no peito. Apresentava limitado insight e baixo juízo crítico.
Foi lhe dado o diagnóstico de Bipolar I, no momento apresentando um episódio depressivo severo.
Os exames físicos e laboratoriais não apresentaram alterações.
Aumentou-se a olanzapina para 15 mg por dia e reiniciou-se o uso de bupropriona 150 mg por dia. Após três dias de hospitalização, ela se mostrava melhor, negava ideação suicida. Foi-lhe dada alta e recomendado que seguisse o tratamento no ambulatório psiquiátrico e com seu obstetra. Dois dias após, a paciente se deu um tiro no lado esquerdo do peito e faleceu junto com seu feto.
Por favor, faça seus próprios comentários sobre o caso antes de continuar a leitura!
Meus comentários:
Este caso revela o dilema: retirar a medicação, evitando, assim, qualquer risco de teratogenidade, ou manter a medicação, evitando o risco de agravamento do transtorno bipolar?
Estima-se que de
Os estabilizadores do humor, agentes antimaníacos, como lítio, e anticonvulsivantes ocasionam algum risco de teratogenicidade quando usados no início da gravidez e podem trazer efeitos negativos no final da gravidez e na hora do nascimento.
A suspensão abrupta desses medicamentos está associada a alto risco de recaída e de suicídio. Em geral, os anticonvulsivantes possuem dois períodos de risco de teratogenidade: no início da gravidez, quando o tubo neural está se formando, e no final do primeiro trimestre, quando estão se formando estruturas faciais. Quando a paciente estava na oitava semana de gestação, já havia passado o primeiro período de risco e ainda estava longe do segundo período.
Quando ela procurou atendimento, a hospitalização fez-se necessária pelo risco de suicídio e por ela, na verdade, não ter quem a cuidasse fora do hospital, pois a mãe, que a trouxera na primeira vez, residia noutra cidade.
Quando hospitalizada, havia várias possibilidades terapêuticas.
O lítio poderia ter sido uma boa escolha, pois o risco maior de teratogenicidade dele ocorre no primeiro mês de gravidez, por ocasião do desenvolvimento do coração. E ele tem sido associado com baixo risco de suicídio. Embora os dados atuais pareçam tranqüilizadores, ainda não se pode ter certeza absoluta dos efeitos dos antipsicóticos atípicos, como a olanzapina, sobre o feto.
O ECT deveria ter sido considerado.
No caso, não se avaliou corretamento o risco-benefício da utilização de tratamento. A paciente apresentava os seguintes fatores de risco: depressão severa; estresse emocional e social pela gravidez não desejada, não planejada e pela ruptura com o namorado que a engravidara; pensar, falar e escrever sobre suicídio; evidências de que ela caminhava nesse sentido: largou emprego, doou seus pertences, disse adeus a seus familiares; ela tinha acesso a uma arma.
A PACIENTE QUER ENGRAVIDAR
14.3. A PACIENTE QUER ENGRAVIDAR
a. Examinar com ela seu real desejo de engravidar. Lembro-me de uma paciente que já tinha um filho pequeno dizer: “É o meu filho que quer um irmão. Eu sofri tanto na gravidez dele que... não sei se quero”. “E o seu marido?” “Ela está mais para não”. A gravidez só seria indicada se ela tivesse um desejo muito forte de ser mãe novamente.
b. Explicar o risco de a paciente voltar a sofrer da doença prévia, seja depressão, seja t. bipolar.
c. Explicar que a primeira escolha seria ela permanecer sem medicamento, tratando-se com psicoterapia.
d. Planejar junto com ela a gravidez para somente após, pelo menos, dois anos de tratamento bem-sucedido.
e. Examinar com ela a possibilidade de trocar as medicações que ela está usando para outras que sejam de menor risco para o feto na gravidez.
f. Orientá-la a interromper o método anticoncepcional só após ter suspendido a medicação.
g. Definir com ela os procedimentos terapêuticos que serão tomados caso a doença apareça durante a gravidez.
h. Se o quadro que ela teve foi grave com risco de suicídio, contra-indicar a gravidez, sugerir adoção. Se ela, mesmo assim, decidir engravidar, explicar-lhe a possibilidade de se ter de usar ECT.
i. Se a paciente já chega grávida ao consultório, discutir com ela e seus familiares a possibilidade de se experimentar suspender a medicação, isso se sua história prévia for de um quadro de leve a moderado. A paciente deverá permanecer todo o tempo em atendimento psicoterápico.
j. A retirada deverá ser feita os poucos, em torno de três a sete dias.
k. Discutir a possibilidade de experimentar medicação de menor risco.
l. Se seu quadro tiver sido grave ou com risco de suicídio, sugerir que se continue a medicação, pois uma depressão ou transtorno afetivo grave na grávida também trará prejuízos ao feto.
m. Se usando estabilizador do humor, a paciente deverá realizar exames mais freqüentes com o ginecologista, que deverá solicitar ecografias repetidas para avaliar o desenvolvimento do coração e da coluna do feto.
n. Caso se tenha interrompido o lítio, o índice de recaídas nos seis meses é de aproximadamente 50%. O lítio poderá ser reintroduzido no último trimestre da gravidez.
o. As pesquisas apontam para a seguinte conclusão: as medicações que mais podem ocasionar malformações são os anticonvulsivantes.
p. Compartilhar com a paciente e com seus familiares os seguintes dados: 1. As malformações no feto estão associada à exposição fetal durante as primeiras 12 semanas de gestação, quando ocorre a formação dos órgãos. 2. A passagem pela placneta dos medicamentos da mãe para o feto já se constatou a partir da quinta semana de gestação. 3. Um medicamento que não atravesse a placenta pode influir de maneira indireta, alterando, por exemplo, a pressão arterial ou a contratilidade uterina.
ECT
14.7. ECT
A eletroconvulsoterapia foi considerada um procedimento médico seguro tanto para a mãe como para o feto, pois não revela efeito teratogênico nem fetotóxico. Porém, deverá ser aplicada em centro especializado, com experiência de uso de ECT na gravidez e na presença de um obstetra.
ANTIPSICÓTICOS
14.4. ANTIPSICÓTICOS
Como regra, os antipsicóticos atravessam facilmente a barreira placentária, alcançando níveis significativos no feto. Os recém-nascidos expostos intra-útero podem desenvolver sinais extrapiramidais.
Os antipsicóticos são considerados classe C na escala da FDA.
Se for necessário usá-los, a literatura sugere que se prefiram os de alta potência, como haloperidol, flufenazina e trifluoperazina, pela ausência de efeitos teratogênicos. Pede-se que sejam retirados no terceiro trimestre, pelo risca de efeitos extrapiramidais no neonato.
Os antipsicóticos atípicos, como risperidona, olanzapina, ziprazidona, aripiprazol, não estão suficientemente estudados e restringem-se na literatura, a relatos de caso. As pesquisas com olanzapina estão sendo promissoras mas ainda não dão a segurança para que se possa indicá-la.
ESTABILIZADORES DO HUMOR
14.3 ESTABILIZADORES DO HUMOR
Infelizmente, não temos um estabilizador que, com certeza, não possa trazer problema ao feto. Portanto, a princípio o melhor será não usá-los.
Como as drogas anticonvulsivantes estão associadas à maior incidência de malformações do que o lítio, não são, em princípio, recomendadas na gravidez. Além disso, em casos de retirada do lítio, não é recomendada a troca de estabilizador do humor em pacientes sem resposta a outras medicações, pois a gravidez não é, conhecidamente, um momento para experimentar novos fármacos.
Não encontrei dados definitivos a respeito dos riscos teratogênicos associados com os novos anticonvulsivantes também usados corno estabilizadores do humor, como lamotrigina e topiramato, por exemplo.
A manutenção do lítio deve ser considerada no caso de transtorno bipolar severo. A reintrodução do lítio depois de sua interrupção durante o primeiro trimestre devido ao risco de malformação fetal maior não parece ser tão preventiva de recaídas como a manutenção durante toda a gravidez.
Caso o lítio tenha de ser suspenso, o uso de drogas antipsicóticas deve ser considerado. Nos transtornos bipolares na gravidez o ECT sempre deve ser considerado.
Em função de potencial teratogênico da carbamazepina e do ácido valpróico serem maiores e dos novos anticonvulsivantes ainda não terem sido suficientemente avaliados, o lítio segue sendo o estabilizador de humor mais utilizado nos EUA durante a gravidez. É prescrito em múltiplas doses diárias, evitando-se a exposição do feto a um nível sangüíneo de pico.
ANSIOLÍTICOS
14.6. ANSIOLÍTICOS
A princípio, a conduta deverá ser a suspensão do benzodiazepínico antes de a paciente ficar grávida. Se a paciente estiver em uso de benzodiazepínico e souber que está grávida, não se recomenda a retirada abrsupta pelo risco de crise convulsiva e de abortamento.
Alprazolam. As pesquisas realizadas não demonstraram aumento na freqüência de malformações congênitas nem de abortamentos espontâneos. Porém, teria apresentado uma maior associação com fenda palatina, com incidência de 0,7% em casos de exposição no primeiro trimestre contra 0.06% na população geral.
Bromazepam. Não encontrei estudos específicos.
Clonazepam. Considerado classe C pela FDA pela ausência de estudos em humanos.
Diazepam. O benzodiazepínico mais bem estudado em seres humanos. O uso de diazepam durante o 1.º e o 2.º trimestres estaria associado a pequeno aumento do risco de aparecimento de fissura labial palatina. Usado no parto, o diazepam poderia levar a APGAR baixo, demonstrado pela demora da criança em chorar.
Em resumo, quando necessários, os benzodiazepínicos mais indicados na gestação são os de meia-vida curta e com ausência de metabólitos ativos. Preenchem estes critérios o alprazolam e o lorazepam. Como o primeiro tem maior associação com fenda palatina, além de, pela maior potência, estar associado a síndrome de abstinência mais intensa, o lorazepam é o preferido.
ANTIDEPRESSIVOS
14.5. ANTIDEPRESSIVOS
Está se chegando, aos poucos, à conclusão de que, além da fluoxetina, vários outros antidepressivos, como citalopram, escitalopram, fluoxetina, paroxetina, sertralina, venlafaxina, desvenlafaxina, mirtazapina e bupropiona, não estão associados a risco de malformações maiores. O risco deles está abaixo de 1-3%, que é o observado na população em geral.
Parece, entretanto, que alguns antidepressivos produzem sintomas transitórios de toxicidade ou abstinência perinatal quando usados próximo ao parto. Que sintomas são esses? São tremores, irritabilidade, letargia, hipotonia, sintomas anticolinérgicos, como constipação, taquicardia e retenção urinária.
Ou seja, nós clínicos temos no que nos basearmos para usar os antidepressivos. No momento, talvez tenhamos de pensar se no último mês de gravidez o antidepressivo que estamos prescrevendo não deve ser, pelo menos, reduzido.
Entretanto, as pesquisas, felizmente, continuam. Vamos seguir acompamnhando-as. Por exemplo, há o relato de um caso de prolongamento transitório do intervalo QT em recém-nascido de mãe que utilizou fluoxetina. Há outro caso com provável associação de ISRS com sintomas hemorrágicos em recém-nascido.
Infelizmente, ainda falta acumular mais evidências cientificas sobre o uso de medicamentos na gravidez. Por isso, cada caso é um caso e a decisão sempre deve ser tomada em conjunto: paciente, familiar, obstetra e psiquiatra.
THE SWEDISH MEDICAL BIRTH REGISTRY
14.4. THE SWEDISH MEDICAL BIRTH REGISTRY
Entre 969 bebês cujas mães haviam usado no início da gravidez algum tipo de antidepressivo não foi encontrada nenhuma evidência de efeito teratogênico. O citalopran fora usado por 364 mulheres, clomipramina por 333, paroxetina por 118. Algumas, inclusive, usaram uma associação de antidepressivos. Leia mais em: Ericson A. et al Delivery outcome after the use of antidepressants in early pregnancy Eur J Clin Pharmacol (1999) 55: 503-508.
Creio que esta pesquisa é suficientemente ampla e importante para podermos nos basear nela.
AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRICS
14.2. AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRICS
- Depressão: os tricíclicos e a fluoxetina não apresentam nenhum efeito teratogênico sobre o feto humano. Dos tricíclios, indica a nortriptilina e a desipramina.
- Transtornos bipolares: o uso do lítio durante o segundo e terceiro trimestre pode causar no feto tireóide “goiter”. Quanto a malformação congênita que se acreditava poderia causar quando usado no primeiro trimestre, especialmente Ebstein, tem se visto que o risco é muito baixo. Mesmo assim, recomenda-se ultra-sonografia cardíaca entre
- Os benzodiazepínicos poderiam provocar a síndrome da criança flácida: hipotonia muscular, baixo Apgar, hipotermia. Se for necessário usar, o indicado é o lorazepan.
- A segurança do uso da fluoxetina é considerada muito boa, a ponto de a indicarem também para o caso de a grávida apresentar síndrome de pânico e/ou transtorno obsessivo-compulsivo.
FDA e BNF
14.2. FDA E BNF
O FDA classifica os medicamentos em categorias (A, B, C, D e X) de acordo com o grau de risco ao feto, especialmente se usados no primeiro trimestre da gestação.
Categoria A – Estudos controlados em mulheres não mostraram risco no primeiro trimestre da gravidez para a mulher, e o risco para o feto mostrou-se remoto.
Categoria B – Medicamentos cujas pesquisas em animais não indicam riscos para o feto, mas não há comprovação em humanos; ou medicamentos cujas pesquisas em humanos não demonstraram risco para o feto, mas pesquisas em animais revelaram efeitos adversos sobre o feto. A prescrição pode ser feita, mas com cautela.
Categoria C – Foram relatados efeitos teratogênicos ou tóxicos em embriões de animais; mas não há estudos controlados em mulheres, ouu simplesmente não existem estudos seja em animais, seja
Categoria D – Há evidência de risco para os fetos humanos. Em doenças graves, com risco de vida, para as quais não existe outra alternativa terapêutica, pode ser a única opção. Prescrição de alto risco.
Categoria X – Pesquisas em animais ou humanos têm demonstrado que o medicamento causa alterações fetais. O risco supera claramente qualquer possível benefício. Não há situações em que possam ser prescritos para mulheres grávidas.
Os medicamentos da categoria A estão liberados; os da B e da C dependem de se avaliar o risco/benefício.
As pesquisas procuram observar se há um dos seguintes problemas com o uso de medicamentos psicotrópicos na gravidez:
1. efeitos teratogênicos com elevação do risco de malformações usualmente durante o 1º trimestre de gestação;
2. toxicidade neonatal e síndrome de descontinuação usualmente relacionadas ao uso no 3º trimestre;
3. efeitos comportamentais e no desenvolvimento, mais difíceis de caracterizar e manifestos mais tardiamente.
O FDA vai mudando de categoria os medicamentos dependendo da evolução das pesquisas.
DESINFORMAÇÃO E PESQUISAS A RESPEITO
14.1. DESINFORMAÇÃO E PESQUISAS A RESPEITO
The Motherisk é um serviço da cidade de Toronto, Canadá, que oferece por telefone informações baseadas em evidências científicas para as mulheres e para os profissionais que as atendem sobre o risco, entre outros, do uso de determinado medicamento na gravidez e no aleitamento. De todas as consultas telefônicas, 12% são sobre o uso de antidepressivos.
Ou seja, há muita dúvida não só entre a população, mas também entre os profissionais de saúde. As pesquisas não respondem totalmente a nossas angústias a respeito. Para ler mais a respeito, sugiro: Bonari L. et al Use of antidepressantes by pregnant women: Evaliation of perception of risk, efficacy of evidence based counseling and determinants of decision making. Arch Womens Ment Health (2005) 8: 214-220.
As pesquisas a respeito não param. Citarei algumas como exemplo e depois direi como podemos nos orientar de uma maneira mais rápida e prática.
(1) Numa pesquisa com 138 mulheres que tomaram fluoxetina, paroxetina ou sertralina durante a gravidez observou-se que a incidência de anormalidade congênita foi de 1,4 %, ou seja, semelhante ao que se encontra na população que não faz uso destes medicamentos. O resultado, portanto, aponta no sentido de se poderem usar esses antidepressivos na gravidez. Entre o grupo estudado, verificou-se que quatro nenês nasceram com baixo peso. As mães, três delas, haviam tomado fluoxetina 80 mg por dia. É possível que os nenês nascessem com baixo peso se as mães não tivessem tomado o antidepressivo: a grávida deprimida tende a descuidar-se de sua alimentação e cuidados básicos. Para ler mais: Hendrick V. et al Birth outcomes after prenatal exposure to antidepressant medication Am J Obstet Gynecol 188 (3), 812-5
(2) Começam a surgir pesquisas avaliando crianças aos sete anos filhas de mães com doença depressiva. As crianças que apresentaram algum atraso no desenvolvimento parecem ser aquelas cujas mães não trataram a depressão. O uso de antidepressivos por suas mães não parecem tê-los afetados.
Porém, nos que somos clínicos temos de agir e não podemos ficar catando uma pesquisa nos Estados Unidos, outra no Canadá. Vamos recorrer a quem já faz isso para nós: FDA, BNF, American Academy of Pediatrics e The Swedish Medical Birth Registry.
CANADIAN PEDIATRIC SOCIETY
A Canadian Pediatric Society em novembro de 2011 já havia chegada a algumas conclusões, as quais foram reafirmadas em fevereiro de 2016.
1. O tratamento adequado da depressão durante a gravidez é muito importante tanto para a mãe quanto para o bebê.
2. A Síndrome Neonatal devido aos SSRI é comum mas normalmente moderada ou leve, é transitória e não deixa sequelas.
3. O risco de hipertensão pulmonar não é significativo.
4. Não há nenhuma evidência de que os SSRI incrementem o risco de mal formação.
5. É contraditório se a paroxetina causa risco de mal formação.
AMAMENTAR OU SUSPENDER?
15.1. AMAMENTAR OU SUSPENDER?
A. Devemos não utilizar medicação em seu tratamento?
B. Devemos pedir à paciente que pare de amamentar?
C. Devemos medicá-la e ela continuar a amamentar?
Se a sua depressão é de leve intensidade, é possível se pensar na utilização de uma psicoterapia sem o uso de medicamentos. Porém, se moderada ou grave, a medicação torna-se imprescindível.
Na minha observação, nas depressões moderadas (e nas leves caso não tenhamos optado pela psicoterapia isolada) é que vamos poder optar, em alguns casos, pelo item C: medicar a paciente e ela continuar amamentando.
Na depressão grave, a mãe nem tem condições emocionais de amamentar, ou seja, a questão nem é mais a passagem da medicação pelo leite para o nenê. Assim sendo, estaremos liberados para medicá-la sem restrições, como o caso grave exige.
No caso dos transtornos bipolares, sempre teremos de utilizar algum tipo de medicação ou ECT. Podemos indicar também psicoterapia, mas nunca devemos prescindir da medicação. E a minha indicação é a de que se suspenda a amamentação.
Cada vez mais se usa antidepressivos concomitante a amamentação. Aliás, os medicos sempre prescreveram e continua a prescrever o EQUILID para que a mãe tenha mais leite. Ora, um antidepressivo. E mais: um antidepressivo que nós psiquiatras praticamente não prescrevemos mais devido aos seus efeitos colaterais. Ou melhor, devido ao fato de que existem vários antidepressivos melhores em eficação e melhores por terem bem menos efeitos colaterais. Então, por que não prescrevê-los? Os níveis de alguns destes medicamentos são minimos tanto no leite da mãe quanto no sangue do recém-nascido.
Os medicamentos mais pesquisados e, portanto, mais recomendados até o momento (segundo o Guia Diretrizes da Associação Médica Brasileira) são a nortriptilina, a sertralina e a paroxetina. Mas outros antidepressivos estão cada vez mais sendo usados em mães que amamentam. Já tive pacientes que usaram desvenlafaxina, citalopram e escitalopram sem nenhuma repercussão negativa.
Se no passado a paciente já melhorou com outro antidepressivo devemos pensar na utilização deste que já lhe fez bem. Sabemos que há o risco de um novo antidepressivo não funcionar e o quadro da paciente tornar-se ainda mais grave. Portanto, impera a ponderação, o bom senso, a troca de idéias com a própria paciente e seus familiares. A decisão do tipo de antidepressivo deve levar em conta todos esses fatores.
INFORMAÇÕES E DICAS
15.2. INFORMAÇÕES E DICAS
a. Alguns medicamentos suprimem a liberação de fatores inibidores da prolactina agindo como lactagogos: sulpirida, reserpina e clonidina.
b. Estima-se que a quantidade de um medicamento que é transferida para o leito não ultrapasse 2% da dose ingerida pela mulher (10% do nível do medicamento presente no plasma da mulher).
c. A exposição do bebê será menor se a mãe tomar a medicação logo após completar a mamada. Enfatizando: deve tomar a medicação em seguida à última mamada, não imediatamente antes da próxima.
d. Os psicofármacos estão mais presentes no leite posterior. Portanto, a exposição pode ser minimizada desprezando-se esta porção do leite. Há referência na literatura médica do uso de vários antidepressivos na amamentação, entre eles a sertralina e a amitriptilina. Esta, por ser mais antiga e, em consequencia, já ter sido mais usada.
e. Peço para a paciente comunicar ao pediatra para que ele observe a presença de algum efeito no nenê. No caso da sertralina, por exemplo, principio com dose de 25 mg e vou aumentando a cada dois dias até a dose de, pelo menos, 100 mg.
f. Sempre que a paciente está em condições de decidir, adoto a conduta em combinação com ela. Nunca podemos negar o quanto uma depressão não tratada afeta a saúde da mãe e a saúde do seu nenê. Se a paciente já se beneficiou de determinado antidepressivo no passado, o uso dele deve ser considerado. Ultimamente tenho prescrito para várias mães que amamentam a desvenlafaxina e não notamos nenhum efeito colateral do medicamente no nenê.
g. O uso de ansiolítico também é possível quando por um curto período e em dose bem baixa e comunicando o pediatra para que observe se o nenê está também sentindo seu efeito.
h. Se a ansiedade da paciente é grande, sugiro que ela pare de amamentar para que possamos aumentar a dose.
i. Quando a paciente vai necessitar de medicação, estabelecemos uma diminuição gradativa da amamentação concomitante ao aumento gradativo da dose.
j. As depressões pós-partos são quadros preocupantes, há mais risco de suicídio e há casos, felizmente raros, de infanticídio. Portanto, não vamos valorizar excessivamente as vantagens do aleitamento materno (e as "vantagens" do nenê não receber pelo leite porções mínimas do medicamento antidepressivo) em detrimento do tratamento adequado.
k. Alguns sites úteis a respeito:
www.elsevier.com/inca/publications
www.cps.ca
EXERCÍCIO
EXERCÍCIO PARA REFORÇAR CONTEÚDO
CASO DE MULTÍPARA COM IDEAÇÃO SUICIDA QUE QUER AMAMENTAR
Uma mulher de 38 anos acaba de ganhar seu quarto filho e, mais uma vez, revela depressão pós-parto. É a terceira. Como nas outras, tem ideação suicida, muita ansiedade e grande irritabilidade. Já recebera no passado sem sucesso sertralina, fluoxetina e paroxetina. Diz querer desta vez amamentar; nas outras o fizera muito pouco. Obtivera melhora da depressão no passado fazendo uso de nortriptilina 150 mg por dia. Para tanto, suspendera a amamentação. Gostaria de tomar outro antidepressivo, um novo, que ainda não tomara; ou de tomar a amitriptilina, mas continuar amamentando seu nenê, fato que já acontecia há três semanas.
Como proceder?
Por favor, faça seus próprios comentários sobre o caso antes de continuar a leitura!
Meus comentários:
A depressão da paciente é importante: muita ansiedade, muita irritabilidade e grande irritabilidade. Experimentar um antidepressivo novo não me parece uma conduta adequada pois não temos certeza de que ele será eficaz na paciente. Poderíamos perder alguns meses. A paciente poderia permanecer por muito mais tempo do que o necessário com os sintomas, com todos os prejuízos advindos, inclusive na relação com seu bebê. O prudente seria voltar à nortriptilina, que já se mostrara eficaz nela. Desaconselharia ela a continuar amamentando. A paciente já amamentara por algumas semanas, já havia beneficiado o nenê desta maneira. Agora, precisa beneficiá-lo tendo na mãe uma mulher sem sofrimento e em plenas condições de estabelecer um bom vínculo com ele.
ÚTEIS NAS PESQUISAS
15.1. ÚTEIS NAS PESQUISAS
Menos de 5 % dos médicos usam as escalas. Eu mesmo as utilizei poucas vezes. Entretanto, é bom conhecê-las bem para um caso que julgarmos necessário.
Concluído o diagnóstico, podemos estimar a gravidade dos sintomas de um paciente previamente diagnosticado com depressão utilizando de algumas escalas, que são úteis a pesquisas e também para avaliar a evolução do paciente. Podemos aplicá-las de tempos em tempos e discutir com o paciente os resultados.
As escalas fornecem resultados aproximados, pois na atribuição de escores há a subjetividade do entrevistado e do entrevistador. Porém, elas já estão sendo empregadas há muitos anos e passaram por estudos de validação e confiabilidade.
Avaliação pela ótica do profissional:
Montgomery-Asberg (MADRS)
Avaliação pela ótica do paciente:
Inventário de Depressão de Beck (BDI)
Questionário breve de sintomatologia depressiva de Rush.
Essas escalas devem ser completadas logo após a entrevista, não durante nem muito tempo depois.
INVENTÁRIO DE BECK
15.2. INVENTÁRIO DE BECK
Beck publicou-a em 1961 e até hoje é a medida de auto-avaliação de depressão mais utilizada. Em 1996 surgiu a forma II do BDI.
Existem três versões da escala: a BDI original, publicada em 1961 e revisada em 1978; a BDI-1A; e a BDI-II, publicada em 1996.
Além de útil para o paciente depressivo observar sua evolução, a escala vem se mostrando eficaz na detecção de depressão na população.
O Inventário de Beck foi adaptado ao português por Clarice Gorestein e Laura Andrade.
ESCALA DE HAMILTON
15.3. ESCALA DE HAMILTON (HAM-D)
Hamilton ofereceu-nos esta escala há cerca de quarenta e sete anos. Até hoje mantém-se utilizada e é considerada, por muitos, o padrão-ouro para avaliação de confiabilidade e de validade das escalas desenvolvidas depois.
Possui três versões: de 17, 21 e 24 itens.
A versão mais utilizada é a de 17 itens.
Considera-se que o paciente obteve melhora quando seu escore foi reduzido em 50%. Considera-se que houve remissão da depressão quando o paciente atingiu o escore de 7 ou menos que 7.
MONTGOMERY-ASBERG
15.4. MONTGOMERY-ASBERG (MADRS)
Publicada em 1979, avalia especialmente mudanças clínicas no decorrer do tratamento. Difere da HAM-D por não incluir sintomas psicomotores e sintomas somáticos. Seu resultado final ficará entre 0 e 50. Na prática conclui-se que:
35 ou mais: depressão muito grave.
10 ou 11: remissão.
A avaliação deve basear-se em uma entrevista clínica que se inicie com perguntas genéricas sobre sintomas e seja acompanhada de questões mais detalhadas que permitam a avaliação precisa da gravidade. O avaliador deve decidir se a avaliação se situa em graus definidos da escala (0, 2, 4, 6) ou entre eles (1, 3, 5).
É importante lembrar que somente em raras ocasiões se encontra um paciente deprimido que não pode ser avaliado de acordo com os itens da escala. Caso respostas definidas não possam ser obtidas do paciente, devem ser usados todos os indícios relevantes, bem como informações de outras fontes, como base para a avaliação, de acordo com a prática clínica costumeira.
A escala pode ser usada para qualquer intervalo de tempo entre avaliações, seja semanal ou outro, mas isso deve ser registrado.
Lista de Itens
1. Tristeza Aparente
2. Tristeza Relatada
3. Tensão Interna
4. Sono Reduzido
5. Diminuição do Apetite
6. Dificuldades de Concentração
7. Lassidão
8. Incapacidade de Sentir
9. Pensamentos Pessimistas
10. Pensamentos Suicidas
QUESTIONÁRIO DE RUSH
15.5. QUESTIONÁRIO BREVE DE SINTOMATOLOGIA DEPRESSIVA DE RUSH (QIDS – SR 16)
Marque a resposta em cada item que melhor o/a descreve durante os últimos sete dias.
1. Conciliar o sono:
0 Nunca tenho demorado mais que 30 minutos para dormir.
1 Tenho demorado pelo menos 30 minutos para dormir, menos da metade das vezes.
2 Tenho demorado pelo menos 30 minutos para dormir, mais da metade das vezes.
3 Tenho demorado mais de 60 minutos para dormir, mais da metade das vezes.
2. Sono noturno:
0 Não me acordei durante a noite.
1 Todas as noites tenho tido um sono superficial e intranqüilo e tenho despertado várias vezes por um tempo curto.
2 Pelo menos uma vez em cada noite tenho despertado, porém volto a dormir facilmente.
3 Todas as noites tenho despertado mais de uma vez e tenho ficado acordado/a durante 20 minutos ou mais na maioria das vezes.
3. Acordar-se muito cedo:
0 Na maioria da vezes tenho despertado não mais de 30 minutos antes da hora habitual de me levantar.
1 Na maioria da vezes tenho despertado mais de 30 minutos antes da hora habitual de me levantar.
2 Quase sempre tenho despertado pelo menos uma hora antes do necessário, porém eventualmente tenho voltado a dormir.
3 Quase sempre tenho despertado pelo menos uma hora antes do necessário e não tenho conseguido voltar a dormir.
4. Dormir demasiadamente:
0 Tenho dormido não mais que 7-8 horas por noite e não tenho feito sesta durante o dia.
1 Tenho dormido não mais de 10 horas num período de 24 horas, incluindo as sestas.
2 Tenho dormido não mais de 12 horas num período de 24 horas, incluindo as sestas.
3 Tenho dormido mais de 12 horas num período de 24 horas, incluindo as sestas.
5. Sensação de tristeza:
0 Não tenho me sentido triste.
1 Tenho me sentido triste menos da metade do tempo.
2 Tenho me sentido triste mais que a metade do tempo.
3 Tenho me sentido triste quase todo o tempo.
6. Diminuição do apetite:
0 Meu apetite habitual não mudou.
1 Tenho comido muito menos freqüentemente ou em menor quantidade que o habitual.
2 Tenho comido muito menos que o habitual e mediante um esforço.
3 Quase não tenho comido em um período de 24 horas e só consigo comer mediante um grande esforço ou quando os outros me convencem a comer.
7. Aumento do apetite:
0 Meu apetite habitual não mudou.
1 Sinto necessidade de comer com mais freqüência que o habitual.
2 Normalmente tenho comido com mais freqüência e ou com mais quantidade que o habitual.
3 Tenho sentido necessidade de comer mais, tanto nas refeições como entre elas.
8. Perda de peso dentro das últimas duas semanas:
0 Meu peso não mudou.
1 Sinto como se houvesse tido uma leve perda de peso.
2 Perdi
3 Perdi mais de
9. Aumento de peso (dentro das últimas duas semanas):
0 Meu peso não mudou.
1 Sinto como se houvesse tido um leve aumento de peso.
2 Aumentei
3 Aumentei mais de 2 kgs.
10. Concentração / tomada de decisões:
0 Minha capacidade habitual para me concentrar ou tomar decisões não mudou.
1 As vezes tenho me sentido indeciso/a ou tenho me dado conta de que me distraio.
3 Não tenho podido me concentrar suficientemente para ler ou nem sequer tenho podido tomar decisões sem importância.
11. Percepção de mim mesmo/a:
0 Tenho me considerado como tendo o mesmo valor ou os mesmos direitos que as demais pessoas.
1 Tenho me sentido mais culpado que o habitual.
2 Em grande medida, creio que causei problemas a outras pessoas.
3 Tenho pensado quase constantemente em meus defeitos, tanto nos importantes como nos triviais.
12. Pensamentos de morte ou suicídio:
0 Não tenho pensado em suicídio ou na morte.
1 Tenho sentido que minha vida está vazia ou me perguntado se vale a pena viver.
2 Tenho pensado no suicídio ou na morte várias veces por semana durante vários minutos.
3 Tenho pensando em suicídio ou na morte várias vezes ao dia com certos detalhes, tenho feito planos de como me suicidar ou realmente tenho tentado tirarme a vida.
13. Interesses gerais:
0 Meu interesse habitual em outras pessoas ou atividades não mudou.
1 Tenho notado que estou menos interessado nas pessoas ou nas atividades.
2 Só estou interessado em uma ou duas das atividades que habitualmente fazia.
3 Não tenho tido praticamente nenhum interesse nas atividades que costumava fazer.
14. Nível de energia:
0 Meu nível de energia habitual não mudou.
1 Tenho me cansado mais facilmente que o habitual.
2 Tenho tido que fazer um grande esforço para iniciar ou terminar minhas atividades diárias (por exemplo: fazer compras, estudar, cozinhar ou ir trabalhar).
3 Realmente não tenho conseguido realizar a maioria de minhas atividades diarias porque simplemente não tenho tido energia.
15. Sensação de lentificação:
0 Minha velocidade habitual para pensar, falar e me mover não mudou.
1 Tenho me dado conta de que meu pensamento tem estado lento ou que minha voz tem soado monótona e apagada.
2 Tenho demorado vários segundos para responder à maioria das perguntas e estou seguro/a de que meu pensamento está lento.
3 Com freqüência, só com grande esforço consigo responder quando me fazem perguntas.
16. Sensação de inquietude:
0 Não tenho me sentido inquieto/a.
1 Com freqüência tenho estado intranqüilo/a, tenho apertado minhas mãos ou tenho necessitado mudar a posição em que estava sentado/a.
2 Tenho tido impulsos de estar em movimento e tenho estado bastante inquieto/a.
3 Por momentos, me resulta imposível ficar sentado/a e tenho necesidade de caminhar ao redor.
A escala de Rush é muito prática e tem sido cada vez mais usada. Para obter mais informações sobre ela sugiro a leitura dos artigos:
- Rush AJ, Trivedi MH, Ibrahim HM, Carmody TJ, Arnow B, Klein DN, Markowitz JC, Ninan PT, Kornstein S, Manber R, Thase ME, Kocsis JH, Keller MB. The 16-item Quick Inventory of Depressive Symptomatology (QIDS) Clinician Rating (QIDS-C) and Self-Report (QIDS-SR): A psychometric evaluation in patients with chronic major depression. Biological Psychiatry, 54:573-583, 2003.
- Rush, A.J., Gullion, C.M., Basco, M.R., Jarrett, R.B. and Trivedi, M.H. The Inventory of Depressive Symptomatology (IDS): Psychometric properties. Psychological Medicine, 26:477-486, 1996.
- Rush, A.J., Hiser, W. and Giles, D.E. A comparison of self-reported versus clinician-rated symptoms in depression. Journal of Clinical Psychiatry, 48:246-248, 1987.
EXERCÍCIO
Ofereça a alguns pacientes uma dessas escalas e aplique-as naqueles que consentirem.
Você consegue as escalas pesquisando-as na internet. Algumas exigem permissão para uso outras não.
CID-11, DSM V
16.1. CID 11, DSM V
A CID-11 e a DSM-V foram elaboradas por dois grupos diferentes mas que trabalharam em estreita colaboração. Em conseqüência, há muita convergência nos critérios. Como a CID-11 é a classificação da Organização Mundial da Saúde e é a oficial no Brasil, vamos trabalhar com ela. Mas vamos aproveitar algumas coisas da DSM-V, a classificação norte-americana.
Assim como os norte-americanos lançaram em 2013 a DSM-V, a Organização Mundial de Saúde (OMS) publicou a CID-11 em 2018.
CID-11
Como a CID 11 ainda é de aplicação recente, desde 2018, precisamos de mais tempo para avaliar seus efeitos na prática clínica.
DSM V
Lançada em maio de 2013, a quinta revisão da DSM, a DSM-V tem despertado acirrados debates e grandes polêmicas. E isso dentro da propria American Psychiatrica Association, responsável por essa classificação. Portanto, vamos aguardar a poera baixar para podermos avaliar melhor seus reais benefícios.
ÚTIL NOS TEMPOS PRÉ-HUMANOS?
17.1. ÚTIL NOS TEMPOS PRÉ-HUMANOS?
Exemplo de resposta emocional vestigial de comportamento que uma vez foi útil: o medo de cobras. Disperdiçamos nosso tempo com medos de cobras, quando os perigos que nos assolam no dia-a-dia são bem outros.
No passado, a capacidade de se deprimir teria sido extremamente útil. Os animais superiores e os homens primitivos viviam em bandos com um comandante. Se o animal de hierarquia inferior desafiasse o líder e não fosse desencorajado, ele continuaria desafiando. A luta seria permanente e o grupo perderia sua finalidade, tornar-se-ia incapaz de auxiliar na sobrevivência de seus componentes. Entretanto, se ao perder o animal sofresse um abalo na sua autoconfiança e se retirasse para um estado mais ou menos depressivo, a paz voltaria ao grupo. O líder, inclusive, não precisaria matá-lo ou expulsá-lo do grupo, atitude que, se tomada, enfraqueceria o próprio grupo.
O cérebro evoluiu nas espécies animais conforme as estratégias que lhe eram úteis à sobrevivência. Os mamíferos carnívoros possuem capacidade olfativa bem maior que a nossa. Precisam delas, já que caçam sua presa pelo cheiro. Já os primatas tem o sentido cheiro bem menos desenvolvido, mas uma visão a cores, para sobreviver num ambiente de muitas árvores. Também precisam de equilíbrio, por isso têm esse setor do cérebro bastante desenvolvido.
A propósito, o que nos diferencia dos outros animais não é o tamanho do cérebro. Elefantes e baleias possuem cérebro maior. O peso do cérebro em relação ao peso do corpo? Nosso cérebro: 2% do peso do corpo. Pintos têm cérebro que chega a 4% do peso do corpo. A diferença parece estar no crescimento diferente de estruturas do cérebro, daquelas que foram mais necessárias à sobrevivência da espécie.
Referimo-nos ao cérebro como se fosse um só órgão. Na verdade, são vários órgãos unidos. O cérebro humano apresenta um aumento dos lobos frontal e pré-frontal e suas outras partes permitem que ele seja versátil. Não fazemos nada melhor que os outros animais, mas fazemos muito bem um conjunto de coisas que nenhum consegue. Somos especialistas em pentatlo: corremos, nadamos, subimos na árvore e conseguimos contar com sentimento nossas façanhas. Será que os outros animais se deprimem como nós? Enfim, a primeira teoria levanta a hipótese de que a capacidade de se deprimir foi útil e necessária. Mas... trata-se apenas de uma hipótese.
ÚTIL NOS TEMPOS ATUAIS?
16.2 ÚTIL NOS TEMPOS ATUAIS?
A depressão causa instropecção e nos leva a refletir sobre os rumos que estamos dando a nossas vidas e, quem sabe, a ajustá-los de uma maneira mais adequada e útil. Pode fazer com que as pessoas lamentem equívocos e evitem errar de novo.
A capacidade de fazer e manter vínculos é extremamente vantajosa para a perpetuação de nossos genes. Uma unidade familiar estável facilita a criação dos filhos. Já uma unidade instável, com muitas brigas, é prejudicial. O instinto de chocar um ovo e mantê-lo quente, ao contrário de botar um ovo e depois abandoná-lo, nitidamente aumenta as chances de reprodução. Fomos feitos para sofrer quando nos afastamos das pessoas que amamos. Caso não houvesse nenhum desespero devido à perda de uma pessoa, só utilizaríamos tempo e energia emocional com aquela pessoa à medida que ela fosse motivo de prazer, nenhum minuto mais. Cuidaremos do vínculo com quem amamos para evitar o sofrimento intolerável para nós mesmos.
Mas, a depressão oriunda da alteração bioquímica do cérebro, esta não tem utilidade alguma. Só traz sofrimentos e nada mais. E por isto mesmo, deve ser tratada o mais rápido e eficaz que seja possível.
Para ler mais sobre os evolucionistas, sugiro: Steven Pinker. Dois livros seus foram traduzidos pela Compnhia das Letras: Como o cérebro funciona e Tábula raza.
CÉREBRO DESPREPARADO
16.3. CÉREBRO DESPREPARADO
Nós, clínicos, vemos o lado disfuncional da depressão e dos transtornos bipolares. Vemos o sofrimento e a perda de qualidade e de quantidade de vida. Estamos animados pelos tratamentos que estão por chegar. O futuro é bom.
EMT
17.1. EMT
A Estimulação Magnética Transcraniana consiste na colocação de um eletromagneto com uma bobina em forma de oito no couro cabeludo do paciente e em ligar e desligar o fluxo magnético. De maneira mais simples, um ímã é feito pela eletrecidade. A bobina em forma de oito permite concentrar a força desse ímã e, com algum material que o atraia, consegue que essa força seja direcionada tipo um canhão de luz.
Essa força mexe com a bioquímica do cérebro e provoca mudanças. Creio que tal tratamento será aprimorado
Não poderá esse tratamento físico desbancar com o tratamento químico?
A Agência de Projetos de Pesquisas Avançadas para a Defesa (Defense Advanced Research Projects Agency) contrata pesquisas para desenvolver a EMT. Seu interesse é militar. Por exemplo, combater a fadiga em pilotos, ou melhor, a capacidade mental deles. Mas é possível que tal força possa ser desenvolvida, não sabemos, para se tornar uma arma. Uma estimulação magnética a distância poderia interferir no pensamento de um inimigo: ligar ou desligar seu pensamento. Ou até mesmo introduzir uma pensamento tipo uma ordem ou contra-ordem, na chamada “transmissão da fala por microondas”. É possível, sim, criar um campo acústico interno audível na faixa de 5-15 quilohertz. Desse modo se poderia perturbar um adversário com uma estranha “conversa” vinda de longe, desorientando-o.
Quando algo desperta o interesse da corrida armamentista recebe muito dinheiro para pesquisa e tende a se desenvolver. Algo poderá derivar daí para uso civil. Portanto, vamos permanecer atentos ao promissor desenvolvimento da EMT.
O aparelho concentra uma força que penetra no couro cabeludo e no crânio visando ao córtex pré-frontal ventromedial, região que está implicada nos neurocircuitos da depressão. Outras regiões-alvo serão identificadas no futuro, permitindo, assim, que se aumente a eficácia dessa modalidade nova de tratamento. O tratamento é feito sem anestesia, os pacientes não sentem nada a não ser uma sensação no couro cabeludo, além de ouvir o ruído do aparelho.
Seus resultados ainda não estão bem avaliados. Mas, no futuro, com a melhoria do aparelho...
MST
17.2. MST
A Terapia Convulsiva Magnética (MST) usa um campo magnético para induzir uma crise convulsiva. É direcionada a áreas específicas do cérebro. Nisso difere do ECT, que atinge o cérebro inteiro. Requer anestesia.
ENV
17.3. ENV
Estimulação do Nervo Vago (ENV), já aprovada pelo FDA para o tratamento das depressões resistentes. Consiste na implantação cirúrgica de um pequeno aparelho na parede torácica esquerda com um fio correndo sob a pele que leva a espirais em torno do nervo vago direito. O aparelho provoca pulsos elétricos contínuos em intervalos de 30 segundos ligado e 5 minutos desligado. Pesquisas apontam para a melhoria de 15 % dos pacientes com depressão resistentes tratados pela ENV.
ECP
17.4. ECP
Estimulação Cerebral Profunda (ECP). Aprovado para doença de Parkinson, está sob investigação para a depressão resistente e para o transtorno obsessivo-compulsivo. Até o presente, há apenas vinte casos relatados. O procedimento implica a implantação de geradores de pulso internos em ambos os lados da parede torácica e a realização de perfurações no crânio para permitir a colocação dos eletrodos.
MANIPULAÇÃO GENÉTICA
17.5. MANIPULAÇÃO GENÉTICA
Existem duas formas de manipulação genética: germinativa e somática. A terapia em linhagem germinativa consiste em pegar o óvulo ou o espermatozóide deficiente e substituir o alelo afetado por uma versão correta. A engenharia genética entra aqui. A terapia genética somática manipula os genes em indivíduos já em desenvolvimento ou mesmo adultos, inserindo um DNA novo.
O desenvolvimento dessa área da ciência levará a que tenhamos medicamentos racionais ou receitas sob medida, medicamentos específicos aquele indivíduo.
Vai ser possível identificar o gene ou conjunto de genes específicos que predispõem aquela pessoa a desenvolver alteração na neuroquímica e depressão. Atualmente, não sabe de certeza qual antidepressivo será eficaz naquela pessoa. Na prática, testa-se. No futuro, é possível que se saiba de antemão; também o gene que levaria o indivíduo a ter um efeito colateral com determinada substância. De posse das informações, poder-se-ia produzir uma medicação sob medida.
Haverá repercussão econômica. Atualmente, os laboratórios conseguem lucros que lhes permitem financiar novas e caríssimas pesquisas vendendo um mesmo novo produto para um número imenso de pacientes. Porém, a economia de escala poderá desaparecer com as drogas sob medida.
Vídeo - O FUTURO
ATUALIZAÇÃO PERMANENTE
18.1. ATUALIZAÇÃO PERMANENTE
Aqui serão colocadas as novidades que me parecerem útil na prática clínica. Sejam elas artigos, livros ou comunicações pessoais com colegas. Útil para nós que estamos no dia-a-dia nos relacionando com os pacientes.
Um livro muito bom de se ter: PSICOFÁRMACOS: CONSULTA RÁPIDA. Aristides Volpato Cordioli. ARTMED.
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Amphetamine Use in the Elderly: A Systematic Review of the Literature.
Author information
- 1
- Department of Psychiatry and Behavioral Science, McGovern Medical School, The University of Texas Health Science Center at Houston, Houston, TX, United States.
Abstract
OBJECTIVE:
To systematically review the literature on the therapeutic use of amphetamine, lisdexamfetamine and methylphenidate in elderly population with and without dementia.
METHODS:
We conducted two researches on the PubMed, Scopus and Embase using the keywords ("elderly") AND ("amphetamine" OR "methylphenidate" OR "lisdexamfetamine") and then ("Alzheimer" OR "dementia") AND ("amphetamine" OR "methylphenidate" OR "lisdexamfetamine").
RESULTS:
Twenty-nine papers met all the eligibility criteria. The results are encouraging as 81.5% of the studies showed clinical improvement of the investigated condition.
CONCLUSION:
Amphetamines and methylphenidate are probably effective strategies for different conditions in the elderly population. However, further studies are needed to provide more robust evidence on efficacy, dosage and safety for this population.
Copyright© Bentham Science Publishers; For any queries, please email at epub@benthamscience.net.
KEYWORDS:
Stimulant; amphetamine; dementia; elderly; lisdexamfetamine; methylphenidate
- PMID:
- 31660835
- DOI:
- 10.2174/1570159X17666191010093021
Bipolar Disorder: The Shift to Overdiagnosis
Philip B Mitchell, AM, MB BS, MD, FRANZCP, FRCPsyc
Correspondence: School of Psychiatry, Prince of Wales Hospital, Randwick, NSW 2031, Australia; phil.mitchell@unsw.edu.au.
Sometimes dramatically changing vogues in diagnostic practice in psychiatry resemble the volatility of international share markets. One such quickly shifting diagnostic area has been that of bipolar disorder (BD). Historically regarded as a relatively uncommon condition until recent decades, the construct of BD underwent a major expansion in the 1990s and 2000s with promulgation of the concept of the soft bipolar spectrum disorder, from which the recent research focus on subthreshold BD presentations was derived. Related to this has been renewed interest in treatments for BD from the pharmaceutical industry. The increasing rates of diagnosis have largely related to BD II, for which there has been a dramatic broadening of diagnostic criteria. This article critically reviews research data, both for broadening the diagnostic criteria for BD and, conversely, for the growing evidence of overdiagnosis in clinical practice. Why does this debate matter? I would suggest that there are many valid reasons to be concerned about overdiagnosis: first, the potential for overtreatment or inappropriate treatment of such patients with mood stabilizing treatments, including antipsychotics; second, the potential for diagnostic oversimplification, with consequent diagnostic deskilling and loss of credibility for the psychiatric profession; and third, the potential major impact on etiologic research for this condition. Psychiatry should not uncritically accept the shift to overdiagnosis, which has developed a rapid momentum in recent decades, in both clinical and academic circles. We must ensure, as a profession, that any change in diagnostic practice is underpinned by rigorous and critical research inquiry.
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A lomotrigina foi recomendada por determinados guias de tratamento do transtorno bipolar como agente de primeira linha quando haviam sido publicados apenas os trabalhos com resultados positivos. Quando apareceram os artigos mostrando resultados mais modestos ou até mesmos negativos, o papel da lamotrigina foi reconsiderado. Vera o resumo do artigo:
. Publicado online 18 janeiro 2013 doi: 10.2147/NDT.S37126
PMCID: PMC3554228
Uma revisão crítica da literatura recente e diretrizes de terapia selecionados desde 2006 sobre o uso de lamotrigina no transtorno bipolar
Anja Tränkner , Christian Sander ,e Peter Schönknecht
Informações sobre o autor ? Direitos de Autor e Informação sobre a licença ?
Este artigo foi citado por outros artigos em PMC.
Abstrato
O fármaco anticonvulsivo lamotrigina (LTG), um bloqueador de canal de sódio e inibidor da libertação de glutamato, foi indicado como tendo efeitos antidepressivos no tratamento da doença bipolar. Recomendo por certas diretrizes de terapia como um agente de primeira linha para o tratamento agudo e de manutenção na depressão bipolar; mas só houve alguns resultados promissores em ensaios controlados com placebo em seus efeitos antidepressivos agudos; a recomendação em diretrizes de terapia tem sido reconsiderado . Pelo contrário, os resultados positivos para a terapia de manutenção pode ser confirmada, e LTG ainda é uma opção bem tolerada, especialmente em doentes com episódios depressivos predominantes. Efeitos antimaníacos não são mostrados na literatura, e o seu uso não é recomendado. Em conclusão, os resultados do presente artigo de revisão sobre as diretrizes para tratamento do transtorno bipolar questiona o papel da LTG em estados depressivos agudos, e nos leva a discutir o seu uso particularmente em estados depressivos agudos.
Psychopharmacol. 2011 Oct;25(10):1289-94. doi: 10.1177/0269881110376695. Epub 2010 Sep 7.
Lamotrigine: when and where does it act in affective disorders? A systematic review.
Amann B, Born C, Crespo JM, Pomarol-Clotet E, McKenna P.
Source
Benito Menni, Complex Assistencial en Salut Mental, CIBERSAM, Research Unit, Sant Boi de Llobregat, Barcelona, Spain. benedikt.amann@gmail.com
Abstract
Recent published data and treatment guidelines have created uncertainty about the use of lamotrigine in affective disorders, especially in acute bipolar depression. Furthermore, unpublished data on lamotrigine in mania, mixed episodes, unipolar depression and rapid cycling are still waiting to be integrated into the literature. Therefore, we critically reviewed the position of lamotrigine in the acute and long-term treatment of affective disorders. Studies were identified by searching English language articles published in MEDLINE using the key words: lamotrigine, bipolar depression, unipolar depression, mania, mixed episode, long-term treatment, rapid-cycling. Results of unpublished trials were obtained from the GlaxoSmithKline website. Lamotrigine showed efficacy in the prophylaxis of bipolar disorder, more so in depressive than manic episodes. There was no evidence of effectiveness in the acute treatment of mania, mixed episodes, unipolar depression or rapid-cycling bipolar I disorder. Its effect in the acute treatment of bipolar depression is at most small. Based on current evidence, lamotrigine is indicated for the prophylaxis of bipolar disorder with predominantly depressive episodes. Its effectiveness in the acute treatment of bipolar depression is open to debate, and practical considerations limit its usefulness here. There are no grounds for recommending its use in manic or mixed states, in rapidly-cycling bipolar I or in unipolar depression.
Am J Psychiatry. 2010 Jul;167(7):792-800. doi: 10.1176/appi.ajp.2009.09020284. Epub 2010 Apr 1.
Efficacy and safety of long-term fluoxetine versus lithium monotherapy of bipolar II disorder: a randomized, double-blind, placebo-substitution study.
Source
Depression Research Unit, Department of Psychiatry, University of Pennsylvania School of Medicine, Philadelphia, PA 19104, USA. jamsterd@mail.med.upenn.edu
Abstract
OBJECTIVE:
The authors examined the safety and efficacy of long-term fluoxetine monotherapy, lithium monotherapy, and placebo therapy in preventing relapse and recurrence of bipolar type II major depressive episode. The authors hypothesized that fluoxetine monotherapy would be superior to lithium monotherapy with a similar hypomanic mood conversion rate.
METHOD:
Patients at least 18 years old who recovered from their major depressive episode during initial open-label fluoxetine monotherapy were randomly assigned to receive 50 weeks of double-blind monotherapy with fluoxetine at 10-40 mg/day, lithium at 300-1200 mg/day, or placebo. The primary outcome measure was time to relapse or recurrence. Secondary outcome measures included the proportion of patients remaining well and the frequency of hypomanic symptoms.
RESULTS:
There were no significant differences in clinical or demographic characteristics among the fluoxetine (N=28), lithium (N=26), and placebo (N=27) groups. The mean time to relapse was 249.9 days for the fluoxetine group, 156.4 days for the lithium group, and 186.9 days for the placebo group. The hazard of relapse was significantly lower with fluoxetine compared with lithium, and the estimated hazard of relapse with lithium was 2.5 times greater than with fluoxetine. There were no statistically significant or clinically meaningful differences in hypomanic symptoms among treatment groups over time. One patient taking fluoxetine and one patient taking placebo discontinued treatment because of hypomania.
CONCLUSIONS:
These findings suggest that long-term fluoxetine monotherapy may provide superior relapse-prevention benefit relative to lithium monotherapy after recovery from bipolar II major depressive episode without an increase in hypomanic mood conversion episodes.
Estes resultados sugerem que a monoterapia fluoxetina a longo prazo pode fornecer superior de benefício de prevenção de recaída em relação à monoterapia com lítio após a recuperação da II episódio depressivo bipolar sem um aumento nos episódios de conversão de humor hipomania.
Br J Psychiatry. 2013 Apr;202(4):301-6. doi: 10.1192/bjp.bp.111.104711. Epub 2012 Oct 25.
Efficacy and mood conversion rate during long-term fluoxetine v. lithium monotherapy in rapid- and non-rapid-cycling bipolar II disorder.
Amsterdam JD, Luo L, Shults J.
Source
Depression Research Unit, University of Pennsylvania School of Medicine, Philadelphia, PA, USA. jamsterd@mail.med.upenn.edu
Abstract
BACKGROUND:
Controversy exists over antidepressant use in rapid-cycling bipolar disorder.
AIMS:
Exploratory analysis of safety and efficacy of fluoxetine v. lithium monotherapy in individuals with rapid- v. non-rapid-cycling bipolar II disorder.
METHOD:
Randomised, double-blind, placebo-controlled comparison of fluoxetine v. lithium monotherapy in patients initially stabilised on fluoxetine monotherapy (trial registration NCT00044616).
RESULTS:
The proportion of participants with depressive relapse was similar between the rapid- and non-rapid-cycling groups (P = 0.20). The odds of relapse were similar between groups (P = 0.36). The hazard of relapse was similar between groups (hazard ratio 0.87, 95% CI 0.40-1.91). Change in mania rating scores was similar between groups (P = 0.86). There was no difference between groups in the rate of syndromal (P = 0.27) or subsyndromal (P = 0.82) hypomania.
CONCLUSIONS:
Depressive relapse and treatment-emergent mood conversion episode rates were similar for lithium and fluoxetine monotherapy and placebo during long-term, relapse-prevention therapy of rapid- and non-rapid-cycling bipolar II disorder.