Módulos do Curso
RELAÇÕES INTERPESSOAIS INTELIGENTES
-
INTELIGÊNCIA EMOCIONAL
- INTRAPESSOAL E INTERPESSOAL
- Aula Virtual 1 - APRESENTAÇÃO (português)
- Aula Virtual 1 - APRESENTÇÃO (inglês)
- Aula Virtual 1 - APRESENTAÇÃO (italiano)
- OBSERVAR O OLHAR E A IMAGINAÇÃO
- ESCUTAR
- CALAR
- PONTO EM COMUM
- RELAÇÃO PESSOA-PESSOA
- FRANQUEZA VERSUS TRANSPARÊNCIA
- Aula Virtual 2 - TÉCNICAS DE COMUNICAÇÃO (inglês)
- Aula Virtual 2 - TÉCNICAS DE COMUNICAÇÃO (italiano)
- PALAVRAS CERTAS
- COMPORTAMENTO GENÉTICO
- VIVÊNCIAS E APRENDIZADO
- OLHAR-SE NO ESPELHO
- SEMELHANTE MAS DIFERENTE
- Aula Virtual 3 - APROXIMAÇÃO X DISTANCIAMENTO (italiano)
- EXERCÍCIO - AVALIANDO AS RELAÇÕES
- EXERCÍCIO - MAPEANDO A INTELIGÊNCIA DO MEIO
- Aula virtual 3 - APROXIMAÇÃO VERSUS DISTANCIAMENTE (inglês)
- PERSONALIDADE
- MATURIDADE
- DEFEITOS HUMANOS
- QUALIDADES HUMANAS
- ÉTICA E MORAL
INTRAPESSOAL E INTERPESSOAL
Sei que as introduções teóricas são chatas. Como não podemos fugir delas, serei o mais sucinto possível. Você pode pular este tópico!!! Começar já pelo seguinte.
A inteligência é uma das dez funções mentais. As outras são atenção, sensopercepção, memória, orientação, consciência, pensamento, linguagem, afeto e conduta.
A inteligência é a capacidade de aproveitar a sua própria experiência prévia para resolver problemas, superar obstáculos e alcançar seus objetivos. Tal capacidade não nasce totalmente pronta. É aprendida e desenvolvida.
Antigamente, avaliava-se a inteligência de uma pessoa apenas por suas capacidades cognitivas, intelectuais. Os testes de QI relacionavam a idade cronológica com a idade intelectual.
Causou surpresa a constatação de que muitos dos indivíduos portadores de alto QI não revelavam bom desempenho em suas atividades. Os considerados inteligentes não eram inteligentes? David McCelland, professor em Harvard, sugeriu nos anos setenta ser mais eficaz testar a competência do que a inteligência, chamando a atenção para a importância de outras habilidades, incluindo a empatia, a iniciativa e a autodisciplina (NOTA 2).
A denominação “inteligência emocional” foi introduzida no início dos anos noventa por Peter Salovey e John Mayer, que a descreveram como um tipo de inteligência social que envolve a habilidade para monitorar suas próprias emoções e as dos outros, para discriminá-las e para usar esse conhecimento como guia no seu pensar e no seu agir (NOTA 3).
Na psiquiatria, está questão já era conhecida. Desde a década de 1970 existe a Psicoterapia Interpessoal criada sob a liderança de Gerald Klerman. Entre suas atribuições está exatamente o desenvolvimento de habilidades para bem se relacionar. Pratico-a em meu consultório há cerca de vinte anos. No Brasil, se destacam na sua divulgação, entre outros, os colegas Marcelo Feijó de Mello e Sidney Schestatsky.
Entretanto, o tema ganhou popularidade com a publicação em 1995, por Daniel Goleman, do best-seller Emotional intelligence, sugerindo cinco qualidades da inteligência emocional: 1. conhecimento de suas próprias emoções; 2. habilidade para manejar suas próprias emoções em situações difíceis; 3. capacidade para se motivar; 4. habilidade para reconhecer as emoções das outras pessoas; 5. habilidades interpessoais (NOTA 4).
Também foi importante a expressão “inteligências múltiplas”, sugerida por Howard Gardner (NOTA 5).
A função mental inteligência passou a ser subdividida e, para fins didáticos e de pesquisa, estudada em sete ou até mesmo em mais áreas. As sete principais inteligências são: 1. Lógico/matemática; 2. Visual/espacial; 3. Verbal ou lingüística; 4. Musical; 5. Cinestética corporal ou esportiva; 6. Interpessoal; 7. Intrapessoal.
A inteligência emocional engloba a interpessoal (também chamada de social), e a intrapessoal (também chamada de inteligência pessoal). A primeira delas, como diz o nome, refere-se à capacidade de se relacionar com as pessoas e a segunda, consigo mesmo.
Alguns testes foram elaborados e outros estão sendo avaliados visando medir o QE (quociente de inteligência emocional). Os primeiros foram voltados para o desenvolvimento organizacional de empresas, não para habilidades pessoais. Assim o fez Golemam em 1995. Em 1997, Bar-On publicou o EQ-I: Emotional Intelligence Inventory (NOTA 6).
Posteriormente, Mayer, Caruso, Salovey e outros passaram a desenvolver testes voltados para as habilidades pessoais (NOTA 7).
Também estão sendo desenvolvidos testes específicos para determinadas profissões, como administração de empresas, medicina e outras. No futuro, quem quiser ingressar numa atividade profissional que implique a relação com pessoas terá de alcançar um bom escore nesses testes (NOTA 8).
Se somos “inteligentes” em relação aos outros, é provável que o sejamos em relação a nós mesmos. E vice-versa. Mas nem sempre é assim. Há pessoas, por exemplo, que lidam melhor com os outros do que com elas mesmas.
A inteligência emocional requer, portanto, um duplo “olhar”: para o outro que está a meu lado e para mim mesmo. Dos itens que vamos examinar a seguir, alguns são mais pertinentes à inteligência interpessoal e outros, à intrapessoal.
Descrevo habilidades não complexas, mas de utilidade prática, como saber ouvir, calar, exercitar a empatia, saber que não sabe etc.
Mas chega de teoria, vamos ao conhecimento prático.
NOTA 2 - Sugiro a leitura do artigo MacCelland D.C. Testing for Competence Rather than Inteligence. American Pwycologist, 43, 1973.
NOTA 3 - Para conhecer o tema "inteligência emocional" desde seus primeiros estudos, leia: (a) Salovey P, Mayer JD. Emotional intelligence. Imagination, Cognition, and Personality. 1990; 9:185-211; (b) Mayer JD, Salovey P. The intelligence of emotional intelligence. Intelligence. 1993;17:433-42.
NOTA 4 - Goleman D. Emotional intelligence. New York: Bantam Books, 1995.
NOTA 5 - Gardner H. Multiple intelligences: the theory in practice. New York: Basic Books, 1993.
NOTA 6 - Bar-On, R. The Emotional Intelligence Inventory (EQ-I): Technical manual. Toronto, Canada: Multi-Health Systems, Inc. 1997.
NOTA 7 - O(I) Mayer JD, Caruso DR, Salovey P. Emotional intelligence meets traditional standarts for an intelligence. Intelligence. 27, 267-298, 1999. (II). Mayer JD, Caruso DR, Salovey P. Mayer-Caruso-Salovey Emotional Intelligence Test (MSCEIT) User’s Manual. Toronto, Canadá: MHS Publishers. (III) Mayer JD, Caruso DR, Salovey P, Sitaraneos G. Emotional intelligence as a standard intelligence. Emotion. 1, 232-242, 2001. (IV) Mayer JD, Caruso DR, Salovey P, Sitaraneos G. Measuring emotional intelligence with the MSCEIT V2.0. Emotion. 3, 97-105, 2003. Leia mais: www.eiconsortium.org North-Eastern Ohio Universities College of Medicine, por exemplo, um consórcio de três universidades (Kent State UniversitY, the University of Akron e Youngstown State University), desenvolve o EI Instrument, que visa avaliar maturidade, compaixão, moralidade, sociabilidade e temperamento calmo dos candidatos ao ingresso na faculdade de medicina. Para mais informações sobre o teste, contate o Departamento de Sociologia da Kent State University e fale com Stantford W. Gregory Jr.
NOTA 8 - Duas faculdades de medicina da Holanda submeteram seus programas à avaliação comparativa: Maastricht e Leiden.
Em Maastricht o ensino se faz através de um laboratório de habilidades (Skillslab). O currículo da faculdade é do tipo baseado em problemas (PBL) e oferece um programa de treinamento de habilidades integrado e permanente tanto nos quatro anos iniciais como nos dois anos de estágio. Já em Leiden o ensino é feito em cursos concentrados. Mesmo usando os mesmos métodos e tempo similar de ensino, o ensino integrado e permanente provocou melhores resultados. O ensino em ambas as faculdades se faz em pequenos grupos de dez alunos, com simulações entre os participantes e com a simulação de entrevistas específicas. Na avaliação dos acadêmicos das duas faculdades holandesas utilizaram-se, entre outros, casos de hipotireoidismo, gravidez com hipertensão e reduzido desenvolvimento fetal, adenocarcinoma de próstata. Na avaliação levaram-se em conta: 1. a clarificação da exata razão da vinda do paciente ao médico; 2. a tomada da história e sua descrição; 3. a “negociação” dos procedimentos necessários com o paciente; 4. a capacidade de amenizar más notícias. Leia mais em: Van Dalen J, Kerkhofs E, Van Knippenberg, Van Den Bert BW, Van Den Hout H, Scherpbier AJA, Van Der Vleuten COM. Longitudinal and concentrate communication skills programes: two dutch medical schools compared. Advances in Health Sciences Education. 7:29-40, 2002.
Aula Virtual 1 - APRESENTAÇÃO (português)
Aula Virtual 1 - APRESENTÇÃO (inglês)
Aula Virtual 1 - APRESENTAÇÃO (italiano)
OBSERVAR O OLHAR E A IMAGINAÇÃO
Ivan Petrvich Pavlov (1849-1936), fisiologista russo, Prêmio Nobel em 1904, conhecido pelos estudos sobre os reflexos condicionados e sua aplicação na psiquiatria, mandou escrever em letras garrafais em seu laboratório de pesquisa: “Observação, observação e mais observação”. Ele mesmo engolia pedaços de carne amarradas a um barbante. Depois de algumas horas, puxava para fora e observava o que os sucos gástricos haviam feito àquele alimento.
Pavlov estava certo: tudo começa pela observação. Caso contrário, estamos a lidar apenas com a nossa imaginação.
A propósito, é importante observar a imaginação de quem está ao nosso lado e a nossa própria. E que se saiba discriminar uma da outra. Um pai me disse que ajudou seu filho adulto jovem na escolha profissional ao observar e distinguir a sua imaginação da do filho. Perguntou-se: “Passados quinze anos, como eu, pai, imagino que estará a vida de meu filho? Passados quinze anos, como ele, meu filho, imagina que estará sua própria vida?” A imaginação que o filho fazia passou a ser o caminho, o norte, a orientá-lo na decisão da escolha profissional.
Luciano se disse pego de surpresa quando sua mulher um dia lhe comunicou: “Nosso casamento acabou, não sinto mais nada por ti”. Refutando seu aparentemente justificado espanto, comentou ela: “Você não observa o que se passa à tua volta”. Barba por fazer, olhar parado, esparramado na poltrona à minha frente, Luciano suspira: “Que chato ter de memorizar o dia do aniversário dela... a data do casamento...” Esfregou várias vezes a mão no rosto como quem tenta acordar: “Ela continuava a lembrar a data de meu aniversário e a do nosso casamento. Doutor, qual coisa eu deveria de ter observado que me faria perceber seu desamor por mim?” Respondo de pronto: “O olhar”.Sim, o olhar revela. É difícil um casal que namora às escondidas não se delatar quando juntos num mesmo grupo. Basta que um dos presentes observe o olhar de procura de um pelo outro, o olhar de desejo de um para com o outro...
Você que está me lendo, já observou com que olhos as pessoas com quem convive estão a se olhar? Ao se aproximar de um grupo novo na faculdade, no trabalho, numa festa, você observa como eles se olham? Você faz esse “mapeamento” das relações? Percebe algum olhar de soslaio dirigido a você?
Aprenderemos nos outros módulos a importância da observação qualificada, da observação de quem deixou de ser leigo no assunto. Da observação dos traços de personalidade, do nível de maturidade, dos defeitos humanos, das qualidades humanas e da ética e da moral.
Para ser bom observador, não há que se ter pressa.
O mundo acelerou! As relações apressaram, são curtas, rápidas. Porém, temos de nos esforçar para ir contra a maré. "Devagar que eu tenho pressa!" Nunca esqueci a frase que repetia o pai de um colega de faculdade para ele enquanto viajavamos de automovel. "Vá devagar - dizia ele para o filho - porque eu tenho presssa em chegar lá". Desapressar!
Para se observar com calma e interesse, é necessário SABER QUE NÃO SABE.
Repito para mim com muita freqüência o ensinamento de Confúcio: “Quando não sabes algo, o reconhecimento de que não o sabes é saber” (NOTA 9).
Como me foi importante tomar consciência desde cedo de que eu não sabia como lidar e de que eu nem tinha idéia de quem eram e de como funcionavam as pessoas humanas. Doutor, o senhor sabe quem é seu paciente? E você sabe quem é seu namorado? Sua sogra? Seu irmão? Seu sócio? Seu chefe? E quem é você?
Portanto, a inteligência para bem se relacionar com os outros e consigo mesmo principia com o primeiro saber: o de que não sabemos.
Revela inteligência emocional quem, antes de tudo:
1. Sabe que não sabe.
NOTA 9 - Confúcio (551-479) sábia da provincia chinese de Lu.
Revela inteligência emocional quem:
1. Sabe que não sabe.
2. Sabe desapressar
3. Sabe observar.
ESCUTAR
Dr. Telmo, meu pediatra, sentava-se numa cadeira de couro ao lado de minha cama e me escutava. Escutava minha mãe. Escutava a quem mais estivesse presente. Por vezes, meu pai, minha avó, algum de meus irmãos, a cozinheira. Escutava sem pressa. Depois, com voz compassada apontava um caminho.
Certo dia, o dr. Telmo atendeu um irmão meu, olhou para mim e disse: “Pega teu travesseiro e venha te deitar, amanhã você estará doente como ele”. Obedeci faceiro. Como é bom ser doente! Quanta atenção! E não é que amanheci com rubéola?!
Das pessoas que visitavam minha casa de infância, a voz era quem adentrava primeiro. Apenas a do Dr. Telmo chegava depois. Homem inteligente, pois quando falava dizia coisas irrefutáveis. Concluiu que eu iria acordar com manchas vermelhas no rosto e acertou na mosca.
A propósito, nos Estados Unidos, são mais processados os médicos que não ouvem os pacientes (NOTA 11).
Sei que não exponho novidade. Plutarco escreveu que muitos lugares e partes do corpo proporcionam ao vício a possibilidade de apoderar-se do indivíduo, mas, para a virtude, os ouvidos são a única porta de entrada. Plutarco dedicou a um jovem que entrava na vida adulta um texto alertando-o para a importância de ouvir. A obra Como ouvir foi escrita no ano 100 d.C. Sim, há mais de mil e novecentos anos! Plutarco (46-120 d.C), filósofo grego nascido na Queronéia, na Beócia, educou-se em Atenas e residiu em Roma, onde deixou renome pelas conferências que realizou. Mais tarde, regressou à Grécia e, em Atenas, foi eleito arconte. Entre outros, escreveu Vidas paralelas de homens ilustres, gregos e romanos: quarenta e nove biografias, ricas de informes anedóticos e inspiradas num alto senso de apreciação moral. É livro básico para o estudo da Antigüidade clássica. Em Plutarco, encontramos as passagens: “(...) muitos lugares e partes do corpo proporcionam ao vício a possibilidade de apoderar-se da alma, atingida por eles. Mas, para a virtude, os ouvidos dos jovens são o único meio de conquistar a sua alma, se esta for pura, e se conservar, desde o princípio, inflexível à adulação e inacessível às palavras licenciosas” (p.7) “Na ocasião em que tomas a toga viril, Nicandro, já independente dos teus primeiros preceptores, eu te envio por escrito a dissertação que fiz sobre o modo de ouvir, para saberes ouvir convenientemente as pessoas desejosas de te persuadir. Pois a ausência de autoridade, a qual certos jovens, por carência de instrução, julgam ser liberdade, constitui os desejos, como que libertos de suas amarras, déspotas mais duros do que os mestres das crianças e os pedagogos; e assim como afirma Heródoto que as mulheres, ao despirem-se do vestido, despem-se também da vergonha, igualmente alguns jovens, depondo a vestidura pueril, abandonam juntamente a vergonha e o temor; tirando a roupa que lhes impunha um caráter, logo se enchem de desregramento. (...) ...a passagem da meninice para a idade viril não consiste, para os sensatos, em substrair-se à autoridade, mas na mudança de líder: em vez de ter como guia um assalariado ou um escravo comprado a dinheiro, eles tomam a razão como condutor divino da vida. Somente aqueles que a seguem merecem ser considerados livres. Pois são os únicos que, tendo aprendido a desejar o que se deve, vivem como desejam...”(p.3-5) (NOTA 12).
Para escutar, é óbvio, necessário se faz que o outro fale. Nas aulas de relação médico-paciente, os alunos aprendem a estimular os pacientes a exporem seus pensamentos e sentimentos. De que forma? Apenas deixando a própria fala para depois. “Doutor, esta dor que sinto no peito pode estar sendo causada por que tipo de problema?” “Ainda não sei lhe responder. Preciso que a senhora me fale mais”. “Sempre que fico nervosa a dor piora”. “Nervosa?” “Algumas coisas me deixam nervosa”. “Ultimamente, o que a vem deixando nervosa?” “Meu filho passou a viajar...”
E quantas brigas evitamos se deixamos a outra pessoa falar, falar e falar? Há pessoas que, enquanto estamos a narrar, concentram-se na elaboração de mais um argumento. Não prestam atenção quando a voz que se ouve no ambiente não é a própria voz.
Há que se ter perspicácia ao escutar. “Professor, eu gosto de ser chamado a atender os pacientes nas noites em que faço plantão no hospital. Mas eu não gosto quando sou chamado para escutar bobagens”, queixa-se um bom aluno do sexto ano de medicina com a concordância de seus colegas. Afasto minha cadeira tentando escapar da réstia de sol que perpassa a vidraça naquele final de dia: “Conte-me alguma das bobagens que você escuta?” “Noite passada fui chamado para atender uma senhora que não conseguia dormir. Disse-me ela que não se adaptara ao travesseiro do hospital. E passou a me falar um monte de bobagens sobre travesseiros. Travesseiros de pena de ganso! O senhor já escutou alguém descrevendo um travesseiro de pena de ganso às três da madrugada?”
Na aula seguinte, meu aluno revelou como pusera em prática a constatação de que, por trás de toda a bobagem, há algo que dói. “Escute-a além dos travesseiros, das penas e dos gansos”, orientara-o com humor. “Professor, descobri: a paciente sofre de uma solidão de dar dó. A solidão de uma mulher que, aparentemente, está bem casada, tem bons filhos, uma vida confortável. Mas ninguém a escuta. Professor, eu já senti algo parecido. Quando me mudei para esta cidade, ao iniciar a faculdade, aparentemente minha vida estava ótima. Passara no vestibular, objetivo alcançado, apartamento só para mim... Mas, nos primeiros tempos, as relações eram superficiais. Tipo: ‘bom dia’, ‘vai chover de novo’. Não havia quem quisesse realmente me ouvir”. Enfim, quando a escuta é qualificada, as “bobagens” são portas de entrada... O aluno descobriu, assim agindo, a verdadeira dor daquela paciente. Se a solidão não é trazida ao atendimento médico, como vai haver melhora? Quem sabe não seria essa a causa principal de sua internação?
Mas há limites na escuta. Um cirurgião, meu amigo, recebe na emergência um homem que acabara de sair de uma briga com quatro balas no corpo. Enquanto acompanha apressado a maca que leva o ferido ao bloco cirúrgico, ouve o aflito pedido: “Doutor, quero lhe contar um segredo. Uma coisa que fiz. Não quero morrer sem desabafar”. “A mim não conte!” exclama meu amigo. “Vou chamar o padre”, completa. E se ele sobrevivesse, como sobreviveu, o cirurgião sabedor de tal segredo não viraria um arquivo? Um arquivo morto?
Há coisas que devemos não querer escutar, mas são elas a exceção.
Curiosidade minha: será que o padre escutou?
Revela inteligência emocional quem:
1. Sabe que não sabe.
2. Sabe desapressar.
3. Sabe observar.
4. Sabe escutar.
NOTA 11 - Levinson, Wendy e colaboradores. Physician-Patient Communication: The Relationship with Malpractive Claims Among Primary Care Physicians and Surgeons. Journal of the American Medical Association. 19, fev, 1997.
NOTA 12 - Como ouvir, Martins Fontes. 2003.
CALAR
No Mato Grosso, antigamente, quando precisavam passar o gado através de um rio infestado por piranhas, deixavam que um boi fosse na frente. Enquanto as piranhas todas devoravam o apressadinho, "o boi de piranha", o restante atravessava com tranqüilidade.
Certa vez, um amigo que mora muito longe passou três dias em minha casa. Sabia que ele não tinha o hábito de escutar, que falava muito, mas não imaginava que fosse tanto. Nesses três dias, praticamente só ele falou. Meu filho mais novo, no período, não emitiu uma só palavra. Nenhuma. Dias depois, sua esposa me telefonou se queixando: “Meu marido não soube contar nada de vocês. Até fiquei desconfiada: ele esteve mesmo aí?”
Em reuniões, quem fala por primeiro “leva chumbo”. Quem fala por último consegue tempo para captar a opinião consensual e para formar em seu interior frases bem articuladas. Suas colocações são consideradas brilhantes.
Sei de um político que conseguiu a indicação de seu partido para se candidatar a senador utilizando apenas a técnica de nunca falar por primeiro nas reuniões internas. Quando se manifestava, conseguia em suas colocações expressar a síntese da opinião dos seus companheiros de sigla. Conclusão: era o líder. Líder de fato e, em conseqüência, o candidato natural.
Saber a hora de falar requer que saibamos calar. Em 1771, um livro foi escrito por Dinouart com o sugestivo título A arte de calar (NOTA 13).
Contra a febre de falar e falar é necessário que se cultive o “tempo do silêncio”. O silêncio pode ser mais que um simples silêncio. Pode ser uma maneira de fazer alguma coisa aos outros. Quando o orador emocionado faz silêncio, mantém em suspenso a alma de todos nós, seus ouvintes, e prepara-nos para bem receber a seqüência de sua fala. Esse silêncio faz parte de seu “jeito de dizer”, que, por sua vez, nada mais é que o esmerado produto final de uma elevada habilidade interpessoal.
Revela inteligência emocional quem:
1. Sabe que não sabe.
2. Sabe desapressar.
3. Sabe observar.
4. Sabe escutar.
5. Sabe calar.
NOTA 13 - Dinouart A. A arte de calar. Martins Fontes, 2002.
PONTO EM COMUM
Há pessoas que procuram um ponto de discórdia. E encontram. É tarefa fácil. Afinal, somos seres que fizemos trajetórias únicas, diferentes das dos demais. Portanto, temos necessariamente visões diferentes em variadas coisas. Em contrapartida, também não é difícil encontrarmos pontos em comum. Afinal, somos todos exemplares da mesma espécie viva. Basta querer. E não importa a diferença de idade.
Meu avô e eu conversávamos todos os dias na área envidraçada de sua casa sobre viagens imaginárias. Minha imaginação era pequena como eu, mas o tema nos unia tanto que só acidente com passarinho nos apartava. Pardais descuidados se chocavam contra as vidraças e tínhamos de reanimá-los. Meu avô sempre gostara de viajar pelo desconhecido. Morara em Paris no início do século vinte. Quem sabe enquanto dialogava comigo estava a imaginar como seria a grande viagem que logo faria para o “outro mundo”. Tínhamos exatos setenta anos de diferença e, mesmo assim, nossos encontros eram estimulantes para nós dois. Compartilhávamos um ponto comum. Não o seriam se eu ficasse a falar sobre minhas disputas de futebol no colégio e ele, sobre o PIB do Brasil comparado ao da França.
Nos Estados Unidos existem mais de dez mil religiosos regulamentados na função de visitar os doentes hospitalizados. Eles são capazes de dar conforto ao sofrimento de pessoas com religiões diferentes das suas. A propósito, vale reler a Carta Pastoral de Paulo VI, do Concílio Vaticano II, do ano de 1965. “O respeito e o amor devem se estender também àqueles que pensam e operam diferentemente de nós nas coisas sociais, políticas e até mesmo religiosas, pois com quanto mais humanidade e amor entrarmos em seu modo de sentir, tão mais facilmente poderemos iniciar com eles um diálogo” (NOTA 15).
Um pastor pode consolar um agnóstico e até mesmo um ateu hospitalizado. Deixando de lado as diferenças conceituais, ambos, naquele momento, estão voltados para a busca de um alívio no sofrimento da doença, comungam o mesmo sentimento. Ambos estão, naquele momento, interessados em refletir sobre a condição humana.
Se respeitarmos as diferenças, se não quisermos acabar com elas enquadrando os demais na nossa crença, teremos mais facilidade para encontrar um ponto em comum e iniciar um diálogo. Tal tarefa será facilitada se duvidarmos de nossas verdades. John Dewey (1859-1952), um dos mais importantes filósofos da América, criticou a noção tradicional de “verdade”. Para a maioria dos filósofos a verdade era a verdade. Ou seja, era concebida como pronta, acabada, perfeita, final, eterna. Para Dewey, a verdade depende do estágio de evolução do ser humano. Cada fragmento de conhecimento adquirido altera um pouco a noção de verdade. A verdade de hoje não será a verdade de amanhã (NOTA 16).
A mim agradam as palavras prudentes de Niels Bohr: “Tudo o que digo deve ser entendido não como uma afirmação, mas como uma pergunta”.
Revela inteligência emocional quem:
1. Sabe que não sabe.
2. Sabe desapressar.
3. Sabe observar.
4. Sabe escutar.
5. Sabe calar.
6. Sabe ser empático (veremos na seqüência).
7. Sabe descobrir os pontos comuns.
NOTA 15 - Carta Pastoral de Paulo VI. Concílio Vaticano II. 1965. Pesquise em: www.vatican.va
NOTA 16 - Além de ter sido um influente filósofo, Dewey também é reconhecido como um educador revolucionário. Em seu tempo, o ensino se fazia pela “pedagogia” da imposição de conteúdos através da disciplina e da punição. Dewey propôs que a educação das crianças deveria basear-se na abordagem de solução de problemas; que elas deveriam ser estimuladas a pensar e a aprender fazendo e, mais ainda, a serem imaginativas.
RELAÇÃO PESSOA-PESSOA
SABER SER EMPÁTICO. De propósito, já escrevemos na lista como número 6 - SABER SER EMPÁTICO.
Um professor faz a chamada correndo e dá início à primeira aula. Outro professor, primeiro se apresenta, conta coisas do seu dia-a-dia e descreve como foi que a vida o levou para aquela profissão e para aquela disciplina. Depois, faz a chamada pedindo que cada aluno conte um pouco de sua história.
Você já se encontrou com um político apressado? Enquanto fala com você ele já está buscando outro com o olhar. Vai ao encontro desse outro já de olho num terceiro. Ele prioriza a busca de votos, não a relação.
Há profissionais que estão preocupados com a tarefa que desempenham, não com a pessoa que estão a atender. Um médico chega à cabeceira de sua cama, olha a papeleta, examina seu órgão doente, prescreve e vai embora, numa relação impessoal. Outro médico senta-se ao lado de sua cama, quer conhecê-lo e se dar a conhecer. Depois, só depois, olha a papeleta e examina seu corpo. Pratica o que chamamos de “medicina da pessoa”.
Em “O corpo do senhor Olmedo ou um corpo desaparece”, o contista e cirurgião uruguaio Juvenal Botto descreve magistralmente a atuação de um médico interessado na tarefa, não no doente (NOTA 17).
Um médico de “elevado tecnicismo” começa a amputar partes do corpo do Sr. Olmedo, doente de uma enfermidade expansiva e crônica. Primeiro, amputa-lhe o pé esquerdo. Depois, mais partes de seus membros inferiores. Sempre com uma grande precisão técnica. Ao correr do longo processo de tratamento, acaba conhecendo e tendo um caso amoroso com a esposa do Sr. Olmedo: “Num café, a pouca distância do hospital, tivemos ela e eu muitas horas ausentes para os demais, que foram nossas...”(p.29) As amputações chegam ao absurdo: “... em poucos minutos, seccionei-o a alguns centímetros abaixo da cintura”. (...) “Sobreviveu vários dias. Fiz várias fotos dele para documentar o caso cirúrgico”. (...) “Mostram-no em atitude de erguer-se no leito, apoiado sobre seus braços. Nu. O tórax e os braços. O que lhe restou”. (...) “A última vez em que o vi, foi uma visão dramática... sobre a mesa do necrotério”(...) “Após poucos dias da operação, houve um erro de cálculo na quantidade de soros que se estavam administrando...; porém, isso não muda em nada os resultados cirúrgicos”. (p.34-35). Afinal, a cirurgia foi um êxito e foi bem documentada.
Juvenal Botto põe diante de nossos olhos exemplo maior de contra-senso e de insensatez. A prioridade deve ser a relação, não a tarefa. Exercício de inteligência emocional: observar se no trabalho, por vezes, não priorizamos os “resultados cirúrgicos”.
Para ocorrer uma boa relação é necessário possuir a capacidade de empatia. A - Empatia cognitiva: eu percebo sempre a existencia dos outros, levo isso sempre em conta, consigo entender que o outro faz uma leitura da vida do seu próprio angulo de visão e não da minha; B - Empatia afetiva: sinto o que o outro sente; tristeza empática, alegria empática; C - Empatia compassiva: não só sinto o que o outro sente, mas tenho vontade de agir, de fazer algo por ele.
Revela inteligência emocional quem:
1. Sabe que não sabe.
2. Sabe desapressar.
3. Sabe observar.
4. Sabe escutar.
5. Sabe calar.
6. Sabe ser empático.
7. Sabe descobrir os pontos comuns.
8. Sabe dar prioridade à relação pessoa-pessoa.
NOTA 17 - Botto J, Curbelo M. Cuentos desmixtificantes. Grippoli. (tradução livre)
FRANQUEZA VERSUS TRANSPARÊNCIA
O Transtorno Obsessivo-Compulsivo leva o paciente a apresentar alterações na função pensamento e na função conduta. No pensamento, em seu conteúdo, surgem idéias obsessivas: idéias que vêm à mente de forma repetitiva, contra a vontade da pessoa; idéias que ela considera absurda, mas que não consegue repelir em definitivo. Na conduta surgem as compulsões, rituais que o indivíduo julga sem sentido, mas que se sente impelido a repetir, pois, se não o fizer, teme que alguma coisa ruim possa lhe acontecer. O namorado apresenta a idéia obsessiva de que irá estrangular a namorada.
Na troca de carícias, quando ele vê o pescoço da namorada, a idéia obsessiva volta a atormentá-lo. Ela não corre risco, ele jamais fará isso, nunca passará de uma tortura mental que desaparecerá com o adequado tratamento. Aliás, quando ele viaja de automóvel é afligido por outra idéia obsessiva sempre que se aproxima de uma ponte: irá jogar o carro por sobre a amurada e mergulhar no rio.
Pois bem, o namorado deve ser transparente e contar à namorada? “Você está vendo aquela ponte? Eu estou com a idéia de jogar o carro... Você está vendo aquela outra ponte...” Ou ainda: “Quando eu beijo o teu pescoço, repete-se em mim a idéia de que devo te estrangular”.
Ou aquele que apresenta uma compulsão, o ritual, por exemplo, de dar três pulos antes de entrar no elevador? Se não o fizer, o elevador vai despencar com ele dentro. Ele sabe que não, mas não adianta, a necessidade de dar os três pulos se impõe. Ele deve ser transparente e deixar que seus colegas de trabalho vejam-no dando os três pulos?
E nossos desejos não patológicos, desejos saudáveis? O namorado deve dizer para a namorada: “Aquela tua amiga... me dá uma tesão...” Ou é melhor ele guardar para si e omitir de revelar esta parte de seu mundo interior? A namorada, transparente, confessa ao namorado apaixonado: “Eu desejo ter experiências sexuais com mais alguns homens além de você”.
O namorado, com um preparo prévio, quem sabe até poderia ouvir sem se abalar os desejos de sua namorada: nossa espécie é desejante, porém nossa cultura e nossa moral é que vão decidir o que faremos com os desejos. Mas sem o amadurecimento da idéia, seremos pegos como se criança fôssemos diante do tema. Em Fausto, Goethe coloca na boca de um personagem a máxima: “O melhor do que sabeis não pode, afinal de contas, ser contado a meninos” (NOTA 18).
Alguns casais sofrem por não respeitarem tal limitação. Só poderão usufruir o lado bom do relacionamento se deixarem de ser transparentes.
Aconselhei João e Joana: “Você, João, não lerá mais o diário íntimo escrito na adolescência dela. E você, Joana, não perguntará mais com quantas mulheres ele já fez sexo. E não contará a ele que seu namorado anterior gostava de fazer sexo quando já estava desatremado de tanto beber vinho. Você, João, não dirá a ela o quanto era afeiçoado a determinada boneca inflável a ponto de nunca mais ter dirigido a palavra ao amigo que a furou com um garfo”.
Os médicos ginecologistas não fazem a revisão ginecológica de suas mulheres. As médicas proctologistas, segundo sei, não examinam seus maridos com o colonoscópio. Se você entrar no departamento de anatomia de uma faculdade de medicina observará um esqueleto com um fígado dependurado à esquerda de quem olha, um baço quase caindo à direita. Seu namorado é bem semelhante. A diferença é que você não vê. Fortunosamente, nosso corpo não é transparente, temos uma pele a esconder nossos músculos e nossos órgãos internos. Portanto, muitas vezes devemos dizer: “Não quero ver além da tua pele”.
Não é por nada que temos o pensamento como algo reservado e só nosso. A inteligência emocional ensina que sejamos francos, mas não a ponto de sermos transparentes.
Revela inteligência emocional quem:
1. Sabe que não sabe.
2. Sabe desapressar.
3. Sabe observar.
4. Sabe escutar.
5. Sabe calar.
6. Sabe ser empático.
7. Sabe descobrir os pontos comuns.
8. Sabe dar prioridade à relação pessoa-pessoa.
9. Sabe ser franco sem ser transparente.
NOTA 18 - Goethe. Fausto. Otto Pierre, Rio de Janeiro, 1980.
Aula Virtual 2 - TÉCNICAS DE COMUNICAÇÃO (inglês)
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PALAVRAS CERTAS
Contam muitas histórias sobre personagens da história, verdadeiras ou não. Numa delas, Stálin pergunta ao primeiro-secretário se ele tem idéia do significado do sonho que tivera naquela noite, no qual perdera todos os dentes menos um. O primeiro-secretário responde que Stálin iria perder todos os seus parentes, só sobraria ele. No minuto seguinte, o primeiro-secretário é embarcado rumo à Sibéria. O segundo-secretário, chamado a opinar, afirma seguro: Stálin viverá muito, muito, a tal ponto que sobreviverá a todos os seus parentes. No minuto seguinte, ele deixa de ser o segundo e passa a ser o primeiro-secretário.
O comandante recebe a triste notícia de que a mãe do soldado 151 acabara de falecer. Quem teria habilidade para avisar o jovem sem traumatizá-lo? Um sargento, especialista em dar notícia ruim, é convocado a entrar em ação e, imediatamente, reúne todo o pelotão em posição de sentido: “Atenção! Quem tem a mãe viva dê um passo para a frente. Você não 151, você não!”
Não se trata de anedota, eu presenciei um médico examinar a radiografia que mostrava a dimensão do tumor existente no pulmão de um paciente, virar-se e sentenciar em alto e bom som no posto de enfermagem junto à enfermaria do hospital: “Inoperável! Está morto e não sabe!”
As notícias ruins, é melhor que sejam dadas em conta-gotas. Sim, aos poucos, para dar tempo de o indivíduo assimilá-las sem se desestruturar.
Graciela apresenta um quadro de depressão paranóide. Não admite que a sensação de que está sendo enganada pelos familiares, de que a vida vai acabar em poucos dias e de que não há nada que se possa fazer, que isso tudo que sente e pensa possa ser uma doença curada com medicamentos. Dependendo das palavras utilizadas por mim, ela não tomará a medicação e poderá, até mesmo, chegar ao homicídio ou ao suicídio. “Você está doente, sim, e por isso precisa tomar os remédios”. Se ela ouvir de mim tais palavras, pensará: “Ele, assim como meus familiares, também está contra mim, também acha que eu estou louca”. Abandonará a consulta irada e seu quadro se agravará. Entretanto, se eu disser: “Graciela, você está enfrentando uma situação difícil. Está se sentindo muito pressionada. Precisa estar com o cérebro bem forte para superar tudo isso”, Graciela concordará que será bom para ela fortificar seu cérebro com determinados medicamentos. No caso, “fortificar o cérebro para enfrentar a situação difícil que enfrenta” são as palavras certas.
Ou seja, a palavra certa é aquela que, além de trazer em seu bojo a verdade, respeita as concepções de quem a ouve. Leva em conta que estamos diante de um ser humano que necessita preservar sua dignidade.
Já incluimos na lista o que mais adiante veremos: 10 - Ponto de aproximação versus distanciamento; 11 - O outro é nosso professor.
Revela inteligência emocional quem:
1. Sabe que não sabe.
2. Sabe desapressar.
3. Sabe observar.
4. Sabe escutar.
5. Sabe calar.
6. Sabe ser empático.
7. Sabe descobrir os pontos comuns.
8. Sabe dar prioridade à relação pessoa-pessoa.
9. Sabe ser franco sem ser transparente.
10. Sabe o ponto de aproximação-distanciamento.
11. Sabe que o outro em alguma coisa é professor.
12. Sabe as palavras certas.
COMPORTAMENTO GENÉTICO
Para bem desenvolver a inteligência intrapessoal necessitamos situar-nos em relação à espécie animal a que pertencemos. Até que ponto seu comportamento é decorrência das pressões evolutivas? Até que ponto a minha maneira de ser e de funcionar e a sua, prezado aluno, é determinada pelo passado da espécie?
O darwinismo vem sendo reativado pela sociobiologia com E. Wilson e, pela psicologia evolucionista, com Steven Pinker, entre outros (NOTA 20).
Vi na TV um chipanzé que mora com uma família, bem-vestido, comendo educadamente à mesa. No supermercado, empurra, cuidadoso, o carrinho das compras. Porém, há limitações em seu cérebro. Quando passa pelas frutas, subitamente se atira sobre as bananas e começa a comê-las. A educação some de repente, e some de todo. Os chipanzés aprendem, ensinados por pesquisadores, a apontar para a mão vazia para ganhar o objeto que está na outra mão erguida para o alto. Porém, quando se trata de bananas, eles não o conseguem. Esquecem o que aprenderam e ficam pulando tentando pegar a banana, não conseguem postergar o desejo por ela nem um segundo mais.
Herdamos traços neurobiológicos, assim como ocorre com outras espécies animais, que favorecem o aprendizado de certos comportamentos e que são denominados de “aprendizados facilitados pela genética”.
O “bicho” homem viveu mais de 99% de sua existência em condições bem diferentes das de hoje. Viveu nas florestas, nas matas, nas savanas; era um nômade, caçador e coletor de alimentos. Quando encontrava alimento, devia comer mais do que necessitava naquele momento, pois não sabia quando iria comer de novo. Somos descendentes daqueles que assim procederam, foram os que sobreviveram e deixaram filhos. Daí a tendência tão comum de comer desnecessariamente, além da conta, e engordar.
Ainda hoje, um dos medos que mais temos é das serpentes, apesar de nunca em nossas vidas urbana nos depararmos com elas. No entanto, é fácil para uma criança aprender a ter medo de cobra e difícil aprender a ter medo de correr de automóvel, de usar drogas, estes, sim, perigos bem atuais.
Continuamos sendo muito mais capazes de lembrar fisionomias do que nomes. O cérebro é um órgão que foi se construindo à medida que ia resolvendo problemas que apareciam ao longo da evolução. Na floresta era útil memorizar as fisionomias, pois precisávamos distinguir amigos e inimigos. Nomes na floresta? Não, guardar nomes é uma necessidade bem mais recente.
Uma dose de ousadia é útil, não há dúvida. Porém, temos facilidade em exagerar. Nossos antepassados necessitavam muito mais da ousadia do que nós. Nômades, a cada dia se deparavam com o desconhecido. Atravessar ou não o rio? Precisavam ousar ou morriam de fome e, é claro, também morriam muito por ousar. Muitos erros de julgamento que cometemos ao nos arriscarmos vêm desse fato. Continuamos gostando da “adrenalina”, especialmente quando adolescentes, fase em que necessitamos muito da ousadia para sair do ambiente bem conhecido da família e “atravessar o rio”.
A agressão é outro aprendizado geneticamente facilitado. Passamos o tempo todo ensinando nossas crianças a não se agredirem umas às outras e, no entanto, se não ficarmos permanentemente de olho nelas... E nós, adultos, com que facilidade ficamos brabos! A agressão era útil na mata, onde não havia a instituição policial e a judicial. Nos encontros na floresta, quem revelasse em gestos e em palavras que era capaz de agredir tinha mais chance de não ser molestado. Um homem se irritou com o fato de uma senhora de idade que dirigia um carro atrás do seu deixar pouco espaço entre ambos os veículos. Ao pararem numa sinaleira, engatou marcha a ré e jogou seu carro contra o dela. Ria ao contar aos conhecidos que a senhora de idade fora considerada culpada.
Então, uma amiga lhe perguntou: “Você sabe qual a semelhança entre um espermatozóide e um homem?” “Não”, respondeu ele. E ela: “A cada milhão apenas um consegue se tornar um ser humano”.
Hoje, é rara a situação em que uma atitude agressiva nos ajuda. Na maioria das vezes, a agressão nos prejudica. Perdemos em termos de vínculos, e a raiva acumulada pelos embates cotidianos nos leva a adoecer.
Nosso cérebro está adaptado a viver em grupos pequenos. Somente há bem pouco, quando o homo sapiens aprendeu a plantar e a criar animais, é que os grupos de convivência começaram a aumentar. Agora convivemos com bilhões de pessoas e acompanhamos seus sucessos e suas tragédias. Acreditam alguns que essa pressão é a responsável pelo aumento de certas doenças, como a depressão, por exemplo.
Há tendências comportamentais diferentes nos gêneros feminino e masculino. Na vida primitiva, para o macho deixar mais descendentes a melhor estratégia era ser promíscuo. Para as fêmeas, tal estratégia não ajudava porque elas não podiam gerar “centenas” de filhos. Com sorte, um por ano. Portanto, era mais útil manterem vínculos estáveis com parceiros que revelassem condições de ajudar na sobrevivência de pequenas proles. Para um gênero, a estratégia era a quantidade; para o outro, a qualidade.
Clark e Hatfield contrataram homens e mulheres atraentes para uma pesquisa sobre comportamento sexual (NOTA 21).
Eles se aproximavam de alguém do sexo oposto num campus universitário e diziam: “Tenho notado você aqui. Acho você muito atraente”. Em seguida, faziam as perguntas: 1. “Gostaria de sair comigo esta noite?”; 2. “Gostaria de ir a meu apartamento esta noite?”; 3. “Gostaria de ir para a cama comigo esta noite?” Nenhuma das mulheres consentiu em “ir para a cama esta noite”. Setenta e cinco por cento dos homens aceitaram a oferta de sexo naquela noite. Dos vinte e cinco por cento restantes, muitos se desculparam, estavam impedidos de ir por um ou outro motivo, mas pediram outra oportunidade.
O homem pensa em sexo mais do a mulher. Mas é fato que homem só pensa em sexo? Preocupado com o fato de o filho só falar em sexo, o pai leva-o a uma avaliação psicológica. O profissional mostra ao menino uma série de desenhos muito simples, um papel em branco com uma linha e pergunta o que lhe sugerem. Frente à linha na posição horizontal o menino diz: “Para mim o desenho sugere um casal transando numa cama”. A linha na posição vertical: “Um casal em pé transando contra a parede”. A linha na posição diagonal: “Um casal transando numa escada”. O profissional chama o pai e explica como o menino reagira. Mostra-lhe os traços verticais, horizontais e diagonais. O pai exclama de pronto: “Pudera! Com esse tio de desenho, é natural que o menino fique excitado!”
Nas agências de namoros, as mulheres lêem os formulários e os homens olham as fotos. Nos formulários elas verão a estabilidade, a confiabilidade e o poder do homem: qualidades necessárias de um companheiro útil à sobrevivência da pequena prole. Já os homens dão mais valor que as mulheres à juventude e à aparência bela: qual melhor garantia de boa saúde e, em conseqüência, de mais fertilidade e de melhores genes? Na época primitiva, não havia outro critério a se basear.
O que pensar disso tudo? Hoje, a conduta sexual dos homens impelida pela genética não é mais adaptativa. Ao contrário, para se adaptar, os “machos” de hoje precisam lutar contra tal imposição genética. Portanto, o aluno do sexo masculino deve se resignar. Há dentro dele um frustrado homem primitivo com um tacape na mão, um desejo de fazer sexo com quase todas as mulheres, o qual, vez por outra, quer dominar sua personalidade e lhe trazer grandes dificuldades de adaptação ao mundo de hoje.
A influência comportamental genética das mulheres no que se refere à sexualidade é mais adaptada. A frustração é menor. As mulheres frustram-se mais quando não encontram um companheiro estável. No filme Proposta indecente, Robert Redford oferece um milhão de dólares para uma mulher casada passar uma noite com ele (NOTA 22).
Não se espera que parta de uma mulher semelhante proposta. Ou seja, é generalizada a percepção de que o comportamento sexual de homens e de mulheres é diferente.
Dan Wasserman aproveita esse fato. Surpreende e provoca o riso com o cartum do casal que sai do cinema após assistir ao filme. O marido pergunta: “Você iria para a cama com Robert Redford por um milhão de dólares?” E ela: “Sim, mas teriam de esperar algum tempo até eu conseguir arranjar todo esse dinheiro”.
Revela inteligência quem admite: há um primata insatisfeito habitando meu interior, desadaptado aos tempos atuais, um “peixe fora d´água”.
Revela inteligência quem o reconhece e lida com ele; quem o tolera, o contém, o instrui e o coloca frente a interesses mais sofisticados que os seus desejos primitivos; quem o imerge em banhos de civilização. Mas cuidado, alguém já delatou: “A civilização não é senão uma camada de pintura que qualquer chuvinha lava”.
Revela inteligência emocional quem:
1. Sabe que não sabe.
2. Sabe desapressar.
3. Sabe observar.
4. Sabe escutar.
5. Sabe calar.
6. Sabe ser empático.
7. Sabe descobrir os pontos comuns.
8. Sabe dar prioridade à relação pessoa-pessoa.
9. Sabe ser franco sem ser transparente.
10. Sabe o ponto de aproximação-distanciamento.
11. Sabe que o outro em alguma coisa é professor.
12. Sabe as palavras certas.
13. Sabe da tendência genética para certos comportamentos.
NOTA 20 - Wilson, E. O. Da natureza humana. São Paulo: T. A. Queiroz Ed./Edusp, 1978. Leia-se também Dawkins sugerir que o corpo é tão-somente o veículo de transmissão dos genes: Dawkins, R. O gene egoísta. Belo Horizonte: Itatiaia, 1979; Steven Pinker. Como a mente funciona. Companhia das Letras. 1998. Steven Pinker é professor de psicologia e diretor do Centro de Neurociência Cognitiva do MIT. Cambridge. Massachusetts. Escreveu também Tabula rasa. Companhia das Letras, 2004.
NOTA 21 - Citado por Steven Pinker. Como a mente funciona. Companhia das Letras. 1998. p.483.
NOTA 22 - Título Original: Indecent Proposal (1993). Dirigido por Adrian Lyne. Com Robert Redford, Demi Moore e Woody Harrelson no elenco.
VIVÊNCIAS E APRENDIZADO
Se percorrermos a pospelo nossa história de vida, perceberemos o quanto somos as vozes que ouvíamos saídas da boca de nossa mãe, de nosso pai, de nossos irmãos, avós... Freud desenvolveu sua inteligência emocional, especialmente a intrapessoal, nos longos anos em que adotou a prática de sistematicamente observar seu próprio passado infantil. Esse processo foi a base para o desenvolvimento da complexa teoria psicanalítica (NOTA 23).
Os pais funcionam como provedores de afeto e tudo o mais que ainda não conseguimos por conta própria. E servem de modelos: como lidavam conosco? Como se relacionavam entre si? Como tratavam a si mesmos? São modelos que vamos adotar ou que vamos rejeitar. Todos poderíamos ter tido pais mais capazes de exercer a função paterna, assim como poderíamos ter tido pais menos capazes. De nada adiantará chorar leite derramado.
E, além do mais, somos também as vozes ouvidas na escola e na sociedade em que vivíamos. A ponto de questionar-se hoje se as vivências que mais nos formaram foram as experimentadas com os pais ou com os companheiros das turmas de colegas e de amigos que tivemos. É deles que provêm muitos de nossos hábitos. Desculpe, prezado aluno, a analogia: “Passarinho que voa com morcegos, dorme de cabeça para baixo”. Aliás, mesmo adultos, as pessoas continuam nos influenciando e muito. Há uma certa dose de verdade no provérbio: “Diga com quem andas e te direi quem és”.
Numa noite de verão, conversei com um psicólogo indiano num centro de psicoterapia. Ele se sentava na frente de uma grande janela envidraçada, de tal forma que em torno dele eu via as luminárias da cidade e o acende-apaga de uma peça publicitária que emitia intermitentemente fachos de luz azul. “Vou lhe dar uma lição sobre o que é diferença cultural”, assegurou ele. Com doutorado numa universidade americana, apresentávamos grandes semelhanças no que se refere ao conhecimento científico. Porém, como éramos diferentes! O casamento do indiano fora determinado pelo seu pai e pelo pai da sua noiva. Aliás, conheceu-a apenas um dia antes do casamento, por obra do acaso, porque ambos se encontraram no cartório aonde haviam ido com os pais acertar os papéis do casamento. “A diferença entre nós: acho certo casar assim”, esclareceu-me ele. “Acho um absurdo casar devido a um apaixonamento, formar uma família a partir de um sentimento irracional como vocês fazem”, complementou. “E vocês não se apaixonam?”, retruquei. “Quando este sentimento surge, procuramos eliminá-lo na raiz. Assim como fazemos como terapeutas quando principiamos a sentir alguma atração por uma paciente”.
O indiano e eu sofremos ambos a influência do passado genético de uma mesma espécie, tivemos pais que nos atenderam, porém fomos formados num meio cultural distinto. Acabamos resultando em pessoas bem diferentes. O colega indiano, cuja imagem chegou até meus olhos em meio a diversos pontos de luzes brancas sobrepujadas pelo azul ritmado da peça publicitária, clareou minha mente. A cultura nos estrutura tanto quanto nossos ossos e músculos!
Lembro-me da jovem japonesa que por obra do acaso conheci na Torre de Tóquio, há duzentos metros do chão, a me falar dos bons namoros que vivenciara nos anos em que vivera no Brasil: “Voltei para casar com um japonês. Para constituir uma boa família, devo procurar alguém de cultura semelhante à minha”.
As vivências e o aprendizado são determinantes, inclusive, na formação e na constante modificação de nossa inteligência. Jean Piaget, com base na observação cuidadosa de seus próprios filhos e de muitas outras crianças, concluiu que a inteligência não aumenta por acréscimo e, sim, por reorganização (NOTA 24).
O ser humano vai edificando estruturas mentais enquanto se relaciona e enquanto participa de um processo de aprendizado e vai fortalecendo a capacidade de operar em espaços cada vez mais amplos e em situações cada vez mais complexas. Enquanto houver integridade física, vai reconstruindo sua inteligência.
Portanto, sobre arcabouços biológicos herdados, as estruturas mentais vão se desenvolvendo influenciadas pelo meio. A inteligência será construída e reconstruída ao longo de toda a existência na dependência da qualidade do estímulo externo recebido.
Revela inteligência emocional quem:
1. Sabe que não sabe.
2. Sabe desapressar.
3. Sabe observar.
4. Sabe escutar.
5. Sabe calar.
6. Sabe ser empático.
7. Sabe descobrir os pontos comuns.
8. Sabe dar prioridade à relação pessoa-pessoa.
9. Sabe ser franco sem ser transparente.
10. Sabe o ponto de aproximação-distanciamento.
11. Sabe que o outro em alguma coisa é professor.
12. Sabe as palavras certas.
13. Sabe da tendência genética para certos comportamentos.
14. Sabe da influência das vivências e do aprendizado.
NOTA 23 - Sigmund Freud nasceu a 6 de maio de 1856 em Freiberg, que pertencia, na época, à Áustria, atualmente Pribor, na Tchecoslováquia. Seu pai, Jakob Freud, tinha 41 anos quando Freud nasceu e sua mãe, Amália Nathanson, 21. Em 1938 os nazistas invadiram a Áustria e revistaram a casa de Freud. O câncer no maxilar debilitava-o fisicamente. Freud foi obrigado a deixar Viena e se dirigir a Londres contra sua vontade. Contava, então, com 82 anos. Faleceu pouco depois, em 23 de setembro de 1939.
NOTA 24 - Jean Piaget nasceu em Neuchâtel, Suíça, em 1896, e faleceu em 1980. É interessante ler: (I) Piaget, Jean. (1936) O nascimento da inteligência na criança. 4. ed. Rio de Janeiro, Zahar, 1982; (II) Piaget, Jean & Gréco, Pierre. (1959) Aprendizagem e conhecimento. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1974; (III) Piaget, Jean. As formas elementares da dialética. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1996. Leia também: Maturama, Humberto. Da biologia à psicologia. Porto Alegre, Artes Médicas, 1998.
OLHAR-SE NO ESPELHO
Há pessoas que tem baixa empatia por elas mesmas.
Não se colocam no lugar dessa pessoa que é ela. Priorizam sempre os outros. Acabam a serviço dos outros.
Não se colocam na frente de um espelho. Não olham para si. Acabam tendo uma baixa inteligencia intrapessoal, pois não se observam. Não auscultam seus desejos e seus sonhos. E não tratam com consideração seus desejos e seus sonhos.
Revela inteligência emocional quem:
1. Sabe que não sabe.
2. Sabe desapressar.
3. Sabe observar.
4. Sabe escutar.
5. Sabe calar.
6. Sabe ser empático.
7. Sabe descobrir os pontos comuns.
8. Sabe dar prioridade à relação pessoa-pessoa.
9. Sabe ser franco sem ser transparente.
10. Sabe o ponto de aproximação-distanciamento.
11. Sabe que o outro em alguma coisa é professor.
12. Sabe as palavras certas.
13. Sabe da tendência genética para determinados comportamentos.
14. Sabe da influência das vivências e do aprendizado.
15. Sabe olhar-se no espelho.
SEMELHANTE MAS DIFERENTE
Quem é este ser que convive comigo de dia e de noite por todo o sempre, este ser que sou eu? De novo, a santa curiosidade! Assim como na inteligência interpessoal, só vamos desenvolver a inteligência intrapessoal se nos dermos conta do quão pouco sabemos sobre nós mesmos; se nos observarmos e nos escutarmos.
Anotar na agenda: “Vou levantar mais cedo às sextas-feiras. Das seis às sete horas, vou apreciar o sol nascente e vou escutar a mim mesmo, vou descobrir o que sei e o que não sei sobre este ser que sou eu”. Lisiane começou o processo de desenvolver sua inteligência intrapessoal porque agora ela sabe que não sabe. Nunca é demais repetir Confúcio: “Quando não sabes algo, o reconhecimento de que não o sabes é saber”.
Espelho meu, quem sou eu? Em parte, sou o que a minha espécie é. Sou semelhante aos outros bilhões de homo sapiens, um animal cujo comportamento é em muito influenciado pelo passado genético e pelo meio ambiente encontrado ao nascer, em especial pelas vivências obtidas nas primeiras relações estabelecidas com quem me cuida e me dá condições de crescer. Enquanto a psicologia evolucionista estuda a influência da genética, a psicanálise estuda a influência das vivências na infância na formação de nossa personalidade e no nosso comportamento na vida adulta.
Mas, espelho meu, quem sou eu? Em contrapartida às semelhanças, sou diferente de todos os demais exemplares de minha espécie. As influências genéticas e ambientais não são uniformes e geram, como produto final, seres peculiares e únicos. Seres que revelam diferenças no que tange a personalidade, nível de maturidade, qualidades e defeitos humanos, ética e moral.
Preciso aceitar que sendo diferente, há relações que eu posso me aproximar mais, somos semelhantes, há outras que tenho de me distanciar mais, somos muito diferentes. Há um ponto ideal de aproximação-distanciamento em cada relação.
Revela inteligência emocional quem:
1. Sabe que não sabe.
2. Sabe desapressar.
3. Sabe observar.
4. Sabe escutar.
5. Sabe calar.
6. Sabe ser empático.
7. Sabe descobrir os pontos comuns.
8. Sabe dar prioridade à relação pessoa-pessoa.
9. Sabe ser franco sem ser transparente.
10. Sabe o ponto de aproximação-distanciamento.
11. Sabe que o outro em alguma coisa é professor.
12. Sabe as palavras certas.
13. Sabe da tendência genética para certos comportamentos.
14. Sabe da influência das vivências e do aprendizado.
15. Sabe olhar-se no espelho.
16. Sabe que somos semelhantes e diferentes.
17. Sabe descobrir o ponto ideal de aproximação e distanciamento de cada relação.
Aula Virtual 3 - APROXIMAÇÃO X DISTANCIAMENTO (italiano)
EXERCÍCIO - AVALIANDO AS RELAÇÕES
CLASSIFICAÇÃO DA RELAÇÃO COM AS PESSOAS DO MEIO EM QUE VIVE.
Você e as pessoas de seu meio estão com relações:
. Mutuamente satisfatórios.
. Razoavelmente satisfatórios.
. Toleráveis
. De pouca ou nenhuma qualidade positiva.
. Razoavelmente conturbadas e confusas.
. Marcadas pela confusão e conflito.
. Que romperam-se por completo.
EXERCÍCIO - MAPEANDO A INTELIGÊNCIA DO MEIO
Você faz o levantamento e no ato de faze-lo já realiza o necessário treinamento. É indispensável praticar repetidas vezes para que o novo conhecimento crie raízes dentro de você.
A - A INTELIGÊNCIA EMOCIONAL DO SEU CÍRCULO DE RELACIONAMENTOS
Avalie a própria, depois a de seu pai e a de sua mãe (mesmo se já falecidos), de pelo menos dois outros familiares próximos e, por fim, a de pelo menos dois amigos significativos. E também de colegas, vizinhos, chefes e professores.
De uma nota de 1 a 10 para o nível de aptidão em que você acha que a pessoa se encontra em cada um dos itens.
A.1. Você
Saber que não sabe
Desapressar
Observar
Escutar/calar
Empatia
Ponto comum
Relação pessoa-pessoa
Franqueza versus transparência
Aproximação versus distanciamento
Palavras certas
Total =
Média =
A.2. Seu pai
Saber que não sabe
Desapressar
Observar
Escutar/calar
Empatia
Ponto comum
Relação pessoa-pessoa
Franqueza versus transparência
Aproximação versus distanciamento
Palavras certas
Total =
Média =
A.3. Sua mãe
Saber que não sabe
Desapressar
Observar
Escutar/calar
Empatia
Ponto comum
Relação pessoa-pessoa
Franqueza versus transparência
Aproximação versus distanciamento
Palavras certas
Total =
Média =
A.4. Irmão (ã)
Saber que não sabe
Desapressar
Observar
Escutar/calar
Empatia
Ponto comum
Relação pessoa-pessoa
Franqueza versus transparência
Aproximação versus distanciamento
Palavras certas
Total =
Média =
A.5. Amigo (a)
Saber que não sabe
Desapressar
Observar
Escutar/calar
Empatia
Ponto comum
Relação pessoa-pessoa
Franqueza versus transparência
Aproximação versus distanciamento
Palavras certas
Total =
Média =
A.6. Colega/vizinho
Saber que não sabe
Desapressar
Observar
Escutar/calar
Empatia
Ponto comum
Relação pessoa-pessoa
Franqueza versus transparência
Aproximação versus distanciamento
Palavras certas
Total =
Média =
A.7. Chefe/professor
Saber que não sabe
Desapressar
Observar
Escutar/calar
Empatia
Ponto comum
Relação pessoa-pessoa
Franqueza versus transparência
Aula virtual 3 - APROXIMAÇÃO VERSUS DISTANCIAMENTE (inglês)
JEITÃO
Sempre é bom repetir o quanto é útil conhecer alguma coisa sobre personalidade, maturidade, ética e moral, qualidades e defeitos humanos. Como se nossa inteligência interpessoal pedisse: “Preciso saber que ‘tipo de gente’ está aqui bem a minha frente a conversar comigo”. E nossa inteligência intrapessoal: “Preciso saber quem sou”.
Comecemos pela personalidade, que pode ser conceituada como o conjunto de características que definem uma pessoa. Em palavras simples: o jeito da pessoa, o jeitão dela. Desde há muito se pesquisa o papel que a personalidade de um indivíduo desempenha na sua maior ou menor habilidade em se relacionar com os outros (NOTA 1).
Na personalidade encontramos características que se repetem, disposições permanentes. Chamamos de traços. Diferem do que chamamos de estados, estados de espírto, que são passageiros e ocasionais. Alguns dos traços são positivos, como a tendência repetitiva a interpretar os acontecimentos da vida de forma otimista. Outros são negativos, como a tendência repetitiva a uma interpretação pessimista ou a uma interpretação paranóide.
A personalidade será, inclusive, considerada doente (transtornada) quando o negativo for bem além de ser apenas traços, quando o negativo a comandar. Considera-se doença (transtorno) quando se percebem desvios muito importantes no sentido negativo do modo como o indivíduo médio, em uma dada cultura, percebe, sente, pensa e se relaciona com os outros. São vários os tipos de doenças ou transtornos de personalidade classificados pela psiquiatria. Vamos descrever os principais: narcisisista, paranóide, histriônico, dependente, obsessivo, instável, esquizóide e anti-social (NOTA 2).
O traço negativo da paranóia, citando como exemplo, conduz a que o estado de ciúme deixe de ser passageiro e transforme-se em permanente. Conhecendo os casos extremos, os transtornos da personalidade, teremos mais facilidade para detectar os traços negativos nas pessoas com as quais convivemos e em nós mesmos.
Quanto aos traços positivos, ainda não temos uma classificação pronta e acabada para eles. Pesquisadores, liderados por Cristopher Peterson, estão trabalhando nesse sentido. Devido a tal limitação, comentarei apenas o traço positivo do otimismo realista, do qual derivam a alegria, a esperança, a ousadia, a tendência a não desistir nunca e a resiliência. Por resiliência entenda-se a capacidade do indivíduo de rapidamente retornar ao seu jeito habitual após sofrer evento adverso. Termo retirado da física: propriedade de certos materiais de voltar ao normal depois de submetidos à máxima tensão.
No futuro, características que você lerá no capítulo que trata das qualidades humanas farão parte da classificação dos traços positivos de personalidade.
NOTA 1 - Cito como exemplo o artigo publicado na década de oitenta: Hayslip B Jr. Personality-ability relationships in aged adults. J Gerontol. 43(3): P79-84, 1988. O tema segue sendo objeto de estudos na década atual. Por exemplo: Melley AH, Oltmanns TF, Turkheimer E. The Schedule for Nonadaptive and Adaptive Personality (SNAP): temporal stability and predictive validity of the diagnostic scales. Assessment. 9(2): 181-7, 2002.
NOTA 2 - ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Classificação de transtornos mentais e de comportamento (CID-10). Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.
NARCISISTA
Apenas um por cento da população apresenta transtorno de personalidade narcisista. Porém, é grande o número de pessoas com traços narcisistas. Até porque todos nós nos utilizamos da defesa narcisista no início da vida. O estado de libido autodirigida foi denominado por Freud em 1914 de “narcisismo” (NOTA 3).
Narciso, segundo a lenda, rejeitou o amor de Eco e de outras pretendentes porque, ao beber água num lago, viu sua imagem refletida e se apaixonou por ela. A paixão foi tão grande que ele não mais conseguiu se afastar e acabou sua vida aí. E quando sua alma, ao subir aos céus, fez sombra na água, Narciso, como um beija-flor, por instantes, parou no ar a fim de admirá-la.
Pois bem, todos passamos no início da vida por uma necessária fase narcisista. Precisamos imaginar que somos o maior e o melhor para aliviar a esmagadora sensação de que não somos nada perto da grandiosidade do mundo. Somos os menores e os piores, no sentido de que nada sabemos fazer. A fantasia do contrário vem nos salvar. Somos os maiores, os melhores, somos como Narciso da lenda.
A essência do desejo narcisista é sentir-se único, diferente, superior a todos os demais, recebendo um olhar que assim o ateste. Os pais reforçam esse indispensável narcisismo ao olhar seu nenê como o ser mais bonito que já existiu sobre a face da terra.
Um adulto narcisista é alvo da pilhéria dos conhecidos. Dizem, por exemplo, que ele anda despreocupado caminhando numa tempestade, pois acha que os raios são flashes da máquina com que Deus o está fotografando. Que acha que, caso não tivesse nascido, a humanidade estaria se perguntando por quê. Os adversários do general Charles De Gaule popularizaram uma anedota referente a sua noite de núpcias. “Meu Deus! Como está frio!”, exclama sua esposa. E de Gaule: “Na intimidade, meu bem, você pode me chamar de Charles”.
Vamos crescendo, conhecendo um pouco mais a vida, ficando mais fortes, realizando coisas, tendo outras fontes de prazer, e vamos deixando na lembrança esta fase chamada de “narcisismo primário”. Há uma máxima que diz: “Os que merecem um monumento não precisam dele”.
Está bem, não somos o Narciso, mas alguém é. Ou seja, estamos prontos a idealizar alguém, a nos apaixonarmos não mais por nós mesmos, mas por este ser que idealizamos. Fixamos o olhar: ali está o ser mais maravilhoso que existe. Tenho de conquistá-lo para mim. Esta fase é chamada de “narcisimo secundário”. Como bem o sabemos, não existe este ser fantástico, maravilhoso. As maravilhas desta vida não estão concentradas num único alguém, estão espraiadas. Com o amadurecimento podemos abrir mão também do narcisismo secundário.
A propósito de narcisismo e humor, Classius Clay, o Mohamed Ali, saiu-se com a pérola: “Bem que tento ser humilde, mas me faltam argumentos”.
Características do indivíduo com o transtorno:
1. Possui um sentimento grandioso quando à sua importância; tende a exagerar suas capacidades, talentos e realizações; espera ser reconhecido como superior sem fatos que justifiquem tal expectativa.
2. Alimenta fantasias de ilimitado sucesso, de poder, de inteligência, de beleza, de amor ideal.
3. Crê ser especial e único; crê que só pode ser compreendido e só deve associar-se a pessoas de condição elevada e a instituições especiais.
4. Espera sempre ser excessivamente admirado.
5. Possui a expectativa de receber um tratamento especial e de que seja automaticamente atendido em suas exigências.
6. Tira vantagem de outros para alcançar seus objetivos, ou seja, é explorador nas relações interpessoais.
7. Possui pouca capacidade de empatia, raramente se identificando com os sentimentos ou necessidades alheias.
8. Seguidamente sente inveja de outras pessoas e acredita-se ser alvo de inveja.
9. Adota comportamentos arrogantes. Memorize o tripé: grandiosidade, necessidade de admiração e falta de empatia.
A auto-estima dos narcisistas é por demais frágil e vulnerável. Críticas, mesmo que pequenas, magoam profundamente. Reagem muitas vezes agressivamente. Por vezes, retraem-se socialmente e adotam uma aparência de humildade que pode mascarar ou proteger a grandiosidade. O mais comum, entretanto, é serem arrogantes, esnobes. Podem, por exemplo, pensar que não precisam esperar numa fila, que suas prioridades são mais importantes que as de todos os que ali estão. Ficam irritados quando os colegas deixam de auxiliá-los em seus “trabalhos superimportantes”. Tendem a discutir suas próprias preocupações em detalhes intermináveis, não se interessando em ouvir as preocupações dos outros.
Portanto, quando aquele sujeito diz que “não pode andar de vidro aberto em seu carro porque as mulheres se jogam para dentro”, você já sabe com quem está lidando.
Como lidar?
Como conviver bem com um narcisista?
O nosso conhecido narcisista precisa se auto-afirmar. Precisa viver fazendo de conta que é forte, que é grande, que é um ser que vale a pena, que se andar em seu carro com o vidro aberto as mulheres se jogarão para dentro. Ao encontrá-lo, já sabemos que ele necessitará se descrever, de alguma forma, como alguém digno das maiores admirações. Pois, dentro dele, há a certeza do contrário, de que não tem nada de valor para que as pessoas gostem dele. Se não o criticarmos por isto, se o tolerarmos, ele se acalmará e, então, poderemos dialogar sobre os assuntos que nos interessam.
É bom não esquecer que todos nós, por vezes, também precisamos reagir como a segunda cobra do cartum de Luís Fernando Veríssimo. A primeira cobra, olhando para o céu à noite: “Como nós não somos nada!” E a segunda: “Nós? Você e quem?”
A palavra-chave para narcisismo é: admiração.
NOTA 3 - Freud, S. Sobre o narcisismo: uma introdução. Vol. XIV, Obras completas, Imago, 1974. Freud atribui a Paul Näcke e a Havelock Ellis a introdução do termo “narcisismo” nos estudos psicológicos.
PARANÓIDE
Estima-se que a prevalência do transtorno de personalidade paranóide varie de 0,5 a 2,5 %, ou seja, de cinco a vinte e cinco mil indivíduos numa cidade de um milhão de habitantes.
Características do indivíduo com o transtorno:
1. Desconfia de que estão armando contra ele.
2. Suspeita, sem fundamento, de estar sendo enganado pelos outros.
3.Interpreta significados ameaçadores ocultos em acontecimentos corriqueiros.
4. Não confia informações aos outros por temer que elas possam ser depois usadas contra si.
5. Não esquece ofensas ou desatenções guardando rancores para sempre.
6. Suspeita seguidamente, sem motivo, da fidelidade de seu parceiro amoroso.
7. Com facilidade se torna magoado e rancoroso ou, até mesmo, agressivo.
8. É muito crítico com os demais; por outro lado, é incapaz de aceitar críticas.
9. Tende a culpar os outros por suas dificuldades.
O paranóide tende a acreditar que os “males do mundo” são devidos a determinados povos, raças etc. Facilmente se junta a grupos religiosos ou políticos fechados e a grupos que compartilham de seu sistema de crenças paranóides.
Em contrapartida, até na paranóia encontramos algo positivo. Diz o provérbio tcheco-eslovaco: “As desgraças entram sempre por alguma porta que fora deixada aberta para elas”. Quem não confia em ninguém, não esquece porta aberta.
Como lidar?
Como conviver bem com um paranóide?
Devemos explicar tudo para ele. Não deixar vazios na conversa. Os vazios serão preenchido pela interpretação doentia. Se meu chefe é um pouco paranóide, convém ficar sussurrando no ouvido de alguém a sua frente?
Há casos em que a paranóia aparece a certa altura da vida e, portanto, não é um transtorno de personalidade, mas uma doença tratável com medicamentos.
Palavra-chave: desconfiança.
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Narcisista - admiração
Paranóide - desconfiança
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HISTRIÔNICO
Acreditava-se que este transtorno era mais freqüente em mulheres. Porém, estudos recentes revelam taxas similares. Estima-se a prevalência de 2 a 3% na população geral. O Brasil deve ter entre três milhões e quatrocentos mil a cinco milhões e cem mil pessoas com personalidade histriônica. E quantos mais que, mesmo não apresentando o quadro inteiro, funcionam com algumas de suas características?
O indivíduo com o transtorno:
1. Apresenta teatralidade, autodramatização e expressão emocional exagerada.
2. É sugestionável e facilmente influenciado pelos outros.
3. Necessita ser o centro das atenções e não se sente bem quando isso não acontece.
4. Adota comportamento sedutor e usa exageradamente a aparência física para chamar a atenção sobre si mesmo.
5. Suas emoções são superficiais e mudam rapidamente.
7. Considera os relacionamentos mais íntimos do que realmente são.
Em qualquer grupo que chega, esforça-se pela conquista da posição central. De início, em geral, encanta por seu entusiasmo e sedução. Quando essa atenção para si não se mantém, o indivíduo se desagrada do grupo, podendo até se irritar e adotar atitudes de menosprezo.
Para impressionar os outros, gasta dinheiro e tempo em demasia para se vestir e se embelezar. Às vezes, cria embaraços para familiares e amigos por uma descomedida exibição pública de emoções: chora incontrolavelmente em situações emotivas de pouca importância, abraça ardorosamente conhecidos casuais. Liga e desliga suas exaltadas emoções com rapidez impressionante, dando a impressão de ser fingido.
O narcisista e o histriônico podem compartilhar da necessidade de se tornar o centro das atenções, porém no narcisismo a exigência é de que a atenção seja acompanhada de admiração.
Como lidar?
Como conviver com um histriônico?
Faça com que se sinta no centro das atenções e ele se acalmará. Por exemplo, quando, numa festa em sua casa, ele põe o pé para dentro, imediatamente conduza-o para o centro da roda e apresente-o a todos. Seu amigo histriônico se sentirá bem e achará sua festa ótima.
Assim agindo, você não estará reforçando seu jeito infantil de funcionar? Você não é o educador dele. É apenas seu amigo.
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Narcisista - admiração
Paranóide - desconfiança
Histriônico - centro das atenções
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DEPENDENTE
O indivíduo que apresenta o transtorno de personalidade dependente:
1. Permite ou até encoraja outros a tomarem a maioria das decisões importantes de sua vida.
2. Quer que alguém administre sua vida.
3. Subordina suas necessidades e desejos às necessidades e aos desejos das pessoas de quem depende.
4. Reluta em fazer exigências mesmo que razoáveis às pessoas das quais depende.
5. Sente-se desamparado quando sozinho devido a medos exagerados de incapacidade de se autocuidar.
6. Teme ser abandonado.
7. Frente às decisões cotidianas recorre ao conselho de outros.
Como lidar?
Relacione-se com ele evitando assumir o papel de “você decide” que ele propõe. Se você se tornar o seu cuidador, irá cansar; ao contrário, estimule-o a agir por conta própria.
Pessoas dependentes, quando iniciam um vínculo amoroso, tornam-se mais dependentes ainda. Giram em torno do namorado, da namorada, e suas vidas empobrecem. Há casos em que eu afirmo: “Namoro está contra-indicado para você”.
O par, no início, gosta; depois não mais, pois o dependente está sempre insatisfeito com a atenção recebida, sempre querendo mais. Queixa-se das mínimas desatenções.
Lembro-me de um homem que, não suportando mais ouvir as queixas de sua mulher em meu consultório, levantou-se e disse contido: “Com licença, vou aguardar na sala de espera”. Antes de fechar a porta não se conteve e gritou: “Não agüento mais!”
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Narcisista - admiração
Paranóide - desconfiança
Histriônico - centro das atenções
Dependente - "você decide"
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OBSESSIVO
Acredita-se que o transtorno de personalidade obsessivo seja prevalente em 1 % da população. O indivíduo tem uma preocupação com organização, perfeccionismo e controle mental e interpessoal, às custas da flexibilidade e da eficiência.
Caracteriza-se por:
1. Tenta manter um sentimento de controle através de uma atenção extenuante a regras, a detalhes triviais, listas, horários, chegando a perder o ponto mais importante da atividade.
2. Seu perfeccionismo impede-o de completar uma tarefa porque não consegue atingir seu padrão demasiadamente rígido.
3. Devotamento excessivo ao trabalho e à produtividade, pouco tempo para lazer e para as amizades.
4. Inflexível em assuntos de moralidade, de ética e de valores, com exagerada conscienciosidade.
5. Incapaz de se desfazer de objetos inúteis ou usados, mesmo quando não têm valor sentimental.
6. Reluta em delegar tarefas para outras pessoas, a menos que estas se submetam a seu modo exato de fazer as coisas.
7. Administra na sua cabeça o ambiente a sua volta e tenta impor o seu "projeto" de bem viver.
8. Rigidez e teimosia.
Os obsessivos tendem a ficar irados em situações nas quais não conseguem manter o controle do ambiente.
Apesar da semelhança, é fácil de se distinguir a personalidade obsessiva do transtorno obsessivo-compulsivo, pois este último apresenta verdadeiras obsessões e compulsões. Os dois diagnósticos podem estar presentes no mesmo indivíduo.
Por outro lado, é bom lembrar que traços moderados de personalidade obsessiva podem ser especialmente úteis, particularmente em situações que exigem um alto desempenho. É óbvio que nos sairemos melhor se formos devotados ao trabalho e almejarmos a perfeição em tudo o que fazemos.
Como lidar?
Como conviver com um amigo ou familiar obsessivo?
Deixe que ele organize o jantar. Não faltará nada, a comida estará boa e você poderá se ocupar com outras coisas. Quando sua obsessão for excessiva, entenda que é por ansiedade. Ele crê que haverá muitos problemas, que coisas ruins acontecerão se ele não controlar tudo a sua volta. Procure aliviar sua ansiedade e, depois, conte para ele o que você leu sobre o transtorno de personalidade obsessivo.
Você é o obsessivo? Quando estiver irritado porque a pasta de dente não está exatamente no lugar onde você acha que devia estar, relaxe. Diga para si mesmo: “O problema não é a pasta de dente, é a minha ansiedade. Não há razão para eu temer, as coisas ficam bem em diferentes lugares”.
Leia sobre a terapia cognitivo-comportamental (NOTA 4).
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Narcisista - admiração
Paranóide - desconfiança
Histriônico - centro das atenções
Dependente - "você decide"
Obsessivo - administrar o ambiente
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NOTA 4 - Cordiolli AV. Vencendo o Transtorno Obsessivo-Compulsivo: Manual da Terapia Congnitivo-Comportamental para Pacientes e Terapeutas. Artmed, 2003. O texto contém informações básicas sobre o transtorno obsessivo-compulsivo (TOC). Descreve os fundamentos e as técnicas da terapia cognitivo-comportamental ao incluir informações psicoeducativas, exercícios práticos, tarefas de casa, além de automonitoramento e lembretes.
INSTÁVEL
O indivíduo com personalidade emocionalmente instável tem uma tendência a agir impulsivamente, sem considerar as conseqüências; revela uma falta de autocontrole e também se mostra instável afetivamente.
Divide-se em dois subtipos:
(I) Tipo impulsivo. Os sintomas mais marcantes são a instabilidade emocional e a falta de controle de impulsos. O indivíduo tem acessos de violência e ou comportamento ameaçador, em geral em resposta a críticas de outros. Se sua mulher lhe jogou vinagre porque você disse não ter gostado da salada que ela preparou, agora você já sabe seu diagnóstico. Se seu marido é do tipo impulsivo, não o deixe ir à reunião de condomínio, vá você.
A propósito, no filme 21 gramas de Alejandro González-Iñárritu, Benicio Del Toro interpreta Jack, um homem que luta de todas as maneiras para controlar seus impulsos (NOTA 5).
Desde os dezesseis anos, entrando e saindo da cadeia por uso de drogas e furtos, Jack busca na Bíblia um controle externo que lhe permita viver uma vida normal com sua mulher e seu casal de filhos. Quando sente que a religião falha, tenta o suicídio, aceita ser preso e, até mesmo, morto. Diferentemente de um delinqüente com personalidade anti-social, Jack sente culpa por seus atos. Quer, honestamente, contê-los. Mas como conseguir com seus parcos recursos econômicos, culturais e sociais?
Como lidar?
Ninguém gosta de ser agredido. Então, não adianta negar, é estressante conviver com um impulsivo. Porém, lidamos melhor se entendermos que suas atitudes não são nada “pessoais”. Age como age por uma deficiência.
(II) Tipo borderline (limítrofe). Além de instabilidade emocional, o indivíduo revela confusão. Seus objetivos e suas preferências nunca se mostram claras. Há um sentimento crônico de vazio. Envolve-se em relacionamentos intensos mas instáveis, sofrendo de repetidas crises emocionais. Pode revelar ameaças de suicídio frente às crises e atos de autolesão, que, inclusive, podem acontecer sem algum precipitante óbvio.
O termo “borderline” ou “limítrofe” deve-se ao fato de a conduta do indivíduo colocá-lo no limite entre a realidade e a psicose. Cerca de 2 % da população apresenta este transtorno.
Como lidar?
O mais difícil é identificarmos que “este que está ao nosso lado” é um bordeline. Feito isso, tudo fica mais fácil. Sabemos com quem estamos lidando e sabemos de suas limitações. Não temos o direito de querer transforma-lo, de corrigi-lo. Temos o direito de nos afastar. Ou de revermos qual o melhor ponto de aproximação-distanciamento.
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Narcisista - admiração
Paranóide - desconfiança
Histriônico - centro das atenções
Dependente - "você decide"
Obsessivo - administrar o meio
Impulsivo - descontrole
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NOTA 5 - 21 gramas (2003) é o segundo longa-metragem dirigido pelo mexicano Alejandro González-Iñárritu. O anterior fora Amores brutos (2000).
ESQUIZÓIDE
O indivíduo com o transtorno revela:
1. Poucas atividades produzem prazer.
2. Frieza emocional, afetividade embotada.
3. Indiferença a elogios ou a críticas.
4. Quase não manifesta sentimentos para com os outros, sejam afetivos ou até mesmo raivosos.
5. Pouco interesse por relações sexuais.
6. Pouco interesse em ter amigos.
7. Preferência por atividades solitárias.
8. Gostar de permanecer solitariamente absorto em suas fantasias.
É alguém que raramente experimenta fortes emoções. É um verdadeiro ermitão, com pouco convívio social. Quando o tem, mostra-se inábil.
Ao contrário de seu convidado histriônico, jamais coloque-o no centro de sua festa. Faça-o entrar em sua casa com discrição e, quando ele estiver isolado na sala da televisão, deixe-o em paz. Não vá buscá-lo para a roda. Na saída, ele dirá: “Gostei da festa”. O esquizóide dificilmente se casa. Não sofre pela solidão. Não o confunda com quem apresenta fobia social ou timidez e deseja o convívio social, mas, por sentir-se ansioso, evita-o.
Como lidar?
Nem tudo é ruim: se você é um pouco esquizóide, feliz com seu mundo imaginário, poderá viver sozinho numa boa, viajar sozinho para lugares distantes, trabalhar em ambiente de estranhos. Enfim, em tudo há dois lados.
Se sua empresa tiver de escolher entre um funcionário com traços histriônicos e outro com traços esquizóides para passar uma temporada de trabalho na Alemanha ou no Japão, envie o segundo. O histriônico, no terceiro, dia telefonaria aborrecido: “Um povo frio e indiferente”. Desejará voltar imediatamente para o ambiente onde consegue ser o centro das atenções. Já o esquizóide não telefonará. Você é que terá de ligar. Ele dirá que tudo vai bem e que o povo é muito discreto e respeitador, fácil de se conviver.
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Narcisista - admiração
Paranóide - desconfiança
Histriônico - centro das atenções
Dependente - "você decide"
Obsessivo - administrar o meio
Impulsivo - descontrole
Esquizóide - ermitão
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ANTI-SOCIAL
Para receber o diagnóstico de transtorno de personalidade anti-social, de psicopata, de sociopata, o indivíduo tem de ter, pelo menos, dezoito anos e já ter apresentado algum distúrbio de conduta antes dos quinze anos.
Distúrbio de conduta no sentido de violar normas ou regras sociais importantes e adequadas à idade. Podemos dividir em: agressão a pessoas e animais, destruição de propriedade, furto ou séria violação de regras. A prevalência é de cerca de 3% em homens e de cerca de 1% em mulheres.
Porém, existem muitos que apresentam não o transtorno completo, mas algum grau de psicopatia. Existem, inclusive, testes que medem o nível de comprometimento.
Robert Hare, pesquisador do Canadá, tem se destacado no estudo da personalidade anti-social e na elaboração de testes para avaliar o nível de psicopatia de um indivíduo (NOTA 6).
As características do anti-social:
1. Não se conforma em funcionar dentro das leis vigentes em seu meio.
2. Freqüentemente, faz coisas que constituem motivo para detenção, quer seja preso ou não.
3. Não respeita os direitos, os desejos e os sentimentos dos outros.
4. Não possui empatia afetiva, portanto não se coloca no lugar dos outros.
5. Não sente culpa ou remorso pelos seus atos.
6. Arruma explicações superficiais como justificativa por ter ferido, roubado ou maltratado alguém: “a vida é injusta”, “perdedores merecem perder”, “era um boboca mesmo”.
7. Para obter dinheiro, sexo ou poder, engana e manipula as pessoas; mente, finge, faz qualquer coisa sem ética alguma;
8. É irresponsável em tudo: no trabalho, em honrar compromissos financeiros.
9. É impulsivo, não leva em conta o futuro.
10. Com facilidade se mostra irritado e violento.
11. Pode revelar um encanto superficial e ter facilidade com as palavras.
Esse transtorno tem um curso crônico, mas pode tornar-se menos evidente ou apresentar remissão por volta da quarta década da vida.
Os indivíduos com transtorno de personalidade anti-social e transtorno de personalidade narcisista compartilham a tendência a serem insensíveis, exploradores, superficiais e não apresentam empatia. Porém, o narcisista não revela, necessariamente, impulsividade, agressão e a mentira consciente.
Muitos dos que possuem personalidade anti-social apresentam, de forma concomitante, personalidade narcisista ou personalidade histriônica ou personalidade bordelaine.
Como lidar?
“Professor, como se relacionar bem com um psicopata?” Vendo a carteira de um dos alunos sobre a mesa, respondo: “Se eu fosse um anti-social, por que motivo não iria desejar roubar tua carteira? Sem empatia, para mim você seria com uma laje ou como uma das cortinas da sala. Não nos colocamos no lugar das cortinas, vamos embora da faculdade e não pensamos mais nela. Mais ainda, absolutamente não sentiria culpa ou remorso por tirar tuas coisas. Portanto, por que motivo não iria desejar roubar tua carteira? Não há como se relacionar bem com um psicopata. Fujam dele como o diabo da cruz”.
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Narcisista - admiração
Paranóide - desconfiança
Histriônico - centro das atenções
Dependente - "você decide"
Obsessivo - administrar o meio
Impulsivo - descontrole
Esquizóide - ermitão
Anti-social - ausência de culpa
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NOTA 6 - É interessante ler seus artigos, entre eles: Hare RD, Clark D, Grann M, Thornton D. Psychopathy and the predictive validity of the PCL-R: an international perspective. Behav Sci Law. 18(5): 623-45, 2000. PCL-R é a abreviatura de Psychopathy Checklist Revised. Esse instrumento está sendo traduzido e adaptado para uso no Brasil pela Dra. Hilda Morana. Para se corresponder com Robert D. Hare o endereço é: Department of Psychology, 2136 West Mall, University of British Columbia, Vancouver, BC, Canada, V6T 1Z4. E-mail: rhare@interchange.ubc.ca
Aula Virtual 4 - TRAÇOS DE PERSONALIDADE (inglês)
OTIMISMO VERSUS PESSIMISMO
Para alguns autores, as classificações deveriam incluir o transtorno de personalidade depressiva, cuja característica essencial é o pessimismo. Outros pensam que não, pois este quadro pode ser uma distimia, aquela depressão leve e crônica. De qualquer forma, ninguém discute a existência do pessimismo e de sua influência negativa.
Em contrapartida, o otimismo e seus derivados – alegria, esperança, ousadia, a tendência a não desistir nunca, a resiliência – exercem uma influência altamente positiva em nossas vidas.
A Mayo Clinic de Minesota (USA) selecionou 839 pacientes que haviam iniciado tratamento há quarenta anos. Na admissão, todos foram avaliados em relação ao seu grau de otimismo. No ano 2000 muitos já haviam falecido. Comparados aos pessimistas, os otimistas conseguiram viver 19% acima das expectativas (NOTA 7).
Um estudo sobre otimismo e longevidade observou 178 freiras. Todas viveram com dietas semelhantes, não fumaram, não beberam, tiveram a mesma assistência médica. Textos escritos por elas foram avaliados por pesquisadores que não tinham informações sobre a duração de suas vidas. Dentre as consideradas mais otimistas e alegres na avaliação, 90% viveram até os 85 anos de idade. Dentre as consideradas mais pessimistas, apenas 34% alcançaram os 85 anos. Chegaram aos 94 anos: 54% das otimistas contra apenas 11% das pessimistas (NOTA 8).
Ser otimista é uma bênção para si mesmo e para seus amigos, parentes, vizinhos, clientes... Refiro-me ao otimismo realista, aquele em que o indivíduo mantém os pés no chão.
O pessimismo pode ser corrigido. A começar pela consciência da existência de tal traço negativo dentro de si. Quando temos consciência do processo negativo ou patológico, o processo não opera mais tanto.
MAUS EVENTOS
No pessimista, os maus eventos se propagam e duram. Cito como exemplo alguém que é reprovado num dos tantos “vestibulares” desta vida. O pessimista tenderá a propagá-lo pelo todo de sua pessoa, por seu passado, presente e futuro. Pensará: “Sou incapaz em tudo, sempre fui e sempre serei”. E o sentimento negativo ocupará sua mente por dias e dias.
No otimista, os maus eventos não se propagam e não duram. Pensará: “Não fui aprovado neste específico ‘vestibular’”. O mau evento permanece localizado, não se propaga pelo todo de sua pessoa, por seu passado e seu futuro. E o sentimento negativo ocupará sua mente por minutos apenas.
BONS EVENTOS
No pessimista, os bons eventos não se propagam e não duram. Disseram que seu nariz era bonito. “De que adianta um nariz bonito se o resto todo é horrível?” E o bom sentimento de alguém achar algo bonito nele desaparece em segundos.
No otimista, ao contrário, os bons eventos se propagam e duram. A observação de que teria um nariz bonito é estendida: “Já me acharam bonito em outras ocasiões e, certamente, continuarão me achando no futuro”. O sentimento positivo perdurará por um bom tempo (NOTA 9).
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Narcisista - admiração
Paranóide - desconfiança
Histriônico - centro das atenções
Dependente - "você decide"
Obsessivo - administrar o meio
Impulsivo - descontrole
Esquizóide - ermitão
Otimismo - leitura positiva
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NOTA 7 - Maruta T, Colligan R, Malinchoc M, Offord K. Optimists vs pessimists: Survival rate among medical patients over a 30-year period. Mayo Clinic Proceedings. 75, 140-143. 2000.
NOTA 8 - Danner D, Snowdon D, Friesen W. Positive emotions in early life and longevity: Findings from the nun study. Journal of Personality and Social Psychology. 80: 804-813, 2001.
NOTA 9 - Martin Seligmam oferece em seu site www.authentichappiness.org um teste para avaliar o nível de otimismo de uma pessoa. Ele publicou, entre outros textos sobre o tema, o livro Learned Optimism.
Exercícios - TESTE SEU CONHECIMENTO
TESTE SEUS CONHECIMENTOS.
1. (Vale 1 ponto) Observe se você saberia preencher os espaços para OTIMISTA e para PESSIMISTA com:
. duram/propagam-se
. não duram/não se propagam
Otimista
MAUS EVENTOS.......................................
BONS EVENTOS.......................................
Pessimista
MAUS EVENTOS.....................................
BONS EVENTOS.....................................
2. (Vale 3 pontos) Observe se você sabe qual traço de personalidade corresponde a palavra-chave. (Esquizóide – Bordeline – Impulsivo – Obsessivo – Histriônico – Paranóide – Narcisista – Anti-social – Dependente).
Palavra-chave
Admiração..............................
Desconfiança..........................
ser o centro............................
“você decide”........................
controlar o meio....................
Descontrole..........................
Confusão..............................
Ermitão................................
ausência de culpa..................
3. (vale 1 ponto) A sua empresa contrata para gerente B.A., um homem de 42 anos que revela o hábito de cumprimentar dando a mão para todos os doze funcionários do setor. Logo você percebe que, diferente do gerente anterior, ele se interessa pela colocação da mesa de trabalho de cada funcionário. Também sobre o que cada um coloca sobre a mesa. Dias após, manda que todos desocupem suas gavetas e orienta como as mesmas deveriam ser novamente arrumadas. É muito pontual em tudo o que faz. Quando dirige uma reunião marca com exatidão o horário de seu fim. Se a reunião será de uma hora e são vinte os assuntos agendados concede três minutos para cada assunto. Aquele que passa do tempo fica falando sozinho até se calar, pois os outros, comandados por ele, já iniciaram o próximo tema agendado. Alguns colegas seus começam a se revoltar. E a revolta foi maior quando ele fez uma reunião para orienta-los a “como educar o próprio pensamento”.
Você percebeu tratar-se de alguém com traço____________________
4.(vale 2 pontos) S.J., um homem de trinta anos, foi em busca de trabalho nos Estados Unidos. Hospedou-se na casa da irmã, casada com um homem de boa índole mas que possuía baixa tolerância a frustrações. Certo dia, S.J. disse sorrindo ao cunhado: “Você deve mesmo me dar uma mão. Fui o único a te aceitar na nossa família. Meu pai dizia quando você se aproximava da nossa casa: ‘Lá vem aquele risonho`. Meu irmão te achava muito chato”. O cunhado, irritado, jogou suas malas na rua e não o quis mais em casa. No hotel, S.J. pensava no que eu errei?
Qual o traço de personalidade do cunhado de S.J.?_____________
Qual das habilidades aprendidas no modulo Inteligência Emocional está ausente em S.J.? ___________________
5. (Vale 1 ponto) L.J. é uma mulher de trinta anos que veste roupas de cores vivas e que realçam as formas de seu corpo. Gasta muito tempo em lojas femininas e em consultórios de medicina estética. Queixa-se de que não sabe porque motivo chama tanta a atenção dos homens. Quando chega num lugar logo procura a atenção de todos. Irritou-se recentemente com um homem que enquanto falava com ela voltou o olhar para uma outra mulher: “Não olhe para outra pessoa enquanto estou falando com você!”
Qual traço de personalidade? _______________________
6. (Vale 1 ponto) F., um homem de quarenta anos, seu funcionário há seis meses pede para falar a sós consigo. Diz que não vem agüentando mais lidar com a conspiração armada contra ele na firma e por isso solicitou a reunião. Determinados colegas riem quando ele passa. Outros falam dele pelas costas. E há um, inclusive, que está preparando alguma coisa ruim que ele ainda não conseguiu identificar. Você diz para ele que não havia notado nada disso que ele lhe contava. Tal colocação faz com que ele se cale. A reunião acaba e a partir de então você percebe que F. passa a lhe cuidar com o olhar.
Qual traço de personalidade? ____________________
7. (Vale 1 ponto) P.A., um homem de trinta e cinco anos, seu novo colega no trabalho, conta-lhe uma série de pequenos problemas não resolvidos em sua vida. Pouco a pouco, começa a lhe pedir opiniões: Em que colégio deve colocar sua filha pequena? Deve colocar aparelho nos dentes ou não? Qual tênis deve comprar para caminhar no final da tarde? Se ele deve manter relações sexuais com a esposa à noite ou pela manhã?
Qual traço de personalidade?______________________
RESPOSTAS:
Questão 1 (vale 1 ponto)
Otimista:
BONS EVENTOS: duram/propagam-se
MAUS EVENTOS: não duram/não se propagam
Pessimista:
BONS EVENTOS: não duram/não se propagam
MAUS EVENTOS: duram/propagam-se
Questão 2 (vale 3 pontos).
Resposta:
NARCISISTA Admiração
PARANÓIDE Desconfiança
HISTRIÔNICO ser o centro
DEPENDENTE “você decide”
OBSESSIVO controlar o meio
IMPULSIVO Descontrole
BORDELAINE Confusão
ESQUIZÓIDE Ermitão
ANTI-SOCIAL ausência de culpa
Questão 3 (Vale 1 ponto)
Resposta: traço obsessivo.
Questão 4 (Vale 2 pontos)
Resposta: traço impulsivo / franqueza mas não transparência.
Questão 5 (Vale 1 ponto)
Resposta: traço histriônico
Questão 6 (Vale 1 ponto)
Resposta: traço paranóide.
Questão 7 (Vale 1 ponto)
Resposta: traço dependente.
Se você somou sete ou mais pontos, passe para o módulo seguinte.
Aula Virtual 4 - TRAÇOS DE PERSONALIDADE (italiano)
NÍVEL DE MATURIDADE
Alcançamos a maturidade quando chegamos à condição de pleno desenvolvimento em uma dada área. Podemos falar de maturidade intelectual, profissional, emocional ou psicológica e outras mais. Há aqueles que são maduros em várias áreas; outros, numa só.
Há uma certa compatibilidade entre idade cronológica e nível de maturidade. Uma criança é uma criança. Porém, algumas crianças já são mais maduras que outras da sua mesma idade. E há adultos que dizem deles: “É uma criança grande, um bebezão”. Há cinqüentões que são apontados como adolescentes e que, inclusive, pertencem a turmas de adolescentes, namoram com adolescentes.
Por quê? Porque possuem interesses e forma de encarar a vida semelhantes, ou seja, a despeito da idade cronológica, eles realmente “são da turma”. E não há por que criticá-los por isso. Não atingiram a maturidade plena e pararam no nível adolescente por fatores que independem de sua vontade.
Todos conservamos dentro de nós os níveis anteriores de maturidade. Todos sabemos ser crianças, adolescentes, adultos jovens... Inclusive, em certos momentos de dificuldade, podemos regredir a uma dessas fases de funcionamento. Quantos que, quando adoecem, voltam a ser crianças e querem ser atendidos na cama com os cuidados de uma mãe?
Muitos, inclusive, nunca atingem a maturidade plena porque ficam fixados numa fase prévia, eternos adolescentes, por exemplo. Portanto, é útil, ao nos relacionarmos com alguém, observarmos o seu nível de maturidade. Saberemos com quem estamos lidando e, em decorrência, como lidar com ele.
E o nosso nível de maturidade como está? A propósito, quanto mais desenvolvemos nossas inteligências interpessoal e intrapessoal, mais maduros nos tornamos.
Lembre-se que uma maneira “imatura” de se auto-elogiar é dizer-se maduro e chamar o outro de “imaturo”. Como a história da maçã que caiu da árvore porque amadureceu. As outras, as verdes, dão risada lá de cima. E a que acaba de cair, a madura, olha para elas e diz: “De que se riem suas imaturas?”
TEMAS DE INTERESSE
Alguns temas são atrativos independentemente do nível de maturidade. Os esportes são um bom exemplo. O jogo de botão fez parte da infância de muitos meninos e continua a ser o lazer de muitos adultos. Porém, a uma criança não seduzem diálogos sobre pesquisa política aplicada ou sobre os custos da reconstrução da Câmara de Âmbar, próxima a São Petersburgo. Conclusão: os temas de interesse podem revelar o nível de maturidade, em especial, da maturidade intelectual. E é inegável que as relações fluem mais fácil quando há semelhanças nesse particular.
Lembro-me de Jorge, que me procurou chateado por não estar conseguindo acertar sua vida afetiva. Aos quarenta anos se separara de sua primeira esposa e iniciara namoro com Débora, uma jovem de dezenove anos.
No terceiro mês de namoro, ele, que nunca fora apreciador de decoração de interiores, dá-se conta da pintura mais escura existente no alto da parede de cor afazema do restaurante em que janta com sua jovem namorada em Provença, no sul da França. Já se detivera longamente a examinar com o olhar as taças de cristal e os miniabajures de tecido estampado existentes sobre as mesas.
O primeiro mês foi o das sensações fortes e da vivência de pequenos detalhes que emocionam. “Há muitos anos, doutor, meu rosto não ficava tão próximo ao rosto de uma mulher tão jovem e tão bonita”, disse-me Jorge. O segundo mês foi o das descobertas. Dois seres humanos observam cada um o jeito do outro. No terceiro mês, reagindo aos primeiros silêncios prolongados entre ambos, surge a idéia da viagem romântica à França. Talheres de prata, mesa redonda, atmosfera delicada, o espelho grande de moldura trabalhada distraem Jorge a ponto de ele murmurar sem pensar: “Não há o que fazer. Maturidades incompatíveis”.
Sim, no terceiro dia de viagem Jorge parara de falar. “Por piedade, doutor. Débora é muito educada. Percebi o quanto ela se esforçava para encontrar algo de seu interesse em meus assuntos”. A janta no restaurante acontecia no oitavo dia. “Desculpe, não compreendi o que você falou”, repete Débora pela segunda vez, tentando trazê-lo de volta de seus devaneios. “Jorge, você deu para murmurar...”
De volta da viagem, na primeira semana falaram sobre ela. Na segunda semana, as conversas foram gradativamente sumindo. “Doutor, faço o quê?” Passo para você, prezado aluno, o trabalho de elaborar uma boa resposta para esse nada incomum dilema vivido por esse e por tantos outros Jorges...
CONCRETO VERSUS ABSTRATO
O pensar infantil se faz baseado em objetos, em fatos, em fenômenos, não em seus significados. Evitar o caminho das pedras é, literalmente, evitar um caminho com pedras. Não há, ainda, a capacidade de abstração, de perceber outros significados, analogias, metáforas.
Jack London, no conto “Acender um fogo”, descreve um corajoso homem adulto cujo pensamento permanecera concreto: “O que se passava era que carecia de imaginação. Era veloz e agudo nas coisas da vida, porém só nas coisas da vida e não em seus significados. Este fato não o levava a meditar a cerca de sua fragilidade como ser vivo de sangue quente, nem sobre a vulnerabilidade do homem em geral, capaz de viver somente entre certos estreitos limites de frio e calor, e a partir daí não se voltava para o campo conjetural da imortalidade e do papel do homem no universo. Vinte e cinco graus abaixo de zero queriam dizer apenas que deveria se proteger com protetores de orelhas e com grossas ceroulas. Vinte e cinco graus abaixo de zero eram para ele nada mais nem nada menos que vinte e cinco graus abaixo de zero” (NOTA 1).
Há pessoas que não conseguem ir além do mundo concreto que as rodeia a ponto de não conseguir nominar seus sentimentos. Cunhou-se o termo alexitimia para a incapacidade de se colocar os afetos em palavras. Timia significa alma, sentimento; lexia, palavra; a, falta. (NOTA 2).
NOTA 1 - Trecho retirado e traduzido livremente da página 130 do livro de Ernesto Sabato Cuentos que me apasionaron. Editora Planeta, 2003. Jack London, cujo nome verdadeiro era John Griffith London (1876-1916), viveu dezessete meses no Alaska na companhia de garimpeiros que buscavam ouro. O ouro que Jack London trouxe foram vivências que lhe permitiram escrever contos maravilhosos.
NOTA 2 - As primeiros referências sobre alexitimia foram feitas por Marty, M’ uzan e Nemiah. Marty P, M’Uzan M. Le “pensée operatoire”. Rev. Franc. Psychoan. 27 (suppl.): 345-356, 1963; Nemiah JC. Psychology and psichosomatic illness: reflections on theory and research methodology. Psychoter. Psychosom. 22:106-111, 1973; Nemiah JC. Alexithymia. Theoretical considerations. Psychoter. Psychosom. 28:199-206, 1977. Outros artigos sobre alexitimia: (I) Lolas F, De la Parra G, Aronsohn S, Collin C. On the measurement of alexithymic behavior. Psychother Psychosom. (2) 33(3): 139-46. 1980; (II) Salton JA. Alexitimia:breve revisão. Psicossomática. 2:9-11, 1987; (III) Franz M, Schneider C, Schafer R, Schmitz N, Zweyer K.Factoral structure and psychometric properties of the German version of the Toronto Alexithymia Scale (TAS-20) in psychosomatic patients. Psychother Psychosom Med Psychol. 51(2): 48-55, 2001; (IV) German. Bydlowski S, Corcos M, Paterniti S, Guilbaud O, Jeammet P, Consoli SM. French validation study of the levels of emotional awareness scale. Encephale. 28(4): 310-20, 2002
RESPONSABILIDADE
É senso comum que não devemos deixar a uma criança a incumbência de “espantar os corvos”. Descrevo um exemplo chocante (e muito triste) que ajudará a memorização de quem lê. A Revolução Federalista, ocorrida em 1893 no sul do Brasil, trouxe como conseqüência sofrimentos atrozes para as famílias da época (NOTA 3).
Uma mulher viu seu marido e seu filho mais velho serem assassinados por um grupo de republicamos que passara por sua pequena fazenda. Sentada na porta da casa, ela e seu filho pequeno, únicos sobreviventes, ficaram ali, estáticos, por muito tempo. Os assassinos afirmaram à viúva e mãe que, se sepultasse os cadáveres, ela e o menino, único filho que lhe restara vivo, também seriam mortos. Os corvos começaram a descer. A mãe deu ao menino a incumbência de afugentá-los. Muitas e muitas foram as vezes que o menino, levantando-se da soleira daquela porta, espantou os corvos. Os corpos foram ficando podres e ele continuou a espantar os corvos. A certa altura, um beija-flor passou voando a sua frente. O menino foi atrás, encontrou algumas rosas, experimentou seus perfumes e, cansado, dormiu, dormiu por muito, muito tempo.O menino não foi responsável como a mãe esperava, apenas porque é criança. E a crianças não se dá a responsabilidade de “espantar os corvos”.
Observem o namoro de certos adolescentes. Abraços e juras de amor. No dia seguinte, um deles simplesmente some sem dar sequer notícias. A responsabilidade com tudo que se faz e se cria na vida vai sendo adquirida aos poucos. O senso do dever, de que temos um papel a bem desempenhar na comunidade humana é um parâmetro a observar na avaliação do nível de maturidade. A maturidade profissional depende muito da responsabilidade com que exercemos nossa atividade.
NOTA 3 - A Revolução Federalista opôs, de um lado, os federalistas, alcunhados de maragatos e chefiados por Gaspar Silveira Martins, e, de outro, os republicanos, os pica-paus, liderados por Júlio de Castilhos. A luta sangrenta, a maior guerra civil que o Brasil já teve, estendeu-se de 1893 até 1895.
PRAZER VERSUS REALIDADE
Para evitar a dor e obter o prazer, a mente humana utiliza dois processos: primário e secundário.
O processo primário é impulsionado pelo princípio do prazer. Consiste em formar a imagem de um objeto que removerá a dor e trará prazer imediatamente: a pessoa faminta, por exemplo, constrói uma imagem mental de alimento. É uma experiência alucinatória, em que o objeto desejado está presente na forma de imagem mental.
Para Freud, o sonhar acordado ou dormindo seria um exemplo disso, representaria a tentativa de satisfazer um desejo. A percepção da morte, outro exemplo, teria levado aqueles seres primitivos a criarem sonhos de uma vida após a morte. Focalizando a questão por outro ângulo, poderíamos dizer que a percepção da morte fez crescer nosso mundo interior, repleto de sonhos, fantasias, imaginações.
Já o processo secundário obedece ao princípio da realidade: tolera-se a dor e posterga-se o prazer até que seja encontrado o objeto apropriado para a satisfação da necessidade. O processo secundário é pensamento realista: através dele formulamos um plano exeqüível à satisfação da necessidade, não de forma fantasiosa ou alucinatória, mas, sim, concretamente. Não basta alucinar o pão, é necessário um plano realista para conseguir efetivamente comê-lo. O processo secundário movido pelo princípio da realidade vai sendo adquirido ao longo do nosso desenvolvimento emocional.
TESTE DA REALIDADE
Quanto mais maduros, mais conseguimos viver em acordo com o princípio da realidade. Inclusive nos saímos melhor no chamado Teste da Realidade, que consiste em conseguir distinguir o que é pertinente ao nosso próprio mundo interior e o que é pertinente ao mundo exterior.
Um menino pequeno ainda não faz essa distinção e expõe seu mundo de fantasias ao conversar com seus brinquedos na sala de sua casa mesmo na presença de visitas. Não se espera que um adulto jovem entre cantando numa sala de aula e continue mesmo sob o olhar de desaprovação do professor e o riso dos colegas.
Espera-se que um adulto tenha um bom juízo de realidade, um bom juízo crítico. Porém, quem não conhece alguém que toma a palavra numa reunião e não a entrega mais? A falta de “desconfiômetro” pode indicar imaturidade.Um adolescente não percebe o quanto nós vivemos dentro de uma “rede de relações”. Qualquer ato nosso repercute.
ADMINISTRANDO A ANSIEDADE
Freud introduziu o termo “defesa” em 1894 (NOTA 4). Mecanismos de defesa são processos psíquicos que tendem a evitar o aparecimento na consciência de idéias e de afetos desprazerosos. Ana Freud, em 1936, empregou a palavra “negação” para se referir a uma maneira primitiva de lidar com ansiedades desencadeadas por realidades externas desagradáveis (NOTA 5).
A criança, com os poucos recursos que possui, limita-se ao emprego de mecanismos não tão eficazes: defesas primitivas ou imaturas. Exemplo delas: negação, projeção, deslocamento, onipotência. Um dos critérios para a maturidade é o emprego de defesas mais elaboradas, ditas “maduras”, como a sublimação, a antecipação e o humor.
Testes foram elaborados para se avaliar a qualidade dessas defesas, como o Defensive Function Scale of the DSM-IV (NOTA 6).
Observemos essas formas de administrar a ansiedade através de uma situação do dia-a-dia. Um rapaz, que chamaremos de Antônio, disse aos amigos que não iria encontrá-los no bar do posto de gasolina: compromisso assumido com namorada nova. Conhecera-a na noite anterior e haviam ficado juntos numa boate. Combinara buscá-la em seu apartamento às 17 horas. Quando lá chegou, às 17 horas e 15 minutos, encontrou apenas a mãe da nova namorada, aflita, à procura de desculpas. Na despedida, à porta do elevador, acabou desabafando toda a verdade: sua filha acabara de sair com seu antigo namorado. Antônio chegara atrasado.
O que fazer diante de tão desagradável situação? Como lidar consigo mesmo? E com ela? E com os amigos do bar do posto de gasolina? Vamos descrever diferentes cenários.
NOTA 4 - Freud S. As neuropsicoses de defesa. In: Obras Completas. Vol. III. Imago, 1969.
NOTA 5 - Freud, A. O ego e os mecanismos de defesa. Civilização Brasileira, 1972.
NOTA 6 - AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. DSM 4. ed. Washington: American Psychiatric Association, 1994. Leia: (I) Vaillant GE. Adaptive mental mechanisms. Their role in a positive psychology. Am Psychol. 55(1): 89-98, 2000; (II) Evans DW, Seaman JL. Developmental aspects of psychological defenses: their relation to self-complexity, self-perception, and symptomatology in adolescents. Child Psychiatry Hum Dev. 30(4): 237-54, 2000; (III) Manners J, Durkin K. A critical review of the validity of ego development theory and its measurement. J Pers Assess. 77(3): 541-67, 2001.
NEGAÇÃO
Desde o dia 18 de novembro de 1940, o Estado Maior do Exército Soviético recebia informações de seu embaixador em Berlim e dos agentes secretos de codinomes Açor, Diamante, Fiel e Carmem que revelavam as preparações da Alemanha nazista para invadir a URSS.
Carmem, em 20 de junho de 1941, chegou ao desespero: “Não entendo o que está a acontecer. A Alemanha está para agredir-nos de um momento para o outro! No entanto, estranhamente, ninguém reage as minhas informações. O que se passa? Peço-lhes que levem as minhas comunicações ao conhecimento das autoridades supremas!”
Como reagiu o todo-poderoso Béria? Enviou uma nota a Stálin em 21 de junho de 1941, um dia antes da invasão: “Nosso embaixador em Berlim deve ser punido por continuar a enviar-me inúmeras desinformações sobre a suposta preparação da agressão alemã contra a URSS. Comunicou, inclusive, que essa ‘agressão’ seria desencadeada amanhã... Esta mesma informação foi transmitida pelo major-general Tupikov, adido militar em Berlim. Esse bronco desse general afirma que três grupos de exércitos da Wehrmacht avançarão em direção a Moscou, Leningrado e Kiev”.Nesse mesmo dia 21 de junho, Béria emitiu um despacho escrito à caneta-tinteiro com letra pesada: “Ultimamente muitos dos nossos colaboradores têm dado crédito a insolentes provocações e provocado pânico. Pela sua desinformação sistemática, reduzir a pó nas colônias penais os colaboradores secretos ‘Açor’, ‘Diamente’, ‘Fiel’ e ‘Carmem’, como cúmplices dos provocadores internacionais que se propõem lançar-nos contra a Alemanha. Admoestar severamente os restantes” (NOTA 7).
Na madrugada do dia seguinte, 22 de junho de 1941, os tanques nazistas entraram na URSS trazendo atrás de si um imenso e aparelhado exército. Que exemplo de negação! Com esse mecanismo primitivo, é provável que Béria e Stálin tenham conseguido dormir a noite de 21 para 22 de junho.
Voltemos ao Antônio, que desce pelo elevador, caminha pela calçada e pára defronte à primeira vitrine: “Quanto custa este telescópio?” Como se dissesse para si: “Não houve nada”. Ansioso? Não mais. Se não houve nada, não há por que sentir ansiedade. Não é uma maneira tão eficaz, pois a realidade continua a existir, a realidade é maior do que nós. E no bar do posto? O que diz para seus amigos? Nada. E se, nesse exato momento, a ex-nova-namorada estiver passando em frente ao bar do posto com seu velho namorado?
Outro exemplo: uma mulher queria se separar, o marido não admitia, insistia que ambos ainda se amavam. Cansada de repetir, resolveu reunir testemunhas. Na frente dos pais do marido, de um irmão e de uma irmã dele, disse: “Quero que todos ouçam o que vou afirmar do fundo de minha alma: eu não o amo mais! Não o amo mais! Quero me separar! Se-pa-rar! Ouviram?”. E ele: “Não dêem atenção ao que ela diz. Ela me ama muito. Ela não quer se separar. Escutem bem: ela... não... quer... se... separar”. Você se lembra da frase de Nelson Rodrigues? “Se os fatos estão contra mim, azar dos fatos”.
NOTA 7 - Revista Sputinik, em maio de 1989, publicou essas informações, recolhidas em velhas pastas encontradas no Kremlim. Tais informações constam também na novela documental de Ovidi Gortchakor intitulada A véspera, ou a tragédia de Cassandra.
ONIPOTÊNCIA
Antônio desce pelo elevador com um sorriso no canto do lábio, imaginando a nova namorada ajoelhada a seus pés implorando seu amor: “Mulher que sentiu meu calor jamais conseguirá gostar de outro. E o canalha que saiu com ela? Assim que souber quem eu sou, de medo, mudará de cidade. E mudará de estado!” Ou seja, administra a ansiedade com a fantasia de que é muito, muitíssimo poderoso.
Onipotência e negação se complementam. Voltando ao exemplo histórico da Segunda Guerra, Béria e todo o alto comando do Exército soviético negavam as informações vindas do serviço secreto devido a Stálin ter garantido que Hitler não invadiria a URSS. Pelo menos no ano de 1941, Hitler não invadiria. E se Stálin disse, está dito. A realidade? O que é a realidade perto de Stálin? Se os fatos estão contra Stálin, azar dos fatos.
PROJEÇÃO
O rapaz desce pelo elevador, pisa na calçada e vocifera: “É uma puta! O que que eu quero com mulher sem-vergonha? E nem é tão bonita assim. É muito burra”. Ou seja, ele projeta nela todo o problema e todas as coisas ruins do mundo. Provavelmente, no bar do posto, com a ajuda dos amigos, falará muito mal das mulheres. Os defeitos dos seres humanos, incluindo aí os seus próprios defeitos, são jogados para fora e projetados na sua ex-nova-namorada.
Outro exemplo de projeção é o do pai que leva seu filho de seis anos pela madrugada à emergência de um hospital universitário para retirar uma bolinha que o menino, inadvertidamente, colocara em seu próprio ouvido há dois dias. Os sextoanistas não conseguem retirar a bolinha. E o pai, projetando seu próprio “defeito”, sua incompetência como pai por não ter acudido e levado seu filho a um otorrinolaringologista durante o dia, projeta neles sua incompetência como pai: “Um hospitalzinho de estudantes! Aqui não se acha um que seja competente!”
DESLOCAMENTO
Antônio desce pelo elevador e, quando pisa a calçada, encontra um amigo que está com um CD seu emprestado. Cobra a devolução com aspereza. Trocam palavras irritadas. O rapaz vai embora murmurando impropérios, listando todos os defeitos do amigo. É menos ansiogênico para ele este último conflito do que o primeiro.
O deslocamento pode ser para o corpo: a somatização de um conflito. Em vez do problema com a ex-nova-namorada, tem de se ocupar com uma dor de estômago de causa “desconhecida”. A negação, a onipotência, a projeção, o deslocamento aliviam, às suas maneiras, os sofrimentos. Porém, há maneiras mais maduras e eficazes de se alcançar o alívio.
SUBLIMAÇÃO
Na sublimação, procura-se uma atividade substituta que seja possível de se conseguir na realidade da vida e que também traga gratificação. Antônio poderia raciocinar assim: “Por alguma razão que eu não sei bem, as coisas aconteceram como aconteceram. De que adianta ficar raivosamente frustrado? Vou aproveitar este meu final de tarde fazendo o que também gostaria de fazer hoje: encontrar meus amigos no bar do posto de gasolina e jogar conversa fora ou, talvez, pegar aquele livro que ainda não encontrei tempo para ler”.
ANTECIPAÇÃO
Se com base em dados reais previrmos os problemas, poderemos antecipadamente adotar medidas que os previnam ou que, pelo menos, os minimizem. Caso já tenhamos sido “pegos”, vamos analisar a situação buscando observar o certo que deixamos de fazer e o errado que fizemos. Vamos nos antecipar: no futuro não seremos “pegos” novamente.
Antônio desce pelo elevador pensando que tomara uma atitude precipitada. Mal e mal conhecera a garota e já estava antevendo o início de um namoro. Por que agira assim? Por outro lado, não sabia dos motivos dela. Quem sabe era mesmo imatura, irresponsável em seus vínculos. Ou, quem sabe, o ex-namorado reaparecera sem avisar e ela saíra com ele como forma de evitar o natural constrangimento advindo de um encontro entre os dois pretendentes. Oportunamente, irá conversar com ela e se inteirar dos fatos.
HUMOR
Antônio desce pelo elevador e já na calçada sorri: “Essa foi boa! Me acontece cada uma!” No bar do posto conta aos amigos. É alvo de muita chacota. Entra na brincadeira: “Aprendi uma lição. Nunca mais vou me atrasar em nada. Fiquei de passar lá às 17 horas... alguns minutos de atraso e deu no que deu!”
Por que ele ri? Porque sabe que todos podemos entrar em “frias”. O que houve não foi nada “pessoal” com ele.
Houve o que houve porque a vida é assim. A vida é uma constante mistura de acontecimentos trágicos e risíveis. Chaplin não nos ensinou?
ALMAS DESUNIDAS
Dificilmente alguém consegue funcionar de forma madura em todas as áreas da vida. E em cada área específica poderá haver disparidade. Na intelectual, por exemplo: um indivíduo pode falar como adulto no que se refere à música e ao cinema e como adolescente no que se refere à política.
Como os seres humanos dão palpite sobre o que não sabem! Adolescentemente, acham que sabem de tudo. Já vi um psicólogo escrever um artigo sobre soja transgênica, um agrônomo receitar um novo antidepressivo e um técnico em informática insistir para que um colega suspendesse o tratamento medicamentoso que fazia para síndrome de pânico.
Na área afetiva também nosso amadurecimento é irregular. Frente a algumas ansiedades conseguimos sublimar, antecipar, rir de nós mesmos. Frente a outras, só sabemos negar, projetar ou deslocar. Observando o tipo de defesa utilizado numa dada situação, descobriremos o quanto estamos amadurecidos naquela área.
Adquirimos “leituras” mais maduras ao longo da vida, porém as anteriores nunca se apagarão.
Por isso, seguidamente nos vemos envolvidos em debates interiores. Ora é a criança que toma a palavra afobada, ora o adolescente tenta impor suas verdades, ora o adulto...
Como poetizou Murilo Mendes: “Deram-me um corpo só para suportar calado tantas almas desunidas”.
Exercício - ILHA DO MEL
Vamos examinar o seguinte caso.
Como todos os descritos no curso, não se trata de caso real. Portanto, qualquer semelhança não passa de mera coincidência.
Donaldo, 40 anos, pai de Melissa, 16 anos, busca organizar sua bagunçada relação com a filha. Melissa mora com a mãe, Maira, 36 anos. As duas ora se amam, ora se odeiam. Combinam no interesse por roupas de griffe, jóias, tratamentos estéticos e pelas novelas da TV. Também combinam no desinteresse por questões profissionais, políticas, econômicas e pelos programas de notícia. Brigam porque Melissa quer mesada maior, gosta muito da noite e teima em dirigir o automóvel mesmo sem carteira, além de que não se interessa pelos estudos e, ultimamente, passou a beber cerveja e a fumar.
Donaldo e Maira se separaram há seis anos, após um casamento que principiou apaixonado e com Maira no segundo mês de gravidez.
O teste comprobatório foi realizado em plena viagem de núpcias. Sabe onde? Em Paranaguá, antes de tomar o barca para a Ilha do Mel. Na volta, saberiam o resultado. No barco, pensaram em nomes. Quando tinham à direita o verde da Serra do Mar, à esquerda a Ilha do Cardoso e bem próximos, a companhia de golfinhos, surgiu da sua boca o nome “Melissa”.
O motivo da separação, segundo ele, se deveu à vida fútil e à irresponsabilidade de Maira: “Só pensava em comprar, comprar e comprar. Nunca soube viver dentro de um orçamento”. Para ela o motivo se deveu à constante intromissão de Donaldo em sua vida: “Um chato que nasceu para trabalhar. Não sabe o que é se divertir. Com ele junto, não podia ser eu mesma. Sempre aquele olhar de censura, seja pelo brinco novo, seja pelas brincadeiras que eu fazia nos jantares com os amigos”.
Donaldo reclama: não consegue participar com autoridade da educação da filha. Quando tenta impor limites, Maira o boicota. Por exemplo, proibiu Melissa de sair de casa à noite. Só sairia aos sábados, caso tivesse um comportamento adequado durante a semana. Entenda-se: não chegar atrasada à escola, estudar em casa uma hora por dia, não fumar e não gritar com os pais. A mãe a deixou sair à noite fora do combinado. Mais ainda: para, segundo suas palavras, não perder o diálogo com a filha, permite que ela dirija o carro pelo bairro. Donaldo diz que a ex-mulher nunca soube tolerar frustração e, por isso, não consegue educar a filha a aprender a tolerar frustração. Que ele sabe como fazer, porém, quando tenta, Maira se alia a filha e ambas se afastam dele.
Maira reclama: diz que Donaldo não sabe ser flexível, não é um pai, é um carrasco. Que age com a filha como agia com ela quando eram casados. Que ela se identifica com Melissa, sabe a dor de querer algo e se ver impedida e frustrada.
PREENCHA COM O NÚMERO CORRESPONDENTE
(1) Donaldo
(2) Maira
( ) Traço de personalidade obsessivo
( ) Predomina o princípio do prazer
( ) Predomina o princípio da realidade
( ) Administra os problemas usando a negação
Qual o verdadeiro problema?
Níveis diferentes de maturidade dos pais. Em Maira predomina o princípio do prazer, por isso identifica-se com a filha. Administra os problemas usando o mecanismo imaturo da negação: acaba emprestando o carro, deixando com que saia à noite. Ou seja, nega as possíveis conseqüências. Donaldo se baseia no princípio da realidade. Por outro lado, revela traços de personalidade obsessiva que lhe atrapalham a lidar com o problema.
Acumulam-se sentimentos negativos em ambos. Donaldo: indignação, raiva, sensação de impotência. Maira: mágoa com as atitudes do marido que a agridem.
A análise da situação pode ser resumida no seguinte diálogo: “Doutor, acho que já perdi minha filha”. “Donaldo, talvez você tenha perdido a filha que imaginava que teria, feita a sua imagem e semelhança”. E ele: “Admito, doutor. Mas, convenhamos, para ela sobreviver nessa vida difícil seria bem mais fácil se ela, como eu, tolerasse frustração, soubesse viver dentro de um orçamento, fosse responsável nos seus afazeres, se interessasse por outras coisas além de jóias e de estética”. “Seria”, concordo com Donaldo, e descontraio nosso diálogo contando-lhe da entrevista com o diretor irlandês Jim Sheridan sobre seu filme Terra dos sonhos: “Minha mulher disse que eu parecia gostar das crianças no filme mais do que das minhas próprias filhas. Naomi, minha filha mais velha, falou: ‘É claro que sim. Ele pode reescrever essas meninas do jeito que quiser’”.
Prezado aluno,
faça uma pausa. Reflita sobre o caso. Pense numa solução.
O problema principia na impossibilidade dos pais de Melissa se comunicarem. Ele tem interesses compatíveis com sua idade, acompanha os desdobramentos da política e da economia de seu país, vive baseado no princípio da realidade. Tem um nível de maturidade compatível com o de uma pessoa de quarenta anos, sua idade cronológica. Maira, por sua vez, é realmente imatura para a idade e vai continuar sendo, e assim continuará lidando com sua filha.
A questão fundamental, na visão de Donaldo, é a imaturidade de Maira. Concordamos com ele. Como modificar o sentimento que tal fato desperta nele? A raiva da indignação e a depressão da impotência.
Você que está fazendo curso, o que você faria?
Digo: “Sua ex-esposa não vai se tornar madura de repente. E você tem apenas a autoridade de pai, não a de pai e mãe”. Ele me conta que um amigo havia lhe dito: “Quando você quis ter filho com uma mulher de mentalidade adolescente, não poderia esperar educação diferente para esse filho”.
Solução: diminuir as expectativas em relação à educação da filha. O amigo havia lhe dito mais ainda: “E se sua filha fosse deficiente mental, você ficaria importunando-a com expectativas inadequadas?”
Concluímos que terá de aceitá-las se não quiser perder a convivência. Porém, aceitá-las é uma coisa. Aceitar comportamentos de risco é outra.
E a ação?
1. Procurar tanto a filha como a ex-mulher e propor o diálogo em termos diferentes do que vem fazendo. 2. Conversar com elas em termos não ofensivos, localizando a dificuldade de entendimento na “leitura” diferente do jeito de bem viver e não no uso pejorativo da palavra “imaturidade”. 3. Reconhecer que, por vezes, desrespeitou a visão delas e, até mesmo, foi grosseiro. 4. Passar a intervir de forma branda em questões menores ou, até mesmo, “fazer vista grossa”. 5. Intervir com força apenas quando houver risco para a vida da Melissa e, no caso, ter de suportar as desavenças decorrentes. 6. E quando a filha se negar a vê-lo? Se for situação de risco, irá impor a sua presença. Será um chato, mas não a abandonará.
Donaldo teve a feliz idéia de propor um evento futuro positivo. “Vamos tentar nos entender a ponto de podermos nós três viajarmos juntos”, disse a elas. “Vamos a ilha inspiradora do nome Melissa”. Passeariam pelo Lagamar, coleção de água entre mangues, nem rio nem mar, e desembarcariam na Ilha do Mel dispostos a reviver os bons sentimentos que os uniram. Com certeza, visitariam o Farol das Conchas e, talvez, desceriam pela escada que vai do teto ao fundo da morada das sereias, a Gruta das Encantadas.
Os vínculos e os sentimentos não são fenômenos inertes. Mas com o uso de uma boa inteligência interpessoal, podemos conseguir que, mesmo modificados, eles voltem a ser bem-fazentes.
PECADOS CAPITAIS
As qualidades e os defeitos não são, necessariamente, disposições permanentes, componentes constantes no jeito de ser do indivíduo. Por isso, não os descrevi como traços positivos ou negativos no capítulo sobre personalidade.
Na maioria das vezes, as pessoas os apresentam em determinados períodos ou momentos. Mas há exceções. Há aquelas que são sempre invejosas ou sempre despreendidas.
Alguns defeitos são habitualmente agrupados sob o título “Os sete pecados capitais”: ira, inveja, gula, luxúria, preguiça, orgulho e avareza no sentido de mesquinhez. Exemplo do último: o filho chega em casa ofegante: “Pai... voltei da escola... correndo atrás do ônibus... economizei dois reais”. E o pai: “Por que não veio correndo atrás de um táxi?! Terias economizado dez reais! Escutou bem? Dez reais!”.
Há também o egoísta, o sádico, o caluniador. São tantos os defeitos que nos deteremos apenas nos seguintes: inveja, ciúme, calúnia, preconceito, discriminação e maldade. Por que adquirimos alguns deles e não outros?
INVEJA
No conto “Verba testamentária”, de Machado de Assis, Nicolau, em testamento, pede que o caixão em que seu corpo será enterrado seja fabricado por Joaquim Soares. Por que por Joaquim Soares?
No final do conto ficamos sabendo que os caixões de Joaquim Soares eram de péssima fabricação, não prestavam, ninguém os queria. Por que Nicolau pede um caixão de Joaquim Soares? Nicolau não podia se aproximar de nada que tivesse valor, pois, se o fizesse, sentia desejo de destruir. E ele não queria destruir seu próprio caixão. Machado de Assis, sem usar uma única vez o termo, descreve a inveja (NOTA 1).
A palavra inveja vem de invídeo, que significa olhar mau, ter olho grande, “secar” com o olho grande alguém. A principal razão da inveja reside num sentimento de incapacidade de viver seus próprios sonhos, de alcançar suas metas, de realizar-se.
Quando carrego dentro de mim a sensação de capacidade, eu gosto de ouvir de um amigo que ele fez a “volta ao mundo”. Que bom! Significa que é possível dar a “volta ao mundo” no sentido de realizar sonhos, isto é, reforça ainda mais a sensação de que eu também vou conseguir.
A sensação de incapacidade, ao contrário, me faz ter inveja, querer destruir. Que bobagem dar a “volta ao mundo”! Quanto gastou?! Se eu não consigo realizar meus sonhos, ninguém consegue. Ele não realizou sonho nenhum, entrou numa “furada”.
A sensação de incapacidade, matriz da inveja, pode advir do fato de o indivíduo não valorizar as coisas que estão ao seu alcance. Alguém já disse: “Vive bem quem gosta daquilo que é seu”.
A propósito, vale lembrar Fernando Pessoa (1888-1935) e seus heterônimos: “O Tejo é mais belo que o rio que corre na minha aldeia, mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre na minha aldeia, porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia” (NOTA 2).
Alberto Caieiro, “autor” da poesia da qual retirei um fragmento, era um sujeito simples, expansivo, satisfeito com o mundo e dava muito valor às coisas concretas: rios, árvores, campos, casas. Só poderia sair de seu espírito a poesia que diz: “Mas poucos sabem qual é o rio de minha aldeia / E para onde ele vai / E donde ele vem / E por isso, porque pertence a menos gente, / É mais livre e maior o rio da minha aldeia”.
Às vezes, essa sensação de incapacidade que é matriz da inveja advém da escolha inadequada de metas. O indivíduo, por exemplo, passa a desejar para si algo que está muito distante. Algo que fica na “contramão” de sua vida. Ou ele se coloca sempre em ambientes nos quais não há espaço, não há abertura para progredir. Voltando a Fernando Pessoa: “Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta”.
As raízes da inveja estão no início da vida, todos passamos por ela. Por isso, é impossível não tê-la em nosso cofre mais secreto. É uma questão de grau: da muita inveja a muita pouca inveja. A inveja, segundo a teoria psicanalítica, principia na relação com quem nos alimenta, representado pelo seio materno. Quando queremos mais alimento e não temos, não toleramos a frustração, ficamos com raiva de quem tem o alimento. Queremos destruí-lo. O invejoso, ocupado em destruir o outro, perde tempo precioso para construir a si próprio.
No ano 100 d.C., Plutarco escreveu sobre a inveja: “Realmente, não é difícil, mas até muito fácil contradizer um discurso pronunciado: contudo, substituí-lo por um melhor é trabalhoso sob todos os aspectos. Assim declarou o Espartano (Agesípolis, rei de Esparta, em 371 a.C.), ouvindo falar que Filipe tinha destruído inteiramente Olinto: ´Mas ele provavelmente não poderia reedificar uma cidade semelhante`” (NOTA 3).
O filósofo escreve mais sobre o tema: “(...)mas quando a inveja, originária do amor inoportuno à própria glória ou duma injusta ambição, se volta contra os que falam, não deixa a pessoa com esta disposição prestar atenção ao que diz, mas confunde e distrai o entendimento, o qual examina o seu próprio potencial para ver se é inferior ao de quem fala, e considera, ao mesmo tempo, se os outros ouvem com gosto e o admiram. Fica abatido com os louvores a quem estiver falando, e exasperado contra os presentes se o acolhem favoravelmente” (p.16).
Costuma-se dizer que há uma inveja boa quando admiramos alguém por alguma coisa: “Ah, como te invejo por isso”. Não acho correto o termo “inveja boa”. É melhor dizer: “Ah, como te admiro!”
Como lidar? Há uma maneira de lidar com o invejoso?
Primeiro, vamos mudar os sentimentos negativos que ele nos desperta. Vamos reconhecer que ele sofre. Sofre, como vimos, por julgar-se incapaz de se realizar. Portanto, vamos poupá-lo de saber de nossos sucessos.
Lembro a máxima: “Um amigo é alguém que gosta de ti apesar de teus sucessos”. Um amigo não invejoso. Uma dúvida: o invejoso consegue ser amigo?
E vamos ter cuidado com sua auto-estima, reforçando suas capacidades quando surgir a oportunidade. Quem sabe sugerindo que reveja seus objetivos, que mude de emprego, de atividade, de lugar, que deixe de ser “sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta”.
NOTA 1 - Assis, M. Verba testamentária. Em: Papéis avulsos. W.M. Jackson Editores, 1938.
NOTA 2 - Alberto Caieiro, Ricardo Reis e Álvaro Campos são “pessoas” diferentes criadas pela imaginação de Fernando Pessoa. Heterônimo, não é um pseudônimo. É mais que isso, é um personagem criado pelo autor que, como todo o personagem, tem de ter personalidade própria, interesses e comportamento singular. Este personagem vai criar poesias.
NOTA 3 - Plutarco. Como ouvir. Martins Fontes, 2003 p.20-21.
Aula Virtual 5 - CIÚME (inglês)
CALÚNIA
Calúnia é um dos crimes contra a honra. Os outros são difamação e injúria.
Injúria consiste em atribuir adjetivo desonroso a alguém. Por exemplo, fulana é mulher de programa.
Difamação consiste em imputar a alguém fato ofensivo a sua reputação. Por exemplo, beltrana dorme com o chefe para conseguir regalias no trabalho.
Calúnia consiste em acusar alguém de conduta criminosa. Ciclano é um estuprador, por exemplo.
Do ponto de vista psicológico, difamação, calúnia e injúria se assemelham. Refiro-me ao termo “calúnia” por ser o mais grave. Afirmativas como “onde há fumaça há fogo”, em verdade, são artifícios empregados pelos caluniadores. O correto é: “Onde há fumaça há um caluniador”.
Para bom entendedor, quem está sendo exposto não é o caluniado, mas, sim, o caluniador: revela-se e desvenda um interior conflitado e torpe. O caluniador tenta transferir seu desequilíbrio. Lançando uma calúnia, ele percebe que o interior da pessoa atingida começa a se desorganizar. Para que isso ocorra, a calúnia deve ser impactante, deve penetrar na vítima e estourar como uma bomba. Portanto, agora quem está desequilibrado é o outro e não mais ele. Ou, pelo menos, há mais alguém perturbado e em sofrimento como ele. Como esse artifício não promove alívio duradouro, o caluniador, como um viciado, tende a repetir e repetir o ato de caluniar. É uma falsa saída. É como se alguém pegasse o lixo de sua casa e o jogasse no pátio do vizinho. Por alguns momentos, há sensação de limpeza. Mas o lixo reaparece na sua casa, pois é ela quem o gera.
Existem dois tipos de caluniador: aquele que calunia sistematicamente e aquele que o faz num momento em que sua vida não vai bem. E quando há muito zunzunzum, saiba que pessoas estão propalando calúnia inventada por alguem. Plauto, dramaturgo romano, escreveu em uma de suas peças: “Os que propalam a calúnia e os que a escutam, se prevalecesse minha opinião, deveriam ser enforcados, os primeiros pela língua e os outros pela orelha”.
Como lidar?
Temos de aprender a lidar com esse fenômeno. Todos estamos sujeitos a ele. Scheakespeare escreveu: “Mesmo que sejas tão puro quanto a neve, não escaparás à calúnia”.
Se atingidos não devemos negar, por vergonha, o que está ocorrendo. Devemos agir no sentido de tentar mudar o foco da atenção do meio, que deve deslocar-se da vítima para o agressor. Deve ficar claro que o ser maléfico e criminoso inventado pelo caluniador é fruto de sua imaginação e revelador da ignobilidade de sua mente.
A internet vem sendo muito usada para a prática da calúnia, da injúria e da difamação (cyberbullying). Veiculados em blogs, e-mails, fotologs, mensagens de MSN e ICQ ou no Orkut, os casos online representam cinqüenta por cento das denúncias feitas as autoridades.
PRECONCEITO E DISCRIMINAÇÃO
O preconceito é uma idéia errônea tomada por verdadeira, que não pode ser corrigida, ou facilmente corrigida, pela confrontação com a realidade. Uma idéia acolhida sem crítica, passivamente, que vem da tradição ou de uma autoridade cujas ordens acatamos sem discussão. Os preconceitos são individuais ou coletivos quando compartilhados por todo um grupo social e voltados a outro grupo social.
É esperado que surjam preconceitos quando um grupo entra em contato com outro até então desconhecido: uma desconfiança, um temor, uma tendência a criticar os “novos vizinhos”, a estereotipá-los. Porém, é importante que se tome de imediato consciência do fenômeno. Urge combatê-lo dentro de si e apontá-lo e criticá-lo em seus pares. Só assim se evita sua conseqüência negativa: a discriminação.
A discriminação, além do significado de diferença ou distinção, tem uma conotação pejorativa. Processa-se na seqüência: a) somos diferentes deles; b) somos melhores e superiores a eles; c) os superiores e melhores devem dominar os inferiores.
Há grande diferença entre uma comunidade ou um país preconceituoso e outro discriminatório. No primeiro caso, não há um discurso teórico, uma doutrina defendida por grupos organizados em prol do racismo, por exemplo.
Como lidar?
Podemos evitar esse defeito se combatermos dentro de nós, na raiz, todo e qualquer preconceito. Caso contrário, um dia em nosso espelho veremos a imagem de um preconceituoso discriminador. A imagem de alguém fora de órbita, com a mente poluída por idéias fixas, por generalizações superficiais e estereótipos.
Conviver com aquele que é alvo de nosso preconceito ajuda muito. A realidade corrige a fantasia.
MALDADE
Problema amplo e multifacetário, a maldade é estudada por historiadores, teólogos, filósofos, biólogos, psiquiatras, psicólogos, enfim, por todos que querem vê-la minimizada e controlada.
As pessoas dizem sobre certos crimes: “Só pode ter sido cometido por um louco!” Troque-se o termo “louco” por “maldoso”, pois loucura é um estado em que a pessoa sai da realidade e confunde fantasia com imaginação. Por exemplo, alguém apresenta um quadro de esquizofrenia paranóide e dá um tiro num vizinho por achar que ele tramava a sua morte. Ora, a grande maioria dos portadores de esquizofrenia paranóide não comete crime algum. Quantas pessoas têm fantasias pedofílicas e não matam nem atacam crianças? Por que alguns o fazem? Por que um homem em depressão se suicida e outro na mesma situação mata a esposa e as duas filhas e depois se suicida?
A psiquiatria, hoje, dá o nome de maldade a esse triste componente a mais que acompanha certas pessoas e outras não. As prisões estão cheias de pessoas que não apresentam doença mental alguma. Portanto, o termo correto não é “loucura”, é “maldade”.
Por que algumas pessoas são maldosas e outras não?
Os motivos são inúmeros e não foram todos catalogados. Por exemplo, em Ricardo III, de Shakespeare, encontramos uma passagem em que o personagem diz que, por haver nascido tão feio, resolveu, pelo menos, ser mau, numa tentativa de recapturar um sentimento de superioridade sobre os demais, fazendo-os sentir o peso de seu poder, no chamado “narcisismo maligno”.
Penso que a sociedade humana vem sendo permissiva com a maldade e penso que isso permite que ela cresça. Quando meteoros caíram na Sibéria, nossos ancestrais disseram: “Deus atirou em nós”. E completaram: “Por nossa culpa”. A justificativa do sofrimento mediante a culpa está entranhada no ser humano.
Como escreveu Bobbio: “Da realidade cotidiana, o princípio da justiça retributiva – ou da necessária relação entre o mal que se faz e o mal que se sofre – foi transferido, nas sociedades arcaicas, para a interpretação de todo o universo” (NOTA 4).
Lembro-me de um conhecido meu que, além de um excelente carpinteiro - fez as divisórias de um consultório que tive -, à noite atendia num pequeno bar que montara na garagem de sua casa. Tragicamente teve sua vida interrompida por um tiro. Negara-se a alcançar uma caixa de fósforos a um homem que há dias bebia e fumava em seu bar sem pagar. Sabem que comentário eu ouvi? “Também, que custava dar uma caixa de fósforos”. Morreu por não ter alcançado uma caixa de fósforos?! Absurdo! Morreu pela maldade de alguém!
Outra questão: quando não há consciência do mal não há maldade? Obviamente, não podemos acusar um terremoto de “maldoso”, assim com outros fenômenos naturais. Ou haveria um mal natural?
Darwin teria ficado chocado com a conduta adotada por determinadas vespas para alimentar seus descendentes. A vespa atinge com seu ferrão o sistema nervoso de um inseto até paralisá-lo completamente e deposita em seu corpo os ovos com suas crias. Abertos os ovos, as larvas se alimentam de carne sempre fresca. O inseto não tem como reagir, não pode se mover. A vespa não tem cérebro para ter consciência do mal. Mas nós que temos cérebro achamos que ela comete uma maldade.
O homem com esquizofrenia paranóide (e com maldade) que matou o vizinho não tem consciência do ato. Admitimos isso a ponto de considerá-lo inimputável: ao invés de cadeia, necessita de tratamento. Mas nós que temos consciência achamos que ele cometeu, sim, uma maldade.
Como lidar?
É fundamental que se rompa essa maneira primitiva de pensar – se há maldade é porque houve uma culpa. Tipo “Deus atirou os meteoros em nós por nossa culpa”. Ela leva à permissividade e à passividade frente a esse que é o comportamento mais abominável do ser humano, ao maior de todos os defeitos de nossa espécie.
NOTA 4 - Bobbio N. Elogio da serenidade. Unesp, 2000.
Exercício - ADMINISTRANDO A INVEJA
E. S. é um homem de quarenta e quatro anos, casado há doze anos, sem filhos. Ele é muito organizado, pontual, meticuloso, tem uma tendência a administrar os ambientes que freqüenta, seja na vida familiar, social ou profissional.
Recentemente passou a fazer parte da diretoria de um clube social de sua cidade. Logo começou a se ver invadido por um sentimento de inveja em relação ao presidente recém eleito. Todas as vezes que o mesmo era agraciado com alguma regalia por dirigir a entidade – uma janta, um discurso, uma viagem – E. S. se sentia diminuído. Ficava até sem jeito quando ouvia algo de positivo sobre o novo presidente. Seu sentimento era o de humilhação.
No início veladamente, depois sem muitos cuidados, começou a se tornar crítico da diretoria da qual ele mesmo fazia parte. E.S. um dia resolveu refletir. Resolveu exercitar sua inteligência intrapessoal. Logo concluiu: “Estou sofrendo do mal da inveja. Não adianta me enganar alegando os defeitos do novo presidente e de meus companheiros de diretoria. Não estou tolerando o sucesso deles”.
Mais adiante, E. S. pensou: “Por que não compartilho do sucesso da diretoria da qual pertenço?” Na reflexão, E.S. passou a observar a si mesmo: seus traços de personalidade, nível de maturidade, qualidades, defeitos, ética e moral. Encontrou, além do defeito da inveja, determinado traço de personalidade. E. S. apresenta qual dos seguintes traços de personalidade?
(a) Anti-social
(b) Impulsivo
(c) Dependente
(d) Obsessivo
(e) Paranóide
E. S. refletindo sobre seu comportamento concluiu que sofre de inveja apenas em situações especiais. Normalmente não sofre desse mal. Deu-se conta de que em sua vida familiar e profissional é ele quem administra o ambiente. Porém, na diretoria do clube não. O presidente administrava. Supôs que esse fato é que fez com que a inveja eclodisse. Tentaria controlar melhor seu traço de personalidade. Sabia que o mesmo se tornava mais intenso em situações de ansiedade.
Conseguiria permanecer na diretoria do clube com menos ansiedade mesmo sem poder controlar/administrar o ambiente? Sem, como conseqüência final, ver eclodir dentro de si o mal da inveja? Caso não conseguisse, iria pedir demissão da diretoria. Não queria estragar as boas relações que mantinha com seus colegas de clube. Diria para si mesmo que, por enquanto, não era capaz de conviver bem dentro de um grupo.
RESPOSTA: a inveja veio à tona quando ele se inseriu num grupo no qual ele não pode exercer plenamento seu traço obsessivo; não era ele quem "administrava" o clube; passou a ter inveja de quem tinha o poder de administrar.
Aula Virtual 5 - CIÚME (italiano)
VIRTUDES
As qualidades ou virtudes humanas, classicamente, são divididas em individuais e em sociais. As primeiras são disposições boas somente no que diz respeito à própria pessoa. Por exemplo, a coragem. As segundas, são disposições boas dirigidas aos outros. Por exemplo, o senso de justiça.
Norberto Bobbio propõe uma divisão baseada em virtudes fortes e virtudes fracas. Não usa os termos no sentido positivo ou negativo. As fortes são as que têm mais oportunidade de se mostrar quando presentes naqueles que exercem o poder, que comandam, que dirigem, que governam. As fracas não são inferiores, menos úteis, menos nobres. São aquelas que podem ser exercidas pela parte da sociedade que não está no comando, pelos desprovidos de poder, pelos pobres, pelos que pertencem à história submersa, à micro-história em contraposição à macro-história dos poderosos (NOTA 1).
São elas:
VIRTUDES FORTES
Coragem Firmeza Bravura Ousadia Audácia
Descortino Generosidade Liberalidade Clemência.
VIRTUDES FRACAS
Humildade Modéstia Moderação
Recato Pudicícia Castidade Continência
Sobriedade Temperança Decência
Inocência Ingenuidade Simplicidade
Mansuetude Doçura Serenidade
São tantas as qualidades humanas que vou abordar apenas algumas das que mais admiro: tolerância, altruísmo, compromisso, senso de dever, senso de justiça e serenidade.
NOTA 1 - Bobbio N. Elogio da serenidade. Unesp, 2000.
TOLERÂNCIA
Vamos dividi-la em tolerância quanto a si mesmo e em tolerância quanto aos outros.
Lembram-se da lição de vida de Chuang Tzu? “Era de manhã. O guarda falou que os macacos deviam comer uma banana de manhã e duas à noite. Os macacos ficaram muito infelizes com esse tratamento. O guarda então disse que eles comeriam duas bananas de manhã e uma à noite. A macacada ficou muito satisfeita com esse tratamento”.
A tolerância à frustração faz a diferença. Alunos de quatro anos de idade da pré-escola de Stanford foram levados um por um a uma sala e colocados diante de um marshmallow: “Você pode comer esse marshmallow agora. Mas, se não o comer até eu voltar, te darei mais um e você poderá comer dois”. As crianças do teste do marshmallow foram avaliadas quando adultos pelo psicólogo Philip Peake (NOTA 2).
Aos trinta anos de idade, a diferença era grandemente favorável aos que tinham tolerado a frustração de comer imediatamente. Os que haviam agarrado logo o marshmallow eram claramente menos aptos do ponto de vista intelectual e do ponto de vista emocional. Na maioria, eram solitários, distraíam-se com facilidade e continuavam incapazes de retardar um prazer.
Na psiquiatria observamos a capacidade de tolerar frustração para antever a evolução do tratamento. Quem terá êxito em superar o uso de maconha? De álcool? Qual indivíduo com desejos pedófilos é periculoso? Quanto maior a presença desta virtude, melhor o prognóstico.
A tolerância em relação a si mesmo se faz também em relação às limitações da condição humana e em relação às nossas próprias limitações pessoais. O sujeito que se olha no espelho e suspira: “Mesmo assim... eu gosto de mim”.
Quanto à tolerância em relação aos outros, a boa convivência não se mantém sem ela. No campo intelectual, a aplicação dessa virtude depende da visão que temos da verdade. Será mais fácil se adotarmos o entendimento personalista: toda a verdade é pessoal, produto de um ser singular. Conforme já dizia uma antiga máxima chinesa: “Não existem verdades, existem versões”.
Porém, a tolerância tem limites. Tanto na vida privada quanto na social. Sabemos do mal que fazem aos filhos os pais excessivamente tolerantes. Um adolescente dá um soco no pai por ele lhe negar o automóvel. Quebra seu nariz e as lentes de seu óculos. E a mãe, que sempre tomava o partido do filho, assim comenta o ocorrido: “Seria exigir demais do meu filho querer que ele primeiro tirasse os óculos do pai para depois agredi-lo”.
O “espírito democrático” funda-se no exercício da tolerância. Meu pai foi prefeito de minha cidade por duas vezes. Ganhou algumas eleições e perdeu outras. Aliás, foi a pessoa que conheci que menos se chateava por perder uma eleição. Dava um assobio nervoso ao ouvir a contagem final dos votos e, em seguida, pegava algo para ler ou, até mesmo, ia dormir um sono descansado. Certa vez um amigo seu veio visitá-lo dias antes de uma eleição para lhe informar que votaria no outro candidato. Motivo: o adversário havia, no passado, empregado um filho seu. Conversaram animadamente sobre assuntos gerais. Meu pai em nenhum momento tentou demovê-lo de sua decisão. Ao se despedirem, ambos trocaram agradecimentos. Questionado por minha mãe, meu pai respondeu: “É um direito dele. É a sua forma de pensar”.
A consciência da irredutibilidade de certas opiniões e da necessidade de se encontrar um modus vivendi entre elas conduziu as sociedades democráticas a elegerem a tolerância como um valor maior.
A questão é: todas as idéias devem ser toleradas? Mesmo aquelas que negam a idéia mesmo da tolerância? Você que me lê, o que pensa a respeito? Devem ser tolerados os intolerantes?
NOTA 2 - A pesquisa do psicólogo Philip Peake é descrita por Daniel Goleman no livro Trabalhando com a inteligência emocional. Objetiva, 1999, p. 93-4.
ALTRUÍSMO
Desejo ler o dicionário da primeira à última página. Ainda vou conseguir. Seguidamente abro-o ao acaso e aprendo o significado de algum verbete. Em “desprendimento” leio: “abnegação, altruísmo no sentido de amor ao próximo, filantropia”. Abandono o texto e evoco um episódio inesquecível.
Uma marquise me abriga da garoa que cai colorida por minúsculos flocos de neve, mas não me abriga do frio. Estou na frente do hospital onde estagio como estudante de medicina. De vez em quando sou tomado por uma rajada de tremor. Quem vejo chegar? O tio João! Viera visitar um amigo doente. A nossa conversa, como sempre, é prolongada. O tio João e sua narrativa detalhada, esmerada, as coisas do seu dia-a-dia relatadas com a segurança de quem sabe viver e sabe contar me fazem esquecer o frio e não me importar com os tremores em rajada.Somos interrompidos por um homem de uns quarenta anos a pedir esmola. Tio João observa-o: roupas umedecidas pela garoa, nos ombros flocos brancos, o vapor que sai de sua boca não esconde sua falta de dentes. Seu tremor, diferente do meu, é contínuo e, de tão intenso, o faz saltitar. “Você precisa de roupa”, afirma tio João enquanto retira um dos dois casacos que usa e veste aquele homem sofrido. Ato contínuo, volta-se novamente para mim e continua sua, detalhada e cheia de calor humano, narrativa.
Tio João não me surpreendeu naquela manhã na frente do hospital. Era o seu jeito espontâneo, natural de ser. O desprendido é um forte. E como faz bem conviver com alguém que é um forte!
COMPROMISSO
Recordo a observação de um homem de bastante idade e experiência com o qual convivi numa organização que patinava, patinava e não evoluía: “Doutor, não adianta, nossos colegas são daqueles que rodeiam, rodeiam, mas não carregam o caixão”.
Que qualidade essa “de carregar o caixão!” Boa para quem a tem: a vida é vivida de forma mais intensa. Boa para os seus companheiros de jornada. Deveríamos ter a prudência de só nos associarmos, seja profissional, afetiva ou até mesmo socialmente, com quem faz relações compromissadas.
SENSO DE DEVER
É fácil conviver com alguém que, sem ser obrigado ou pressionado externamente, levanta-se pela manhã e vai estudar ou vai trabalhar. Alguém que faz isso movido apenas por um sentimento. Pela sensação de estar de bem consigo mesmo por cumprir seu dever.
Quando esse senso é teorizado, quando sai do campo do sentir e penetra no campo do pensar, passa a fazer parte da ética, da parte da filosofia que discursa sobre o bem e o mal.
O bem, no caso, é participar ativamente dos afazeres humanos. É retribuir com trabalho o trabalho que os outros fazem para nós: o jornaleiro, o motorista do ônibus, a cozinheira, o encanador... É ter consideração pelo muito que os seres humanos que nos antecederam construíram e nos deixaram. Se não fosse o trabalho deles, ao vir ao mundo nos encontraríamos nus numa floresta. Convém nunca esquecer que, diferentemente dos outros animais, ao nascer, deparamo-nos com a natureza propriamente dita, a “primeira” natureza, e com uma “segunda” natureza construída pelos nossos antepassados. Quanto trabalho tiveram eles!
Porém, pode haver exagero no senso do dever e a vida pode se resumir ao trabalho. Há alguns anos estive no Japão visitando a Associação de Defesa das Vítimas do Karoshi. Karo=cansaço; shi=morte. Morte por cansaço do trabalho. Morre-se em geral de infarto ou AVC. Uma pessoa que trabalha e ou estuda 60 horas ou mais por semana faz parte da população de risco do karoshi. No Japão, o senso do dever exagerado, leva a milhares de mortes por ano. Por exemplo, só folgam um dia por semana e não necessariamente no domingo. Mesmo com direito há quinze dias de férias por ano, só usufruem, em média, nove dias. Tal situação, não só adoece a pessoa como a empobrece mentalmente. Dificulta em muito sua capacidade de criar. O ócio é sim criativo.
SENSO DE JUSTIÇA
É seguro relacionar-se com quem diz: “Não acho isto justo”. Ou: “Acho que o justo é...” Alguém que valoriza e procura se conservar em sintonia com o que sente que é justo. Ao contrário, quem não carrega dentro de si tal sensação nos deixa inseguros quanto a suas atitudes.
Mas devemos ir além: perceber se existe no outro um senso de justiça é o primeiro passo. O segundo é: qual é a sua justiça? Para ele, o justo é o que defende exclusivamente seus próprios interesses?
Por ocasião da conclusão de curso numa faculdade, de uma turma de sessenta alunos cinco compõem a Comissão de Formatura. “Tenho dentro de mim a sensação de que os integrantes daComissão de Formatura, pelo trabalho que estão tendo, devem obter algumas regalias em detrimento dos demais colegas”, diz um formando. Pois bem, soa diferente se esse que fala é um dos cinco que compõem a Comissão ou se é um dos outros cinqüenta e cinco alunos.
Critério para avaliar se o senso de justiça do outro é digno de admiração ou não: o quanto ele vai além de seus próprios interesses. Pode englobar, além de si, seus familiares, ou ir além, incluindo as pessoas de sua comunidade, de seu país, de outras etnias, da humanidade.
Quando esse sentimento interior de justiça é verbalizado, teorizado, discursado, pensado, já passa para o campo da moral. Sim, a moral é fruto da reflexão, que vai nos dizer o que é certo e o que não é certo. Por trás, a motivar nossa moral, está o nosso sentir. Nosso senso de justiça influi na formação de nossa moral. O contrário também: uma reflexão no campo da moral pode provocar modificações no nosso senso de justiça.
SERENIDADE
O homem sereno passa pelos conflitos humanos sem se alterar, mantém-se tranqüilo e dentro de seu habitual jeito de ser. Não se torna raivoso quando desconsiderado e ofendido. Mas também não se submete. Não é um ingênuo. Sabe que o seu semelhante é capaz da bondade e da maldade.
Passa pela vida com os pés no chão, esperando dela o que é possível esperar. Sabe que se trata de uma curta temporada. Para que passá-la em meio a disputas e conflitos tolos? Sim, o sereno tem consciência do quanto a vida é finita e curta.
Lembro Mário Quintana: “Eu estava dormindo e me acordaram / E me encontrei, assim, num mundo estranho e louco... / E quando eu começava a compreendê-lo / Um pouco, / Já eram horas de dormir de novo!”
A serenidade e as outras qualidades que enfatizei se manifestam espontaneamente em alguns seres humanos. Sorte deles e sorte da humanidade em tê-los.
Quando passamos do campo da espontaneidade para o da “coisa pensada”, da razão e do discurso teórico, entramos no campo da ética e da moral. Vamos a ele.
Exercício - FLASH
Leonardo, um homem de 35 anos, dirigia determinado setor burocrático de uma grande empresa. Uma de suas novas funcionárias, Helen, uma mulher de 28 anos, começou a apresentar desavenças com seus colegas. Pequenas coisas geravam atitudes irritadas por parte dela.
Leonardo chamou-a a sua sala duas vezes sempre explicando da importância de se trabalhar em equipe. Na terceira vez, enquanto Helen se defendia, Leonardo observou-a melhor: vestia-se com cores aberrantes e estava usando um chapéu. Helen começou a chorar e Leonardo pensou: “Essa mulher parece ridícula chorando com este chapéu que está usando”. Teve vontade de rir.
Prezado aluno, faça uma pausa para pensar sobre o encaminhamento que você daria a essa situação. E recorde de situações semelhantes vivenciadas por você.
Leonardo chocou-se com seu próprio jeito de encarar aquela situação. Leonardo era um homem tolerante, possuía um bom senso do dever e era sereno. Essas qualidades humanas fizeram com que ele pudesse repensar a situação.
Deu-se conta de que aquela funcionária, pela maneira como agia e como se vestia, deveria fazer com que os outros sentissem antipatia por ela e rissem dela. Colocou-se no lugar dela e entristeceu-se pensando na solidão que ela deveria estar a sofrer. Ninguém sintonizava com ela.
Nesse momento, Helen enxugou as lágrimas com um lenço de papel e se desculpou por estar chorando na frente dele. Helen revelou olhar de surpresa quando ouviu de Leonardo: “Eu é que devo pedir desculpas por até agora não tê-la deixado a vontade para chorar na minha frente sem ter de se desculpar”. Ela sentiu de imediato a mudança na relação. Permaneceu em silêncio secando mais algumas lágrimas.
Depois, com voz calma, perguntou: “Por favor, seja sincero. Ajude-me. Por que você acha que eu estou tendo tantos problemas aqui?” Leonardo disse que ela se vestia com cores estravagantes e que seu chapéu também era estravagante. “Na verdade, por algum motivo, você não tem tido vontade de atrair para si os sentimentos bons de todos que aqui trabalham”.
Ela pensou um pouco e concordou. Disse que viera para a empresa por não ter conseguido trabalho melhor. “Eu sei que você e os outros não tem culpa disso”. Leonardo disse que até agora parece que eles tinham culpa sim. Helen sorriu: “Eu tenho de ser mais tolerante com vocês”. Na saída do encontro, Leonardo arrematou: “Espero que ninguém nunca mais tenha de se desculpar por chorar na minha frente”.
Prezado aluno, faça uma pausa para observar Leonardo. Vamos avaliá-lo.
Além das qualidades da tolerância, do senso do dever e da serenidade, Leonardo revelou boa capacidade de empatia. Na seqüência e de forma imediata, Helen também demonstrou empatia, também ela colocou-se “no lugar do outro”. No caso, no lugar de seu chefe e de seus colegas.
Essa mútua empatia súbita é chamada de FLASH: uma clarão rápido e intenso fornece luz necessária para que se tome conhecimento de algo que até então estava “no escuro”.
BEM MAL CERTO ERRADO
Ética debate o bem e o mal. Moral decide qual atitude é a certa, qual é a errada (NOTA 1).
Os termos “ética” e “moral” freqüentemente se apresentam misturados e sobrepostos. Alguns, inclusive, falam em ética das virtudes e ética das regras. A ética das regras, em meu texto, assemelha-se ao que chamo de “moral”. No dia-a-dia, ocupamo-nos mais com a moral do que com a ética, avaliando e julgando a nossa conduta e a conduta dos outros de acordo com algum parâmetro.
De forma simplificada, temos duas maneiras de decidir o que é certo:
a) Pelo que já está “escrito”, pelas normas.
b) Pelas conseqüências advindas de nossa opção.
NOTA 1 - A divisão por mim empregada não é considerada por muitos filósofos.
Aula Virtual 6 - A MORAL (inglês)
MORAL MISTA
Ora nos baseamos pela moral das normas, ora pela moral das conseqüências.
Normas já estabelecidas facilitam nosso agir. Caso contrário, em cada situação teríamos de examinar as conseqüências antes de decidir. Perderíamos muito tempo. E muito do que ficou escrito como certo foi pensado, praticado, constatado que era a conduta que propiciava as melhores conseqüências.
Houve um estágio “conseqüencialista” prévio ao estabelecimento da norma, do “já-escrito”. Apoderamo-nos de todo esse processo de forma imediata e dizemos: “Matar é errado, roubar é errado...” Porém, a vida é mutável com rapidez maior do que a velocidade com que as normas são criadas.
Há situações em que, se nos basearmos no “já-escrito”, estaremos adotando condutas ultrapassadas e não adaptativas. Por outro lado, uma pessoa que só se baseia nas conseqüências causa uma insegurança nas demais.
É também por isso que se escreveram os códigos profissionais. Sentimo-nos mais seguros se nosso médico é apegado ao Código de Ética Médica: sabemos com quem estamos lidando. Empresas também elaboram guias próprios de ética norteando as ações de seus funcionários e dando mais segurança para seus clientes.
Por outro lado, convém observar a “qualidade” tanto da moral das normas como da moral das conseqüências. As normas que encontramos prontas são aristocráticas, escravagistas, machistas, democráticas?
E as conseqüências? Quando uma decisão é tomada com base nessa moral, temos de observar a quem vai beneficiar. Nosso amigo, que costuma decidir sobre o certo e o errado por essa moral, está a avaliar as conseqüências pensando na humanidade como um todo? Em seu país? Em seu grupo? Em sua família? Em si mesmo? É um “conseqüencialista” que não enxerga além de seu próprio umbigo? Um que diz: “O certo é eu pegar para mim o casaco do outro, pois pelo menos um de nós, no caso eu, não tremerá de frio”. Ou é um “conseqüencialista” despreendido que conclui que o certo é “tirar um de seus dois casacos e vestir um homem desabrigado”?
ESPAÇO FORA DA MORAL
Há situações nas quais, para determinado indivíduo, não há ainda uma moral. Um espaço ainda fora da moral. Afinal, a moral não cai do céu, não está a priori pronta. Ela está em permanente construção.
David, um rapaz solteiro, conhece numa livraria uma jovem que lhe desperta muita atração. Segundo seus critérios, ela é daquelas capazes de lhe provocar uma paixão de “alta intensidade”. Apenas trocam alguns olhares e poucas palavras. Quando ela deixa a livraria, entra num carro onde um rapaz a espera e a beija. David consegue com a vendedora o nome e o telefone da jovem.
Num primeiro momento, crê que o dilema entre permitir ou não uma aproximação entre ambos será dela, que está namorando. Ele, livre e desimpedido, não precisa se questionar. Num segundo momento, David questiona se é certo paquerar mulher que tem compromisso com outro homem? Por outro lado, é certo fazer murchar seus próprios desejos? Afinal, a jovem em questão faz parte de um time especial que desperta nele paixão de “alta intensidade”.
David não possui uma moral “já-escrita” em relação à questão. Também não dispõe de um parâmetro para decidir qual decisão será a certa. Considera correta a conseqüência que favorece a humanidade como um todo. Mas, no caso, a conseqüência será benéfica ou a ele ou ao atual namorado da jovem. Enfim, nesse momento, o rapaz se depara com um espaço que ainda está fora da moral. Deverá trazer e catalogar essa situação imediatamente para o campo da moral? Ou deverá primeiro vivê-la, praticá-la e depois, só depois, com base na experiência, torná-la parte de seu discurso teórico sobre o tema?
Repito: moral e ética não são fenômenos que existem a priori, por obra divina ou determinação genética. A moral de um povo vai sendo construída, destruída, reconstruída. O mesmo se processa com a moral de cada indivíduo.
Exercício ANUAL
EXERCÍCIOS PARA SEREM REPETIDOS PELO ANO TODO !
Para realmente modificarmos nossa vida com este curso, devemos repetir, repetir e repetir no nosso dia-a-dia o que aprendemos nele!
EXERCÍCIO 1
Observe as principais relações que você mantém atualmente com base na:
“TOMOGRAFIA” DO RELACIONAMENTO PESSOA/PESSOA
O seu comportamento e o do outro mostra que:
. existe um relacionamento em que ambos são capazes sempre que se encontram de se comunicarem livremente e sinceramente entre si.
. existe um relacionamento em que ambos são capazes na maioria das vezes em que se encontram de se comunicarem livremente e sinceramente entre si.
. ambos fazem alguma tentativa, com algum sucesso, para estabelecer um relacionamento em que podem se comunicar livremente e sinceramente.
. em raras encontros são capazes de estabelecer um relacionamento em que possam se comunicar com algum grau de liberdade ou sinceridade.
. um ou ambos não tentam estabelecer um relacionamento em que possam se comunicar livre e honestamente.
. um ou ambos fazem esforços no sentido de evitar uma comunicação honesta entre ambos.
. a comunicação honesta entre ambos foi rompida por completo.
EXERCÍCIO 2
Reflita sobre o caso descrito a seguir.
(ele me foi enviado por uma pessoa que fez um de meus cursos para que eu o utilizasse com meus alunos; seu nome e outros dados foram alterados para preservar sua identidade; sou muito grato a ela)
Maria Helena, a avó, vai buscar Fabi, a neta de nove anos que mora com a mãe em outro estado. Conforme combinado na Justiça, a menina passará as férias com o pai, filho de Maria Helena. Trata-se de um casamento que terminou mal: os ex-casados brigam por telefone, não podem se falar, as famílias criticam-se asperamente.
No horário combinado, a ex-nora não aparece com Fabi. Maria Helena vai perder o vôo, terá de trocar a passagem e posar uma noite na cidade. Maria Helena, como a maioria de nós em semelhante situação, sente-se irritada. As decepções e a raiva acumuladas há anos tendem a vir à tona e a explodir numa grande briga.
Porém, Maria Helena decide evitar o comportamento habitual: “Vou ser criativa. Algo que ninguém da minha família e da família de minha ex-nora está sendo”. Maria Helena lembrou-se do curso e passou a analisar a situação de uma maneira diferente da habitual.
Lembrou-se da empatia e de observar os traços de personalidade, o nível de maturidade, as qualidades e os defeitos humanos.
Observou que ela, Maria Helena, era um pouco obsessiva. Queria administrar o meio. Planejava tudo com antecedência e angustiava-se quando a vida andava de forma diferente.
A ex-nora, por sua vez, era sob alguns aspectos imatura. Não media muito as conseqüências. Não se dava conta de que suas atitudes afetavam uma série de outras pessoas. Por exemplo, Maria Helena teria de cancelar a hora no dentista marcada para o dia seguinte.
Portanto, era uma obsessiva lidando com uma imatura. Ela teria de diminuir sua obsessão. Quem sabe as coisas andaram de forma diferente ao planejado não poderiam resultar em algo melhor?
Maria Helena resolveu exercitar sua empatia. Pensou: “Não deve ser fácil para uma mãe, por ordem da justiça, afastar-se mesmo que temporariamente de sua filha”.
Seis horas após o combinado, a ex-nora aparece. Joga os cabelos bem escovados para trás e, de seu rosto irretocavelmente maquiado, deixa escapar o sorriso irônico: “Como se seu filho nunca tivesse me feito esperar!” Maria Helena abraça calorosamente a neta. Apresenta-se para o novo namorado da ex-nora: “Sem lhe conhecer já lhe quero bem. Minha neta falou por telefone muito bem de você. Sinal que você é um bom homem e a trata bem”. Volta-se para a ex-nora e diz: “O que são algumas horas de espera em contrapartida a esse presente maravilhoso que você me deu?! Poder conviver nos meus últimos anos de vida com uma menina maravilhosa como é a tua filhinha. Fabi tem muito de você”.
Maria Helena, antes de falar, buscara dentro de si motivos para ter afeto pela ex-nora. Portanto, expressou algo que sentia. Tudo que é dito com sentimento sincero convence.
A bem maquiada ex-nora e seu novo namorado, constrangidos frente à inesperada recepção amistosa, aceitaram o convite para jantar. A partir desse primeiro momento criativo, uma trégua teve início. Após muito tempo, Fabi viu as pessoas adultas com as quais ela convivia e tinha afeto se relacionarem sem agressão. Relaxou a ponto de, em meio à janta, dormir sobre duas cadeiras com a cabeça no colo da avó.
O bem que Maria Helena fez!
EXERCÍDIO 3
Anote na sua agenda o esquema abaixo e, seguidamente, recite-o para sempre tê-lo vivo em sua memória:
REVELA INTELIGÊNCIA EMOCIONAL QUEM:
1. Sabe que não sabe.
2. Sabe desapressar.
3. Sabe observar.
4. Sabe escutar.
5. Sabe calar.
6. Sabe ser empático.
7. Sabe descobrir os pontos comuns.
8. Sabe dar prioridade à relação pessoa-pessoa.
9. Sabe ser franco sem ser transparente.
10. Sabe o ponto de aproximação-distanciamento.
11. Sabe que o outro em alguma coisa é professor.
12. Sabe as palavras certas.
13. Sabe da tendência genética para certos comportamentos.
14. Sabe da influência das vivências e do aprendizado.
15. Sabe olhar-se no espelho.
16. Sabe que somos semelhantes e diferentes.
OBSERVAÇÃO ESPECIALIZADA
TRAÇOS DE PERSONALIDADE
1. Narcisista
2. Paranóide
3. Histriônico
4. Dependente
5. Obsessivo
6. Instável
7. Esquizóide
8. Anti-social
9. Otimismo versus pessimismo
NÍVEL DE MATURIDADE
1. Temas de interesse
2. Concreto versus abstrato
3. Responsabilidade
4. Prazer versus realidade
5. Teste da realidade
6. Administrando ansiedades
.Negação
.Onipotência
.Projeção
.Deslocamento
.Sublimação
.Antecipação
.Humor
DEFEITOS HUMANOS
1. Inveja
2. Ciúme
3. Calúnia
4. Preconceito e discriminação
5. Maldade
QUALIDADES HUMANAS
1. Tolerância
2. Desprendimento
3. Compromisso
4. Senso de dever
5. Senso de justiça
6. Serenidade
ÉTICA E MORAL
1. Moral das normas
2. Moral das conseqüências
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COM A PALAVRA O PROFESSOR
Agradeço a todos que tem feito os meus cursos. Apesar de já estar na “estrada” há muitos anos, continuo bastante motivado. Porém, não consigo terminar um curso sem pedir desculpas aos meus alunos, pois gostaria de ter sido um professor melhor.
Um forte abraço,
Jorge Alberto Salton